Volume 9

Capítulo 194: O segredo do estilo Yaegashi

Foi pouco antes de o sol se aproximar do auge de sua escalada. Hajime estava andando sem expressão pela área residencial de um determinado rio.

Não era como se ele estivesse de mau humor, mas quando ele pensou no local que estaria visitando depois disso, ele se sentiu um pouco melancólico. Além de tudo isso, o evento também o levou a pensar sobre várias coisas, quando se tratava de como lidar com isso, sua expressão ficava rígida.

Entretanto, não importava o quanto o Sinergista se preocupasse com isso, já que ele não tinha intenção de ceder ao status quo ou mudar sua vontade, resolver isso era extremamente difícil e encontrar uma solução que pudesse funcionar de uma só vez era quase impossível. Comparado a esse problema difícil, conquistar um grande calabouço era algo muito simples.

— Bem, isso é óbvio, mas não há o que fazer, hum?

Ele suspirou enquanto olhava para o seu destino que apareceu no caminho à frente.

Era um terreno espaçoso, cercado por sebes esplêndidas com uma grande casa japonesa dentro dela, ou melhor, ao invés de uma casa, era uma mansão. A história podia ser sentida apenas com sua aparência.

Com um olhar para aquela cerca e propriedade, Hajime enfim chegou em frente à entrada. O portão da frente também era uma estrutura pesada e esplêndida. A madeira e o ferro estavam transmitindo os meses e anos que estavam se acumulando até hoje. Se uma pessoa comum visitasse esse lugar pela primeira vez, inconscientemente se endireitaria.

O nome da família escrito ao lado do portão da frente era: "Yaegashi".

Sim, este lugar era a casa de Shizuku, e ao lado da casa estava o dojo1 de longa data do estilo Yaegashi.

Por alguma razão, Hajime olhou para a placa de identificação onde o nome “Yaegashi” estava gravado enquanto pressionava o botão do interfone instalado ao lado do portão; a única peça que se aproximava da era moderna no local.

— Sim, quem poderia ser?

Uma voz feminina respondeu na mesma hora. Parecia jovem, com um tom agradável que soava calmo, uma voz que dava a sensação de maturidade. A dona daquela voz, se sua memória de quando ele a conheceu pela última vez estava correta, essa era a voz da mãe de Shizuku, Kirino. Foi ela quem atendeu Hajime.

— Eu recebi o convite. Aqui é Hajime Nagumo.

— Você chegou na hora, Hajime-san. Bem-vindo. O portão não está trancado, então, por favor, pode entrar.

— Com licença.

Hajime colocou a mão no portão. E então ele o abriu enquanto suspirava mais uma vez por causa "daquilo" que ele sentiu quando estava andando pelo caminho que dava para a cerca.

Logo depois disso, hyu!, um som de vento cortante surgiu!

— Como esperado, hum…

Ele levantou a mão na frente da testa. Entre as frestas de seus dedos havia várias esferas presas. Essas coisas voaram no instante em que o rapaz abriu o portão. Quando ele colocou um pouco de força em seus dedos, essas bolas se partiram com um som de estalo e, de dentro delas, pó colorido surgiu.

Quando ele aproximou o nariz, o aroma de várias especiarias como pimenta ou caiena2 perfurou sua cavidade nasal. Se as esferas atingissem a testa e seu conteúdo se dispersasse, então uma pessoa normal derramaria enormes lágrimas enquanto se contorcia em um ataque incontrolável de espirros.

— Quero fazer uma reclamação sobre que tipo de período é esse, mas... sério, esta casa. Além disso, se me disserem que isto é colher o que eu plantei, então... não há o que fazer.

Hajime atravessou o limiar da residência Yaegashi enquanto sorria com ironia.

Primeiro, a paisagem de um jardim consideravelmente amplo, que se estendia até a entrada do edifício principal, entrou em seus olhos. Não era algo como um jardim de estilo japonês onde se podia apreciar a vista, mas um jardim com ervas daninhas e cascalho espalhados por toda parte que parecia bem conservado. O caminho do portão da frente até a entrada do edifício principal era mostrado por pavimentação de pedra; havia também um pequeno lago afastado no meio. Em seguida, havia também lanternas de jardim penduradas de forma irregular e árvores relativamente grandes crescendo.

Havia outra casa independente de um andar a uma pequena distância, aquele lugar havia se tornado o dojo do estilo Yaegashi. Mas, neste feriado, deveria haver vozes zelosas de muitos discípulos praticando vindo dali, em vez disso, de forma estranha, não havia som.

Hajime, que queria suspirar depois de adivinhar a razão desse silêncio, avançou sobre o pavimento de pedra, aproximando-se de um local onde uma árvore próxima com folhas densas tinha um de seus galhos se estendendo até chegar acima do pavimento de pedra. Foi nesse momento que...

Uma intenção assassina de repente surgiu!!

Quando Hajime olhou para cima, havia a figura de um homem velho pulando do galho acima de sua cabeça, o hakama3 do velho tremulava enquanto suas mãos seguravam uma espada de madeira no alto! A atmosfera com que o velho estava revestido não era algo normal, uma determinação de vitória certa com um golpe residia em seus olhos! Aquela figura que desceu do céu, realizando um ataque poderoso, era como a técnica de um certo espadachim errante!

Mas, em direção a esse ataque repentino...

— Já faz muito tempo, Shuuzou-san.

Hajime, que parou com uma mão o ataque que parecia capaz de pulverizar pelo menos um pedregulho, abaixou a cabeça e o cumprimentou. O oponente diante de seus olhos, que parecia ter cerca de 80 anos com um rosto profundamente enrugado e cabelos brancos, era um instrutor do estilo Yaegashi e avô de Shizuku, então Hajime devia mostrar boas maneiras a ele.

— Sim, há quanto tempo, Hajime-kun. Que bom que você veio. Você pode ficar à vontade.

— Muitíssimo obrigado.

Shuuzou estava dando palavras de boas-vindas como se nada de especial tivesse acontecido enquanto parecia inexpressivo com as mãos empurrando a espada de madeira até o limite. Em resposta a isso, Hajime também retornou a saudação de forma familiar.

Hajime e Shuuzou se entreolharam sem dizer nada por um tempo, mas como esperado, o idoso silenciosamente puxou sua espada de madeira para trás como se nada tivesse acontecido e ele se virou.

— Eu acho que Shizuku está no quarto dela. Mas, é um pouco inaceitável para vocês dois que ainda são estudantes se isolarem no mesmo quarto. Também há deliciosos bolos de chá, então venha para a sala de estar.

— Aaaaa, sim, obrigado.

Shuuzou virou as costas para Hajime e voltou para o dojo enquanto conversava. Mas, no meio dessa conversa, em um momento estranho, uma nova intenção assassina atacou o Sinergista!

Hajime rapidamente se agachou e, sobre sua cabeça, um vendaval violento passou por ele. Além disso, a bainha de um hakama foi refletida no limite da visão de Hajime agachado. Um chute baixo apontando para a cabeça do rapaz se aproximava com rapidez.

Ao fugir disso, saltando para o lado, Hajime usou uma de suas mãos em uma postura de cabeça para baixo para rolar antes de pousar. À frente de seu olhar, havia a figura do atacante ainda em alerta.

— Eii, Hajime-kun. Que bom que você veio. Você pode ficar à vontade.

— … obrigado, Koichi-san. Perdoe-me pela intrusão.

Koichi Yaegashi. Ele era o pai de Shizuku e um instrutor do dojo Yaegashi. Ele era um homem bonito de meia-idade com um olhar bastante severo, devido ao corte na bochecha que ele recebeu de algum lugar e que era sua marca registrada. Enquanto recitava um discurso igual a seu pai Shuuzou, e também com o mesmo olhar inexpressivo já esperado, ele colocou a espada de madeira na cintura como se nada tivesse acontecido.

Naquele momento, uma espada de madeira foi lançada a grande velocidade do lado! Hajime, que rapidamente virou a cabeça e esquivou, ouviu uma língua estalando ecoando atrás da cesta de lanternas por perto.

Além disso, por trás do Sinergista, um som de "zapaa!" ressoou. No momento em que ouviu isso, ele soube que um dos alunos que parecia espreitar dentro da lagoa jogou inúmeras varas de ferro do tamanho de uma palma de uma pose que parecia um falcão selvagem!

Hajime evitou isso com um movimento de pés flutuando como um peixe nadando no ar, mas logo depois disso, ele notou alguma coisa e eu um mortal de costas daquela posição. Quando ele fez isso, no momento seguinte, um jovem aluno sujo de terra saltou debaixo do chão no jardim, segurando uma espada de madeira. O aluno estava sussurrando: — Chiih, então eu falhei em derrubá-lo. — com uma voz baixa.

Hajime, que pousou enquanto sorria para essas palavras, levantou a mão e agarrou algo que voava em sua direção. Uma flecha foi apanhada por aquela mão. Quando ele seguiu a trajetória, acima do telhado do edifício principal havia uma figura de alguém que parecia ser um aluno segurando um arco.

— Penso nisso o tempo todo, mas… o estilo Yaegashi não é de forma alguma um dojo de kenjutsu4, não é? Em vez disso, acho que este lugar é um dojo de ninjutsu5.

— O que você está dizendo, Hajime-kun? Algo como um shinobi não poderia existir. Você anda lendo muito mangá? É preocupante que alguém tentando se tornar parceiro de Shizuku esteja fazendo algo assim.

Hajime sussurrou sua conjectura enquanto olhava fixamente para os alunos que estavam retornando depressa ao dojo, enquanto também agiam como se nada tivesse acontecido. Ao ouvir isso, Shuuzou disse algo assim com um tom que parecia muito perplexo.

O aluno encharcado, que estava à espreita na lagoa, logo tirou o uniforme de dougi6 e, por baixo, havia roupas pretas, mas... seu rosto parecia dizer: — O que foi? — Sem dúvidas, mesmo que as barras de ferro jogadas contra ele parecessem shuriken que ele já havia visto no museu, ou mesmo que o aluno que desceu do telhado do prédio principal estivesse usando uma ferramenta especial onde a ponta da corda tinha algo em forma de um ancinho a ser fixado na borda do telhado, ou que um deles não estava criando nenhum som de passo enquanto corria, com certeza, tudo era apenas um mal-entendido de Hajime.

Mesmo que agora, diante dos olhos de Hajime, um aluno estivesse correndo rapidamente com uma postura inclinada para a frente com os braços esticados para trás, popularmente chamada de corrida ninja, passou por ele, sem dúvidas isso tudo era apenas o mal-entendido do rapaz!

— Hajime, bem-vindo!

Mas, naquele momento, uma voz animada chamou Hajime, que estava olhando para as costas das figuras do pessoal do dojo Yaegashi com uma expressão complicada. Quando ele se virou na direção da voz pôde ver a figura de Shizuku vestida com um lindo quimono acenando com a mão para ele da varanda do prédio principal.

O Sinergista levantou a mão com uma saudação enquanto se aproximava dela. A expressão da garota ficava mais brilhante quanto mais perto ele chegava. Olhando de perto, parecia que ela estava usando um cosmético, mesmo que fosse só um pouco. Parecia que ela estava se arrumando um pouco por Hajime ter sido convidado.

Shizuku, que era adorável como sempre nas pequenas coisas, logo apagou aquele sentimento sombrio que estava se acumulando devido aos eventos que aconteceram desde que o rapaz passou pelo portão da casa Yaegashi, algo que ele não podia contestar, mesmo quando queria fazer isso.

— Como esperado, Shizuku combina mais com roupas japonesas. Embora essa não pareça uma yukata pura…

— Si-sim. Recebi isso como uma amostra de um protótipo que Tio projetou. Parece que essa é uma combinação das roupas da raça dos dragões com roupas japonesas.

— Entendo, ela é uma pervertida, mas tem bom gosto. É como se tivesse sido feito sob encomenda para Shizuku. Além disso, a cor rosa também combina com você.

— … obrigada.

Shizuku parecia tímida enquanto tocava os lábios em silêncio. Ela não podia esconder sua felicidade de Hajime perceber e elogiá-la. A pessoa que estava lá não era a Shizuku cavalheira e galante habitual, mas uma garota normal apaixonada que podia ser encontrada em qualquer lugar.

Imediatamente, Hajime colocou a mão no bolso e invocou uma Minidonner que tinha um silenciador. Sem sequer mostrar um movimento de tiro, ele disparou rapidamente para o lado direito com o cano da arma escondido debaixo do braço! Na mesma hora, inúmeras faíscas e sons metálicos se espalharam no ar!

Shizuku voltou a si com um: — Hah! — Quando ela virou seu olhar, encontrou uma protuberância no chão tão pequena que ninguém notaria que estava ali sem prestar atenção, de lá várias pequenas coisas que pareciam canos de bambu apareceram...

Parecia que ainda havia vários alunos escondidos no subsolo. Provavelmente havia um túnel que podia ser usado por uma pessoa sob a superfície ao levantar a tampa que estava camuflada com o chão, e eles atiraram em Hajime usando zarabatanas7.

— Ei-ei, vocês! Vocês todos estão fazendo esse tipo de coisa de novo!? Saiam agora!

Shizuku levantou um grito de raiva com um rosto vermelho brilhante. Mas eles não responderam às palavras da garota, o chão estava fazendo movimentos irregulares e eles desapareceram em algum lugar.

Shizuku tremia toda. Hajime estava lhe enviando um olhar de simpatia enquanto tentava perguntar a ela sobre o assunto que o incomodava.

— Ei, Shizuku. Sua família, como eu imaginava, são descendentes de ninjas ou algo assim, não são? Essa é a verdade, não é?

— … não há forma de isso ser verdade, eu acho. Antes de sermos invocados, não havia nada disso. Só tem sido assim desde que Hajime veio à minha casa. Até eu não sabia que esse tipo de técnica existia no estilo Yaegashi. Na realidade, eu só aprendi a usar a katana, arte marcial e a arte de arremesso.

— Eu não acho que isso esteja no nível de "só". Ou, como devo dizer, você não perguntou a eles? Tipo: "Eu recebi treinamento de kunoichi enquanto eu mesma não percebia?".

— Eu já os questionei. Eu perguntei, o que é o estilo Yaegashi? Desse jeito.

— E a resposta?

— É um kenjutsu comum com um pouco de acrobacias. Foi o que me disseram.

— Então eles esconderam até mesmo de sua filha...

Shizuku estava sussurrando: — Esta minha família... — com um olhar distante, para o qual Hajime estava enviando-lhe um olhar cada vez mais simpático, enquanto sobre o mistério da família Yaegashi... não só eles não estavam escondendo isso de verdade, pois eles eram obviamente muito parecidos com ninjas, até essa tramoia era tão evasiva que o fez querer retrucar: — Vocês têm muita motivação para esconder isso, hein? —, o rapaz estava sorrindo sem graça.

Depois disso, Shizuku, que sabia sobre as agressões de seu avô e pai, pediu desculpas a Hajime com os olhos marejados enquanto se dirigia para seu quarto. No entanto, mesmo durante sua caminhada até o local, lanças foram desferidas contra o Sinergista a partir do espaço entre as paredes, um buraco apareceu de repente no chão do corredor, a parede virou de forma abrupta e um Koichi sem expressão foi para cima de Hajime com um kodachi8 nas mãos, e quando eles pensaram que ouviram alguém dizer: — Muh, minha mão escorregou. — do canto do corredor, uma foice presa em uma corrente voou fazendo de um pilar seu apoio para alterar sua trajetória usando a força centrífuga na direção de Hajime...

— Shizuku… apenas aceite. Sua casa é a residência de ninjas. Sua família é feita de ninjas.

— Eu, que não sabia até este ano que minha própria casa tinha esse tipo de engenhoca, estou... quer dizer, vovô! Uma kusarigama9] não é legal! Veja, ela ficou presa na parede! Isso é sem dúvidas uma arma real, não é!? Onde você estava guardando esse tipo de arma!?

Shizuku seguiu com raiva para o canto do corredor enquanto segurava a bainha de sua yukata, mas já não havia ninguém lá. A Espadachim desmoronou de quatro. Esta foi a primeira vez que ela viu o outro lado de sua família desde que voltou do outro mundo. Parecia que Shizuku estava sobrecarregada pelo destino de passar por dificuldades mesmo dentro de sua casa.

— Ei, Shizuku. Como esperado, devemos ir para a sala de estar em vez do seu quarto? Shuuzou-san também me disse isso. Pois não sei que tipo de engenhoca se ativará no momento em que entrarmos no seu quarto. Não será um problema para mim, mas sua preciosa coleção (bonecas de pelúcia) pode estar em perigo, você sabe.

— … uu. Não há nada como essas engenhocas estranhas no meu quarto, eu acho. Há, sem dúvida, algo na sala... ou melhor, eu já estou terrivelmente irritada com o fato de que Hajime foi atacado! Eu vou ficar com Hajime no meu quarto até a hora da refeiçãoooo! Se alguém se tornar um incômodo, eu com certeza não vou perdoá-los, vocês ouviram!

Sem dúvidas, Shizuku estava levantando a voz para sua família que devia estar espreitando atrás do teto e do outro lado da parede.

O casal enfim chegou ao quarto de Shizuku. Lá dentro, havia muitas bonecas de pelúcia colocadas ao redor, o que tornava o quarto apertado. Havia um adorável calendário de animais e gatos, cortinas rosas, uma almofada presa com fofas orelhas de coelho, toda a sala estava envolta em uma atmosfera suave com uma fragrância levemente doce. Era um quarto muito feminino.

Shizuku colocou a almofada de sentar de um guaxinim em frente a uma pequena mesa redonda feita de vidro. Quando Hajime sentou-se na almofada, ela fez um som de pukyu! A figura do rei demônio de outro mundo sentado em uma almofada de mascote que fazia esse tipo de som, se fosse vista pelos colegas de classe e pelos companheiros do outro mundo (em especial um certo imperador) sem dúvidas seria uma conclusão precipitada para eles explodirem em gargalhadas.

— Espere aí. Vou preparar chá e petiscos.

— Não, você não precisa fazer isso. Pelo contrário, eu não quero ficar sozinho nesta casa...

— Uu. Vai-vai ficar tudo bem. Porque meu quarto é uma zona segura.

Mesmo vacilando em suas palavras, Shizuku garantiu que: — Meu quarto está seguro! —, logo depois disso, no entanto...

— Hajime-san, bem-vindo. Esta é uma geleia de feijão doce de uma loja bastante antiga. Por favor, experimente um pouco.

A mãe de Shizuku, Kirino, apareceu carregando chá e lanches.

... do teto, ela pulou.

— Mãe!? De onde foi que você veio? Espere, a placa do teto está fora do lugar!? De jeito nenhum… mesmo que tenha investigado de forma apropriada meu quarto quando soube que a casa era uma residência com engenhocas…

Kirino estava sorrindo de forma amigável como se nada tivesse acontecido com um olhar de soslaio para a filha, que ficou pasma enquanto olhava para o teto. Aquela figura que era gentil e calma como uma Yamato Nadeshiko10, mas com uma atmosfera onde a retidão podia ser sentida, fez com que Hajime compreendesse algo; que ela era de fato a mãe de Shizuku. Ela era uma mulher que o fazia pensar ou até o fez antecipar que, quando Shizuku envelhecesse lindamente, sem dúvidas ela se tornaria uma mulher como a que estava diante de seus olhos.

No entanto, o fato de ela ter pulado do teto enquanto usava um quimono, com uma bandeja na mão com chá e lanches, não apenas suas roupas não estavam desarrumadas, mas nem mesmo uma gota de chá foi derramada, ela não era alguém normal.

— Ei-ei, mãe. Deixe-me perguntar isso, deixando de lado o assunto referente ao teto do meu quarto para mais tarde, é o que eu imaginava, não é, a mãe é uma kunoichi? Ei, isso é verdade?

Desde que voltou para casa até este dia, diferente de seu pai e avô, sua mãe não mostrou nenhum sinal desse tipo. Shizuku estava perguntando à mãe com um sentimento realmente complicado que era metade: "Diga que isso não é verdade, mamãe", e metade: "Mãe, então você também".

Para Shizuku, Kirino respondeu:

— Oras, Shizuku. Você está animada demais porque Hajime-san está aqui. Perdoe-a, Hajime-san. Nossa, esta garota, com certeza ela está tentando o seu melhor para fazer uma piada que está de acordo com o hobby de Hajime-san, mas… por natureza, ela é uma pessoa séria, então suas piadas não são muito engraçadas, não é verdade? Uma piada como "Você é uma kunoichi?" para sua mãe, entende? Ela é uma criança assim, mas por favor, não a abandone, não importa o que aconteça.

— … por favor, não se preocupe. Não acho que seja algo sem graça, nem um pouquinho. Em vez disso, sinto muita simpatia por ela. Você está bem, Shizuku?

— Eu não posso mais fazer isso, Hajime. Eu quero me tornar filha da família de Hajime agora mesmo…

Hajime fez o possível para consolar Shizuku, que estava abaixando a cabeça com uma expressão que era como um velho cansado. Vendo aquela figura harmoniosa (?) da filha com Hajime, Kirino disse: — Minha nossa, Shizuku, agindo assim na frente dos seus pais. Sim, sim, a mamãe sairá agora mesmo. — e deixou o quarto.

Claro, ela pulou para o teto.

Vendo a placa do teto que voltou ao normal sem emitir som, Shizuku então olhou para o Sinergista com uma expressão que indicava que ela poderia chorar a qualquer momento.

— Bem-bem, sabe... desta forma, Shizuku também aprendeu o segredo de sua família aos poucos, não aprendeu? Não sei se é porque você voltou de outro mundo ou porque conseguiu um namorado como eu, mas... bom para você.

— Neste mundo, eu me pergunto se existe uma questão que é melhor não ser conhecida. Eu sinto que o que eles estão fazendo está aos poucos aumentando...

Shizuku foi consolada ao ter a cabeça acariciada por Hajime.

O rapaz pensou enquanto olhava para a Espadachim nesse estado. Normalmente, seria difícil imaginar que ela não saberia sobre sua família e as engenhocas da casa até entrar no ensino médio. Mas, de nenhuma maneira Shizuku estava mentindo, nesse caso, isso significava que Shuuzou e os outros estavam escondendo as coisas da garota.

Além disso, antes da invocação, em outras palavras, mesmo quando ela se tornou uma estudante do ensino médio, esse assunto não havia sido contado a ela. Isso poderia significar que Shizuku não saberia de nada disso por toda a vida; essa possibilidade não poderia ser descartada.

Então, por que uma questão sobre a própria família foi escondida da única filha e neta?

No grande labirinto de outro mundo, os verdadeiros sentimentos de Shizuku foram expostos. Depois disso, Hajime ficou ciente das coisas que a Espadachim estava abrigando pela história que ele ouviu da própria Shizuku. Sobre o quão feliz seu avô ficou quando Shizuku mostrou o talento para o kenjutsu. Sobre o quanto as pessoas ao seu redor estavam colocando suas expectativas nela.

E também sobre como, como resultado, o quanto dos verdadeiros sentimentos da garota foram suprimidos por causa deles.

Hajime lembrou as palavras que lhe foram ditas na primeira vez que Hajime enfrentou Shuuzou e Koichi.

"Entendo, Shizuku, já está bem."

"Muito obrigado, por deixar Shizuku ser uma garota."

Parecia que, em vez do retorno de outro mundo, os dois estavam sentindo gratidão do fundo do coração pelo fato de Shizuku se apaixonar e descobrir sobre seus próprios sentimentos, por seu crescimento. O alívio também exalava deles.

Hajime não perguntou muito naquele momento, mas conseguiu adivinhar.

Por um acaso, Shuuzou e os outros podiam estar se arrependendo de terem feito Shizuku estudar o estilo Yaegashi. Era impossível dizer ao avô para não ficar feliz quando a neta tinha muito talento para o estilo da família, e um pai tendo expectativas para os filhos também era algo natural.

Foi por isso que eles se envolveram demais contra seu melhor julgamento, e assim, quando perceberam, Shizuku já não podia sequer reclamar com sua família, criando uma garota que matou tantas partes de si mesma.

Vendo ela assim, sem dúvidas Shuuzou e os outros não lhe ensinaram nada além de kenjutsu, para que ela não matasse mais uma parte de si mesma. Eles ocultaram por completo o segredo da família.

Este era apenas um palpite, mas Hajime estava convencido de que era a verdade.

Hajime falou com um tom suave enquanto acariciava a cabeça de Shizuku.

— Talvez eles sejam uma família problemática, mas... você é um tesouro para eles, certo?

— … não vou negar isso.

Parecia que Shizuku também adivinhou isso de alguma maneira. Embora ela não pudesse evitar, sem querer, seu olhar pareceu azedar, porque isso foi ocultado dela, e quão perturbador era o absurdo desse segredo.

— Muito bem, vamos deixar de lado por enquanto como uma de minhas esposas se tornou uma kunoichi...

— Eu não me tornei uma kunoichi, e não deixe isso de lado!

O olhar de Shizuku ficou cada vez mais azedo com as palavras de Hajime, mas quando ela notou a presença de muitas pessoas que estavam se espalhando pouco a pouco nos arredores, suas bochechas se apertaram.

— Bem, também acho que Shizuku está aprendendo sobre sua família, porém... mais da metade disso é um teste para mim, eu acho. Isso deve ser algo como vingança para um homem criando um harém que ousou colocar as mãos na importante filha da família. Até Kirino-san foi impiedosa, mesmo que seu rosto estivesse sorrindo daquela forma.

— Mãe? Até onde eu sei, a mãe não fez nada com o Hajime…

— Não, ela está agindo agora mesmo, sabia? Este chá e geleia de feijão doce, algo foi colocado dentro. Veneno não funciona em mim, mas pela sensação, é algo como uma droga paralisante, eu acho. Talvez eles pretendam atacar enquanto eu não posso me mover.

— MÃÃÃÃÃÃEEEEEEEEEE!!! O QUE VOCÊ ESTÁ DANDO AO AMADO DE SUA FILHA!!! PAREM DE FAZER ISSO; EU VOU ACABAR COM TODOS VOCÊS!

Dentro da residência Yaegashi durante o meio-dia, o grito de raiva de uma Shizuku enfurecida reverberou. Ela pulou para fora da sala com uma katana preta na mão.

Hajime, que foi deixado sozinho no quarto, provou o último pedaço da geleia de feijão doce antes de sussurrar:

— Bem, comparado ao pai de Kaori, essa abordagem de força bruta me poupa de problemas.

Do jardim, sons de: — Vovô e pai e mãe, ajoelham-se ali, em seiza11! —, o som de algo sendo destruído surgiu, ou: — A senhorita, ela está ficando louca! Enviem reforços! —, ou: — Muu, Shizuku, sua habilidade melhorou! —, ou: — Não pensem que a Shizuku atual pode ser parada por meios comuns! Façam a formação! Preparem a formação das Mil Execuções dos Quatro Cardeais! —, ou: — Vamos separar a senhorita daquele pirralho, com certeza! Esquadrão Tigre Branco, matem aquele cara agora! —; sons como esses podiam ser ouvidos vindos de vários pontos.

Hajime estava sentindo as múltiplas presenças que estavam se aproximando dele enquanto falava: — Seja a Terra ou o outro mundo, realmente não há muita mudança, hein... — com uma expressão vazia.

Depois disso, se Shizuku enfim conheceu todos os segredos de sua família e se Hajime foi reconhecido pela família dela ou não...

Por enquanto, digamos que os alunos do estilo Yaegashi (escola oculta) se deram muito bem com a garota com orelhas de coelho de outro mundo.


Notas

[1] Dojo, ou Dojô, é o local onde se treinam artes marciais japonesas. Muito mais do que uma simples área, o dojo é respeitado como se fosse a casa dos praticantes. Por isso, é comum ver o praticante fazendo uma reverência antes de adentrar, tal como se faz nos lares japoneses.

[2] Pimenta-caiena, pimenta-de-caiena ou pimenta-de-cayenne é uma variedade de Capsicum annuum. Deve o seu nome à cidade de Caiena (Cayenne) na Guiana francesa. Sua origem veio das Américas, levado para a Europa através das expedições. O fruto da pimenta-caiena seco e moído é usado como condimento picante. É muito utilizado na culinária de diversos países, como Índia, Estados Unidos e México. Estudos científicos comprovam que este condimento é um analgésico natural, tendo eficácia comprovada na redução da dor.

[3] Hakama é um tipo de vestimenta tradicional japonesa. Cobre a parte inferior do corpo e se assemelha a uma calça larga. Existem dois tipos de Hakama: inteiriço, como uma saia, utilizado sobre Quimono longo e especialmente em cerimônias formais; dividido, como calças, o umanori. Originalmente eram usados por samurais para proteger as pernas enquanto andavam a cavalo. A pé, o Hakama esconde as pernas, tornando mais difícil prever a movimentação, dando assim vantagem em combate. Hoje em dia, Hakamas são usados apenas em situações extremamente formais, como a cerimônia do chá, casamentos e funerais; também por atendentes de templos xintoístas e por praticantes de certas artes marciais japonesas, como Aikido, Iaido, Kenjutsu, Kendo, Dō-jutsu, Kyudo.

[4] Kenjutsu, em tradução literal: "Técnica da Espada", é a arte marcial japonesa clássica do combate com espadas. Pode também ser chamada de heihō/hyōhō, entre outras denominações possíveis. Sendo constantemente confundida com Kendo, apesar de grandes diferenças. O treinamento de kenjutsu varia de acordo com o estilo em questão. Na maior parte dos estilos o treinamento se baseia em katas (formas pré-arranjadas). Em alguns estilos, a prática dos katas é complementada por treino de luta utilizando equipamentos de proteção. No treinamento de katas, normalmente, é utilizada uma espada de madeira semelhante a uma katana, chamada bokken ou bokuto. Cada estilo de kenjutsu costuma impor medidas específicas de comprimento, largura e curvatura para o seu bokuto.

[5] O Ninjutsu, também conhecido pelo termo Ninpō, é uma arte marcial japonesa que surgiu a partir da necessidade do emprego de espiões (Ninja) durante o período medieval japonês (século VI). Consistia num conjunto de técnicas que capacitavam os agentes a agir em todas as situações num campo de batalha. O Ninjutsu remonta há mais de 900 anos, em um contexto histórico em que os Samurais, classe de guerreiros, dominavam o Japão. Eles controlavam a terra e seus moradores, numa espécie de feudalismo oriental. O lorde (chefe de um grupo de samurais) era o Daimyō, a única pessoa a quem os samurais deviam respeito e obediência. O Ninjutsu nasceu no Japão feudal, quando monges Tibetanos se espalharam por vários países na Ásia, um deles a China, onde os sacerdotes, no fim da dinastia Ming início da dinastia Chin (Manchu, por conta da invasão Manchu) dedicaram-se ao terrorismo, espionagem e resistência contra os Manchú para recuperarem suas terras. Durante a dinastia Chin os templos foram destruídos e os monges se refugiaram em outros países, um deles o Japão, onde a Arte Marcial que praticavam deu origem a várias outras artes, sendo uma delas o Ninjutsu. Monges residentes nas montanhas das regiões de Iga e Koga tiveram contatos com Ronins que lá constituíram família. Os que hoje conhecemos como Ninjas, seguiam um código de conduta diferente dos Samurais, o Ninpo Ikkan. Com o passar dos anos os ninjas passaram a trabalhar como mercenários e posteriormente o governo japonês passou a usa-los como espiões e assim foi até a 2ª Guerra Mundial.

[6] Keikogi é uma palavra japonesa que significa "uniforme de treinamento". A palavra é mais específica, sendo recomendável seu uso para uniforme de prática de artes marciais, no lugar de kimono que pode se referir a qualquer vestimenta tradicional japonesa. Frequentemente a palavra "Keikogi" é abreviada por "gi", essa substituição é imprecisa, porque "gi" significa meramente "algo que se veste". Uma substituição preferível seria dōgi, que significa "o uniforme usado no caminho que você escolheu". Ainda mais especificamente, se for colocado o nome da arte marcial no lugar de "do", obtém-se o nome da vestimenta específica usada em cada arte marcial, com detalhes específicos (aikidogi, judogi, karategi).

[7] A zarabatana (originária da palavra árabe zarabatan) é uma arma que consiste num tubo originalmente de madeira (caule oco), e hoje de metal ou plástico, pelo qual são soprados pequenos dardos, setas ou projéteis. A zarabatana é uma arma, não um brinquedo, podendo infligir danos graves. Existem restrições a sua venda no Reino Unido, no Canadá e em alguns estados americanos.

[8] Kodachi é uma espada intermediária entre a Wakizashi e a Katana. É usada principalmente para a defesa pois seu tamanho reduzido (59 cm) duplica sua velocidade em relação a espadas maiores, embora não proporcione um bom ataque. A Kodachi tem a dobra da lâmina levemente maior que a Wakizashi e um pouco mais leve e tem seu tamanho mais aproximado com a Wakizashi do que com a Katana.

[9] Kusarigama é uma arma tradicional japonesa que consiste de uma kama (o equivalente japonês a uma foice) com uma longa corrente presa ao cabo e um peso de metal na outra extremidade da corrente (normalmente um kusari-fundo). Embora o kusarigama seja derivado de uma foice de agricultor, e embora a foice fosse frequentemente usada como arma pelos agricultores durante a era feudal do Japão, é importante notar que esses agricultores não usavam a kusarigama. O seu objetivo como uma arma era muito evidente, tão diferente de uma foice, que não poderia ser portada abertamente. A arte de manusear a Kusarigama é chamada de kusarigamajutsu.

[10] Yamato Nadeshiko é como os japoneses se referem a uma mulher com atributos que são considerados tradicionalmente desejáveis na perspectiva dos homens da sociedade; geralmente atribuído a pessoas com educação tradicional. É um assunto vasto, mas com uma complicada estética japonesa.

[11] Seiza é um estilo formal para sentar-se em um tatame que envolve ajoelhar-se, manter as costas retas e apoiar as nádegas nos calcanhares.



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