Volume 1
Capítulo 6: O Segundo Plano
— Que lugar belo — disse Roy
— Sim...
Ester parecia distante, seus olhos não se focavam em nada.
— Está tudo bem?
— Sim, é só que não tenho boas memórias daqui... Vamos seguir adiante!
O lugar está cheio de pessoas por todos os lados. Pessoas com câmeras, roupas exóticas, fazendo poses vergonhosas, entre outras. Tentando ignorar a todos, Ester e Roy começam a passar por eles, abrindo caminho por onde conseguem. Contudo, no meio do percurso duas jovens travam seu caminho. Uma das jovens é loira e a outra tem cabelo preto curto, ambas estão com vestidos e maquiagem.
— Que cosplay daora! — era a de cabelo preto
— De qual personagem é? — era a loira
O clima ficou estranho. Os 4 ficaram se olhando sem falar nada por algum tempo, até que Roy começa a juntar uma espécie de energia de vento em sua mão direita e es encara com um olhar profundo.
— Ele é meio tímido! — disse Ester enquanto puxava-o para longe delas — sinto muito!!
— Ei, você ia atacar aquelas garotas?
— Estavam me irritando — Respondeu Roy
— Você não pode atacar qualquer um assim! A partir de agora só faça coisas assim se eu permitir, entendeu?
— Sim... — Disse repreendido
Adiante eles encontram um local um pouco mais afastado, longe de turistas, podendo ter um espaço para respirar.
— Finalmente um lugar vazio... agora que a situação tranquilizou um pouco é melhor pensarmos sobre o que aconteceu. — disse Ester
— Primeiro aquelas letras mencionaram um tipo de evento que teve início, um tal de Caça as Bestas.
— Depois fomos teleportados para o Rio e ele explicou sobre o evento. Porém, duas coisas me chamaram a atenção.
— Quando fomos enviados para cá recebemos a seguinte mensagem: "Jogadores Teleportados. Mapa selecionado: Rio de Janeiro"
— Sim, o que tem? — indaga Roy
— A mensagem diz "Jogadores", ou seja, não fomos os únicos a serem teleportados. — Responde Ester
— Isso significa que provavelmente há mais pessoas com esse livro estranho por perto. Já que não os conhecemos, precisamos presumir que são perigosos.
— Segundo, no fim do evento foi dito o que aquele que eliminasse a maior quantidade de Mobs seria recompensada com uma "Recompensa Secreta", dependendo do que for a recompensa, seria ruim se outra pessoa pegasse antes da gente.
— Faz sentido — Respondeu Roy
— Agora precisamos saber melhor como funciona o evento em si...
— Eles mencionaram o segundo plano — Disse Roy
— O que tem isso? — Perguntou Ester
— Vocês não devem conhecer, mas esse é basicamente um "Plano Astral", onde habita a alma de criaturas e humanos mortos. Não deveria haver seres vivos andando por lá.
— Entendi... então como deveríamos entrar nesse lugar? — Pergunta Ester
— Acho que teremos que descobrir sozinhos. — Responde Roy
— Certo, as letras falaram algo sobre locais onde estariam as criaturas, então deve haver algum tipo de mapa para nós irmos até elas. — Diz Ester
— Venha!
Booom!!
Seu Grimório emerge. Logo Ester começa a fuçar de um lado para o outro procurando algo que possa servir de informação, até que algumas coisas lhe chamam a atenção. Enquanto mexia na loja percebeu que algumas coisas estavam diferentes de antes.
[Promoções espaciais:
Capa da invisibilidade - de 75SP por 50SP.
Katana do Samurai caído - de 100SP por 80SP
Cutelo Amaldiçoado - de 40SP por 25SP]
[Loja atualizada todo dia as 23:59]
— Nossa, tem umas promoções de uns itens incríveis! Melhor eu olhar isso todos os dias.
Porém, como ainda não encontrou dicas sobre o evento continuou a folear as páginas. E para sua surpresa encontrou mais novidades na loja. Na última página, onde se compram os decks, uma espécie de botão estranho estava lá. Nele está escrito "Milagres".
Sem pensar duas vezes Ester o pressiona, e mais vez letras douradas saem do livro e formam frases, contudo desta vez em volta das letras parece ter sido formado um tipo de tabela que as contorna.
[Milagres:
10SP — Aprenda qualquer língua falada;
20SP — Aumente os espaços de cartas de invocação ou feitiço;
30SP — Troque SP por dinheiro real;
40SP — Troque de Gênero;
50SP — Troque de Classe;
100SP — Habilidade aleatória;
250SP — Recuperação total;
500SP — Tenha qualquer desejo concedido;
Mais milagres serão disponibilizados na loja com o passar dos eventos.]
— Caramba!! — Exclamou Ester — tem muita coisa nova aqui, e algumas são muito interessantes. Todas são interessantes, porém tem 2 que são incríveis demais para ser verdade...
— Trocar SP por dinheiro? Dependendo do valor do SP daria para viver apenas com isso, sem nunca mais trabalhar de novo!
— E tem essa... se for realmente isso... Ter qualquer desejo concedido? Apesar do preço ser alto, se for possível mesmo fazer o que eu desejo então...
— Ester? — disse Roy
— Ah, me desculpe — Respondeu Ester — estava pensando de mais nisso... vamos nos concentrar no que é importante.
— O mapa, onde será que está... Espera!
— Mapa, venha!
No mais puro instinto ela proclamou essa frase, porém, sua teoria se provou verdadeira. Duas luzes, uma dourada e uma azul, que mais pareciam estar se entrelaçando, de repente começam a rodear Ester e formar no meio do ar um tipo de tabela retangular — um mapa.
Suas bordas douradas contrastam com o azul do terreno que era exibido ao centro, revelando um detalhado mapa da cidade do Rio de Janeiro. Rapidamente percebem algo anormal, como se fossem diversos pontos dourados brilhando espalhados por toda cidade. Curiosa ela pressiona um desses pontos, então o mapa aproxima a visão para a localidade pressionada, revelando informações extras.
[Parque Lage, Jardim Botânico | Dificuldade: ★★★★★]
— Agora entendi. Esses pontos devem ser os locais dos Mobs, e pelo jeito quanto maior a quantidade de Estrelas maior a dificuldade.
— Só que se for isso mesmo... tem muitos lugares com monstros!! Será que a gente vai conseguir terminar todos antes do tempo?
— Se tem muitos monstros, talvez signifique que tenha muitos jogadores como você — Disse Roy
— É mesmo... — Respondeu Ester
— Bom, melhor nós começarmos logo esse evento. No tempo que nós estamos os outros podem estar fazendo pontos, e não podemos deixar eles ganharem a recompensa extra!
— Concordo — Respondeu Roy — Mas é melhor ter cuidado. No meu mundo há inúmeras criaturas poderosas.
— Sim... acho que devemos procurar lugares com uma ou duas estrelas de início. — Disse Ester
— Vejamos...
Começou a fuçar pelo mapa, procurando entre todos os diversos pontos dourados algum com uma dificuldade menor. Eram muitos! A maioria de 3 estrelas para cima. Enquanto procurava alguns turistas passaram pelo lugar em que estavam, e em sua visão Ester parecia uma maluca cutucando o ar e murmurando. Após algum tempo procurando, enfim achou um que cumpre seus requisitos.
[Parque Natural da Catacumba | Dificuldade: ★]
— Esse vai servir. O problema é a distância até lá...
— Humph... Você confia em mim? — Pergunta Roy
— Érr... nós acabamos de nos conhecer e tal, por que isso do nada? — Disse Ester
— Confia ou não? — Continuou Roy
— Sim... eu acho. — Responde Ester
Antes que pudesse refletir sobre a pergunta estranha sentiu seu corpo ser erguido como se fosse uma folha de papel. Parecia ter aumentado de tamanho, então percebeu que estava sendo carregada nas costas de Roy.
— Está pronta?
— Ei, como assim?! Pronta para que?
— Vamos!
Roy abaixou-se e começou a preparar-se para algo. Suas pernas estavam tremendo como se toda sua força tivesse se concentrando naqueles músculos. Seu fluxo sanguíneo aumentou rapidamente e percorria todo seu corpo em instantes. Enfim, liberou aquela energia com um salto, forte o suficiente para quebrar o solo abaixo de onde estava, alcançando as nuvens em instantes. Era como se estivessem voando!
— Gyaahhhhhhh!!! — Gritou Ester
— Daqui a pouco você se acostuma. — disse Roy
Ao tocar novamente no chão, como se estivesse em um trampolim pulou novamente aos céus numa velocidade absurda, ganhando aceleração a cada pulo consecutivo. No chão diversas pessoas pararam para observar o vulto que passava pelos céus achando que era algum tipo de animal. Faziam diversos quilômetros em um minuto, assim seguiram até chegar na localização desejada — o Parque Natural da Catacumba.
Enquanto voavam a visão de grande parte do parque se revelou pelo horizonte. Árvores para todos os lados. Parecia uma floresta pequena com algumas construções de pedra, claramente já destruídas pela própria vegetação ao passar dos anos. Pousaram em uma pequena trilha de terra batida, e antes mesmo que Roy pudesse falar algo Ester já estava escorada no tronco de uma árvore vomitando.
"Acho que foi muito pra ela" — Pensou Roy
Após jogar para fora seu café e almoço, estava pronta para outra! Olhou em volta com cuidado, mas algo parecia estranho.
— Chegamos? O lugar está quieto de mais para haver monstros aqui...
— De fato. — Respondeu Roy
— Vamos procurar pelas redondezas.
Ambos começaram a seguir a trilha de terra batida, passando por crianças de mãos dadas com seus pais, famílias fazendo piquenique na grama baixa, jovens jogando bola, afazeres típicos de regiões desse tipo. Mas, no meio de uma área aberta, ao lado de uma árvore especialmente grande, um tipo de luz azul pairava no ar enquanto se deformava em ondas.
— O que é isso? — Perguntou Ester
— Nunca vi algo do tipo — Respondeu Roy
Aproximou-se com cuidado, porém a curiosidade foi mais forte. Ester encostou sua mão naquele fragmento de luz esquisito, que como se fosse água tomou conta de todo ambiente ao redor, sugando-os para dentro.
Algo está diferente. As árvores, antes verdes e vivas, encontram-se mortas e contorcidas com pouquíssimas folhas estranhamente azuis. O chão tornou-se negro como se fosse o podre, o ar estava repleto de cinzas que caíam incessantemente. O horizonte e os céus, a parte mais bizarra, assemelham-se a um tipo de holograma azulado que parecia estar em um loop infinito. Parecia uma ilusão.
— Onde estamos?! — Perguntou Ester
— No segundo plano. — Respondeu Roy
— Então esse é o segundo plano? Que estranho... me sinto mais leve aqui dentro, como se algo no meu interior estivesse escapando de mim.
— É sua alma — Disse Roy
— O que? — Indagou Ester
— Todo ser vivo possui dentro de seu interior dois "motores" para serem capazes de viver. O primeiro e mais conhecido é o Coração, já o segundo que poucos sabem é a Alma.
— O coração tem o propósito de manter nosso corpo vivo, já a alma mantém nosso espírito.
— A magia, por exemplo, é personificação da alma no mundo material. Basicamente você pode trazer sua alma para o mundo e transformá-la à vontade, dependendo de seus conhecimentos e experiência é claro. Entendeu?
Fumaça escorria pelos ouvidos de Ester, que se perdeu antes mesmo de começar. Era muita informação para sua cabecinha!
— Mais ou menos.... — Respondeu — mas por que me sinto assim?
— O segundo plano é o lar das almas, teoricamente não devíamos estar aqui com nossos corpos físicos... Acho que você estar leve significa que sua alma está sendo afetada pelo ambiente externo— Respondeu Roy
— Isso é perigoso? — Perguntou Ester
— Não... — Respondeu Roy — mas talvez se torne perigoso ficar muito tempo com sua alma sendo afetada desta forma já que você nunca a treinou. Geralmente leva de um a dois anos para sentir a própria alma, já conseguir fazê-la correr pelo corpo é outra história...
— Tanto tempo assim?! — Exclamou Ester
— Sim, geralmente precisaria de muita meditação ou estudos arcanos para isso, mas como estamos num ambiente habitado por almas, creio que isso tenha liberado sua alma precocemente. — Continuou Roy
— Se você conseguir controlá-la desde agora, talvez consiga fortalecê-la e ficar mais forte como um todo.
— Certo — Respondeu Ester — Então, pra isso vamos fazer o seguinte: você não vai interferir, apenas se eu não for capaz de continuar o evento.
— Interessante, tudo bem então. — Concordou Roy
Ao terminar sua frase, juntou as mãos fazendo uma espécie de selo com os dedos e sussurrou alguma coisa. Ester ouviu de relance.
— Névoa.
Seu corpo de repente foi consumido por uma espécie de névoa branca que refletia o ambiente ao redor, basicamente tornando-o invisível.
— Incrível... deve ter sido isso que ele usou daquela vez — Disse Ester
— Agora é hora de mostrar meu valor, vamo nessa!
Ela seguiu o caminho. O som de seus passos era como se estivesse pisoteando cadáveres em decomposição. Suas vias aéreas já estavam contaminadas pelo ar corrompido e pelas cinzas decadentes.
As árvores, como se estivessem vivas, moviam-se lentamente. Mostrando-lhe o caminho a seguir talvez? Mesmo com o ambiente hostil ao seu redor manteve sua cabeça erguida e seus passos não reduziram.
Áuuuuuuuu!
Um uivo distante interrompeu o silêncio ensurdecedor em um instante. Suas pernas não conseguiam esconder o medo que se instalou em sua cabeça. Ela era a presa mais uma vez.
— Lobos?! Droga... pelo menos não é um Minotauro de novo!
O som dos galhos quebrando e das folhas balançando revelaram a direção daquele que viria caçá-la, chegando em instantes. Era um lobo anormalmente grande, branco como os cabelos de Ester. Porém, seu tamanho não era a única coisa de anormal. Ele continha duas cabeças, uma delas com olhos brancos e a outra com olhos negros e um chifre pontiagudo.
— Eu consigo mesmo vencer essa coisa?!
— Não... não posso pensar nisso. Eu preciso vencer!
— Cai dentro gatinho!