Volume 1 – Arco 1

Capítulo 23: Olhar Ferido - Parte 2

Icegren estava em pé atrás de sua mesa escolar, o olhar fixo em Evelyn, que a encarava com a mesma intensidade.  Todos na sala estavam atentos, e a professora observava. Sem perder tempo, Icegren, com um sorriso sarcástico, começou a falar, sua voz cheia de confiança e sarcasmo.

— Não caiam nessa. Eu fui a diretora da turma no primeiro ano. E fui uma das melhores. Lancei vários projetos, fiz melhorias que todos aqui viram com seus próprios olhos.

Evelyn apertou os punhos.

— E? Isso não te faz a melhor que ninguém.

Icegren sorriu de canto, mas era um sorriso afiado, sem nenhum traço de humor.

— Mas significa que eu já provei o meu valor. Você, por outro lado... perdeu pra mim, três vezes no treinamento.

O rosto de Evelyn ficou pálido. Ela cerrou os dentes, e suas mãos tremeram ao lado do corpo.

Alguns alunos na sala reagiram com olhares surpresos, enquanto outros soltaram risadinhas abafadas. O duelo entre Evelyn e Icegren havia sido um evento memorável no primeiro ano, e todos sabiam que Icegren havia vencido com facilidade.

Evelyn deu um passo à frente, pronta para rebater, mas antes que pudesse falar, Lira a interrompeu com um comando firme. deixando claro que não havia mais espaço para discussões. A sala ficou em silêncio.

Lira, interrompendo a tensão e, com firmeza, começou a falar:

— A sala de aula não é uma câmara de debate político acadêmico! — seu olhar severo percorreu Evelyn e Icegren. — Se querem disputar esse cargo, façam isso no momento e no local adequados. Agora, voltem a se sentar e foquem na aula, ou vão direto para a diretoria.

O silêncio voltou a dominar o ambiente. Evelyn respirou fundo e, ainda contrariada, voltou para seu lugar. Mas enquanto caminhava, murmurou para os colegas ao redor:

— Conto com os votos de vocês!

Icegren, ainda com a expressão fechada, sentou-se novamente, mas sem tirar os olhos de Evelyn.

O clima na sala estava tenso, mas Lira ignorou, voltando ao conteúdo da aula como se nada tivesse acontecido. Mas algo estava claro: a disputa entre Evelyn e Icegren estava longe de acabar.


A tarde avançou, e a noite no dormitório estava calma. As luzes suaves dos corredores iluminavam as portas dos quartos, imersa em um silêncio quase absoluto. O jantar já havia terminado, e os alunos se preparavam para dormir, enquanto outros ainda terminavam as tarefas do dia. O cheiro de comida recém-servida misturava-se com o aroma suave dos livros, uma combinação familiar que sinalizava o fim de mais um dia.

Tiruli, porém, não compartilhava dessa calma. No canto do dormitório, ele dobrava meticulosamente as roupas dos companheiros de quarto, uma tarefa que já se tornou rotina. Separava os uniformes, colocando-as cuidadosamente nos cestos de roupas sujas.

Ele abriu a porta devagar, saindo com o cesto e fechando-a atrás de si com cuidado. O corredor estava vazio, exceto por alguns alunos apressados indo para suas camas ou saindo dos banheiros. Tiruli caminhou silenciosamente, os pés leves no chão frio de cerâmica polida.

Ele gostava de ir até a lavanderia àquela hora. Era um local afastado, ideal para desconectar-se. Lá, ele poderia ficar sozinho, com seus pensamentos e a música. Ao entrar, o som das portas de ferro batendo nas paredes ecoou, mas logo se acalmou. A sala fria, mas reconfortante, parecia intocada.

Tiruli colocou o cesto no chão e começou a separar as roupas. Colocando os fones de ouvido, a batida suave da música preencheu seus ouvidos, e ele fechou os olhos, deixando-se levar. O som das roupas na máquina misturava-se com a música, enquanto ele se movia com fluidez, lavando e colocando as roupas nas máquinas com um cuidado delicado. 

Era simples, mas o suficiente. Enquanto esfregava a sujeira dos tecidos, sua mente vagava. Pensava sobre a vida, sobre as dificuldades, mas também sentia uma liberdade naquele espaço. Sem as expectativas de professores ou colegas, era apenas ele, a música e a lavanderia vazia.


Makkolb e Quinn estavam deitados, mas alertas. Seus olhos não estavam fechados, e o silêncio do ambiente era quebrado apenas pelos leves sons dos cobertores sendo mexidos. Quinn, comentou baixinho que Tiruli provavelmente iria para a lavanderia. Makkolb concordou em segui-lo. Sem fazer barulho, os dois se levantaram, cuidadosamente e saíram de suas camas. Furtivamente, deixaram o quarto.


Minutos depois. A tranquilidade foi brutalmente interrompida quando a porta da lavanderia se abriu. Tiruli ouviu os passos pesados antes mesmo de ver quem estava ali. Seu coração disparou, e ele tirou os fones rapidamente, olhando pela primeira vez com nervosismo para Makkolb e Quinn, que estavam parados na entrada, observando-o com olhos que pareciam perfurar sua alma. A tensão no ar era palpável, e Tiruli sentiu a pressão aumentar instantaneamente. Ele tentou disfarçar a ansiedade, mas seu corpo estava tenso, pronto para fugir, mas sem rumo.

— Tiruli — a voz de Makkolb cortou o ar como uma lâmina, o tom impessoal, quase como uma ordem. Não era uma saudação; era uma acusação velada.

Quinn estava ao seu lado, em completo silêncio, observando Tiruli com uma calma fria que mais parecia uma ameaça iminente. Seus olhos estreitos estavam fixos nele, como um predador observando sua presa antes do golpe final. Tiruli engoliu em seco, sentindo uma onda de pânico tomar conta de seu peito. Ele não precisava perguntar o motivo de estarem ali. Ele sabia.

Makkolb avançou um passo, a expressão no rosto uma mistura de frustração e desdém, enquanto Quinn se mantinha quieto, mas sua presença só fazia a situação mais assustadora. Makkolb, com um sorriso irônico, começou a falar enquanto Quinn contornava o local.

— Por que estava andando com o Bambi verde e a Naala na biblioteca? E por que mentiu dizendo que estava namorando a Naala? — perguntou, a voz baixa e cruel.

Tiruli sentiu seu estômago revirar, e um calafrio percorreu sua espinha. O olhar penetrante de Makkolb o fez sentir como se estivesse sendo examinado, decifrado. Ele estava sendo confrontado, e não havia como escapar. A mentira que ele havia contado agora parecia insignificante, como uma desculpa frágil que logo se desintegraria diante da pressão deles.

— Eu estava ajudando a Naala — Tiruli tentou justificar, mas sua voz soou forçada. — Ela... ela é muito inteligente, e Glomme estava ajudando ela também. Não é nada demais. Só isso.

Mas as palavras saíram como uma tentativa fraca de enganar, e Makkolb não parecia impressionado. Ele se aproximou ainda mais, seus olhos agora cheios de uma fúria controlada, como se estivesse pronto para explodir a qualquer momento.

— Não me faça de idiota, Tiruli — Makkolb rosnou. — Eu sei o que você fez. Todo mundo sabe que você estava andando com um Bambi na biblioteca. Falaram pra mim, dá pra ver a mentira na sua cara.

Tiruli sentiu o sangue gelar. Ele sabia que as fofocas da escola corriam rápido, mas não imaginava que isso chegaria até eles, até essa intimidade imunda, onde cada movimento era observado, e qualquer erro era usado contra ele. Ele sabia que estava preso. O que começava como um simples erro agora se tornava um fardo insuportável, e a única coisa que ele queria fazer era desaparecer, se esconder debaixo de algo — de qualquer coisa. Mas não havia mais escapatória.

Atrás de Tiruli. A voz de Quinn, finalmente, cortou o silêncio. Tiruli virou-se, seus olhos fixados aos de Quinn

— O que você está escondendo, Tiruli? — disse Quinn, o desprezo evidente em sua voz. — Quebrou a nossa confiança, nossa lealdade. Traiu a nossa amizade.

Tiruli se sentiu afogado naquele olhar de Quinn, aquele olhar frio. Ele tentava desesperadamente encontrar alguma forma de escapar daquela pressão. Seu corpo estava tenso, suas mãos suando, seu coração batendo forte. Mas não havia mais como fugir.

— Não é o que vocês estão pensando — Tiruli disse, sua voz confiante, mas fraca. Ele sentia que estava perdendo a batalha. — Eu só estava tentando ajudar, nada mais. Não tem nada de errado nisso.

Quinn se aproximou lentamente, o silêncio em torno deles se tornando opressor. Ele estava agora tão perto de Tiruli que sua presença era esmagadora, como uma sombra se arrastando sobre ele. 

— Eu não trai ninguém, Quinn... — Tiruli murmurou, sua voz soou esgotada, sem poder. — Não foi isso, eu... não quis fazer nada errado!

Mas, antes que ele pudesse se explicar mais, Quinn se moveu rapidamente. Em um movimento brusco, ele agarrou o cabelo de Tiruli, forçando-o a olhar diretamente para ele. A dor foi instantânea, e Tiruli estremeceu com o toque inesperado e frio. Seus olhos se arregalaram e ele ficou sem palavras, atônito com a agressividade de Quinn. A coragem de tocar em um membro do grupo o deixou ainda mais surpreso. Nunca imaginara que alguém pudesse ser tão audacioso e desafiador, quebrando todos os limites de respeito e lealdade. 

Quinn, com a calma de um predador, olhou para Tiruli e disse, com um tom tão frio quanto o gelo:

— Você andou com aqueles bambis, e isso é a pior das traições. Eu te dei tudo, e você se aliou àquele viado verde, aquele gay.

Tiruli engoliu em seco, sem conseguir encontrar palavras que pudessem justificar ou defender sua ação. Sua mente estava em pânico, e ele sentiu seu corpo se encolher sob o toque de Quinn. O cheiro de Quinn, tão intimidador, invadiu suas narinas enquanto ele tentava se soltar, mas sem sucesso.

Com uma expressão debochada, Quinn finalmente soltou Tiruli, que se sentiu aliviado por um instante. Mas, sem dar tempo para o garoto respirar, Quinn rapidamente puxou sua bermuda para baixo, com um sorriso torto, tirou a própria cueca, lançando-a com força no rosto de Tiruli. Tiruli virou o rosto enquanto a cueca caia no chão. O olhar de Tiruli se arregalou, mas ele não teve tempo para reagir, o choque ainda dominando sua mente.

Com um sorriso de superioridade, Quinn mandou Tiruli pegar a cueca do chão, com uma expressão cruel estampada no rosto.

— Cheire — a palavra saiu de sua boca como um comando, não um pedido. Um desafio.

Tiruli sentiu um nó na garganta. Seu corpo estava tenso, os músculos doloridos pela raiva e vergonha, mas o pavor o fazia hesitar. 

Quinn se aproximou de Tiruli com um sorriso torto, sua voz cheia de desprezo. Ele apontou para o chão, onde a cueca estava jogada.

—  Pega, Tiruli. Vai lá, pega a cueca do chão.

Sua voz soou como um comando, implacável e cheia de desprezo. Tiruli, hesitou por um momento, mas se abaixou lentamente, os joelhos tocando o chão com um som abafado. Ele pegou a cueca e, em uma mistura de nojo e medo, levou-a até o nariz, sentindo a umidade e o cheiro forte que emanava.

Quinn fez com que Tiruli cheirasse a cueca dele mais de seis vezes. A cada vez que a cueca se aproximava de seu rosto, Tiruli sentia o desgosto, a repulsa, mas não conseguia escapar. O cheiro invasivo, o toque de Quinn, as palavras ameaçadoras... tudo isso o estava esmagando.

Quinn, com um sorriso cada vez mais perverso, disse:

— Diga, Tiruli. Você gosta do meu cheiro, não é? Admita.

Tiruli fechou os olhos com força, a raiva queimando sua pele. Ele não sabia mais o que fazer, a humilhação era insuportável. Seus olhos estavam fixos em Quinn, a raiva crescendo, enquanto seus pensamentos pertubavam sua mente.

Ele soltou a cueca. Com movimentos fluidos e ágeis de suas mãos, ele tentou usar seus poderes de geocinese para se defender, seus dedos se ergueram, e as rochas brotaram do solo, mas Quinn reagiu rapidamente. Makkolb abriu uma das torneira, e, com movimentos ágeis, Quinn e Makkolb deslocaram a água em direção a Tiruli, moldando uma bolha de água ao redor do rosto de Tiruli. O ar desapareceu instantaneamente, a pressão aumentando rapidamente, sufocando-o, e Tiruli se debatia, tentando respirar, A falta de ar fez sua visão turvar, e seus gritos se perderam na água, abafados pela pressão crescente.

Ele estava se afogando em silêncio, preso, incapaz de reagir. O som da máquina de lavar parecia distante, quase inaudível. Makkolb e Quinn observavam com calma, impassíveis, como se apenas cumprissem uma tarefa. Suas mãos erguidas mantendo a bolha na cabeça de Tiruli. Quando acharam que era suficiente, a bolha se desfez. Tiruli caiu no chão, tossindo e tentando recuperar o fôlego, a humilhação ainda forte em seu peito.

— Você vai aprender a lição, Tiruli — Quinn murmurou, as palavras um sussurro de morte. 

Os dois se afastaram lentamente, saindo da lavanderia sem pressa, deixando Tiruli ali, sozinho, caído no chão. A água ainda escorria do seu corpo, formando pequenas poças no piso frio. Ele ficou ali, de joelhos, tentando processar o que acabou de acontecer.

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