Chamado da Evolução Brasileira

Autor(a): TheMultiverseOne

Revisão: TheMultiverseOne


Uma Cidade Pacata – Nova cidade, Nova vida

Capítulo 26: Orgulho Ferido

“Aquele metido... Espero que ele ao menos esteja fazendo um trabalho decente, e não só apanhando no meu lugar…!”

O ritmo de corrida de Ryan pelos corredores da Elderlog High não era o melhor, pois estar ferido no braço e panturrilha não o permitiam ter o melhor balanço.

“Mesmo bloqueando as memórias de dor, ainda me falta força... Não tenho mais como lutar agora…”

Ao mesmo tempo, suas preocupações eram ampliadas pelos barulhos que ouvia a subirem as escadarias próximas, diretamente em seu campo de presença.

“Eles chegaram... Já deveria ter imaginado.”

As duas mulheres e um homem uniformizados o viram de longe. Eram policiais, um mais preocupado do que o outro com o que viam logo ali.

— Achamos mais um...! — disse uma das mulheres, à extrema esquerda. — Ei, rapaz! Está tudo bem?!

— Ele parece ferido...! — indicou o único homem, ao centro. — Estamos aqui para ajudar! Vamos levar você com segurança até lá embaixo!

Sem perder tempo, o trio rumou em direção a ele e, logo ao chegarem, o rodearam como se fosse uma celebridade e o encheram de encaradas preocupadas e penosas.

— Esses ferimentos... Como isso aconteceu, rapaz?! — questionou a última mulher, em ânimos alterados.

Balançou a própria cabeça violentamente, o que fez seus cabelos castanhos se desarranjarem, mostrando o pânico por baixo do profissionalismo.

— Me desculpe... — falou, amarga. — Primeiramente, qual o seu nome, rapaz?

“Ah, mas que porcaria…”

Os três representavam um imenso obstáculo em seu caminho até a sala indicada e só existia um jeito para lidar com isso.

“Vocês três vão ter que me desculpar por isso... Mas não posso deixar mais ninguém saber disso.”

Seus próximos passos foram calculados em questão de segundos.

— Eu... Eu sou…

— Ele está ferido demais...! Não aguenta mais ficar de pé!

O corpo do rapaz desfaleceu diante dos três, sem energia para continuar. Com seus braços fortes, o homem do grupo o amparou e segurou todo o peso de seu corpo.

— Ele deve ter sangrado demais! Vamos precisar de reforço das ambulâncias...! Oficial Sheryl, chame imediatamente por mais reforço...!

A primeira mulher assentiu nervosamente e se esforçou descomunalmente para pegar seu comunicador, pronta para chamar mais reforços, além da tão necessária ajuda médica.

— Vou pedir reforço imediato... A situação está pior do que poderíamos ter imaginado...!  — A mulher falou para que todos pudessem ouvir.

Levou o pequeno objeto preto similar a um pequeno rádio à altura de sua boca e, quando pronta para se colocar a falar...

— Isso não vai ser necessário, Oficial Sheryl… Me sinto muito melhor agora, muito obrigado.

— Huh?! O que está fazendo assim, tão de repente?! — perguntou a segunda mulher, que avaliava seus ferimentos. — Não pode se mover assim...! Você está ferido demais! Se preserve!

Nenhum deles entendia que foram colocados no plano perfeito, e a oficial Sheryl seria a primeira a ser encaixada.

Não houve tempo para que ela entendesse qualquer coisa, antes de perder todas as lembranças sobre o que estava a fazer ali.

— Eu também não posso deixar vocês dois irem.

Aproveitou a proximidade dos outros dois oficiais para repetir o mesmo. Não havia tempo a perder.

Como já era amparado pelo homem, não precisou tocá-lo ativamente, além do braço estendido para alcançar o rosto da mulher.

— O que está fazen... Hein...? O que... Mas o que eu tô fazendo aqui...? — disse ela, em confusão plena.

Com os três tirados de eixo, se desvencilhou dos braços do policial e deixou de fingir estar em maus bocados. Inconscientes de suas reais missões, nenhum dos três o reconhecia como ameaça.

— Eu... O que estou fazendo aqui...? Eu... Deveria estar nessa escola...? — perguntou-se o homem, ao mesmo tempo que balançava sua cabeça. — Eu... Não consigo lembrar o que deveria estar fazendo agora...

— Jenkins...? — A primeira mulher, com o comunicador inativo em mãos, dirigiu o olhar para o homem. — Mas o que a gente tá...

— Vocês três estavam aqui para fazer uma coisa bem importante...

Além deles, só existia esse rapaz alto estranhamente ferido, envolto em algo que os três juravam que precisavam lembrar, embora não conseguissem, por qualquer que fosse o motivo.

— A gente... Coisa importante...? — questionou Jenkins. — Claro, estamos trabalhando, mas... Espere! Como ficou tão ferido assim?!

— É uma coisa que vocês deveriam realmente se preocupar...

Hora de parar de fingir. Podia estar machucado, mas ainda era ágil o bastante para cuidar de três pessoas confusas o suficiente para sequer se orientarem no espaço corretamente.

Sem saber o que fazer, o motivo de estar lá ou onde se encontrava, o instinto do Oficial Jenkins foi de alcançar ao seu bolso esquerdo, em um compartimento preso a seu cinto.

As pontas de seus dedos gelaram tanto quanto seu rosto, ao perceber que a coisa a lhe garantir o senso de segurança em tempos difíceis não estava mais ali.

— Minha pistola de choque...! — notou pela falta do contato borrachudo em sua mão. — Você...!

— É, foi isso mesmo...

Não precisou de força ou velocidade, mas só de apertar um gatilho depois de mirar, e simples assim, estava feito.

Jenkins caiu teso, sem o menor semblante de consciência. Um já foi, mas restavam duas.

— Jenkins...?! — A primeira mulher pareceu despertar um pouco mais de sua confusão. — Você...! O que você fez?!

— Sinto muito, mas... — Ryan levantou o bastão outra vez. — Não posso deixar ninguém sair daqui...!

E antes que pudesse reagir, fez o mesmo com Sheryl, que encontrou o mesmo destino em um piscar de olhos. 

Sua colega assistiu o corpo convulsionar violentamente, antes de se entregar àquele sono forçado.

Ela era a última que faltava.

— Você... Eu não sei nem o que tá acontecendo aqui...

Ela puxou sua pistola do coldre ao lado direito do corpo e apontou na direção do rapaz desconhecido. Seus passos para trás vacilavam, em busca de segurança.

— ... Mas eu vou parar isso agora...

O nome “Melanie” era lido na pequena placa ao lado de seu busto. Sua postura, embora assustada, ainda era valente o suficiente para se sobrepujar ao medo do possível criminoso.

“Parece que eu me empolguei... Isso sempre acaba acontecendo nesses casos...!”

Ryan travou no mesmo instante, perfeitamente ciente de que qualquer movimento desencadearia um disparo. No fundo, sempre soube não ser uma boa escolha tentar apagar três pessoas quando se tinha apenas duas mãos.

— Não vai... Mover... Um músculo...

“Droga... Eu tenho que pensar em alguma coisa... Algum modo de me aproximar o suficiente dela sem acabar levando um tiro no meio do peito...!”

Melanie tremia incessantemente. Em uma tentativa de se conter, aplicou mais força em seu agarro na arma, balanceando para não acabar pressionando o gatilho no instante errado.

“Droga... Droga...! Eu não consigo focar...!”, pensou, ao mesmo instante que sentia seu contato com a realidade sumir.

As mãos da mulher de pele marrom-clara transpiravam como quase nunca em sua vida. O medo que vinha com ter uma arma em mãos... O potencial de se tirar uma vida...

“Por que raios o meu coração não para de pulsar tão forte?!”

Queria secar a cachoeira em sua testa, dentes batendo uns nos outros… As pernas estremeciam e, por dentro, queimava em agonia, prestes a chorar com um turbilhão de emoções.

— Nem mais um passo…! Entendeu...?! Nem... Nem mais um...! Nem mais...! Um... Passo...!

O pânico a sufocava com um nó na garganta e logo não podia mais respirar, seus pés ausentes de solidez.

O desconforto em seu corpo inteiro se tornou tão intenso que a fez pensar estar em queda.

“Queda...?”

Na última fração de segundo, percebeu o motivo de sentir-se dessa maneira.

Sete baques surdos desceram pelas escadas, cada um mais alto do que seu predecessor, e ao fim deles, uma nova voz surgiu.

— Sempre tão mal planejadas são as suas estratégias... Esqueça. Não posso mais chamá-las assim.

A frieza violenta presente nessa voz seria reconhecida por ele em qualquer lugar.

— Ryan Savoia, pegue esses e traga-os para o auditório número dois. Esses três vão se juntar aos nossos demais reféns.

Os afiados olhos orientais de Lira Suzuki o miraram com clara intenção. Cada segundo de encarada a mais apenas aumentava a pressão já existente entre ambos.

— Lira... Foi você que fez aquilo?

Se atreveu a perguntar. Nessa altura, já não tinha mais como se importar com qualquer reclamação que sofresse.

— Não foi para salvá-lo, portanto não tenha a ideia errada — cruzou os braços, em gesto de face que transparecia o mais profundo desgosto. — Não gaguejei, disse para trazê-los para dentro da sala. Faça isso o mais rápido possível.

Em um gesto gracioso, a garota de características asiáticas e um longo de rabo-de-cavalo apontou para trás de si com o polegar, repleta de liderança.

Indicou uma porta aberta, de apagada e estranhamente escura em comparação às demais, que ao menos contavam com a luz solar que vinha das janelas.

Ryan pensou por um segundo, e questionar não era a coisa a se fazer.

— Certo.

Sem dizer mais uma palavra, aproximou-se do corpo desmaiado de Jenkins e o carregou. O homem era pesado, mas não seria uma jornada insuportável.

O que mais o surpreendeu, porém, foi o que viu ao olhar para sua direita.

“Huh...? Ele tá... Ajudando...?”

Lira repetiu o mesmo procedimento, desta vez com Sheryl. Depressa, atravessou o braço direito da policial em torno de seu pescoço, como ancoragem, para melhor arrastá-la.

Não veio em sua mente a concepção de que ela fosse minimamente ajudá-lo.

— Continue andando — falou, ríspida. — Não me obrigue a ter que perder tempo precioso esmagando o seu coração metaforicamente.

“Huh... Parece que ela não mudou de jeito nenhum mesmo”, aceitou em pensamento e aplicou seu melhor para não deixar isso escapar.

Pouco sabia que mascarar seu gesto fazia absolutamente nada pelo que sentia, e sentiu os efeitos disso logo a seguir, na forma do intenso aperto gélido em torno de seu coração.

— Isso é um aviso. — Lira desativou seus poderes. — Que não venha a se repetir de novo.

E ela continuou até chegar à sala em questão, incólume e afastada de qualquer senso de responsabilidade.

Por mais que desejasse confrontá-la, notou que alimentar um desejo vingativo por alguém que pode massacrá-lo sem nem precisar de suas mãos para isso não era lá uma coisa muito sábia a se fazer.

“Eu só tenho que aguentar até isso acabar…”

Sua tentativa de automotivação o levou para a sala na qual nunca tinha entrado até então. Da porta, viu um escuro auditório, repleto de cadeiras que, ao menos de longe, pareciam um pouco mais confortáveis que as presentes nas salas de aula.

Ao contrário do restante dos ambientes, as janelas dali eram cobertas por lona plástica escura, por onde passava luz o suficiente para que as formas fundamentais de tudo fossem vistas, e não mais que isso.

O teto era mais alto e, no lugar da lousa, existia uma espécie de painel sobre o qual eram projetadas as apresentações virtuais. Um pouco abaixo, o chão era um pequeno palanque de madeira e logo ali...

“Então esses são os reféns”, pensou. Impressionado, engoliu a saliva acumulada.

As formas de dois homens fracamente se distinguiam do acinzentado hegemônico. Amarrados e amordaçados, debatiam-se contra a parede, em pânico ao verem que mais deles haviam sido abatidos com sucesso por meros estudantes.

— Então... — Ele tentou.

— Sim. — Mas Lira o interrompeu. — Assim que você pegar a última, vamos manter todos aqui. Você vai manipular as lembranças deles para que não tenham a mínima memória do que aconteceu aqui dentro.

Lira pareceu estudar seus arredores por um tempo. Seu foco se espalhou por toda a sala, acompanhado do brilho rosado que escapava de suas írises. Os policiais reagiram pior ainda a essa novidade.

— Mark está confrontando... Mas espere...

Apoiou sua mão em uma cadeira próxima para prender a visão na madeira da mesma como se quisesse perfurá-la. Tal foco ininterrupto durou por longos 15 segundos.

— É apenas um, mas são vários... Três... Não, são quatro... Todos misturados em uma coisa só… Como isso é possível…?!

Levantou o rosto em um sobressalto, incrédula com o que havia acabado de detectar, forçada a se deparar com a informação de que Mark poderia estar em piores bocados do que previamente imaginado.

Não havia mais tempo a perder com aquela tolice.

— Ryan Savoia... Apague depressa as lembranças deles. Altere tudo o que for necessário e faça isso em menos de dois minutos. Iremos encontrar Mark.

Ver Lira preocupada de tal maneira acendeu uma chama na mente do rapaz. Se esse era o sinal de uma luta difícil, restava apenas uma coisa a se pensar.

“Parece que, no final, eu nunca tive chance…”



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