Shelter Blue Brasileira

Autor(a): rren


Volume 1

Capítulo 2.3: Estrela de um céu limitado

A base das forças de ataque ficava em um prédio com a mesma arquitetura dos que se encontravam na academia. Caso fique distraído é capaz de ter a impressão que está suspenso em meio a uma plataforma no ar. Foi nesse lugar em que Rie e Jun foram trazidos pelo capitão, logo após deixar a garota e as duas crianças num refúgio seguro, junto do restante da cidade evacuada.

Eles adentaram um elevador, subiram por alguns minutos até o andar mais alto e caminharam pelos corredores até adentrarem numa sala consideravelmente espaçosa. No centro dela tem uma messa em formato circular que projeta um mapa em tempo real da cidade, com pontos vermelhos e azuis espalhados nela, — seja lá o que esteja marcando. E ao fundo, uma grande tela que é observada por quase todos no local.

E dentre aqueles que estão presentes, no instante em que Rie foi avistada, uma única pessoa em específico veio correndo até ela, exclamando:

— Meu Deus, por que você demorou tanto?

Uma garota com cabelos rosas bem clarinhos e olhos da mesma cor, porém de tom mais escuro. Ela usava uma boina e um blazer preto, junto de um laço e uma saia que remetiam a tonalidade de suas ires. Quanto ao restante, uma camisa branca com colarinho debaixo de tudo e meias-calças escuras. Tratava-se de sua melhor amiga e, também, irmã de consideração, na qual se chamava Chie Ueno.

— Eu não acredito — falava como quem estava passada — Você mal encontra um boy e já deixa ser levada por ele tão rápido, assim? Hein? — Agia da forma mais provocativa e brincalhona possível.

— Sai pra lá, sua louca! — E Rie adentrou na mesma hora em uma postura de defesa. Caso não fizesse nada Chie iria ficar zoando com ela até não aguentar mais.

E em reação, risos sapecas ecoaram pelo local.

— Mas, sabe de uma coisa? Acho que deveria ter supervisionado essa sua missão… Mal consigo pensar no tanto de bolas foras suas que eu poderia ter impedido…

Com uma certa frequência, Chie costuma ajudar Rie na função de comunicadora, passando informações e a orientando em algumas tarefas. Inclusive, nesta manhã, foi ela quem desempenhou esse papel para ajudá-la a recuperar aquela adaga que viria ser de Jun, das mãos dos Ones.

— Oh! Céus, ainda bem que não. Eu explodiria assim…

— Nossa, que é isso… Não precisa ser dramática. Eu não sou talarica.

— Ah, vê se me erra!

Foi nessa hora que Rie reparou em Jun, que observava as duas com uma cara de que dizia: “o que diabos eu acabei de ver?”, sendo mais perfeita definição de alguém confuso, mas que logo sacudiu a cabeça e se virou em seguida. Ele fez uma pergunta para o capitão na qual era do mesmo interesse que o dela:

— Qual que é a dessa espada? Pra mim não faz sentido algum que todo esse caos esteja acontecendo só por causa disso.

— Bem, é porque isso foi feito para o seu tipo de poder. Diferente das armas únicas dos Ones, eles não são capazes de usar isso e também, essa daí consegue intensificar ainda mais a força do usuário e vai além do que as deles permitem.

Na cabeça dela, até então, jamais se passou a ideia da possibilidade de existir uma espada de um tipo mais potente do que a que ela já usava; aliás, já estava além do que uma Zero normal conseguiria. De todo o modo, se era para uma aura especificamente como a do Jun, então significa que ela também pode usar. Embora a resposta fosse óbvia, essa era uma dúvida que ela ainda precisava responder. Quando tiver a oportunidade, com certeza, vai pedir pra tentar.

— De um jeito ou de outro, não se preocupa que já temos um plano. Nós preparamos uma réplica que não sai da forma de adaga, na qual vamos entregar para eles. E assim, ninguém deve duvidar quanto a veracidade do objeto.

— Você não acha que está subestimando os Ones? — questionou Jun — Eles, com certeza, não vão ser burros o bastante pra cair nisso.

— Mesmo que eles venham a descobrir a farsa depois, só nisso vão ter que deixar a nossa cidade para conseguir. Eles precisam de um ferreiro com um equipamento especializado para confirmar a veracidade do objeto, o que não pode ser trazido pro campo de batalha — O homem comentava confiante, mostrando que tinha a segurança absoluta que seu plano daria certo — E com esse tempo, já podemos deixar tudo preparado para caso eles decidam voltar e evitar que a situação atual ocorra de novo.

— Tá, você me convenceu.

— Desse modo, eu imagino que sua mãe iria ficar feliz, com você agora portando essa arma no lugar dela.

— Espera! Isso era dela!?

E mesmo que o capitão tenha escutado claramente esse questionamento sair da boca de Jun, ele não conseguiu dar atenção para ele. Algo chamou a atenção do homem de sobretudo, que o fez atravessar a sala e ir até a frente daquela grande tela. O garoto ficou o encarando com cara de idiota, até desistir de ser respondido e voltar sua atenção para aquela direção, junto do restante.

O capitão, então começou a explicar a mesma estratégia que acabara de contar para os demais. E assim fez, enquanto um forte alarme tocava no ambiente, criando uma ansiedade crescente a cada instante.

— E parece que temos um problema a mais… — Ele falava na tentativa de controlar o clima pesado entre as pessoas — Ai, ai… por que nada sai exatamente como eu planejo? — Pelo visto, até mesmo para ele não estava funcionando.

— Foi detectado a entrada de quatro pequenas ameaças no interior do domo — Então, a voz de uma das pessoas finalmente esclareceu o que estava ocorrendo.

Ao ouvir isso, Rie rapidamente conseguiu raciocinar e compreender do que se tratava. Em um conflito como este, com diversos tipos de barulhos diferentes, explosões e principalmente o uso massivo de aura no ambiente, era claro que a atenção do exterior seria chamada. Foi só uma questão de tempo até que isso acontecesse.

— Não é nada que alguém deva ter dificuldade para lidar, pois são apenas filhotes, mas caso fiquemos sem dar atenção pode vir a se tornar algo pior. Sendo assim, alguém estaria disposto para tomar conta disso?

E perante essa pergunta, apenas o som do alarme continuou a ressoar. Rie olhou para Jun e percebeu que seus olhos estavam arregalados, dando a entender que algo o apavorou nisso tudo, o que ela ficou sem compreender, mas que a tocou de alguma forma. Desde que conheceu ele hoje, Rie se sentiu mais animada do que nunca antes, portanto ela queria de alguma forma mostrar que estava entre ele e que podia fazer qualquer coisa.

— Eu posso fazer isso — disse a garota, aceitando essa proposta que ninguém quis.

— Você realmente tem certeza disso, Rie? — O capitão a questionou — Eu sei que alguém da sua idade já estaria lidando com ameaças maiores, mas mesmo assim…

— Estou completamente certa disso, senhor.

— Tudo bem, eu irei confiar em você… E também, muito obrigado.

A garota respirou fundo e reorganizou todos os seus pensamentos. Com a cabeça em ordem, então começou a se preparar para a batalha que estava por vir, sem hesitar.

Primeiramente, coletou um novo frasco de poção para levar com sigo, por precaução. Foi até Chie e com ela pegou um comunicador de ouvido, o colocou, conferiu se tudo estava em ordem com o seu sabre na bainha e aproveitou para ajeitar sua roupa. Desse modo caminhou até a porta, no entanto parou no meio do caminho ao ouvir uma certa fala:

— Você fica aqui! Não posso mais lhe dar ao luxo de ser pego — O pai de Jun assegurava o garoto pelo braço, o impedindo de andar.

— Eu vou ir com a Rie. Deixar que só uma pessoa lute contra bestas, é uma loucura!

Por um momento, Rie ficou surpresa por ele querer ir junto — o que no fundo a fez ficar muito feliz. Ela realmente iria adorar que ele fosse com ela, pois só o fato de não estar sozinha nisso a fazia ficar ainda mais motivada e de confiar que era capaz de tudo. Tinha tantas coisas que queria fazer, mas todo esse conflito que ajudou a causar a impedia, portanto desejava acabar logo com isso.

— Ela é um prodígio. Uma das espadachins mais jovens e melhores que temos. Não há motivo pra você se preocupar.

— Isso não importa! Ainda mais nessa situação, eu não posso ficar parado.

— Ah, é? E o que você vai fazer, então? Nem parece que você precisou voltar pra essa cidade, pois não conseguiu tomar conta desse mesmo tipo de coisa na antiga.

Foi quando menos se pode esperar, Rie percebeu as ires de Jun serem imbuídas completamente pela sua energia prateada. Em uma questão de instantes, aquele fluxo correndo no interior pode ser escutado acelerando exponencialmente.

— Se for assim, não vai ser diferente de quando aquele major mandou a gente pra morrer! — exclamou, fazendo o capitão largar seu braço na força.

E o homem com cabelos da cor do sangue, apenas lhe dirigiu um olhar pesado.

— Eu realmente não consigo entender… Mesmo que agora você esteja na minha frente, não é diferente de quanto eu te ligava todos os dias. De todas as vezes que ofereci para você voltar pra cá… ainda continua fugindo de mim.

Movendo-se numa velocidade que parecia estar a anos luz do garoto, Isamo apreendeu seu filho. Ele agarrou Jun de modo que não conseguia mover mais um musculo sequer.

— Eu não vou deixar mais você fugir.

— Foi você que me abandonou, pra começo de conversa…

E a corrente de poder dentro dele continuou a manar e a aumentar sem parar. Entretanto, foi quando algo diferente aconteceu, o mesmo som já presente nele, cobriu o anterior assim o duplicando e criando uma sobrecarga. A aura que jorrava dele, então se rasgou e agiu de modo tão feroz e abstrato, mas que ao mesmo tempo ele também sangrar? Rie pensou ver respingos daquele líquido vital voar como partículas do garoto, porém ela mal era capaz de compreender o que estava ocorrendo, pois uma espécie de vapor de formava ao redor dele.

Apenas escutou um estrondo que golpeou o capitão em cheio e criou um rombo no telhado do prédio, permitindo que o céu pudesse ser visto. Consequentemente, assustada com esse acontecimento, olhou para o resultado estraçalhado desse ocorrido. Contudo, quando voltou seu olhar para o garoto, apenas avistou Jun inconsciente que foi abatido por Isamu.

— Então é esse o menino que nós criamos, Yuri…? —  Ele murmurava para si, naquele olhar pesado que só se intensificava.

Rie sentiu um calafrio percorrer pelo seu corpo, perante essa cena. O olhar dela estremeceu e suas mãos tremeram. O desconforto causado por essa visão foi tanto que, somente, forçou-se a manter sua compostura e decidir seguir adiante. Sozinha e de uma vez. Sentia que de todas as formas não era mais bem-vinda nesse lugar. Portanto, desceu pelos elevadores do prédio e, assim que passou pela porta de entrada, começou a correr.

 

* * *

 

Com o foco em mente, ela moveu-se com velocidade pela cidade, enquanto avistava as mesmas cortinas de fumaça de antes, mais uma vez indicando que esse conflito ainda estava longe de acabar. Continuou a passar pelos edifícios tomados pela vegetação e por pessoas lutando, nas quais não tinham nada ver com isso, mas que se encontravam em meio a todo esse caos forçadas a lutar, tomadas pelo medo e o desespero.

O interior dela estava incerto. Foram tantas coisas, tantas emoções que passou somente durante esse único dia que se encontrava em tumultuo. A forma como Jun reagiu antes dela sair e o modo como aquilo acabou, com ela apenas fugindo para não ter o que encarar, a deixava inquieta. Era óbvio que estava preocupada, mas agora não tinha como dar um fim a isso.

E ela ainda estava indo de encontro com algo que só intensificava com mais força o seu nervosismo. Aliás, ela nunca tinha enfrentado o tipo de inimigo que estava indo eliminar, agora. Claramente, devia ser diferente daquela única e terrível vez em que avistou uma besta. Só de lembrar daquele dia conseguia sentir ânsia de vomito, porém era certo que a ameaça que vai eliminar, sequer deve se comparar com os gigantescos monstros que viu quando era menor. Os de agora não deviam ser capazes de engolir uma pessoa por inteira.

— Você já deve conseguir avistar as criaturas logo a frente — falou Chie em meio suas comunicações. Rie até sentia uma satisfação de escutar sua amiga de um modo que não seja o zueiro de sempre.

E como ela podia descrever a primeira visão que estava tendo daquilo? O mais indicado a se dizer seria asqueroso.

Diante dela estavam seres que se assemelhavam a cachorros, mas só no modo quadrúpede, pois os seus membros da frente eram mais longos que os anteriores. Não possuem olhos e tem uma mandíbula comprida em que a pele era rasgada, com dentes compridos e afiados nos quais tem estampado um sorriso sanguinário. A carne preta, ejaculava uma energia escura de forma intensa, e era toda revestida com espinhos feitos de um cristal roxo muito afiados, como um ouriço.

— Então isso é uma besta… — murmurou para si mesma.

— Afirmativo. E, por mais que sejam fracas, ainda seja cuidadosa — E a comunicadora respondeu à pergunta retórica, sem perceber.

Rie saca a sua adaga indo de encontro ao primeiro inimigo, em meio sua ativação em espada, enquanto traça uma linha luminosa de um azul fosforescente no ar. A lâmina perfura o peito da inicial a atravessando e fazendo a carcaça nas suas costas se partirem. E assim a garota sente a força concentrada sendo direcionada no alvo.

A pressão causada pelo choque do movimento ao entrar em contato, cria uma onda que se propaga ao redor. Com seu poder imbuído intensamente faz com que um rombo seja criado no corpo do ser e partículas se espalham na volta. E assim, no final do seu ataque, o bicho é explodido deixando poucos resquícios para trás, como se sua existência fosse quase totalmente apagada, espirrando todo o seu sangue para trás em milhares de pedaços.

Os monstros restantes, então percebem sua presença. Seu coração estava acelerado pela ansiedade, contudo precisava manter sua compostura e garantir que todos sejam definitivamente eliminados.

Criando um reforço físico em si que faz com que seus olhos comessem a brilhar, ela posiciona seu sabre, preparado para atingir os próximos. E a segunda corre na sua direção em uma cena asquerosa, onde seus membros se contorciam enquanto se mexem, saltando e abrindo a boca que rasga o próprio tecido para devorá-la. Com um corte preciso na diagonal, um arco luminoso é desenhado na atmosfera e avança de forma feroz, rasgando aquilo em dois perante um choque de impacto que esmaga suas partes para o longe

Com isso, restavam apenas duas nas quais rapidamente avançaram até ela. Rie, girando seu corpo, fatia a primeira de uma vez, sentindo o cheiro da sua carne queimar ao entrar em contato com a espada preenchida por sua aura, e vê o sangue evaporar enquanto é destruída. Então, por último, pula e ataca a última besta indo diretamente de encontro aos seus espinhos, mas que sequer chegam a ameaçar perfurá-la, pois só com o toque de seu sabre com o poder carregado, aquilo estourou e se espalhou como se fosse líquido.

Rie aterrissa numa pequena cratera que criara e assim, com sua arma de volta no formato de adaga a guarda e limpa a poeira em sua saia. As pequenas partículas azuis ao redor, então vão se dissolvendo suavemente ao som de cristais se partindo. Desse modo, sem sequer ser tocada, ela deu um fim a vida dessas pragas rapidamente, sem dificuldades.

— Missão concluída.

— Que bom… Ainda bem que tudo ocorreu tranquilamente, sem imprevistos.

E ao sinal dessa fala, como se fosse uma maldição que acabou de ser solta, algo repentino ocorreu. Os corpos das bestas — pelo menos o que restou deles — foram derretendo e começaram a se rastejar pelo chão como uma gosma de carne negra, indo de encontro uns aos outros. Assim, foram se unindo em algo só.

— Não pode ser…

Gradualmente, seja lá o que era aquilo, foi tomando uma forma e se solidificando em algo maior. Bem maior do que antes. Cresceu ao ponto de chegar a ter por volta de uns três metros de altura. Dando vida a um novo ser, em que os membros da frente davam lugar a lâminas do mesmo comprimento que o corpo, com espinhos mais longos nas costas, ejaculando aquela energia sombria de forma ainda mais intensa. E no lugar da face, ou melhor, na ausência dela, apenas existiam dentes longos e afiados, perfeitamente prontos para dilacerar a garota à frente, esmagando cada parte sua até se arrebentar.

 

* * *



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