Farme! Brasileira

Autor(a): Zunnichi


Volume 2

Capítulo 41: Julgado

O lado de dentro do portal tinha o mesmo cheiro horrível dos esgotos, e a culpa era com certeza porque goblins jogavam bosta para todos os lugares.

Lucas não se enojou por ter se acostumado ao cheiro dos esgotos, mas ainda queria ir embora por causa que agora seus sapatos se sujaram.

Pena que uma vez dentro do portal, não tinha como voltar até matar o chefão. Na última vez, encontrou-se com um hob como chefe, mas se esses carinhas eram monstros incomuns fora do portal, logo o chefão deveria ser outro.

 

Selva de Tarnisgan

1° Andar

 

Núcleo do Vilarejo Goblin.

 

Outra vez o nome dessa selva. Era igual ao do primeiro portal, o que girou uma chave na sua cabeça. 

Se ele estava no mesmo lugar de antes, então portais não necessariamente transportavam a pessoa para outro mundo, mas sim para o mesmo, apenas numa localização diferente.

“Se é isso, por que os outros não chegaram a essa conclusão também? Esse lugar é muito semelhante a antes, não é como se fosse impossível concluir isso.”

Novas dúvidas inundaram sua cabeça, mas podia ser que somente ele via as telas flutuantes, o que tiraria a possibilidade deles chegarem mais facilmente a essa conclusão.

No entanto, perder-se em pensamento naquele lugar era uma péssima escolha. 

Goblins saíram de suas casinhas e avançaram na direção do invasor, obrigando-o a sacar sua espada e na mesma velocidade cortá-los em pedaços.

 

Aura de Morcego ativada

 

A vida de todas as criaturas serão constantemente drenadas ao longo do tempo.

 

Essa habilidade enfim podia ver algum lampejo de utilidade, estava até feliz de enfim colocá-la em ação nem que fosse por um curto período.

Não que fosse necessária sua plena atenção para lidar com esses monstrinhos que matava há tanto tempo.

“É melhor ser precavido do que esperar um desses bichinhos enfiando uma faca na minha coxa enquanto não presto atenção.”

Um desses carinhas tentou exatamente isso, só para levar um chute no meio do rosto que quebrou seu nariz inteiro e o fez voar para longe.

Lucas estava começando a sentir os efeitos do título adquirido, só o golpe aplicado no goblin da faca demonstrou o tanto do dano.

A marca de seu sapato afundou na cabeça da criaturinha, estava toda inchada e vermelha na região.

O rapaz deslizou o sabre da orelha a metade da boca de um goblin, em seguida atingiu um carinha se esgueirando atrás dele com uma joelhada em cima do pescoço fino.

Esses carinhas não paravam de vir, mas o esforço mal custava uma gota de suor. Sua única preocupação era não ter visto nenhum chefe ainda. 

Isso até seus olhos passarem pela estrutura mais alta da vila, um tipo de trono criado por ossos de animais e com um cara feioso sentado.

Ele tinha uma pele verde-escuro, mas não era nada semelhante ao troll ou ao ogro vermelho. Seus músculos eram curtos e a postura dele era estranha.

Ao lado do trono, havia um cajado preto com uma caveira humana na ponta. Isso tava muito estranho, seu pressentimento ruim estava ainda pior. 

Após algumas hordas, enfim só sobrou o principal. Seu inimigo não saiu do lugar, somente levantou o cajado e os goblins foram consumidos por uma energia sombria.

“Um necromante?! Tá de sacanagem comigo, é por isso que ele tá com a bunda gorda lá em cima!”

Lucas disparou uma rajada de vento enquanto os mortos-vivos não vinham em sua direção, só para ver sua magia ser dispersa por uma barreira mágica.

— Grah, ga gob! — urrou o maldito necromante, ordenando que seus minions atacassem.

— Se eu soubesse tua língua, eu te xingaria tanto que você ficaria sem os ouvidos! — Um soco esmagou o peito de um goblin mortinho que pulou na sua direção.

Os números voltaram a ser infinitos, e pior era a proximidade entre todos. Isso obrigou  a usar a magia Demolir para gradualmente deteriorar o chão e abrir buracos.

Isso, mesmo tirando permanentemente alguns dos monstros, era desvantajoso por diminuir os lugares do qual podia se movimentar.

Ele precisava logo lidar com o necromante. Sabe-se-lá se haviam outros monstros ou corpos ao seu redor, mas enquanto aquele cara estivesse vivo, a batalha não terminaria.

Lucas abriu sua velha bolsa que levava para todo lugar, puxando o arco e um punhado de flechas. Atirou todas, só pra se ver frustado por aquela proteção.

Prendeu o arco ao redor do corpo, seus pés se impulsionaram para que desse um grande salto, chegando a altura do trono com as duas espadas na mão. 

Desceu as lâminas com toda sua força, mas novamente aquela maldita proteção não permitiu que o corte fosse adiante.

Ambas as espadas brilharam numa cor verde, imbuídas com uma quantia alta de magia. O fio enfim rasgou a barreira, despedaçando-a em um X. 

Isso serviu como um bom susto ao hob em cima do trono, que saltou para evitar entrar na linha das espadas.

O trono foi rasgado em migalhas em seguida. Lucas se equilibrou nos pedaços restantes até chegar a zona de pouso de seu inimigo.

As espadas em sua mão não pararam de se mexer, arrastando parte da terra junto conforme aplicava mais força no braço. 

— Fica parado logo, desgraça!

O desespero foi muito em vão, o inimigo era muito mais fraco do que imaginava. O medo só vinha da quantia de inimigos, mas um hob sozinho era fino como papel.

A espada da katana enfim atingiu o corpo do monstro, seguido por outro corte, e mais um, e outro, até que a carne rasgada do monstro parecesse moída.

Respirou muito fundo, vendo o corpo do hobgoblin necromante se desmanchar no terreno esburacado da vila.

 

Você matou o chefe do portal. Drops especiais foram conceitos.

 

Cajado de Necromante 

Permite reviver criaturas com níveis menores que o seu em uma forma morta-viva. Skills serão removidas e eles perderão 25% de seus atributos.

 

Agora era hora de retornar. Atravessou o portal, guardando seus galhos dentro da mochila, mas o que ele não esperava era um conjunto de pistolas mirados em sua direção..

Vinham de todas as direções, portadas por homens altos e fardados.

— Você está preso, levante as mãos e vire!

Finalmente, a sorte de Lucas havia acabado.

 

*****

 

Lucas não soube desde quando a polícia estava no seu encalço. Pensando em retrospectiva, achou suspeito demorarem tanto para pegá-lo.

Se pudesse dizer, tudo começou no primeiro portal, seguido pela invasão numa propriedade privada, caos público com suas bombas e agora obstrução de um portal desconhecido sem a devida permissão.

Nem na vida passada ele foi tão bandido assim. Seus olhos encararam o teto de pedra da cela, as algemas em seus braços podiam facilmente serem quebradas com um feitiço.

Achou engraçado que quando o pegaram na saída do esgoto e puxaram sua ficha técnica, descobriram que Lucas não possuía nenhuma habilidade e por isso não usaram um colar restritivo em seu pescoço.

Esse colar era uma das poucas coisas capazes de conter os criminosos em suas celas, um dispositivo sofisticado que bloqueava o portador de usar qualquer habilidade que tivesse.

Foi por causa disso que a sociedade não morreu quando as pessoas passaram a usar suas capacidades sobrenaturais.

Ele estalou o pescoço, brincando com as algemas ao abrir os braços e ver elas tremerem só por causa desse gesto. Com sua força bruta seria capaz de quebrá-las. 

“Irônico que sei muito pouco desse mundo, só lembro de ter olhado sobre isso numa das minhas primeiras pesquisas por cima… Eu deveria voltar a estudar?”

Enquanto se perdia nos seus pensamentos mundanos, uma batida nas barras da cela chamou sua atenção. 

— Senhor Lucas, hora de sair — disse o guarda, com um cassetete na mão e vestindo um traje preto. — Vou levá-lo ao delegado, por favor não faça nenhuma besteira enquanto vamos para lá.

— Tá bom… — Chutou que o guarda estava pensando que ele iria aprontar alguma coisa quando saíssem. “Se não for isso, significa que outras pessoas fizeram algo semelhante.”

Os dois andaram pela delegacia até enfim chegarem na sala do delegado, um lugar com uma aura extremamente opressora pela aparência do cenário.

Não bastava que havia uma placa dourada em cima da mesa com o nome dele, além de diversos certificados na paredes atrás junto de diversas fotos.

Lucas se sentou conforme foi mandado, querendo se manter o mais calmo possível rente a um oficial. Ele obviamente não conseguia, era sua primeira experiência ali.

A única coisa que passou pela sua cabeça era o quão decepcionada sua mãe estaria se tivesse sido chamada, o que ele implorou para não acontecer imaginando a confusão que rolaria.

— Bom, eu já dei uma olhada no seu histórico, garoto — disse o homem, pondo uma pasta em cima da mesa. — Várias denúncias de agressão, abuso verbal e psicológico, assédio… Sua lista é grande, eu até não esperava isso quando vi o seu rosto, mas não podemos julgar a pessoa pela aparência, certo?

“Porra, eu do passado, tu me fodeu bonito!” Lucas deu um sorrisinho leve e bobinho. — Be-bem, o se-senhor está cer-certo, seu de-delegado. 

— E também, houve uma nova denúncia sua de um homem de bem recentemente. Ele disse que foi espancado por vocês dois serem amigos de escola… Não sei que tipo de amigo faria isso com o outro depois de se verem.

“Leon filho duma puta!”

— Mas você tá com sorte, garoto, uma pessoa veio assim que foi informado da sua prisão. 

“Pera, se for a minha mãe, fodeu!” Lucas levantou da cadeira num pulo. — Que-quem é, seu delegado? Não é… não é ela, né? Né?!

— Ela quem, garoto? É um homem, se acalme. Ele disse que queria há um tempo te conhecer, infelizmente essa foi a única forma que encontrou…

— Senhor delegado? — perguntou o mesmo guarda que escoltou Lucas antes, invadindo a sala repentinamente. — O senhor Xingxong chegou. Ele perguntou se já pode entrar.

— Sim, traga-o aqui. Eu não estou com muita paciência para esperar os atrasos desse paspalhão.

Lucas viu a figura entrar, tomando um susto por lembrá-lo bem por cima como alguém do departamento de vendas do governo.

Ele era o mesmo homem maquiado metaleiro oriental de antes, não dava para discernir quando observava o cabelo azulado longo e os olhos esverdeados.

Era o homem da qual teve um mal-pressentimento quando cruzaram caminhos, e agora mesmo ele tinha a sensação igual.

— Olá, delegado — falou, com um sorriso bem largo no rosto. — Podemos resolver isso como sempre resolvemos, não?

O homem oriental colocou uma maleta em cima da mesa e empurrou para o outro lado da mesa. O oficial olhou o que tinha dentro e rapidamente fechou, sem dar chance para espiar o conteúdo.

— Está tudo certo, pode levar o garoto.

Um sorriso saiu daquele homem, tão grande que causou medo em Lucas.

“O que esse cara quer comigo? Tá muito estranho isso!”

Após ser liberado, os dois foram encaminhados a entrada da delegacia, onde as algemas de Lucas foram libertas e seus bens retornados.

A primeira coisa que ele fez ao receber sua bolsa de volta foi equipar o anel, algo que já tinha apego emocional demais por ganhar tantos pontos de uma vez.

Conferiu se estava tudo certinho na bolsa, só para encontrar seus olhos com os de Xing Xong, que causava um desconforto imenso por demonstrar uma malícia descomunal.

— Você é ele mesmo… Ora, é mais baixo do que eu lembrava…

— É…

Silêncio. Lucas teve um dejá vù, certamente aquilo tinha acontecido em outro momento, mas com outra pessoa no lugar do chinês.

— Pois bem, Lucas, eu estava mesmo procurando você a muito tempo. — Ele pegou uma planta do bolso, da qual o rapaz reconhecia bem. — Lembro de você ter trazido isso ao meu departamento. Eu vou te oferecer um acordo: me traga o máximo disso quanto possível, e eu te darei tudo o que você quer.

Para o azar do mundo, a sorte de Lucas na realidade nunca acabou.



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