Volume 1 – Parte 2
Capítulo 12
Big Tom batia os pés com impaciência. Com sua pequena cara emburrada, ele relutantemente olhava na direção de Lorenzo, como uma criança que encara os pais quando ouve um não.
— Não entendo por que fez isso…
— Entende sim. — O italiano comentou, puxando do bolso um pequeno pacote de cigarros e um isqueiro de latão, enferrujado. O objeto tinha inscrições de seu lado direito, todas em italiano, e seu fogo saiu em uma coloração esverdeada. A fumaça do cigarro tampou uma parte essencial de seu rosto, seus olhos cor de ônix. Só então Thomas foi capaz de olhar Lorenzo nos olhos. — Só é orgulhoso demais para aceitar, Tom.
— Precisamos do banqueiro, grandão… — Jerry comentou, olhando para Lessley logo em seguida. — Vai ser útil pro plano do Lorenzo.
— Ainda não me cai a ficha que vocês querem trabalhar com um sujeito como ele!
— Não queremos… — Lorenzo disse, olhando para frente e encarando o sujeito gordo e baixo que vinha em sua direção. Era Samuel, que caminhava na direção do grupo de três homens, com a cabeça baixa e olhando ao redor, como se estivesse envergonhado de estar ali entre eles. — Mas é preciso.
Goldberg a passos lentos se misturou ao grupo. Seu olhar não pousava no rosto de nenhum deles. Sequer mirava os pés deles. Apenas estava presente, de maneira distante e envergonhada, enquanto estalava os dedos de vez em quando.
— Então? — Perguntou o homem que havia convidado o banqueiro para aquilo tudo. Ainda mantinha o cigarro aceso entre seus dedos, e de vez em quando dava um enorme trago. — Conseguiu fazer sua ligação?
Anteriormente, para a estranheza dos três, Samuel fez um pedido assim que ouviu o convite do Italiano comunista. “Posso fazer uma ligação?” o banqueiro pediu. Era uma frase simples, que em sua boca e naquele momento, foi como se ele estivesse prestes a ser preso para nunca mais ser libertado. Uma última ligação, por favor! Implorava em pensamento, como se os homens diante dele houvessem-no ameaçado. Lorenzo o permitiu de imediato, mas Big Tom disse que o sujeito estava prestes a chamar a polícia, fazendo Jerry temer por um momento que iria voltar para a cela.
Porém, nada disso aconteceu. Na realidade, poucos instantes depois disto e terminado o diálogo de antes, Goldberg reapareceu.
—...Algum de vocês…— Ele começou a dizer, tropeçando sobre as próprias palavras, incerto de onde pisar com as palavras e caminhando por entre aquela simples e vergonhosa frase. — Tem uma moeda para me emprestar?
Thomas desatou a rir, tamanha a ironia que somente ele enxergava. Agarrava o próprio estômago, como se suas entranhas se misturassem, tamanha força que fazia. Nem é tão engraçado assim, criolo de merda. Goldberg pensou, por muito pouco não dizendo.
Lorenzo, porém, entregou ao banqueiro algumas moedas que tinha no bolso. Samuel apenas precisava de vinte centavos, e devolveu o restante para o italiano. Não encostou nas mãos do homem quando fez isso, no entanto.
Com dinheiro em mãos, correu para voltar até a cabine telefônica. Era um lugarzinho apertado demais — menos de um metro quadrado — com vitrôs tão sujos que mal podia se notar que um dia já foram transparentes. Haviam recados espalhados pelas paredes, locações para alugar, médicos baratos e familiares, mulheres que precisavam de um emprego e aceitavam o trabalho de empregada doméstica — havia vários assim.
O banqueiro olhou para todos eles por um momento, antes de fato fazer a ligação. Estava desconfortável, pois a sua barriga encostava constantemente nas paredes e no telefone, além de sentir o suor escorrer pela sua nuca por estar naquele lugar apertado. Também estava apreensivo com o que fazer. Antes, quando disse que queria fazer uma ligação, na verdade sequer sabia para quem ia ligar. Pensou em ligar para seu chefe e avisar que havia ido ao hospital e agora foi sequestrado por três negros. No entanto, seu chefe nunca acreditaria nisso, ele estava bem quando saiu do banco pela manhã.
Imaginou como seria ligar para a polícia e contar a eles todo o ocorrido. Era óbvio que os policiais o ajudariam. Porém, ele hesitava. Por quê?
Pois o homem se lembrava da situação que havia passado na casa. No fim das contas, o que adiantaria ligar para as autoridades ou ao seu chefe? De todas as maneiras teria de voltar para aquele lugar, trabalhar e talvez ser sufocado quase até a morte mais uma vez. Tem algo lá, com toda a certeza! Podia ser algo natural ou sobrenatural, mas não importava. A única coisa importante era voltar para aquele palácio.
Talvez fosse por isso que o italiano comunista queria ir comprar aquele lugar. O criolo deve saber um jeito de cuidar da casa, de limpá-la!
— Sim… ele deve saber… — Murmurou, com um meio sorriso abrindo em seu rosto. — E quando eu descobrir como, posso eu mesmo cuidar daquele lugar!
Goldberg ainda ansiava possuir aquela casa. Não era ingênuo, sabia do perigo que existia ali, a desejava ainda assim, no entanto. Num ímpeto doentio e estranho, inseriu a moeda de vinte centavos, junto de outras que possuía. Quando o tilintar delas caindo soou, colocou um número que conhecia de cor e salteado e esperou até uma doce voz soar.
— Casa dos Goldberg, com quem eu falo? — Disse a mulher do banqueiro, sua voz soou robotizada pelo fio telefônico.
— Meu amor, sou eu… — Começou a dizer, notando que estava prestes a dizer mais uma meia verdade para ela. — O trabalho está me sugando muito hoje, está bem?
Nada disse por um momento após isso, esperava algum comentário de sua mulher, porém ela também se manteve em silêncio como se esperasse algo além. Talvez um pedido de desculpas?
— Não me espere para o jantar. — Comentou por fim, desligando o telefone e ouvindo seus bips mecânicos.