Volume 1
Capítulo XXVI: A flâmula para esta terra.
Então já era noite e sob aquela luz vinda de forma anacrônica de lâmpadas de óleo e elétricas todos comiam e se divertiam, Gilmar contava seus feitos ou causos de sua vida (diga-se azares). Também era interessante o fato de que muitos nativos se esforçaram, de forma inocente quase infantil, para falar português.
Um jovem que mal entrou na adolescência com seu português esforçado que tinha começado a aprender disse:
“Giu—mah, Il gustah ama to Dheos. (Gilmar eu gosto, amo seu Deus), Il pensa elle se multo gentil (Eu penso que ele é muito gentil).”
—É Ele é legal nós que não colaboramos rsrs, respondeu Gilmar.
—Os nativos nos contam que há poucos anos aqui não era um simples ou pobre vilarejo, mas uma comunidade próspera onde pessoas vinham de vários lugares prestar homenagens a deusa da sabedoria e também descansar e aproveitar as águas, as mesmas águas que agora usamos também para gerar energia, essa rota que vocês Gilmar e Kuria estão fazendo já foi movimentada e aqui tinha muitas pousadas. O morador mais velho disse que aqui já chegaram a viver 4 mil pessoas e que um bom número deles foram mortos, recrutados ou expulsos daqui pela guerra.
—Frade antes de continuar sua história, uma dúvida me incomoda.
—Diga Gilmar
—Como vocês aprenderam pelo visto tão rápido a língua dos nativos?
—Bom tivemos não sei se já foi dito a ajuda dos seguidores de nossa amiga a Sra Kuria que aqui está presente conosco, eles como vocês sabem e ela saberia falar melhor, foram inspirados e logo aprenderam nossa língua e nos ensinaram a falar língua local, na verdade ainda estamos aprendendo, eles são andarilhos um deles ficou conosco algumas semanas ensinado nosso pessoal e então partiu sabe-se lá para onde e desde então estamos nos esforçando por contra própria e em troca ensinamos o português e um pouquinho de inglês.
Kuria falou em seguida:
—Não é que eu tenha preferência, mas geralmente as pessoas que escolhem serem meus seguidores ou apóstolos (como eram chamados os seguidores principais do seu deus) são pessoas que não tem raízes e como vocês mesmo dizem no seu mundo, são considerados cidadãos do mundo, elas são leais apenas ao que acham justo segundo sua forma livre de pensar o que pode ser um pouco escandaloso para algumas pessoas mundos afora.
Gilmar retrucou:
—Nas faculdades de ciências humanas é cheio de gente assim, não estranharia se dentro do Brazil (se referindo aos Brasileiros) a Srta tivesse arregimentado um grande número de seguidores.
—Consegui mais almas do que vocês Brasileiros conseguiram para aquele deus da madeira…(A relação de Kuria com o cristianismo era literalmente de amor e ódio uma hora respeitava outra hora desprezava, fora que ela tinha ganho uma bíblia e de vez em quando lia e de preferência sem ninguém ver...)
De fato um movimento religioso surgiu no Brazil, toda a massa de jovens “dinâmicos” ou e que outrora eram ateus, muitos eram ou se consideravam revolucionários, segunda ou terceira geração de “esquerdistas”, “acadêmicos” que apoiavam abertamente o dito governo Brasileiro no exílio, aderiram em grande número a se podemos chamar assim de fé e adoração a Kuria.
Não passavam pela suas cabeças que Kuria por mais dissimulada que fosse às vezes até cínica e mimada era ainda (é que quando uma promessa é feita nem os deuses devem quebrar) forte aliada do governo imperial, a nomeação mesmo que por cortesia da deusa para o posto de Marechal era uma vitória da coroa e não dessas pessoas que a idolatravam no nosso mundo e isso futuramente causaria a derrota daqueles que apostaram que o aparecimento de divindades pagãs iam varrer de vez a legitimidade da Monarquia Católica Federal Brasileira e seus valores.
Voltando ao banquete enquanto a noite passava, alguns moradores pegaram seus instrumentos e tocaram músicas tradicionais. O teor da conversa caminhava para algo puramente ocasional quando um aldeão vindo de um país distante e que se dizia pertencer a um povo chamado Mazalekianos não cansava de contar que a humanidade segundo suas tradições aprendera a arte de dormir e descansar com os gatos e como os gatos dormiam bem e caçavam bem eles que ensinaram aos humanos.
Então chegará um momento em que Kuria, pois em cima da mesa um pacote e após rasgar o lacre com um único movimento, o fez abrir no ar tal como uma flor que desabrocha revelando seu conteúdo, conteúdo este que era uma bandeira.
—Senhores como podem ter visto isso veio de Forte São Jorge enviados pela Coroa, seus representantes sabem da existência deste assentamento (disse se referindo aos colonos) e reivindica para o império este lugar.
Tal como dito em decreto todos aqui que vivem nesta comunidade serão cidadãos Brasileiros agora e está bandeira devidamente colocada em um ponto alto simboliza que vocês (se referindo aos nativos) estarão sob proteção e se tornarão parte do Brazil, do Império do Brazil. Meus amigos em Brasília não os abandonaram.
Dois colonos sem ainda entender direito o que acabara de acontecer se prestaram a ajudar e pegaram a bandeira e a seguraram para que todos pudessem ver (a bandeira era grande com 2 metros de comprimento).
Kuria então chamou o frade Mathias e deu—lhe um documento:
—Frade, poderia fazer as honras e ler para todos nós?
Outro jovem também membro da missão colonizadora e missionária fez o papel de tradutor para os nativos e assim Mathias iniciou a leitura do que tinha em mãos.
—Decreto Imperial assinado no dia 6 de Maio de 2041 durante o terceiro reinado de sua Majestade o Imperador D. Rafael I do Brazil.
Descrição da bandeira a ser utilizada pelo território Ultramarinho de Forte São Jorge para ser hasteada em todos os pontos possíveis desta colônia em seus assentamentos já existentes e também nos que existirão.
Sob esta bandeira os colonos e os nativos amigos estarão protegidos, seus direitos respeitados e a autoridade nacional e imperial exercida.
Fundo azul escuro na proporção 7:10, no canto superior esquerdo a bandeira do Grande Império Unido do Brazil também na proporção 7:10. Na metade direita um disco oval contendo um soldado de infantaria de pele branca para parda e utilizando uniforme padrão de combate, olhando para o lado esquerdo da bandeira segurando com a mão direita um mastro com uma bandeira imperial cravada no chão e com o braço esquerdo segurando a alça de um fuzil preso nas costas.
No fundo do cenário as montanhas dos Alpes Brasileiro sob um céu azul ensolarado, como divisa o seguinte lema: Aqui Chegamos Aqui Ficamos. Em volta do disco, ramos de louros e oliveiras.
Que esta bandeira seja prontamente içada.
Terminada a “solenidade” Gilmar lembrou de algo que o deixou incomodado e perguntou:
—Agora que me dei conta, vejo os nativos desta comunidade de várias origens e ofícios, mas o não vejo, cadê, quem seria o líder desta gente? Toda comunidade tem pelo menos um representante, nem que seja o mais velho e experiente.
O frade Mathias respondeu:
—Essa gente tinha como governante o senhor feudal local que vivia a uns 20 kms daqui e a comunidade em si sempre elegia um representante que ficava no cargo por tempo indeterminado, porém com esta guerra civil o senhor feudal se juntou a facção de Galba convocando muitos homens de seus domínios inclusive vários daqui como o líder da comunidade. Tempos depois alguns mensageiros contaram que o exército em que eles lutavam fora massacrado por um exército de mercenários a serviço de Apolonius.
Então para que a comunidade não ficasse acéfala os moradores elegeram um grupo de anciões, ironias ou não ao longo do último mês passado quando já tínhamos chegado eles os três que foram escolhidos para liderar a comunidade foram morrendo de velhice ou doença cabendo a nós simples Brasileiros colonos o trabalho de cuidar dessa gente.
—Interessante história frade, diga aos nativos que lamento pelas desgraças pelas quais passaram. Comentou Gilmar que logo ficou olhando de forma irônica para Kuria e perguntou:
—Mais algum informe da coroa?
—Ah tem mais umas coisinhas sim, (risos).
Vai vir uma guarnição para cá chegará em alguns dias não se sabe quando, cerca de 35 homens ficarão alocados aqui mas nesta primeira missão virão 90 para realização de algumas obras de infraestrutura como instalação de torres de transmissão para telecomunicações, pavimentação, saneamento e fortificação militar.
Os presentes ao ouvirem (graças à tradução dos colonos) ficaram felizes.
Por volta das 23h00min horário local todos começaram a retornar a seus aposentos, Kuria e Gilmar foram convidados a ficarem em dois quartos da estalagem do povoado e levaram suas coisas, Gilmar estava cansado e mal se lavou já se jogou na cama do seu quarto pondo-se a dormir.
Kuria também se banhou logo após Gilmar, mas em vez de ir para seu aposento saiu e caminhou até sair do povoado e chegar a um terreno alto que era perto dali, lá ficou vendo a escuridão da noite estrelada, apenas uma das luas daquele mundo a menorzinha iluminava fracamente à noite e a escuridão só não era total, pois as lâmpadas elétricas instaladas pelos missionários e colonos iluminavam as principais vias, mas o silêncio era tal que se poderia ouvir o som da pequena hidrelétrica trabalhando a uma certa distância terreno abaixo.
O frade Mathias também tinha chegado ao mesmo local e Kuria ao ver falou:
—O que faz aqui frade? Também não deseja dormir? Está sem sono?
—Não, na verdade gosto do silêncio para fazer minhas preces, meditar e conversar com Deus
—Apesar do portal que liga os mundos existirem (graças a mim) o seu mundo onde seu Deus reina não está um pouco longe? Ou será que ele também pega carona conosco e pode atravessar o vórtice?
—O Senhor Criador está presente em cada parte da existência, ele ouve até os que não acreditam nele se forem justos de coração. Mas o que te trás aqui?
—Meditar, apreciar o silêncio e o frescor da noite, na verdade eu olhando tudo que ocorre e ocorrerá sei que terei uma parte de culpa.
—Você prever o futuro Kuria?
—Não como você deve imaginar, mas as ações das criaturas vivas principalmente as inteligentes geram consequências que podem ser vistas ou deduzidas tal como a direção de uma estrada sendo construída. Isso parece bobo sendo que na minha existência com o poder que tenho não precisando dar satisfações a ninguém sendo uma divindade é irônico, mas agora penso e vendo o que vejo pode ser que eu me sinta culpada apesar de que para nós deuses a dança da vida dos mortais deveria ser mero joguete e por um tempo para mim foi o que tem sido.
—Se me permite Kuria, queria dizer algo é que nós cristãos acreditamos que Deus criou nós humanos a sua imagem e semelhança. Claro que a distância entre o homem e Deus é imensurável, mas o Criador colocou em nós aspectos do seu próprio ser. Por isso eu particularmente acredito que muitos elementos humanos (ou até mesmo dessas criaturas “humanoides” que para mim também são humanas na sua essência) são divinos, pois vieram da centelha divina, ou melhor, dizendo do próprio Deus.
Não se culpe por ter sentimentos humanos, pois você está entre humanos pode ser uma divindade e ter seus argumentos para ser considerado uma, mas perante ao Criador somos todos iguais sujeitos a erros e acertos.
—Gostei da sua franqueza frade, gosto da sinceridade quase infantil, de vocês brasileiros.
Após a conversa Kuria finalmente se retirou para seu quarto para ir deitar, antes observou Gilmar em seu sono profundo e como quisesse provocá-lo incutiu em sua mente sonhos que não devem ser descritos, mas que pode ficar muito bem subentendidos a quem aqui leu.
Durante a noite longe dali entre os bosques e campos alguém corria desesperado tateando cego pela escuridão, tropeçando, ofegante, desesperado, o sangue escorrendo pelo corpo e pelas suas roupas que iam se misturado com o suor, a adrenalina tão forte que não se prestava atenção na dor e assim ia noite adentro em direção a São Francisco Xavier de Tarl—harrel.
Ele seguia por uma trilha e tinha como guia a fraca luz que via no horizonte atrás das colinas na direção de seu destino.
Pela manhã essa pessoa traria notícias, más notícias.
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