Dançando com a Morte Brasileira

Autor(a): Dênis Vanconcelos


Volume 2

Capítulo 30: Grande Heroína

Nathaly, ainda meio tonta, segurando a Hero, começou a caminhar em direção aos restos de Gorgon, misturados à areia. Olhando fixamente para aquilo, Burrmn! lançou mais uma explosão de fogo.

— Te acertei. E agora? Morcego maldito — disse, com nojo, após reduzir a pó o que restava de Gorgon.

Nathaly se virou, olhando na direção do reino e avistando as altas muralhas, mesmo àquela distância.

— Definitivamente, não estou em São Paulo... Não, definitivamente, não estou na Terra.

Caminhando pelo deserto, sua espada se desmaterializou.

Depois de alguns minutos, ela se aproximou do reino e começou a atravessar a ponte enquanto soldados removiam as carcaças dos monstros de seu caminho, mantendo a cabeça curvada em respeito e agradecimento.

Não disse nada e apenas continuou andando até que abriram o portão para ela.

Ao passar pelas muralhas, a população começou a gritar euforicamente em agradecimento. Nathaly, sem entender muito bem aquela reação, apenas acenou com a mão, acompanhada de um belo sorriso.

Jonas se aproximou dela.

— Com licença, grande heroína — disse ele, curvando a cabeça.

— Oi? "Que merda é essa de grande heroína?"

— O rei está solicitando sua presença no salão real... Poderia me seguir, por gentileza?

— Uhum...

— Por aqui.


Nathaly ficou um pouco chocada com a imensidão daquele lugar. Enquanto seguia pelas ruas de pedrinhas cinzas, via crianças rindo e brincando, felizes após a vitória.

Depois de vários minutos acompanhando Jonas, enquanto recebia agradecimentos das pessoas, eles finalmente chegaram à área do palácio real.

Ao passar pela fonte branca cercada por um jardim, Nathaly ficou admirada com o cuidado e a beleza das folhagens.

Ao olhar para cima, avistou a bandeira com o brasão da família real em dourado, que exibia uma fera lendária — um Glifo —, que eles nem chegaram a presenciar de perto. A bandeira balançava nas cores branco, preto, azul-escuro e dourado nas extremidades do tecido.

A porta do palácio se abriu, e eles entraram. Por dentro, o palácio estava destruído.

Os tapetes, que antes lembravam a bandeira, estavam pretos de tão sujos, além de rasgados e manchados de sangue por toda parte. As paredes, rachadas, faziam o lugar parecer prestes a desabar a qualquer momento.

Continuaram andando até o salão real, onde o rei a aguardava.

Nathaly admirava o ambiente, que parecia rico e luxuoso; afinal, ela não via a verdade.

Enquanto caminhava em direção à porta dupla, via lindas armaduras em exposição e até as tocava, impressionada com o brilho de seus metais. O que ela não percebia era que, dentro daquelas armaduras, havia corpos já em estado de esqueleto, presos ali há muito tempo.

Quando chegaram à porta dupla, azul-escuro e enfeitada com detalhes dourados, dois guardas as abriram.

Nathaly e Jonas passaram pelas portas que não existiam mais, pois estavam destruídas; os dois soldados apenas pensaram em abri-las, movendo-se conforme suas imaginações.

Enquanto caminhavam pelo cenário destruído do salão real, o rei permaneceu sentado em seu trono prateado, acolchoado com couro azul-escuro, ao lado da rainha, que ocupava um trono menor de mesma descrição.

Nathaly olhou ao redor, observando as gravuras nas paredes, as figuras e quadros belos ao longe. Quando olhou para frente, viu algumas pessoas curvadas antes das escadas que levavam aos tronos: o general do exército junto com alguns soldados pessoais.

O rei tinha cabelos e olhos tão prateados que chegavam a brilhar. Suas vestes exuberantes demonstravam seu amor pela família, mantendo as cores da bandeira real. Ele era um homem idoso, com 81 anos e 1,64m de altura. Sua coroa dourada exibia grandes pedras nas cores da bandeira, cravejadas e adornadas em ouro bem trabalhado.

A rainha, por outro lado, possuía cabelos e olhos marrons. Vaidosa, suas roupas exuberantes não seguiam totalmente a cor da bandeira, mas eram de um azul-escuro marcante. Sua aparência era a de uma mulher de 30 anos, apesar de ter 55, e ela media 1,70m de altura. A coroa da rainha era menor, mas seguia o mesmo estilo da do rei.

O general, também com cabelos e olhos marrons, usava uma armadura semelhante à dos seus soldados, mas com detalhes em platina que a diferenciavam das demais. Ele era alto, com a mesma estatura de Jonas, e bastante forte, embora menos que Jonas. Tinha 56 anos.

— Seja bem-vinda, grande heroína. É uma honra tê-la em meu reino... Poderia me conceder a dádiva de dizer seu nome? — perguntou o rei.

O general do exército, no entanto, tinha uma expressão meio indignada. Ficou incomodado com o fato de uma garota ter sido escolhida pelo Fogo Sagrado para ser o novo Grande Herói; tanto que nem sequer a cumprimentou.

— Meu nome é Nathaly. "Sujeito estranho."

— Eu sou o Rei de Alberg, Morf Alberg. Ao meu lado está minha esposa, Matilda Alberg. Por favor, aceite um banquete que iremos preparar para comemorar nossa vitória. Graças a você, isso foi possível.

— Hoje?

— Sim. Uma serva irá mostrar seus aposentos e a chamará quando estiver tudo pronto.

— Ah. Pode ser... "Não sei nem onde estou mesmo, comer algo é bom." pensou, fazendo uma careta de fome.

Clap! Clap!

Uma serva atendeu ao chamado e surgiu para acompanhá-la.

Seus uniformes eram inteiramente brancos, com meia-calça, tiaras, brincos e todos os detalhes das roupas também na mesma cor. No caminho, enquanto a guiava, a serva reparou nas roupas de Nathaly, que estavam bastante gastas e um pouco rasgadas.

— Suas roupas estão muito gastas...

Nathaly olhou para suas vestes sujas, lembrando-se de todo o desgaste da luta.

"Realmente."

— Vou levá-la até a costureira do palácio; ela fará uma peça de roupa linda e digna da grande heroína usar.

"'Levá-la'? Ui, ui, fala bonito." Nathaly pensou, rindo discretamente, zoando a serva sem que ela percebesse.

A serva olhou para ela, e Nathaly disfarçou com um sorriso, ainda sem entender muito bem essa história de "grande heroína". Apenas seguiu a serva até o lugar indicado.

— É aqui; pode entrar.

— Obrig... — Nathaly virou o rosto para a serva, mas ela já não estava mais lá. — O quê? — Ainda confusa, entrou pela porta, olhando ao redor e observando o ambiente.

A sala era espaçosa e muito bem organizada, com tecidos extremamente caros e diversas ferramentas de trabalho, embora a profissional ali presente quase não utilizasse a maioria delas.

Vários manequins exibiam vestidos variados, adornados com joias. O teto era coberto por espelhos, assim como a parede, que tinha um espelho com bordas em cristais, para que a pessoa pudesse experimentar sua roupa e se admirar em um ambiente elegante.

No entanto, isso era apenas em seus olhos.

— Com licenç...

Uma mulher andava na sala.

Sua pele e leve pelagem eram de um cinza-escuro com detalhes em cinza-claro, combinando com seu longo cabelo azul-escuro. Vestia um vestido longo, leve e elegante, de cor branca, que tinha aberturas para que seus seis braços pudessem passar.

Usava também um chapéu alto e pontudo, igualmente branco, para esconder parcialmente seu rosto, pois as pessoas costumavam ter um certo receio dela.

Ela era uma híbrida aranha. Como tal, podia se transformar em uma aranha completa ou manter características aracnídeas em seu corpo humanoide, controlando essa aparência conforme desejasse. Embora seu rosto e corpo pudessem se assemelhar perfeitamente aos de uma humana, seus seis braços revelavam sua verdadeira natureza.

Por essa razão, ela preferia se manter reclusa, escondendo-se em sua sala.

A híbrida correu até Nathaly e se ajoelhou a seus pés.

— Sim... Grande Heroína — disse com a cabeça encostada no chão em frente aos pés de Nathaly.

Nathaly escutava o som de água vindo de trás de uma grande cortina à direita da sala, mas ignorou e olhou para a híbrida em seus pés.

— Desculpa a pergunta... Mas o que é você?

— Sou uma híbrida, senhora.

— O que é isso?

— Somos seres que são meio humanos, meio animais. No meu caso, sou da raça das aranhas.

— Híbridas... Entendi... "Porra nenhuma." — Mas por que no caminho até o palácio eu não vi nenhum híbrido?

— É porque não há híbridos aqui. O povo híbrido vive muito longe das capitais. A viagem para cá é cara e perigosa; sem uma boa escolta, pode demorar meses. Além disso, são necessários muitos suprimentos para durar tanto tempo. Além de mim, não sei se existe outro híbrido por aqui.

"Tô entendendo nada." — Pode se levantar; não precisa me chamar de grande heroína o tempo todo. Meu nome é Nathaly.

A híbrida se levantou.

— Sim, senhora. O meu é Akli.

— Então, Akli. Por que vocês vivem tão longe? — curiosa, Nathaly queria entender mais sobre o lugar em que estava.

— Existem muitas raças, e todas sempre tiveram receio de que, um dia, os primordiais pudessem fazer algo ruim. No princípio, os híbridos migraram até chegar a um lugar perto de um enorme mar, onde quiseram viver e, então, começaram a criar o país dos híbridos. A meses de viagem daqui, lá é um lugar pacífico, dificilmente ocorrem roubos ou crimes. Já aqui, como a Bruxa dos Anões e a Bruxa dos Híbridos previram, acontece tudo isso. Primordiais começaram a escravizar e matar pessoas, até da própria linhagem...

"Isso me lembra algo. Foi isso que eles falaram aquele dia? Ser o Primordial Preto... algo assim."

— ...Roubos atrás de roubos, mortes atrás de mortes.

— Sabe me dizer o que levou os primordiais a começarem isso?

Akli começou a se comportar de forma estranha e receosa:

— Não sei... Só sei que no passado não era assim.

— ...

Nathaly a encarou, e o nervosismo de Akli a fez acreditar que seria punida se não dissesse algo:

— Não procurei estudar ou entender a história, os motivos ou o porquê disso estar acontecendo...

— Por que não?

Akli acelerou a fala, tentando explicar:

— Às vezes, não é bom saber de tudo, hehe. Saber demais pode levar uma pessoa à morte. Meu pai me disse isso uma vez, e não quero arriscar minha vida por algo tão bobo. Fui chamada ao palácio porque a rainha gosta das roupas que faço. Prefiro continuar sendo apenas a híbrida que faz roupas do que me tornar um alvo...

Depois de uma pausa, ela continuou:

— Bom... Melhor deixar esse assunto pra lá, né? — deu uma risadinha, pegando suas fitas métricas e se aproximando de Nathaly: — Como deseja sua roupa?

Nathaly olhou para as roupas gastas.

— Quero um short como o que estou usando, mas em vez de azul, quero preto. E uma blusa comprida preta também.

Escolheu as cores pensando em agradar Nino, sabendo que o preto era sua cor favorita.

— Acho que uns detalhes em amarelo ficariam bons para combinar com seus olhos. Vou tirar suas medidas; com licença.

Chegando próxima a Nathaly, ela a segurou e sussurrou em seu ouvido:

— O que há de errado com esse lugar? Eu consigo ver o medo em seus olhos.

Akli, desesperada, tentou desmentir:

— N-não é nada, senhora, não é nada, eu juro.

Nathaly a soltou, ciente de que Akli mentiu.

"Que porra de lugar estranho."

— C-com licença, senhora... — com seus seis braços, Akli tirou todas as medidas de Nathaly rapidamente. — Não se preocupe. Assim que a roupa estiver pronta, eu vou chamá-la...

Nathaly olhou para ela, que mantinha a cabeça baixa de medo.

— Tudo bem.

Se virou e foi até a porta, ao abrir, viu uma garotinha com um vestidinho de princesinha correndo pelo corredor, rindo sozinha e segurando uma boneca.

Nathaly saiu para o corredor e observou a criança.

A garotinha se virou para olhar para Nathaly e, nesse instante, voltou a correr, rindo alegremente enquanto continuava sua brincadeira.



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