Volume 1
Capítulo 27: Mel (Parte 1)
Organizar chás era um negócio legítimo para as concubinas. Gyokuyou parecia promovê-los quase todos os dias. Alguns aconteciam no Pavilhão de Jade; outras vezes, ela era convidada à residência de outra concubina.
“Excelente oportunidade para sondar umas às outras e fazer política”, pensou Maomao. Ela própria não era grande fã desses encontros. Os assuntos de conversa costumavam se limitar à maquiagem e às últimas tendências da moda. Uma conversa entediante, pontuada aqui e ali por perguntas sutis, porém calculadas. Um microcosmo perfeito do palácio interno. Elas pareciam bem à vontade com tudo isso... acho que é isso que faz delas concubinas.
Naquele momento, Gyokuyou conversava com uma concubina de nível intermediário que também vinha do Oeste. A origem em comum parecia incentivar um diálogo mais animado. Maomao não sabia os detalhes, mas o tema parecia girar em torno das futuras relações com a família de Gyokuyou.
Gyokuyou era uma conversadora alegre e envolvente, e muitas concubinas acabavam lhe revelando pequenos segredos antes mesmo de perceberem o que estavam fazendo. Uma das tarefas de Gyokuyou era anotar essas informações. Sua terra natal era árida — mas também um ponto estratégico nas rotas comerciais, e saber ler tanto as pessoas quanto as mudanças dos tempos era uma habilidade fundamental. Além do que ganhava como concubina, ela ajudava sua família enviando-lhes fragmentos de informações.
Ela havia ficado acordada até tarde na noite anterior, mas nem parecia cansada. O imperador visitava sua amada Gyokuyou a cada três dias, às vezes, até com mais frequência. Aparentemente, era para ver a filha, que já começava a se agarrar nas coisas e a se colocar de pé. Mas, é claro, admirar a princesa não era a única coisa que ele fazia durante essas visitas. Maomao sabia que o imperador não negligenciava nem seus deveres diurnos nem os noturnos, o que indicava um homem de energia impressionante. Do ponto de vista de ajudar o país a prosperar, era algo digno de elogios.
Ao final do chá, Maomao recebeu de Yinghua uma porção generosa de balas de chá. Ela estava disposta a comer algumas, mas era doce demais para dar conta sozinha, então fez sua visita habitual a Xiaolan. As histórias de Xiaolan nem sempre eram claras e coerentes, mas ela compartilhava de bom grado seu estoque de fofocas. Naquele dia, falou sobre a criada que havia se suicidado, o envenenamento fracassado e, por alguma razão, algo a respeito da concubina Pura.
— Podem falar o quanto quiserem sobre as “quatro favoritas” do Imperador, mas não se pode negar que ela está envelhecendo.
A concubina Gyokuyou tinha dezenove anos, Lihua vinte e três, e Lishu apenas quatorze. Mas a concubina Pura Ah-Duo tinha trinta e cinco anos completos, um a mais que Sua Majestade. Ainda seria possível que ela tivesse um filho, mas, sob o sistema vigente no palácio interno, logo poderia esperar ser afastada em um processo que às vezes chamavam de “ser deslizada de um travesseiro para outro”. Em outras palavras, Ah-Duo não podia esperar tornar-se mãe da nação.
Já circulavam rumores sobre seu possível rebaixamento e quem poderia ser elevada ao posto de concubina principal em seu lugar. Esse tipo de conversa não era novidade, mas, como Ah-Duo havia sido concubina do Imperador desde antes de sua ascensão e, de fato, lhe dera um filho em algum momento, os rumores raramente ganhavam força.
“Mãe de um pequeno príncipe morto”, pensou Maomao. Era o mesmo destino que aguardava Lihua, caso não engravidasse novamente do Imperador. E ela não estava exatamente sozinha: Gyokuyou também não podia presumir que manteria o lugar de destaque nas afeições imperiais para sempre.
Toda flor bonita murcha com o tempo. As flores do palácio interno tinham que dar frutos, ou eram inúteis. Por mais familiar que essa lógica fosse para Maomao agora, nunca deixava de lembrá-la de que o palácio era, também, uma prisão.
Ela afastou algumas migalhas de bolo lunar de sua saia e ergueu o olhar para o céu nublado.
A companhia de Gyokuyou para o chá daquele dia era um tanto incomum. Era a concubina Lishu, outra das quatro favoritas do Imperador. Não era comum que concubinas do mesmo posto organizassem chás umas para as outras; ainda mais raro quando se tratava das mulheres de mais alto escalão.
O nervosismo era visível no rosto infantil de Lishu. Ela era acompanhada por quatro damas de companhia, incluindo a notória provadora de alimentos. Aparentemente, a mulher não havia sido punida tão severamente quanto Maomao temera.
Como fazia frio, o chá foi realizado em ambiente fechado. Alguns eunucos foram colocados para preparar as espreguiçadeiras das damas de companhia na sala de estar. A mesa tinha incrustações de madrepérola, e a cortina foi trocada por uma nova, com bordados elaborados. Para ser totalmente sincera, nem mesmo o Imperador recebia tanta atenção nos mínimos detalhes — mas era da natureza das mulheres querer apresentar sua melhor imagem diante das colegas.
A maquiagem também foi aplicada com cuidado, e Maomao teve suas sardas apagadas. As meninas acentuaram os cantos dos olhos com linhas vermelhas. Era um nível de maquiagem que homens poderiam considerar ostensivo, mas isso não importava; ali, quem estivesse mais vistosa venceria.
Na conversa, Gyokuyou parecia monopolizar as palavras, enquanto Lishu apenas acenava timidamente. Talvez fosse apenas consequência da diferença de idade entre elas. Atrás de Lishu, suas damas de companhia pareciam menos interessadas na senhora do que nos ornamentos do Pavilhão de Jade, olhando para cá e para lá. Apenas a provadora de alimentos permanecia diligentemente atrás de Lishu, em frente a Maomao, observando atentamente sua antiga algoz.
Qual era a história aqui? Primeiro as mulheres do Pavilhão de Cristal, agora essa garota. Maomao desejava que as pessoas parassem de tratá-la como algum tipo de monstro. Ela não era um cão de rua e não mordia ninguém.
“À primeira vista, pareciam damas de companhia perfeitamente comuns”, pensou Maomao. Ela já havia dito a Gaoshun que elas intimidavam sua concubina. Talvez fosse um pouco constrangedor se essa acusação acabasse não sendo verdadeira, mas ela ficaria igualmente satisfeita em estar errada.
Comparadas às poucas, porém orgulhosas, damas de companhia do Pavilhão de Jade, as mulheres de Lishu pareciam um pouco lentas para agir, mas cumpriam suas funções. Pelo menos as que tinham: como Gyokuyou era a anfitriã da festa do chá daquele dia, elas não tinham muito o que fazer.
Ailan apareceu com um pote de cerâmica e água quente.
— Você gosta de coisas doces? Está tão frio hoje que pensei que isso poderia ser reconfortante — disse Gyokuyou.
— Eu gosto de doces — respondeu Lishu. Pareceu deixá-la um pouco mais à vontade.
Dentro do pote havia casca de fruta cítrica fervida no mel. Aquilo aquecia o corpo, acalmava a garganta e até ajudava a prevenir resfriados. Maomao mesma havia preparado. Gyokuyou parecia gostar, e vinha servindo essa receita com frequência em suas festas do chá ultimamente.
Hmm? Apesar de ter declarado que gostava de doces, a concubina Lishu de repente pareceu visivelmente desconfortável. A provadora de alimentos também parecia querer protestar contra o que estava sendo servido na xícara de sua senhora. “Não podia consumir mel também?” pensou Maomao.
Nenhuma das outras damas de companhia espalhadas pelo ambiente parecia disposta a dizer alguma coisa. Apenas olhavam para Lishu com irritação. Supere isso, pareciam dizer. Ainda achavam que era apenas frescura infantil.
Maomao soltou um pequeno suspiro e sussurrou algo ao ouvido da concubina Gyokuyou. Os olhos da concubina se arregalaram levemente, e ela chamou Ailan.
— Sinto muito, mas parece que isso precisa repousar um pouco mais. Vou servir outra coisa. Aceita chá de gengibre?
— Sim. Obrigada, senhora — disse Lishu, com um tom um pouco mais animado. Trocar o chá parecia ter sido a decisão certa.
Quando Maomao ergueu o olhar, viu as damas de companhia de Lishu. Por um instante, quase pensou que elas pareciam desapontadas. A impressão durou apenas um segundo e logo desapareceu.
Ao cair da noite, apareceu, como sempre, o mais belo dos eunucos, com um sorriso de ninfa à frente e Gaoshun atrás. Maomao tinha a impressão, ultimamente, de que as rugas na testa de Gaoshun haviam aumentado. Talvez tivesse novos problemas para lidar.
— Ouvi dizer que você teve uma festa do chá com a concubina Lishu — disse Jinshi.
— Sim, e foi adorável.
Jinshi fazia visitas regulares às concubinas mais proeminentes do Imperador, quase como se fosse sua obrigação manter a ordem no palácio interno. Ele parecia perceber algo de incomum no encontro daquele dia e, por isso, sentiu-se compelido a se envolver. Maomao tentou escapar antes de ser arrastada para qualquer assunto, mas, naturalmente, ele a deteve.
— Poderia, por gentileza, me soltar?
— Ainda não terminei de falar. — Quando o sublime jovem voltou o olhar para ela, Maomao apenas baixou os olhos para o chão. Ela tinha certeza de que o fitava como se ele fosse um peixe morto. E não um peixe bonito. Provavelmente um daqueles que vivem no fundo do mar.
— Ah, como vocês são amigos — disse Gyokuyou, rindo alegremente. Alegre até demais; e Maomao acabou respondendo:
— Senhora Gyokuyou, um pouco de acupressão ao redor dos olhos pode ajudar a prevenir rugas.
Ops. Não podia falar assim. Precisava tomar cuidado para não ser rude com ninguém além de Jinshi. Er.... Talvez essa também não fosse uma boa ideia. Já o havia irritado no dia anterior. Pequenos deslizes como esse, em excesso, poderiam fazê-la cair das boas graças do eunuco, e, quem sabe, terminar estrangulada logo depois.
— Você soube que a criada que se matou é, supostamente, a responsável pelo envenenamento do outro dia?
Maomao assentiu, pois, pelo tom, parecia que Jinshi se dirigia a ela e não a Gyokuyou. Quanto à concubina, pareceu perceber que aquela conversa deveria ocorrer em particular e deixou o aposento. Maomao, Jinshi e Gaoshun ficaram sozinhos.
— Você realmente acredita que a culpada cometeu suicídio?
— Não cabe a mim determinar isso. — Transformar uma mentira em fato era prerrogativa dos poderosos. Maomao não sabia quem havia tomado tal decisão, mas suspeitava que Jinshi estivesse envolvido de alguma forma.
— Uma simples criada teria motivo para envenenar a comida da concubina Virtuosa?
— Receio não saber dizer.
Jinshi sorriu, lançando um olhar sedutor que sabia usar com maestria para manipular as pessoas. Infelizmente para ele, não funcionava com Maomao. Ela tinha certeza de que ele sabia que não precisava lançar-lhe olhares insinuantes para conseguir o que queria; bastava dar uma ordem. Ela não se recusaria.
— Talvez eu possa enviá-la para ajudar no Pavilhão Granada, a partir de amanhã?
Para que servia aquele ponto de interrogação? Maomao deu a única resposta possível: — Como desejar.
Dizem que uma casa reflete seu dono. Assim, o Pavilhão de Jade da concubina Gyokuyou era acolhedor, enquanto o Pavilhão de Cristal de Lihua era elegante e refinado. Já o Pavilhão Granada, onde vivia Ah-Duo, era eminentemente prático. Não havia nada supérfluo na decoração; a ausência de qualquer ornamento desnecessário criava, por si só, uma espécie de refinamento sublime.
Isso revelava exatamente quem era a dona da casa. Todo excesso havia sido eliminado de seu corpo, que não possuía nem exuberância florida, nem fartura generosa, nem delicada graciosidade. O que restava, no entanto, era uma beleza sóbria e neutra.
Ela tinha mesmo trinta e cinco anos? Se Ah-Duo vestisse um uniforme oficial, poderia facilmente ser confundida com alguma funcionária promissora. No palácio interno, onde só havia mulheres e eunucos, certamente era o centro das atenções de muitos olhares. Ela era atraente de uma forma parecida com a de Jinshi, e ao mesmo tempo, diferente. Maomao não sabia exatamente o que Ah-Duo vestira no banquete, mas agora ela havia trocado qualquer saia ou manga larga por algo que lembrava roupas de montaria.
Maomao estava sendo guiada pela residência junto de outras duas criadas. A chefe das damas de companhia de Ah-Duo, Fengming, era uma bela mulher rechonchuda e falante, que ia narrando fluentemente os detalhes enquanto percorriam o pavilhão.
— Sinto muito por ter chamado vocês com tão pouca antecedência — disse ela. A chefe de uma das quatro concubinas favoritas do imperador provavelmente era uma mulher de posição elevada, e a disposição de Fengming em conversar com mulheres de posto inferior era cativante.
“Será que ela era filha de um comerciante?” pensou Maomao. Ela e as outras haviam sido convocadas para ajudar na grande faxina que marcava o fim de cada ano. O Pavilhão Granada não tinha gente suficiente para dar conta sozinho. E será que ela estava ferida? Maomao reparou em uma bandagem no braço esquerdo de Fengming. O seu próprio braço esquerdo também estava enfaixado. Já estava cansada de ver as pessoas reagirem com alarme sempre que notavam suas cicatrizes.
As mulheres deixavam o trabalho pesado para os eunucos, enquanto elas passavam o dia arejando móveis e pergaminhos para protegê-los de insetos. E havia muitos, muito mais do que no Pavilhão de Jade de Gyokuyou. Tal era a quantidade acumulada por Ah-Duo durante sua longa estadia no palácio interno, a mais duradoura entre todas as concubinas.
Maomao não voltou ao Pavilhão de Jade naquela noite, dormindo junto das outras duas criadas em um amplo quarto do Pavilhão Granada. Recebeu uma coberta de pele para se proteger do frio, e de fato, estava muito quente.
Não me disseram exatamente o que fazer. Maomao se concentrou na limpeza, como Fengming havia orientado. A dama rechonchuda era generosa com elogios, o que tornava mais difícil afrouxar o ritmo. Maomao começou a suspeitar que Fengming era, na verdade, uma habilidosa manipuladora de pessoas.
Fengming parecia o tipo de mulher que se imagina ao falar de uma boa esposa que executa suas tarefas com alegria. Estava ao lado de Ah-Duo desde que a concubina chegara ao palácio, o que significava que já havia passado muito da idade comum para se casar, e até Maomao achava aquilo uma pena. Sabia que, como chefe das damas de companhia, Fengming ganhava mais que muitos homens sem qualificação, mas perguntava-se se nunca lhe ocorrera procurar um marido. Não era esse um pensamento comum? Maomao sabia que as três outras damas do Pavilhão de Jade comentavam sobre isso com frequência. Embora não pretendessem deixar o lado de Gyokuyou tão cedo, ainda sonhavam com a aparição de um príncipe encantado para elas. “Sonhar não custa nada, então sonhem à vontade”, dizia Hongniang com um sorriso, frase que Maomao achava estranhamente inquietante.
“Faz tempo que não sinto que trabalhei de verdade”, pensou. Então se encolheu, tal qual a gata que significa o seu nome, e logo adormeceu.
Será que o cérebro por trás daquela tentativa de envenenamento está mesmo aqui? As damas de companhia do Pavilhão de Jade eram extremamente esforçadas, mas mesmo assim Maomao tinha de admitir que as mulheres do Pavilhão Granada não ficavam para trás. Todas adoravam concubina Ah-Duo e se empenhavam ao máximo por ela.
Isso valia para a líder, Fengming, tanto quanto para qualquer outra. Ela nunca se deixava limitar pelo próprio posto; se via um grão de poeira, pegava um pano e o limpava por ela mesma. Mal parecia a chefe das damas de uma concubina de alto escalão. Até mesmo a diligente Hongniang deixaria essas tarefas para as outras criadas.
Queria que aqueles pavões orgulhosos do Pavilhão de Cristal vissem isso.
A concubina Lihua, ao que parecia, não tinha sorte com as criadas. Talvez fosse por isso que tinha tantas, porque cada uma trabalhava tão pouco. Eram ótimas conversadoras, mas nada além disso, e aí estava o problema. Ainda assim, lidar com questões assim era um dos desafios de quem ocupava um alto escalão.
Lealdade poderosa, no entanto, podia trazer seus próprios problemas. Poderia motivar alguém a tentar um envenenamento, por exemplo. Um alto oficial estava tentando colocar a própria filha no palácio interno, o que levaria à possível perda de posição de uma das quatro concubinas mais importantes. Se alguém tivesse chances de ser rebaixada, essa seria Ah-Duo. Mas, e se de repente o lugar de uma das outras concubinas ficasse vago repentinamente?
Gyokuyou e Lihua estavam mais ou menos seguras, mas, ao que tudo indicava, o imperador não visitava a concubina Lishu. Maomao suspeitava que esse fosse um dos motivos pelos quais as damas de companhia dela a tratavam com tanta displicência. Sua Majestade não gostava delas tão... magras. Talvez fosse uma reação contra a preferência do pai por meninas extremamente jovens: o governante atual só se excitava se a mulher tivesse carne suficiente sobre os ossos. Cada concubina que ele visitava, incluindo Gyokuyou e Lihua, possuía uma certa voluptuosidade.
Assim, Lishu ainda não havia cumprido seu dever como concubina. Talvez isso fosse melhor para alguém tão jovem. Ela estava tecnicamente em idade de se casar, sim, mas uma gravidez aos quatorze anos poderia impor considerável desgaste ao corpo no momento do parto. Mesmo na Casa Verdigris, as meninas não se graduavam da condição de aprendizes antes dos quinze anos. E, até lá, não recebiam clientes. Isso acabava tornando-as cortesãs melhores e de carreira mais longa.
Maomao preferia não pensar demais nas predileções do antigo imperador. Se alguém fizesse um cálculo simples envolvendo as idades do imperador atual e de sua mãe, chegaria a um número deveras perturbador.
De todo modo, se alguém quisesse tirar uma das quatro damas do caminho, a concubina Lishu seria uma escolha lógica.
Maomao deixou os pensamentos vagarem enquanto organizava uma prateleira da cozinha, sobre a qual se alinhava uma fileira de pequenos potes. Um aroma doce lhe afagou o nariz. — O que devemos fazer com estes? — perguntou Maomao, pegando um dos potes, a uma dama de companhia que limpava a cozinha junto com ela. As duas criadas que haviam acompanhado Maomao no dia anterior estavam limpando, respectivamente, o banho e a sala de estar.
— Ah, esses. Tire o pó da prateleira e depois coloque-os de volta no lugar.
— São todos mel?
— Mmhmm. A família de Lady Fengming é de apicultores.
— Ah.
O mel era um artigo de luxo. Uma pessoa teria sorte de possuir sequer uma variedade, quanto mais uma prateleira inteira, mas isso explicava tudo. Maomao espiou dentro de vários potes e viu méis de cores diferentes: âmbar, vermelho-escuro e até marrom. Vinham de flores distintas e tinham sabores diversos. Pensando bem, ela havia notado que as velas usadas para iluminação na noite anterior tinham um aroma adocicado. Deviam ser de cera de abelha.
Hmm... Algo a incomodava, algo relacionado ao mel. O assunto tinha surgido recentemente, ela tinha certeza.
— Quando terminar aí, pode tirar o pó do corrimão do segundo andar? Sempre esquecemos dele quando fazemos a limpeza.
— Claro. — Maomao devolveu o mel ao lugar e subiu ao segundo andar com o pano. Mel. Mel... Enquanto limpava cuidadosamente cada coluna do corrimão, girava a palavra na mente, tentando lembrar o que ela representava.
Ora, ora. Do segundo andar, podia ver o exterior com clareza. Inclusive algumas figuras entre as sombras das árvores. Aparentemente, achavam que estavam escondidas, mas era óbvio que observavam o Pavilhão Garnet.
É a concubina Lishu? A jovem estava ali, com apenas uma acompanhante: sua provadora de alimentos. Nada daquilo fazia sentido para Maomao. Sua memória voltou à festa do chá e à aversão inexplicável de Lishu ao mel.
Mel...
Ela simplesmente não conseguia tirar aquele pensamento da cabeça.
Maomao apropriou-se da sala de recepção do Pavilhão Jade para relatar a Jinshi o que havia acontecido no Pavilhão Garnet.
— O que quer dizer que, no fim das contas, não tenho a menor ideia. — O que ela não sabia, simplesmente, não sabia. Maomao se recusava a subestimar a si mesma, mas, pelo mesmo princípio, também não exagerava suas habilidades. Foi perfeitamente franca com o belo eunuco. Contou-lhe tudo o que havia conseguido descobrir após três dias no Pavilhão Garnet.
Jinshi estava reclinado em uma espreguiçadeira, parecendo elegante, enquanto bebia um chá perfumado vindo de terras distantes. Ele tinha um aroma adocicado; a mistura continha limões e mel.
— Entendo. Sim, claro.
— De fato, senhor.
Maomao estava satisfeita com o fato de que, ultimamente, o belo eunuco parecia um pouco menos “reluzente” que antes, mas lhe parecia que o tom dele havia se tornado um tanto mais eloquente. Talvez fosse porque a doçura havia desaparecido de sua voz, dando-lhe o ar de um jovem, quase um garoto. Maomao não sabia o que ele queria dela, mas, para todos os efeitos, era apenas uma apotecária comum. Não tinha interesse algum em desempenhar o papel de espiã.
— Vamos tentar uma pergunta diferente, então. Hipoteticamente, se, por algum meio especial, houvesse alguém se comunicando com pessoas de fora, quem você acha que poderia ser?
De novo com esse interrogatório cheio de rodeios. Gostaria que ele simplesmente dissesse o que quer dizer. Maomao não gostava de falar sem provas. Sempre aprendera a não trabalhar com base em suposições. Agora, fechou os olhos e soltou um suspiro profundo. Se não conseguisse se acalmar um pouco, poderia acabar olhando para aquele jovem encantador como se ele fosse um sapo amassado. Gaoshun, como sempre, lhe dirigia um olhar silencioso, incentivando-a a ter autocontrole.
— É apenas uma possibilidade, mas, se houvesse tal pessoa, acho que talvez fosse a senhora Fengming, a chefe das damas de companhia.
— Você tem alguma prova?
— Ela tinha um curativo enrolado no braço esquerdo. Uma vez, entrei no quarto enquanto ela o trocava e vi de relance algumas queimaduras.
Maomao já havia lidado, certa vez, com um incidente envolvendo tiras de escrita impregnadas com diversos produtos químicos. Na época, pensara que, se aquelas substâncias tivessem algum significado, talvez representassem algum tipo de código, mas guardara essa conclusão para si. Pelo fato de a roupa que continha as tiras ter sido chamuscada, era fácil imaginar que a pessoa que a usara antes tivesse sofrido uma queimadura no braço. Estava confiante de que Jinshi havia investigado essa possibilidade. Provavelmente fora isso que o levara a tentar transformá-la em seus olhos e ouvidos. Na opinião sincera de Maomao, a serena chefe das damas de companhia não parecia ser do tipo que faria algo assim, mas ela precisava admitir que isso era apenas uma impressão subjetiva. Era preciso encarar as coisas de modo objetivo, ou jamais se chegaria à verdade.
— Hum. Nota de aprovação para você. — Jinshi, de repente, deixou o olhar cair sobre um pequeno jarro sobre a mesa. Em seguida, lançou um olhar a Maomao, e aquele sorriso meloso surgiu. Ela tinha certeza de que conseguia ver algo sinistro por trás dele. Maomao sentiu cada pêlo do corpo se arrepiar. Não gostava nem um pouco da direção que aquilo parecia tomar.
Jinshi pegou o jarro e veio em sua direção. — Uma garota tão esperta merece uma recompensa.
— Eu não poderia.
— Poderia. E deveria!
— Estou perfeitamente feliz sem recompensa. Dê para outra pessoa. — Maomao lançou seu olhar mais fulminante na tentativa de dissuadi-lo, mas ele não demonstrou o menor incômodo. Seria aquilo uma pequena punição por ter ferido os sentimentos dele no outro dia? Infelizmente para ambos, Maomao ainda não fazia ideia do motivo de Jinshi ter ficado tão magoado.
O eunuco se aproximou. Maomao recuou meio passo e deu de costas para a parede. Olhou para Gaoshun em busca de ajuda, mas o reservado assistente estava sentado junto à janela, observando distraidamente os pássaros que voavam pelo céu. A postura claramente artificial o fazia parecer especialmente desagradável.
Vou ter que colocar um laxante na comida dele mais tarde.
Jinshi, ainda ostentando um sorriso que derreteria qualquer outra pessoa, enfiou os dedos no pote. Eles saíram cobertos de mel. Para Maomao, aquela pequena brincadeira já estava indo longe demais.
— Não gosta de coisas doces?
— Prefiro sabores picantes.
— Mas consegue tolerá-las, não é?
Jinshi não demonstrava a menor intenção de recuar; seus dedos avançavam na direção da boca de Maomao. Ela pensou que aquele devia ser o jeito dele de sempre. Mas beleza não dava permissão para fazer o que bem quisesse.
O eunuco examinava o olhar fulminante de Maomao com uma expressão de êxtase.
Ah, é mesmo... Eu esqueci que ele é desse tipo. Tentou fitá-lo como se ele fosse um pequeno rato marrom, mas o efeito foi exatamente o oposto do que queria.
Deveria considerar aquilo como uma ordem e simplesmente deixá-lo enfiar o mel em sua boca? Ou tentar salvar o que restava de seu orgulho encontrando alguma forma de escapar?
Eu suportaria, se ao menos fosse mel de acônito, pensou. O mel de uma flor venenosa teria pelo menos a virtude de ser... bem, venenoso.
De repente, algo se encaixou na mente de Maomao. Ela queria ter um momento para puxar o fio daquele pensamento, mas, com o pervertido prestes a enfiar a mão em sua boca, não conseguia pensar em absolutamente nada. Assim que os dedos estavam prestes a tocar seus lábios, ouviu uma voz:
— O que está fazendo com a minha assistente? — Era a concubina Gyokuyou, parada ali, com uma expressão nada satisfeita. Ao seu lado, Hongniang mantinha a cabeça entre as mãos.
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