Shelter Blue Brasileira

Autor(a): rren


Volume 1 – Arco 1: União

Capítulo 1.1: Mundo ilusório

Ela correu o mais rápido que pôde. Uma única linha gélida escorreu pela silhueta do seu rosto e então caiu. Os batimentos frenéticos em seu peito pulsavam como se ameaçassem explodir a qualquer instante, no entanto, precisava continuar.

Qualquer mínimo deslize era capaz de custar a sua vida.

Algo a perseguia, apesar de não ter qualquer ideia de quem era ou o que fosse. E, de qualquer forma, ela não fazia questão de saber. Pouco interessava o quanto o barulho se tornava mais forte, intenso e próximo dela, fazendo-a acelerar e sentir uma tontura a atingir em meio à visão que se tornava turva. Agora, para Rie, apenas importava conseguir escapar com aquilo em mãos, sã e salva. O que necessitava, e assim faria. Isso era algo muito importante, uma esperança.

— Você conseguiu recuperar o objeto? — perguntou uma voz feminina, ansiosa, através do comunicador escondido na orelha esquerda da garota.

— Eu consegui — respondeu entre palavras escapando de suas respirações pesadas.

Agora não era hora de conversar, ela sequer estava em condições de raciocinar completamente, pois sua mente só conseguia focar naquilo que cada vez se mostrava não ser somente um, mas vários perseguidores prestes a alcançar. E por quê? Qual a razão disso tudo? Era devido a essa simples adaga que segurava firmemente com ambas as mãos sobre seu peito, por mais insignificante e inofensiva que aparentasse ser. Faria o possível para não recuperarem a posse disso novamente.

Entretanto, para começo de conversa, essa já era uma opção que estava fora de seus planos, para deixar claro. Esse era um presente para alguém muito especial que ela não conseguia tirar de sua cabeça. E esse motivo lhe dava ânimo durante o tumulto.

— Perfeito! Sendo assim, a partir de agora assumirei o papel de GPS humano dessa linda. — A preocupação na voz da comunicadora se dissipou e assim deu lugar a um tom bem-humorado.

— Ei! Não é hora para falar desse jeito, sua louca!

— Ah, para de ser chata, para uma diva como você sempre é hora! Mas, antes de tudo, vire à direita no próximo corredor.

Perante as falas descontraídas de sua companheira, uma certa suavidade a atingiu, assim a permitindo ficar mais leve e continuar a correr com confiança. Imersa na atmosfera gélida, seus pés passaram a atingir o chão feito de cristal sob uma melodia que ressoava incessante. Agora o medo e a ansiedade de ser alcançada não eram mais algo que deixaria a dominar.

Enquanto avançava contra uma corrente clara e intensa de uma energia luminosa que ia subindo até o topo, sua sombra era projetada de forma vasta em uma tonalidade mais forte que o ambiente à volta. Os suportes que se afunilavam se tornavam mais largos conforme descia o corredor em espiral em direção à superfície, ao mesmo tempo que lhe passava a impressão de estar se movendo numa passarela em meio ao ar. As próprias paredes e tetos eram feitos de vidro, desse modo permitindo visualizar o exterior em um mundo finito à noite.

Os inúmeros arranha-céus finos e afiados, distribuídos ao decorrer de diversas ilhas pouco espaçadas, chegavam a parecer minúsculos do ponto onde estava. Do lado de fora, se encontrava uma cidade com seus edifícios e construções feitos de mármore branco, perfeitamente polidos, ao mesmo tempo que eram decorados com ouro da forma mais chique possível. E entre essa arquitetura de ponta, tinha um mínimo de vegetação com árvores e arbustos podados.

Uma paisagem que lhe causava gastura como um todo.

Mesmo assim, ela ainda tinha que manter-se firme. Isso que carregava consigo, guardado cuidadosamente em uma bainha preta, era algo que, em hipótese alguma, deveria ser deixado guardado por eles. Uma adaga muito preciosa e valiosa, com o potencial de trazer uma mudança sem fim ao estar sob aquele que a pertence.

— Apenas siga reto! A saída vai estar logo à sua frente!

Então, foi carregando toda essa motivação e desejos que Rie atravessou a porta, adentrando o ambiente enjoado. E deu um passo atrás do outro, fugindo solitária ao longo das ruas e calçadas, respirando um ar seco e áspero com uma fragrância de perfumes artificiais deste lugar que esbanjava perfeição. No entanto, era uma questão de tempo para que essa paz acabasse.

E como uma premonição, assim aconteceu. Inúmeras linhas cruzaram ao seu redor, colidindo contra o chão e fragmentando-se em partículas douradas, assim anunciando o que ela menos desejava: estava cercada.

Soldados incontáveis, trajados com armaduras pretas metálicas da mais alta qualidade, bloqueavam seu caminho de todas as direções. Aqueles barulhos constantes que a perseguiram, enfim, revelaram sua forma diante de si.

— Isso é ruim… — sibilou a comunicadora.

Diversos rifles de assalto, refletindo a aparência do cenário à volta, prontamente preparados para ter seus gatilhos apertados, estavam apontados em sua direção. Seria uma questão de instantes para que Rie fosse baleada, caso não fizesse nada. Ela olhou de um lado para o outro, contudo, todas as rotas de escape possíveis ao redor foram bloqueadas, sem deixar qualquer brecha de fuga — uma formação impecável da parte deles.

Portanto, Rie se viu diante da necessidade de uma ação ousada e arriscada.

Dando um passo para trás, ela fechou os olhos e respirou fundo.

E foi assim que algo extraordinário ocorreu.

Pequenas partículas de um brilho azul fosforescente começaram a emergir suavemente de seu corpo, a ganhar tamanho e jorrar incessantemente. Essas, que lhe deram força para que corresse em direção aos inimigos com uma corrente de poder que a impulsionava através de seus pés, e assim saltasse, girando seu corpo, enquanto se via de forma clara em meio a um céu onde linhas douradas eram desenhadas nas quais desviava.

Com sua silhueta projetando um rastro luminoso, moveu-se suavemente pelo ar, atravessou uma muralha gigantesca e aterrissou no outro lado, deslizando de forma graciosa. Agora, se deparando diante de um cenário drasticamente diferente do anterior.

— Nossa… que alívio… — Um suspiro foi escutado através do dispositivo no ouvido.

— Daqui a pouco eu volto para casa, tá?

— Certo.

E então uma paz silenciosa a envolveu. Se tratava do sinal de que estava segura. Mas ainda não significava que sua missão tinha acabado. Lhe restava fazer uma certa coisa que, até então, tanto aguardou. Rie se encontraria com aquele para entregar o que tem em mãos. Mal conseguia conter o ânimo só de imaginar que, finalmente, conheceria alguém do mesmo tipo que o seu.

— Tomara que ele seja bonito… — fantasiando com o momento adiante, ela foi em direção ao local de encontro.

 

* * *

 

Atraído por uma canção que não deveria existir ali, ele acelerou o ritmo dos passos. Era estranho, pois se tratava de algo incrivelmente nostálgico.

Para falar a verdade, o mesmo podia ser dito sobre todo esse lugar. A essa altura, mal conseguia acreditar que já se passaram seis anos desde a última vez. Ainda assim, mesmo sem entender o porquê, o sentimento causado por aquele som lhe transmitia algo tão intenso que não conseguia se conter.

Algo gelado e confortável como a brisa de uma manhã de primavera. Mas, ao mesmo tempo, trazia uma dor sem fim.

O som da água corrente fluía entre os inúmeros rios e lagos conforme atravessava as pontes de madeira. Ao longe, as pessoas começavam a acordar e caminhar pelas ruas, os barcos deslizavam entre as correntes, deixando vapor escapar por seus funis. Entre os arranha-céus e prédios feitos completamente de vidro, tomados quase por inteiro por trepadeiras cujas folhas balançavam ao vento fresco em um barulho harmonioso, a cidade respirava um ritmo lento e harmonioso.

Pequenas criaturas com asas de borboleta que brilhavam em branco, chamadas de fadas, voavam e pousavam entre ilhas flutuantes onde cascatas infinitas despencavam. Algumas pequenas, outras grandes o suficiente para abrigar construções, escadas e outros caminhos que se entrelaçam entre árvores e flores tocadas pelos primeiros raios solares do amanhecer junto a uma neblina sutil.

E ele seguiu andando pelas calçadas de mármore branco, rachadas, com musgo e vegetação crescendo pelas frestas, à beira de cercas de ferro forjado, também tomadas por plantas que se enrolavam em seus arabescos. Imerso nesse ambiente deixado para morrer, subiu os degraus em direção àquele que já era seu objetivo inicial, mas que agora o atraía com mais intensidade, empurrando-o a descobrir a origem da melodia tão próxima.

Contudo, a resposta para essa pergunta, que tanto desejava, lhe foi entregue de uma só vez, antes mesmo que pudesse processar. Primeiro, tudo foi cortado por um silêncio absoluto. E então, uma presença que o prendeu por completo.

Como se um feitiço mágico fosse jogado nele.

— Você finalmente chegou! — Uma voz animada ecoou pelo ambiente. E, em reação, a única coisa que soube fazer foi parar os passos de imediato.

A névoa suave do amanhecer ainda se dissipava quando ele percebeu, escorada na cerca à beira do local, ao lado de uma torre com um sino, uma figura feminina recortada contra o céu que clareava. Primeiro viu apenas o contorno claro do blazer, depois o brilho discreto de um laço azul balançando na brisa fria. Seu coração disparou antes mesmo de compreender o porquê.

Ainda recapitulando em loopings constantes em sua mente a melodia que ela cantarolava, encaixando-se perfeitamente naquele silêncio úmido que ele sentia a lembrança latejar, como se o tempo houvesse corrido apenas para levá-lo de volta ali.

Quanto os primeiros raios se espalharam pela fachada envidraçadas cobertas de trepadeiras, a luz revelou os detalhes aos poucos: o claro blazer escolar aberto sobre um vestido preto ajustado com decote realçando a cintura por cima de uma camisa. O brilho suave da pele clara arrepiada pelo vento fresco que carrega o cheiro mineral dos canais e o adocicado distante das flores silvestres pendendo das ilhas voadoras.

Por fim, o rosto. Olhos de um azul impossível, vívidos, de um tom muito intenso, cintilando curiosidade, e um corte médio de um cabelo liso completamente branco que parecia capturar e refletir cada centelha do sol nascente. E foi deixando a vista adiante do precipício que essa face parou para encará-lo.

Ele conteve o fôlego, não apenas pela beleza, mas pelo choque de vê-la ali, naquele lugar onde a princípio viera para receber algo importante, certo de que encontraria alguém, mas não ela. Esperava ver um certo alguém, embora dissesse a si mesmo que era impossível. Agora, a visão se mostrava ainda mais inesperada: a dona daquela voz que cantava justamente uma melodia que ele conhecia tão bem — mais do que qualquer um — ao escutá-la pelos fones repousando em suas orelhas, foi a responsável por o prender até esse caminho, mas isso ele guardou em silêncio.

— Quem é você? — A pergunta escapou antes que pudesse medir o tom.

Por um instante, pensou em recuar, dar meia-volta e convencer-se de que cometera um engano. Ela, porém, enrolou calmamente os fios do fone em torno do celular, ergueu o olhar e, em vez de responder, inclinou-se ligeiramente para frente e sorriu.

Nos segundos seguintes, o mundo ficou elastificado: pequenas lascas de luz azul, como cacos de vidro fosforescente, brotaram do corpo dela. Ele reconheceu o fenômeno antes que o instinto pudesse reagir; ainda assim, a súbita explosão de energia empurrou o ar contra o seu peito. Ela se lançou num salto elegante, deixando um rastro cintilante desenhado no ar, e pousou na sua frente de forma suave.

O impacto do pouso espalhou uma onda de pressão que fez as folhas vibrarem e o mármore sob seus pés gemer. Firmou-se, espantado com a proximidade — conseguia sentir o leve perfume doce que emanava da garota — e com o fato de ela ter usado a aura, ou magia, em outras palavras, apenas para se mover numa distância tão curta.

— Hmm… É bem como eu pensei mesmo, os seus olhos possuem um segundo tom muito interessante — disse ela, inclinando seu corpo para frente, com as duas íris preenchidas por uma energia luminosa que, aos poucos, se apagava, fixadas nele.

E o garoto a encara de volta, sem saber como reagir, por uma curta fração de segundo, enquanto escutava o barulho de cristais que aqueles brilhos à volta faziam ao desaparecer. Estavam próximos demais um do outro, o suficiente para que os rostos dos dois quase se tocassem.

A feição dela demonstrava uma expressão inocente, porém muito curiosa, e, em meio a isso, um misto de emoções borbulhava na cabeça dele. Enquanto um lado idiota seu achava essa postura da moça até que fofa e tinha a genuína curiosidade de apreciar o que estava bem diante de si por mais um tempo, o outro se sentia tão desconfortável ao ponto de cogitar se atirar de costas contra o chão para manter a distância.

— Ah… Muito obrigado, eu acho… — Ele se inclina também enquanto fala em provocação. — Mas meio que… isso aqui tá um pouco esquisito, não acha?

Perante a ação, a garota vai recuando instintivamente, chega quase a perder o equilíbrio e, quando o encara novamente, paralisa por um segundo. Uma clara cena em que suas bochechas vão se tornando, gradualmente, cada vez mais vermelhas, de tal modo que fazia ela estar prestes a explodir a qualquer instante internamente. E assim, aparentemente, aconteceu ao ela dar um pequeno pulo para trás junto de um grunhido estranho, dizendo:

— Desculpa… Me… Me desculpa! É que… bem, sabe? Foi curiosidade. Como não paravam de falar sobre você, eu queria te ver logo, então eu… eu… — Agindo toda atrapalhada, ela vai falando até o som de sua voz diminuir o bastante para sumir. No fim, ela abaixa a cabeça e cobre o rosto com os dedos, desviando o olhar para o lado.

A maneira como ela gesticulou, balançando as mãos de um lado para o outro desesperadamente, fez com que ele comprimisse os lábios, embora um som abafado tenha escapado antes que pudesse evitar. Entretanto, independentemente de ter que prender a vontade de rir que surgiu dentro de si, ele rapidamente organizou todos os seus pensamentos e assim falou:

— De qualquer forma, você ainda não respondeu à minha pergunta… — Ele assume uma postura confiante. — Quem é você? O que faz aqui?

Ele tinha quase certeza de que ela era a pessoa com quem deveria se encontrar, devido à forma como agiu, mesmo assim, ainda queria confirmar isso por segurança. No entanto, em reação, a garota apenas inclinou a cabeça para o lado e o olhou, confusa.

— Hm… Acho que tem uma a mais aí, hein?

— Deve ser só impressão. — Se portou como quem não sabe de nada.

Por um momento, ela cruza os braços e faz uma cara como de quem dizia “é sério que você meteu uma dessas?”, todavia, sumiu numa questão de milésimos. Ela, então, deu um sorriso e continuou:

— Eu sou Rie Koike. Fiquei encarregada de vir receber você.

— Me chamo Jun Asano. É um prazer.

— Bem, isso daí eu já sei.

Ao ouvir essas palavras, aquela postura anterior de Jun cedeu completamente, e Rie, no mesmo instante, cobriu a boca com a mão na tentativa de esconder um riso. Ele, sem sombra de dúvidas, acabou caindo em alguma espécie de armadilha da garota, e ela demonstrava ter adorado.

— É um prazer te conhecer também — disse Rie, avançando outra vez em direção a Jun, com os olhos fixados nos dele.

Para onde foi toda aquela vergonha de antes? — Ele se fazia essa pergunta sem parar, como se fosse um enigma sem solução. A maneira como Rie se comportava até então, definitivamente, o instigava.

— E aqui está o seu presente de boas-vindas!

Estendendo ambas as mãos para ele, a garota lhe ofereceu um pequeno objeto. Tratava-se de uma adaga preta, guardada numa bainha da mesma cor. Jun observou o que lhe era apresentado e, então, pegou sem hesitar. Desse modo, Rie deu um passo para trás e disse:

— Me deu muito trabalho pra trazer isso até aqui, viu? Sendo assim, eu quero que você pense em mim todas as vezes que for usar — falava enquanto gesticulava com o dedo em círculos. — O meu esforço não pode ter sido em vão. — E terminou apontando para ele.

— Ah, que fofo… Mas não acha meio romântico demais pedir isso pra alguém que acabou de conhecer? Bem, se me chamar pra sair antes, aí tudo bem.

— O quê!?

— Não?

Agora foi ela quem caiu na armadilha. Cruzou os braços, emburrada, olhando como quem diz “seu chato!”, mas Jun já estava se contendo para não rir, o que a fez fazer beiço. Apesar da cena, obviamente, nenhum dos dois estava sendo totalmente sério, mesmo ambos parecendo estranhamente confortáveis, apesar de essa ser a primeira vez que se viam.

Deixando a situação excêntrica que os dois estavam experienciando por enquanto, Jun concentrou-se em sacar seu novo pertence. Apesar de não possuir guarda-mão, o recorte da lâmina desempenhava essa função. Continha dois gumes e era praticamente escura por completo, exceto pelo contorno prateado ao longo do fio. No entanto, ele não teve a chance de continuar analisando o presente que acabara de ganhar.

Um estrondo ensurdecedor o interrompeu e algo voou ricocheteando contra o chão.

Subitamente, passos ecoaram de todas as direções. Ao virar-se reflexivamente, Jun se deparou com uma cena que lhe causou um calafrio dos pés à cabeça. Soldados trajando armaduras negras, portando espadas imbuídas por um brilho dourado que expeliam partículas, e apontando armas de fogo para os dois. Conforme avançavam, mais e mais tomavam o local até chegar ao ponto de ele ficar completamente preenchido.

A feição do garoto, em reação ao que estava presenciando, se tornou indiferente e um tanto desanimada. Em contrapartida, Rie bateu com o salto do sapato contra o chão e deu um passo adiante.

— Nossa! Como vocês são insuportáveis! Até nesse meu momento querem me encher o saco! — Rie contestou, cerrando os punhos.

Uma linha dourada rasgou o ar. Instintivamente, Jun moveu o braço, parando a adaga na frente da bala. Sua mão aparentou ter assumido instantaneamente aquela posição, mas, ao mesmo tempo, também foi possível perceber o seu movimento de forma clara. Naquela fração de segundo, um rastro de energia muito intenso foi deixado, indicando a trajetória.

Uma enorme pressão se formou e ocasionou uma corrente de ar que, ao se chocar, dissipou-se de forma avassaladora, assim fazendo seus cabelos serem empurrados para trás e balançarem freneticamente. E o projétil disparado continuou a avançar, mas agora como meros fragmentos de ouro divididos em dois até desaparecerem por completo.

— Uau! — exclamou Rie, confusa, ainda na tentativa de processar o que acabara de ocorrer.

Jun avançou brevemente, e a simples adaga que empunhava foi tomada por fios luminosos a partir do toque dele, de um instante para o outro, entrelaçando o objeto. Foi num piscar de olhos, porém, quando conseguiam se dar por conta, a lâmina daquilo já havia começado a crescer. O que parecia algo insignificante transformou-se numa espada.

As mãos dos soldados passaram a tremer; as armas brancas e rifles, sob uma postura impecável, então desabaram, e eles recuaram um passo para trás. Com os olhos de atravessado, ele encara-os fixamente, estando preparado mentalmente para ter que agir. Mesmo sem entender o motivo disso estar acontecendo, ainda não ficaria parado — ainda mais para os autodenominados Ones, como eles.

— Como… Como você é capaz de usar isso!? — questiona o soldado que está mais à frente do grupo.

— Porque eu sou o único. — E respondeu Jun, despreocupado.

O garoto já estava certo de que algo assim aconteceria uma hora ou outra; apenas não esperava que seria logo de cara. Ele viera para essa capital e sua cidade natal já com um objetivo claro em mente, portanto, não iria se esconder ou fugir perante mais nada.

Outra vez, sendo apenas possível enxergar um rápido borrão, uma tormenta cruzou entre os inimigos que os cercavam, derrubando todos em uma rajada assustadora, entre um estalo ecoando sob uma pressão devastadora. No entanto, quando tocaram o chão, Jun já estava no mesmo lugar, como se nunca tivesse saído de lá.

Aqueles na frente da escada, então, tentaram reagir, mas antes que sequer conseguissem, foram esmagados por uma onda de ar de um simples balançar daquela espada de cor noturna. Assim, ele passou a andar em direção ao restante, contudo, foi parado na mesma hora ao ter seu braço agarrado com força.

— Vem comigo. — Rie disse enquanto pegava Jun pela mão e passava a puxá-lo em direção ao precipício, num ato repentino.

— Mas ainda tem mais deles! — Ele contestou, porém, ela não pareceu ligar.

— Não compensa ficar enfrentando eles.

Cacos do mesmo brilho azul anterior envolvem a garota que corre de mãos dadas. E então, antes mesmo que ele pudesse a contrariar, os seus pés já haviam deixado de tocar o solo. Um forte impulso os lançou para o alto, fazendo com que voassem entre as inúmeras estrelas cadentes de ouro que caíam no sentido contrário, tentando os encontrar.

Quando, enfim, consegue se conformar em meio a essa vastidão, os dois se deparam diante de uma torre de tamanho imensurável, tocando os céus.

Após uma grande parede de mármore, responsável por dividir um mundo de duas realidades — uma banhada a ouro, e outra apodrecendo entre a vegetação —, lá estava, ao centro de tudo, a imensa estrutura com um anel luminoso na ponta. Se não estivessem em um dos lugares mais afastados da cidade, sequer conseguiriam ver a olho nu. Algo tão magnífico, mas que era cercado por uma ilusão sem fim. Um domo feito de inúmeras linhas poligonais, nas quais deixavam apenas a luz e a sombra do outro lado passar.

— É bonito, você não acha? — perguntou ela com um olhar encantado.

No entanto, entre o vento e as cores sem fim, o que ela obteve foi apenas um silêncio profundo. Para Jun, não havia como conceber tais palavras. O som do sino daquele local, que foi acertado, apenas recuou e assim ficou, repetidas e repetidas vezes dentro do seu ser. Esta vista, de algum modo, lhe era simplesmente nojenta.

 

* * *

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