Volume 1 – Arco 2
Capítulo 86: Acertou
[ Em um quarto escuro, escondido nos fundos da igreja, um menino pequeno e frágil estava deitado sobre a cama, sem blusa, o corpo parcialmente coberto por uma colcha pesada e sufocante.
Seus olhos, inocentes e confusos, fixavam-se em um ponto vazio da parede, tentando compreender o que não era capaz de explicar com palavras. Atrás dele, em silêncio predatório, um braço forte, peludo e áspero o envolveu lentamente.
Um rosto envelhecido e barbado surgiu, aproximando-se da nuca do garoto, respirando fundo, absorvendo cada instante daquela proximidade doentia.
— Mwah!
Com um beijo simples.
O padre, igualmente sem blusa, sob as cobertas, ficou mais próximo, o corpo colado, ainda no abraço, quando começou a sussurrar nos ouvidos do menino. O menino... com seu rostinho inocente, seguia as instruções de quem se dizia ser servo de Deus.
— Você gostou? — Sua voz asquerosa realçava malícia. O abuso que disfarçou como "pedido divino".
— Uhum... — o menino murmurou, ainda sem entender o que de fato aconteceu.
— Deus se orgulha muito de você, sabia? — A voz do padre era suave, tranquilizadora, porém venenosa, entrando na mente inocente da criança. — Sabia disso, Daniel?
Os olhos da criança brilharam levemente, uma esperança misturada com a dor que sentia surgindo no seu rosto.
— S-sério, padre...? — perguntou com um leve gaguejo, devido à felicidade por acreditar que Deus se orgulhava de como ele ajudava o padre.
— Eu já disse para me chamar de reverendo — corrigiu-o com uma suavidade que escondia crueldade.
— Desculpe, reverendo... — murmurou o menino, diminuindo-se ainda mais.
A mão pesada do reverendo deslizou pela pele macia da criança, cada toque despertando seus interesses. Olhava para baixo, dentro da coberta... vendo seus corpos nus.
— Você é muito obediente, Daniel. Deus só concede bênçãos aos obedientes, àqueles que aguentam tudo por ele. Você entende isso, não entende?
— Sim, reverendo — o menino respondeu baixinho, acreditando verdadeiramente nas palavras do homem que o dominava completamente.
— Assim Deus vai te abençoar mais e mais...
Olhava-o com intenções claras, sua mente perversa.
Continuou, ainda mais próximo, deixando sua respiração atingir a pele da criança:
— Só que precisa ser mais resistente. Mwah!
Beijou atrás do pescoço, outra vez, entrando com a mão na coberta, indo nas genitais da criança.
— Precisa conseguir aguentar sem chorar e, principalmente, manter o nosso ritual, o nosso propósito com Deus em segredo dos seus pais. Pois Deus quer lhe abençoar, Daniel, e para isso acontecer, precisa saber que você é um servo obediente, um servo que ele pode contar para tudo, pois sabe que você não irá revelar nada para pessoas mundanas. Pessoas cheias de pecados.
Tocando o menino, continuava sua manipulação religiosa:
— Se você falar, Deus jamais vai te perdoar. Entende o que eu quero dizer, meu rapaz?
A criança respirou fundo, o medo tomando conta de seu pequeno coração:
— Sim, reverendo.
— Está sentindo dor?
— ...Um pouco, reverendo.
O padre aborreceu o olhar.
— ...Deus quer escutar a sua voz. — Mwah! Beijou o pescoço novamente, reforçando sua falsa proteção para com ele. — Vamos rezar em frente à sua imagem.
— E-eu pequei novamente, reverendo?
— Sim, meu jovem. Não era para estar sentindo dor. Precisa aguentar, assim como eu disse. Senão, de dia, alguém pode notar o nosso ritual. Mwah! Vamos, irei lhe acompanhar. Deus quer que reze dez Pai-Nossos ajoelhados, em submissão a ele... Antes de mais um ritual começar, onde terá mais uma chance de provar sua lealdade a ele... Acha que consegue?
— Sim... reverendo.
Seu sorriso doentio, escondido atrás do menino, sua voz ressoando como uma ansiedade de ser aceito por Deus na cabeça da criança.
— Mwah! Vista sua alba e seu cíngulo. Hoje você precisa pedir perdão com muita força.
— Sim... reverendo.
Daniel, obediente e apavorado, levantou-se dolorosamente, vestindo suas vestes litúrgicas com uma solenidade triste e perturbadora. Vestiu o reverendo também — sem que o homem precisasse dizer uma palavra sequer — com gestos mecânicos e habituais, numa rotina sombria já estabelecida.
O reverendo olhava-o em todo o processo, vendo o menino com dificuldade para se agachar devido à dor de tantos abusos que sofria em nome de Deus.
O padre então caminhou lentamente até o altar, seguido de perto pelo menino, que tremia a cada passo dado. Ajoelharam-se diante da imagem de Cristo, cujos olhos imóveis observavam silenciosamente aquela profanação. Sincronizados, começaram a rezar:
— Pai Nosso que estais no céu, santificado seja o Vosso nome. Venha a nós o Vosso reino, seja feita a Vossa vontade, assim na Terra como no Céu. O pão nosso de cada dia nos dai hoje. Perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido. E não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal. Amém.
A voz doce, frágil e inocente da criança ecoava pelo salão escuro e vazio, deixando o padre excitado. E, assim que o "Amém" veio, e o menino começava a segunda reza... o padre abriu os olhos na direção do jovenzinho... vendo que não se encontrava mais na igreja, e sim no meio do mato.
Seus olhos se arregalaram de medo.
Ergueu-se desesperado, olhando em volta com pânico, sem entender como havia chegado ali. Seus olhos encontraram um ser envolto em sombras, olhos brilhando como brasas violeta, refletindo toda a escuridão que seu coração abrigava.
Nino mostrava o inferno que queria pôr aquele homem. O queimar, o torturar eternamente... mesmo que não tivesse como dar realidade a esse desejo interno em suas intensas íris.
— O-o...
O padre travou por um momento, com o corpo tomado por um pavor profundo e corrosivo. Observando aquela criatura de olhos roxos brilhantes, claramente algo além do humano, sentiu uma onda de terror subir pela coluna, deixando suas pernas tremendo, bambas, quase incapazes de sustentá-lo.
Contudo, tentando reunir coragem através de sua fé deturpada, avançou lentamente na direção de Nino, estendendo a mão, acreditando-se protegido por uma autoridade divina:
— Em Salmos 91:13 está escrito: "Pisarás o leão e a víbora, calcarás aos pés o leãozinho e o dragão." Em Efésios 6:11-12 diz: "Revesti-vos da armadura de Deus, para que possais resistir às ciladas do demônio. Pois a nossa luta não é contra a carne e o sangue, mas contra os principados e potestades, contra os príncipes deste mundo tenebroso, contra os espíritos malignos espalhados pelos ares." — Sua voz ganhava força, uma falsa segurança crescendo nele.
O padre ergueu ainda mais a voz, movido por uma coragem ilusória, acreditando ser abençoado, acreditando estar recebendo a luz... acreditando estar pronto para uma guerra espiritual:
— Em Lucas 10:17-19 está escrito: "Senhor, até os demônios se nos submetem em teu nome! Ele lhes disse: Eu via Satanás cair do céu como um relâmpago. Eis que vos dei poder para pisar serpentes e escorpiões, e sobre todo o poder do inimigo; e nada vos poderá fazer mal!"
Enfim chegou em Nino, e com um movimento teatral, pousou a mão sobre a cabeça do menino, vociferando com convicção:
— EM MARCOS 5:8 DIZ: "PORQUE JESUS LHE DIZIA: ESPÍRITO IMPURO, SAI DESTE HOMEM!" DEMÔNIO MALDITO, SAIA DESTA CRIANÇA, AGORA!
Ao erguer rapidamente a mão, aguardava um sinal divino, mas Nino continuava a fitá-lo, impassível, com um olhar penetrante e gelado. O padre sentiu a falsa coragem se despedaçar completamente ao perceber que sua tentativa era inútil.
Seu corpo parou de vez. O medo que achou que vencera ainda continuava presente — ainda mais agora, a centímetros do menino "endemoniado".
— D-demônio...
— Tsi... Acertou.
Bam! Scrrscshh...
O impacto brutal do soco lançou o homem pelo ar, seu corpo colidindo violentamente com o chão, espalhando terra e folhas pela túnica branca agora manchada.
— Aaarhh... Por que parou? Continua... Hi..Hi-Heha! — riu sarcasticamente, aproximando-se lentamente. — Continua... Chama o teu Deus... Manda ele descer aqui. Quero que assista eu esmagar você, inseto.
Rag abriu seu olho sobre a marca de Nino, olhando para o menino com um olhar admirado, lembrando que, em um passado brevemente distante, Blacko pronunciava palavras como aquela, blasfemando contra uma certa Deusa... que, no momento do passado, não lhe podia fazer nada.
— Vamos... Comece a rezar, orar, clamar... Nada vai mudar.
O padre tentou encarar Nino com fúria, os dentes cerrados em desafio:
— Deus está COMIGgrghht! — tentou gritar, mas foi interrompido brutalmente.
A mão de Nino agarrou o pescoço do padre com força avassaladora, suspendendo-o no ar, sufocando-o lentamente.
— Está, é? E... cadê ele? — sussurrou Nino com ironia cruel, apertando ainda mais o aperto, vendo os olhos do homem se arregalarem em desespero. — Quero matá-lo também... Onde ele tá? — Nino zombava, um rosto teatralmente curioso com um sorriso zombeteiro. — Vaai... me mostra! Tá dentro do seu cu? Pedófilo de merda!
PAHrrcrsh!
Com um movimento feroz, o Primordial lançou o homem violentemente contra o chão, prendendo-o sem esforço, abrindo-lhe a boca à força. Em um gesto impiedoso, fez o homem engolir seu sangue preto, assistindo com prazer enquanto o padre gemia e se contorcia em agonia extrema.
A resistência era ínfima.
A força de um humano normal era a mesma de uma formiga... de fato, um inseto perante o Primordial Preto.
A dor imposta era indescritível, muito superior à de qualquer outro participante daquela macabra cena...
Nino o fez sofrer mais que os outros.
O corpo do padre tremia convulsivamente, sua pele começando a se abrir lentamente, rasgando-se em meio ao sangue preto, revelando, em carne viva e sangrenta, o número 7 gravado profundamente em sua testa.
E, em meio ao seu sofrimento atroz, a única coisa que restou ao padre foi a cruel certeza de que nenhum Deus responderia à sua súplica falsa, oportunista e desesperada. ]
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