Ataque as Torres! Brasileira

Autor(a): K. Luz


Volume 1

Capítulo 19: Sombra entre Sóis

A areia explodiu com a queda do vassalo.

No alto, perto do último andar da torre, estava Dante olhando pelo buraco na parede. O vento balançava seu manto e secava o sangue das pancadas que levou. Enfim confirmado que o monstro morreu na queda, ele se virou e focou no lugar: o caos do corredor.

Os quatro responsáveis por segurar as caixas e impedir a invasão estavam atônitos. Boquiabertos, a realidade descia por suas gargantas.

— Ele… realmente conseguiu! — disse Jorge, o fazendeiro, sorridente. Sem saber, quebrava a barreira dos incrédulos à volta.

Antes que pudessem comemorar de verdade, as caixas atrás foram destruídas, jogando o trio para o chão. Os pedaços de madeira se espalhavam — as centenas — e pela passagem desprotegida adentravam os soldados. Em pouco tempo, sete dele adiantaram-se pelo corredor, lentos por estarem de frente para os resultados da guerra, que se resumia: morte dos seus e a aparentemente dos homens também.

— No fim…! — Gregório levantou a metade do corpo, dolorido. Seu tom era hostil. — Ainda vamos todos morrer aqui?! 

O policial estava com as mãos tremendo pelos recentes combates. À volta se encontravam os sacrifícios pela causa. Diego estava colado na parede com a cabeça baixa. Totalmente nocauteado. Karlos seguia deitado num piso manchado pelo próprio sangue. Otávio: junto do grande escudo transpassado com ele pela espada.

Vermelho predominava.

Ao respirar densamente, Dante pôs as mãos adiante e abaixou o centro de gravidade, preparando a postura para a luta iminente. Mesmo que estivesse longe de estar pronto mentalmente para outro combate, sua expressão séria deixava os lamentos e necessidades para depois.

O tempo passava.

Os homens começaram a se perguntar, impacientes: quando viria a morte?, mas as aberrações não se moviam. Os monstros paralisaram ali, tão focados no buraco da parede e no sangue por perto que esqueciam de golpear os invasores.

Então veio os berros de trás. Altos e desesperados, aproximavam-se.

Os soldados deixaram suas armas caírem e viraram. Aos poucos os gritos dos seus aliados espalharam-se por todo o edifício. Um pandemônio; ficavam cientes da morte do vassalo.

Ao contrário do que os homens previam, os inimigos correram — para longe dali. Era assim por toda a torre. Pela saída, aos montes eles fugiam pelo deserto, unidos. Sem consciência, apenas tinham pressa e ignoraram vingança ou qualquer pensamento estratégico sensato.

Simplesmente a casa foi dada.

— Não pode ser… — disse Armstrong, olhando o vazio no caminho pelo qual vieram.

— Então o comerciante estava falando a verdade — comentou Dante, que desfazia a postura de luta. Em seguida, ele se apressou, como o mais adaptado às loucuras, em comandar como líder: — Se não estão feridos, se levantem! Rápido! Vejam se Otávio está bem! Verei os demais!

Relutantes, eles entenderam e obedeceram. Perto, jogaram o que restava do grande  escudo e espada para o lado.

— Ai ai! — Otávio estava com um corte feio na cintura, que rodeou o manto com a mancha de sangue. Acima disso, prosseguia vivo, então foi um alívio para o grupo. — Espero nunca mais ter uma espada gigante arremessada contra mim… Ai!

— Hahaha! Pare de falar, fique quieto — falou Armstrong. Ele rasgava o tecido para improvisar ataduras.

Após checar Diego, que seguia desacordado, Dante correu para ver a pessoa que mais foi machucada na luta contra o vassalo. Karlos estava morto? Ou Deus ainda o permitiria dar outros passos nesse mundo cruel? Ele tinha que ver por si mesmo. 

A situação do rapaz era critica igual antes. Mal respirava pelo rosto acabado, o indício de que vivia. Fora as fraturas de ossos, o problema real era a perda de sangue, então… mais bandagens.

“Novamente você nos salvou, hein?”, pensou Dante. “Poderia te dizer muitas coisas sobre sua inconsequência — para nós dois —, mas por agora apenas durma. Com certeza salvarei todos aqui.”

Na mão do Karlos havia um pedaço de pano preto que tirou do vassalo antes de ser jogado para longe. Ao notá-lo, o homem o usou como atadura para o machucado no braço.

— Gregório! Armstrong! — chamou. — Pelo tempo que passou, esse lugar já deve estar vazio. Vão buscar o médico e o restante dos que puderem lutar! Temos que assegurar nossa conquista!

Apesar da relutância de topar com um monstro na descida, os dois aceitaram e partiram dali. 

— Reúnam todos os homens!! — disse Gregório ao chegar lá. Os vigias rapidamente agiram e os portões foram abertos

— Conseguimos! — falava Armstrong ao entrar. — A invasão foi um sucesso!

A comoção espalhou-se pela torre, louvores espalharam-se em cadeia até alcançar as mulheres e idosos no último andar. Eva caiu de joelhos, aliviada.

Com o esforço na madrugada férrea, a torre Sees foi conquistada.

 

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— Temos que nos apressar! — avisou Armstrong, que liderava a multidão na saída da torre. — Há feridos e temos que preparar uma defesa para caso eles voltem!

“Certo!” e “vamos lá!” se espalhavam pelo pessoal. Com a moral elevada, eles foram pelo deserto. Apenas uma parte dos homens ficou, encarregados de proteger o lugar se houvesse um ataque enquanto iam para longe.

Em meio ao clima quente — tanto na realidade quanto aos ânimos elevados — Gregório esboçou certa satisfação no rosto, ignorando ao menos por um momento sua personalidade agressiva. Foi quando algo sombrio deslizou pelo seu ombro e o aterrizou.

Uma mão escura — feita de sombras — ficou caída o usando como apoio. Ao lado, perto do seu ouvido, um monstro de trevas rindo se aproximou. Gregório suava frio, suas íris tremiam e a respiração ficou pesada.

— Fez muito bem, meu aluno — disse o desconhecido.

— Quem é?! — perguntou o ruivo, sem se virar. 

— Quem eu sou? Você sabe quem eu sou.

— !… — Gregório encarava à frente, longe de algum foco. Só matava tempo. Atormentado.

A mão de escuridão o deixou. Por fim, o homem se irritou e se virou, decidido a encarar o medo: — O que quer aq…?! — Não havia ninguém perto.

As pessoas passavam ao lado do Gregório e ele continuava olhando feio para esse rumo. Sem achar o desgraçado, ele voltou a focar à frente com o peso imenso de um mau presságio.

O sol movia-se no céu. Em breve as nuvens o cobririam. Para a tarde, os ventos voltaram forte e bombardeavam a torre com as colunas de areia.

— Isso é frustrante — disse Diego, que caminhava com ajuda do Ritsu por um corredor. — Ser carregado por um jovem me faz sentir a velhice chegar antes da hora.

— Tem certeza que não quer ficar parado como o médico mandou?

— Ha ha ha! — riu com dor. — Se começar outra batalha, posso ajudar com instruções. Não vou conseguir descansar até esse lugar for dado como seguro.

— Entendo. Tudo bem, irei com o senhor.

— Obrigado, garoto! E você é bem sério, parece o Karlos. 

Ritsu ficou em silênico e fechou os olhos. Demorou para sua resposta sair: — Não penso isso. 

Os homens vistoriavam as salas. Nenhum inimigo era encontrado. E pelos corredores, Dante comandava o grupo e recebia os relatórios sobre cada andar.

Armstrong e boa parte do grupo se concentrou em frente a um portão que encontraram. Seus rostos estavam enrijecidos ao limite, presos a uma seriedade abissal quando ao local. 

— É verdade o que disse? — perguntou para o homem ao lado. 

— Sim. Vi com meus próprios olhos.

— Ótimo. Vamos, pessoal.

Com posturas firmes eles se aproximaram enquanto a maçaneta girava e a luz cegante surgia pela brecha. Revelou-se uma grande piscina adiante — o paraíso — rodeado por pedras e chuveiros de madeira nas paredes. Os homens rugiram de felicidade, cerrando os punhos estirados em comemoração, e tiravam as roupas ao irem correndo para a água.

A água estourava com os inúmeros pulos para seu interior. Na face dos guerreiros, para os que viam restava a dúvida se dos seus olhos o que escorria era apenas água ou eram lágrimas.

— Juro que se eu passasse mais um dia com aquele cheiro, eu morria! — disse Armstrong, de pé na piscina, esbravejando para o alto.

Esse andar estava impregnado com a barulheira. O ato tão simples de se lavar se tornava a maior comemoração que poderiam ter nesse deserto infernal.

Nessas poucas horas, a torre foi confirmada como segura. 

O salão lá pelo alto, havia sido transformado na zona médica. Karlos estava enfaixado como uma múmia — déjà vu. Otávio estava sentado com as costas apoiadas na parede, observando dali as inúmeras marcas do duelo pelo lugar. O corte que teve foi contido pela quantidade grossa de ataduras.

— Como está? — disse Dante ao entrar.

— Ah? isso? Vou ficar bem. Vão precisar de mais para me derrubar! 

Os policiais riram. As horas que passaram haviam feito milagres com seus humores. Tanto no pesar dos machucados ou do nervosismo da batalha. A responsabilidade ficou miníma, enfim.

— Onde tá o Dr. Marcos?

— Foi caçar o fugitivo.

— Hah! Imagino que o Sr. Diego não foi simplesmente passear.

— Como foi a vistoria?

— Inspiradora. Comida, muita água, espadas e ouro. O que achamos na outra torre nem se compara. É cedo para a contagem, mas estimo que possamos passar um mês sem sufoco. 

— Um mês, é?

— Desapontado?

— Não. É mesmo uma boa notícia, até me senti aliviado por dentro em saber que conseguimos proteger o futuro dessas pessoas. É só que me veio a cabeça: “então vamos ter que passar um mês aqui”, apenas veio.

— Tem razão… Por essa perspectiva as coisas não são mesmo animadoras. Esperava ver alguma resposta daqui, mas por causa do vento, não podemos ver nada dos arredores. 

— Hm… Entendo. — Colocou as mãos atrás da cabeça e relaxou a postura. — Me pergunto se os moleques estão bem.

— Fala da sua família?

— Sim… Vou tomar um esporro da mulher quando voltar. Será que a história de outro mundo vai colar? Certeza que a desculpa de estar fazendo hora extra funcionaria melhor, ha ha ha! E você? Sente falta “dela”?

— Também vou precisar de uma desculpa para quando voltar.

— É impressão minha… ou ouvi alguns gritos lá de baixo? 

— Acharam um quarto de banho, tá um caos. 

— Caos vai ser quando as mulheres assumirem ele!

Ambos conversavam animadamente, colocando em dia o hábito que não puderam há tempos pela situação adversa.

— (...) E como tá o rapaz?

— Igual antes, não, pior. O médico que disse, mas ser um gênio não é necessário para perceber. Vamos precisar das pedras novamente, Dante.

— Entendi… Vamos depender de novo da boa vontade de aparecer do comerciante, huh? Droga! — Bateu o punho contra a palma, revelando o estresse que escondia, apesar de fazê-lo só por um instante. 

Otávio ficou em silêncio, sua expressão animada se apaziguara.

Era assim que as coisas eram.

Ao ir ver Karlos de perto, Dante se abaixou. Surpreso. O pano preto havia coberto todo o braço dele, mas nem de longe deveria ser tão grande. Era impossível que tivesse crescido, certo?... 

Antes que tivesse tempo de considerar a cena estranha, uma mão crescia atrás; temor o percorria como calafrio. Ao virar, ele viu um rosto humano com olhos arregalados devolvendo a encarada, profundamente, mantendo a linha de contato.

— Qual o problema, Sr. Dante? — disse o desconhecido. Seu braço estendido no rumo do Karlos havia sido agarrado pelo policial, por reflexo. — Parece que viu um fantasma ou alguém muito feio atrás de mim. 

— Huh? Quem…?

O estranho puxou o braço e se soltou. Era um homem de altura média, moreno e parcialmente velho. Seu cabelo, bigode e barba bagunçados o deixavam próximos à imagem de um vagabundo. O olhar insano, que lhe era natural, não largava o rapaz caído.

— Não esperava menos de um policial, que aperto forte — mexia no pulso. — Só estava curioso sobre ele, peço desculpas se te peguei de surpresa.

— Qual seu nome! — gritou Dante. — Diga!

— Não. — Ele caminhou para a saída.

— O quê?... Esse bas…! — Se levantou, pronto para correr. 

— Ah! Não entenda errado, por favor! — O desconhecido se virou e gesticulou com as mãos em um sinal de defesa. — O que eu quis dizer é que não tenho nome. Então não fique bravo, me chame do que preferir. Se precisar de mim, estarei por aí. — Riu largamente com os dentes amarelados, indo pela “porta” que foi destruída na invasão. 

Depois, foi embora de vez. 

— Conhece ele? — perguntou Otávio. “Como eu só o percebi tão tarde?...”

— Não sei. — Ele cerrava os punhos, totalmente alerta. — Essa presença… Teremos que ficar de olho. Ele é perigoso.



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