Volume 1
Capítulo 15: Uma Canção A Caminho Da Guerra
Todos excepto Aiyden estavam sentados em uma roda na sala compartilhada; nadando em suas próprias dores, causadas por treinos e castigos, enquanto esperavam as portas das celas serem abertas.
A sala estava em completo silêncio, desde que saíram da ala médica ninguém ousou dizer algo e cada um apenas decidiu ficar com seus próprios pensamentos.
Olhando para o teto de concreto, Astrid batia a parte de trás da cabeça na parede como se aquilo fosse fazer algo brotar, como se fosse capaz de acalmar os vários pensamentos que se misturavam, confusamente em sua cabeça. Mas pior do que os pensamentos intrusos era recordar que a algumas poucas horas atrás, Aiyden havia quebrado o braço de Kieran.
Gritos ainda ecoavam nos ouvidos de Astrid, não lhe permitindo esquecer de forma alguma a dor que fora causada pelo menino sodalitano.
O sodalitano, que não só podia controlar a mente das pessoas, mas também transformá-las em pedra.
— Hoje é que eu não durmo. — Jase disse, alguns segundos antes de entrar na arena de luta.
Alguns minutos antes das notícias voarem, tão rápidas que quando Astrid chegou a ala médica, a luta de Aiyden e Kieran já era o assunto de destaque. Até as pessoas que não presenciaram a luta já estavam sabendo, na verdade Astrid acabou concluindo que todo o centro já estava sabendo.
A arte de espalhar fofocas ainda era a mesma, não importa em que lugar do universo estivessem, e como toda boa fofoca, as pequenas transformações e adulteração dos reais factos que sucederam começaram a surgir.
— Ele usa seus poderes de controle mental, para fazer as pessoas se matarem umas as outras. — Afirmou uma menina.
— Desmembrou todos do seu grupo — falou um garoto que parecia ter saído de algum seriado de vampiros.
— Ele cortou a cabeça do urso de pelúcia favorito de sua irmã — disse outro.
— Matou todos os integrantes do grupo zero.
— Afogou seu próprio cachorro.
— Ameaçou matar a diretora. — Essa ninguém pareceu realmente sentido.
— Vai assassinar todos do centro.
— Matou a própria mãe.
— Recebi tratamento VVIP. — Isso disse Jase.
Das coisas mais horríveis às mais absurdas ditas na ala médica, Astrid por pura curiosidade tentou saber dentre aqueles que o acusavam quem realmente havia presenciado tais coisas acontecerem e a maioria acabou a respondendo com um: Também me contaram. Eu não estava lá, mas tenho a certeza que ele fez isso. Eh!! Ninguém viu nada. Ninguém realmente sabe de nada. Foi a conclusão a que Astrid chegou.
O verdadeiro culpado não é o Centro? A pergunta cutucou insistentemente na cabeça de Astrid que a jogou para longe como um: O Centro não é uma pessoa, como poderia ser culpado.
Mas Aiyden é?
Da forma mais discreta que conseguiu, Astrid olhou para cima do ombro de Logan, e viu Aiyden, o qual se encontrava sentado perto da porta. Silencioso e longe o suficiente para que se esqueçam de sua presença, o que no momento actual parecia ser tão impossível quanto eles realmente saíram dali. Ao menos para Astrid era impossível, ambas as coisas, tanto esquecer da existência de Aiyden quanto acreditar que realmente sairia dali.
Não era um facto bonito, mas Astrid não conseguia realmente se ver dando uma passo para fora do Centro, não sem ter suas mãos pisoteadas ou uma bala cravada em sua cabeça.
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— Astrid!! Astrid. Acorda!
O corpo se moveu para o outro lado, como se soubesse onde estava o inimigo, que queria exterminar seu sono.
— Axel!! — A voz se elevou, mas o sobrenome que atravessou os ouvidos de Astrid não pareceu movê-la a abrir os olhos.
— Astri...
O par de olhos azuis se abriram, o rosto de Chloe entrou e saiu de foco. Astrid piscou os olhos várias vezes e sua visão por fim clareou.
— Astrid!! — Chloe gritou, e o corpo de Astrid se levantou. Manteve-se sentada por breves segundos e muito lentamente como se achasse que ninguém estava vendo tentou voltar a se deitar, no entanto Chloe a segurou pela camisa e a puxou de volta.
— Não vou!! — Foi tudo que Astrid proferiu antes de levantar as mãos em claro sinal de rendição.
Chloe a soltou, olhou brevemente para Aiyslnn e partiu.
Cinco segundos depois os olhos de Astrid se fecharam. Aiyslnn segurou seu rosto com as mãos, obrigando assim a companheira a abrir os olhos.
— Não durma!
— Não vou.
— Temos de ir.
— Tudo bem. Agora por favor, suas mãos. — Aiyslnn a soltou e de seguida jogou uma bolsa sobre as pernas de Astrid.
Astrid jogou a bolsa sobre os ombros e tão logo colocou os pés no chão um alarme soou e sem hesitar a soldada pulou de volta para cama.
— O-o que foi? O... que eu fiz?
— Temos de nos apressar.
Aiyslnn sem muita gentileza a puxou da cama e a empurrou em direção ao banheiro.
— Ainda não é hora da segunda abertura da cela, porque tanta pressa? — perguntou Astrid, após dar uma olhada no relógio.
Aiyslnn não disse nada e somente a empurrou para dentro do banheiro. Sem realmente se sentir na mesma página que suas companheiras, Astrid apenas fez o que vem fazendo frequentemente: Seguir suas colegas. No entanto, mesmo sem fazer qualquer pergunta para elas, Astrid não pode afastar o sentimento de curiosidade sobre factos como; Seu traje não ser o mesmo, tal que normalmente consistia em uma calça, regata, camiseta e um par de botas foi substituído por um fato de corpo inteiro, um casaco que chegava até um pouco acima de seus tornozelos, um par de luvas, botas e um cinto que devido a sua complexidade necessitou de mãos extras para poder prendê-lo e seguido a isso, Aiyslnn acabou prendendo suas tranças também.
Astrid não fez perguntas e ninguém também se dispôs a dar explicações. Saíram da cela e encontraram seus companheiros na sala compartilhada, todos vestidos para alguma coisa que Astrid não fazia a mínima ideia.
— Então...para que tipo de treino estamos indo? — Astrid perguntou para Jase, em algum momento enquanto caminhavam.
Jase olhou para ela, entretanto não disse, permaneceu em silêncio por algum tempo como se estivesse ponderando o que responder e quando enfim resolveu abrir a boca, Astrid desejou que ele nunca o tivesse feito, ao menos não para proferir a palavra: Guerra.
Guerra. Astrid nunca gostou delas, não só porque ceifavam vidas, mas também porque, temas como aquele em sala de aula, geralmente a forçavam a ter de memorizar muitas datas e nomes e que também agora a fazia lembrar que por alguma razão do universo, foi parar no meio de uma, e agora voltaria para lá.
— Posso não ir?
Os olhos azuis não estavam focados em ninguém, após entrarem em uma sala desconhecida e serem direcionados para uma fila, para fazer alguma coisa que a mente de Astrid não se deu ao trabalho de processar.
— Posso não ir à guerra? — Olhou para Edward, o qual se encontrava na fila do lado.
— Seria bom, se eu pudesse realmente te dizer que não precisa ir, mas...
— Eu vou morrer!! — declarou convicta. — Aquelas coisas...eles.... eles vão me matar... não vou sobreviver. E-eu estou aqui, a quê? Dois, um mês? Não há como... não há forma alguma de-de eu...
— Astrid!! — Edward gritou, após tomá-la pelos ombros. — Calma — sussurrou. — Fica calma.
— Eu... vou morrer. — Seus olhos começaram a lacrimejar e Edward a puxou mais para perto, seus olhos heterocromáticos a encarando intensamente.
— Não vão te deixar ficar só porque você quer. Só porque você se acha incapaz. Só porque você não está preparada.
— Mas...
— Eu sei! Você está com medo... — Limpou as lágrimas de Astrid que caiam sem controle. — Mas vai ter de encarar na mesma. Não há por onde fugir, então só se mantenha perto de nós e tentaremos ao máximo para que você e todos nós possamos voltar, tudo bem?
Astrid abanou a cabeça em negação. Edward olhou por cima do ombro dela, tornou a encará-la, limpou suas lágrimas, apertou seus braços com força e em seguida a virou em direção a fila de onde ela havia saído, sem perceber.
Um soldado que se encontrava na fila parou brevemente, abrindo espaço e sem nenhum aviso prévio, puxou Astrid para ocupar o espaço e assim se tornar novamente parte daquela fila. Edward entrou em sua fila e até se tornar a primeira, Astrid persistiu olhando para Edward, que uma vez ou outra apertava seu braço, como se quisesse lhe passar força ou até emprestar um pouco de sua coragem.
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Astrid não estava realmente prestando atenção aos dois ajudantes que a enchiam de itens e armas, enquanto explicavam sobre qualquer coisa que na cabeça dela não parecia realmente relevante. Afinal ela iria morrer mesmo.
— O bracelete é bastante resistente, mas não é indestrutível, então tome cuidado, pois só a partir dele podemos te localizar e saber a tua condição.
Explicou um dos ajudantes e depois uma demonstração se seguiu, explicando brevemente o funcionamento de suas botas que poderiam fazer coisas como: gerar lâminas pela sola e pelas laterais, resistir a temperaturas muito frias ou muito quente e resistentes a lâminas, ao menos a uma normal e por fim começaram a falar de foices, tais que fizeram Astrid pensar em ceifador e de seguida em morte. A sua morte.
— Pode ser um pouco difícil manejá-las de princípio, mas rapidamente iras se acostumar a elas. E não esqueça de nomeá-las....
O ajudante continuou falando, mas Astrid não estava mas aí, ou melhor, sua mente não estava mais naquele lugar.
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As informações entravam por um ouvido e saim pelo outro. Doutora Swooney, explicava algo sobre o campo de batalha, inimigos, lutas, mas Astrid não estava realmente ouvindo.
Seus olhos quase opacos, exploravam seu redor o qual era completamente novo para si, até o céu parecia novo, como se não o visse havia anos.
Lembrou-se de Aiyden dizer que estavam em algum lugar na fronteira de Aquamarine. Mas novamente não conseguia aceitar que aquele lugar coberto de neve poderia de algum modo ser Aquamarine, afinal como um país que nunca em toda sua história registrou algo como neve, poderia simplesmente começar a nevar.
Com os dentes se chocando uns contra os outros, Astrid batia o pé, a fim de afugentar o frio. Seus olhos vagueavam pela nova paisagem que parecia ser o cenário de algum filme de ficção científica, com direito a naves e fileiras de soldados prontos para irem à guerra, para lutar pela humanidade.
Infelizmente para Astrid, ela fazia parte daquele grupo de soldados.
Em céu aberto, eles se encontravam sobre um extenso chão pavimentado, com várias naves e carros de grande porte. A entrada do centro não passava de uma pequena construção que se por acaso ignora-se as naves, carros e soldados, poderia facilmente ser confundida com um banheiro a beira da estrada, claramente isso se também fechasse os olhos para os guardas que se encontravam perto do banheiro, todos bem armados e posicionados bem perto da entrada a qual era um elevador cheio de câmeras e que segundo Jase, possivelmente também pode haver algum tipo de arma escondida em algum lugar, pronta para atirar em intrusos ou soldados fugitivos.
Logan que se encontrava de frente a Astrid começou a se mover, fazendo-a assim perceber que o discurso de Elis já havia terminado e que era o momento de ir.
— Aiyden.
Como se combinassem três cabeças se moveram ao mesmo tempo. Aiyden, Jase e Astrid olharam para Ian Moore que com um gesto de cabeça falou:
— Vamos.
Sem qualquer tipo de despedida, Ian e Aiyden se foram.
— Ele não...
— Vai a guerra? — Jase sugeriu. — Uou!! Deve ser incrível ser um VVIP, você não só recebe boa comida como também sequer vai à guerra.
Jase sorriu.
— Odeio essa merda de lugar.
A fila andou e Astrid permaneceu olhando para as costas de Aiyden e determinados pensamentos começaram a dançar em sua cabeça. Pensamentos que ela certamente não ousaria dizer em voz alta.
Ela com certeza não admitiria que: Suas chances de sobreviver acabaram de ir para baixo de zero, agora que Aiyden se foi. Não que estivesse dependendo dele para sobreviver, entretanto Astrid achou que talvez ele poderia fazer com que sobrevivessem mais uma vez.
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Com a cabeça baixa, Astrid orava. Com os olhos fechados e as mãos juntas pedia por ajuda e proteção, sussurrava vários: Me ajude senhor! Me salva, senhor!! Até que sentiu um peso sobre as suas mãos e de seguida o frio veio e ela soube que se tratava de Aiyslnn.
Astrid parou de orar, no entanto não abriu os olhos.
Muito frias. Suas mãos são muito frias. Poderia por favor não me tocar!
Astrid ensaiou em sua mente, porém quando seus olhos encontraram os azuis de Aiyslnn, as palavras simplesmente se evaporaram, diante daquele olhar ainda estranho, ainda tão desconhecido e frágil que se Astrid resolve-se mesmo o achar genuíno, ele... sumiria.
Aisylnn não disse nada, por longos segundos apenas se manteve olhando para Astrid a qual mesmo tendo seu corpo atacado por vários arrepios, não puxou sua mão para longe do toque de Aiyslnn, a qual começou a entoar uma canção de aniversário. Tão repentinamente. Tão fora de contexto.
A boca de Astrid se abriu um pouco ao mesmo tempo que as suas sobrancelhas se elevaram. Um sorriso brotou nos lábios de Aiyslnn e em algum momento enquanto cantava virou o rosto e um tempo depois Astrid percebeu que ela olhava para Logan.
Sua voz era alta, então rapidamente todos os soldados que se encontravam na nave tinham os olhos nela. Astrid a cutucou levemente como se quisesse avisá-la, mas Aiyslnn percebendo ou não, prosseguiu cantando.
— Não acredito que você está fazendo isso... — Jase limpou a garganta. Testou a voz. Passou a mão pelos cachos e começou a cantar.
Risadas soaram ao som da voz de Jase, que parecia não se importar enquanto tentava cada vez mais afinar sua voz e então o dueto facilmente prosseguiu para um coro. Todos os soldados cantavam para Logan, o qual apenas sorria, triste.
— Para o nosso querido Logan.... — Todos pararam e só a voz de Aiyslnn prosseguiu. — Muitas salvas... de... palmas... Feliz aniversário!!
Aiyslnn desejou, antes de se desfazer em lágrimas.
— Espero... que não seja o último.
— Não será. — Logan disse por fim. — Obrigado a todos. — Agradeceu, sorrindo.
Não será. Astrid repetiu. Enquanto tentava conter as lágrimas, ela prosseguiu repetindo em sua mente.