Volume 1
Capítulo 10: Visão da Alma
O homem-cão, assustado, foi em direção a Novah para saber se ela estava bem, mas foi inesperadamente abraçado por ela, ficando assim, totalmente paralisado e sem reação.
– ...Hãããã...Tá...Tá tudo bem senhorita Novah? – perguntou o homem-cão.
Paragor, por estar contra a luz da vela, não consegue ver o que realmente estava acontecendo, e então, muito preocupado, ele vai em direção a ela perguntando com voz transtornada.
– O QUE RAIOS HOUVE MENINA!? FALA LOGO!
Novah então, ainda abraçada com o homem-cão, abriu lentamente seus olhos e viu, bem de perto, os olhos do homem-cão. Neste momento, de alguma forma, ela sentiu que podia ver o fundo da alma do homem-cão, e essa visão fez com que seu coração se aquecece com uma luz calma e aconchegante de pura felicidade, seu estômago lhe trazia sensações que só poderiam ser descritas como se milhares de borboletas estivessem voando dentro do mesmo. Nunca ela havia sentido algo tão intenso. Tudo que ela queria naquele momento era passar a vida toda perdida dentro daqueles olhos. E ela sabia que nunca mais iria esquecer desse momento. Mas então, o homem-cão, confuso e extremamente sem graça, fala ela.
– Vo... vo... você... está... está bem?
Mas Novah ainda estava perdida em seus sentimentos, e não respondeu ao homem-cão. No entanto, o homem-cão olha mais atento a ela e fica confuso.
– Ué!?... O senhor não falou que arrancaram os olhos dela!?
– O QUE!? – pergontou Paragor – PORQUE VOCÊ ESTÁ ME PERGUNTANDO ISSO RAPAZ?! O QUE HOUVE COM OS OLHOS DELA!?
Então, Paragor vira Novah para sua direção, a tirando dos braços do homem-cão e de seu transe causado pela explosão de sentimentos que ela estava sentindo. E assim Paragor vê chocado os olhos de Novah.
Eram duas safiras azuis cintilantes, de pureza indescritível, que ao mesmo tempo em que aparentavam estar petrificadas em seus ângulos retos típicos de um cristal, também demonstravam estar vivas e pulsantes como qualquer outra parte do corpo que observar.
– … Você… você está… vendo?... – perguntou Paragor, em um misto de felicidade e perplexidade.
Novah, voltando ao mundo real, houve a pergunta de Paragor e olha para os objetos ao seu redor, como se estivesse dando sua última conferida antes de ter certeza que tudo aquilo era real.
– ...Acho… Acho que sim... – respondeu Novah.
Assim, Paragor abre um sorriso tão grande que mau cabe em seu rosto, solta suas muletas e começa a saltar em sua única perna enquanto grita.
– AAAAAHAAAA HAA HAAAAAA! EEEUUU NAO ACREDITOOOO! DEU CEEERTOOOO! AAAAHAA HAAAA!
O homem-cão, se sentindo envolvido o suficiente para ter empatia por aquelas pessoas, acaba se contagiando pela felicidade de Paragor e também começa a sorrir de felicidade com esse aparente milagre que acabará de ocorrer. E Novah, apesar de não demonstrar, fica extremamente feliz com a sua cura inesperada, além de também ficar feliz com a alegria que isso trouxe a Paragor, sua única figura paterna.
Mas foi no sorriso de felicidade do homem-cão, que ela ficou ansiosa e sem jeito, já que, estava se lembrando do que sentiu quando olhou nos olhos do seu novo bem feitor.
Dessa forma, ainda sem saber o que realmente estava acontecendo com seus sentimentos, Novah toma coragem e olha novamente para dentro dos olhos do homem-cão, e mais uma vez aquele sentimento começou a surgir de dentro do fundo de seu coração, a assustando, o que forçou os seus olhos a se desviarem rapidamente da direção do homem-cão.
Contudo, Paragor, apesar de estar distraido com toda aquela felicidade, ainda era bem observador e logo pergunta para Novah.
– O que foi menina!?... Você está com algum problema nesse olho novo?
Novah só balança a cabeça indicando um "não", mas para a percepção de Paragor ela estava claramente evitando olhar para o homem-cão. Então Paragor fez um pedido.
– Rapaz!!
– Hã!? Oi senhor!? – respondeu o homem-cão.
– Muito obrigado pelo que você fez aqui hoje, ouviu!? Agora eu tenho certeza que eu estava certo sobre você garoto.
O homem-cão, sem esperar por esse agradecimento tão sincero, fica sem palavras e apenas sorri coçando a cabeça por estar sem jeito.
– Mas agora garoto… eu preciso de um momento a sós com minha protegida… Você pode dormir na cama perto da porta do outro cômodo ao lado. Até porque, amanhã vai ser um longo dia garoto.
– Hã!? Há tá! Sim senhor! vou deixar vocês tranquilos, tá bom?! boa noite!
Então o homem-cão foi dormir no local indicado à ele, deixandoos a sós. O que se tornou a oportunidade desejada por Paragor, que logo perguntou a Novah.
– … Menina!... Me diga!... O que está te incomodando no garoto-cão?
Novah fica corada e sem jeito devido a pergunta de Paragor, afinal, ela não imaginava que ele havia percebido a tentativa dela de evitar encarar o homem-cão nos olhos. O que a faz pensar que ele também possa ter percebido o seus novos sentimentos pelo homem-cão, dobrando então sua vergonha. Com tudo isso em mente, ela responde de forma atropelada e rápida.
– O QUE!? NADA! Quer dizer… Do que que você está falando velho!?
– Esses olhos… Estão fazendo você ver o cão de… uma forma… diferente?
Após ouvir essa pergunta, Novah abre uma possibilidade em sua mente, possibilidade que, por estar entorpecida pelos últimos acontecimentos, não havia cogitado antes de Paragor comentar. Mas agora que foi plantada a semente da dúvida, Novah já começou a refletir sobre uma questão específica.
– " Esses olhos… Talvez seja isso!... São esses olhos!... O cão pode ter feito algo com esses cristais… Pode ser um tipo de... feitiço… Só pode ser isso! NÃO ACREDITO QUE ESSE VIRA-LATAS ROUBOU MEU MOMENTO!... Eu… Sonhei com esse momento… Por toda minha vida!... E esse cachorro vem pra me tomar isso!"
Paragor, quando viu sua protegida se perdendo em seus pensamentos, ficou um pouco mais preocupado e perguntou novamente.
– … E então?... Eu estou certo não é?!... Você sabe que pode me contar qualquer coisa menina!
Se esforçando para esconder suas questões, Novah respondeu rapidamente.
– … É que… ELE É MAIS FEIO DO QUE EU IMAGINAVA! – exclamou Novah.
– Hããã!?... Há! há! há! há! Realmente ele não é nenhum rostinho bonito! Há! há! há! Mas você vai ter que se acostumar! Afinal, tenho certeza que você já viu coisa pior!
Paragor, mais tranquilo, começou a recolher suas muletas que ainda estavam no chão e com um rosto aliviado, no entanto cansado, falou para Novah.
– É menina… já foram emoções demais para uma noite. Vamos dormir para amanhã cedo começarmos a arrumar as coisas. As engrenagens do seu futuro finalmente começaram a se mexer. E a escolha que você fez a sete anos no momento mais terrível de sua vida logo vai ter sua consequência.
Novah ouviu com atenção as palavras importantes de seu protetor, mas tudo que ela conseguia pensar era em como aquele homem-cão conseguiu enfeitiçar-lhe daquela maneira.
"Ele não vai me tomar desse jeito! Afinal uma coisa tão estranha não pode simplesmente aparecer do nada sem nem mesmo ter uma história!"
Paragor então acompanha uma Novah de olhar fixo e mente distante até a porta de seu quarto, e ainda empolgado ele disse.
– Está tudo começando muito melhor do que a gente poderia imaginar, não é verdade menina?!... E nós navegamos por tanto tempo nessa maré de azar… que agora só conseguimos pensar que até mesmo as coisas boas podem ser só o azar tramando mais uma das suas… POR ISSO ME ESCUTE AGORA MENINA!!!
Novah, devido ao tom mais alto de Paragor, saiu de seus pensamentos profundos e o olhou para ele de maneira focada.
– Pense somente o necessário!... Porque se pensar demais... pode sofrer com problemas que só existem na sua cabeça!
Novah parou seu olhar com perplexidade, imaginando Como Paragor poderia ser tão certeiro naquele momento distinto. Mas logo após Paragor lhe deu boa noite e foi para seu quarto, Novah voltou a ficar pensativa, e quando entrou em seus aposentos improvisados, ela deitou em sua cama, e tornou a falar com sigo mesma em pensamento.
– Mas e se... aquele cachorro… não fez realmente nada…
Já na manhã seguinte, o homem-cão acordou e se levantou de sua cama rapidamente, já que ainda não confiava totalmente nas pessoas daquele lugar, além de também estar com muita fome.
Lembrando de onde era a cozinha, ele vai até lá na esperança de encontrar algo para matar sua fome. E ao chegar lá, tem uma surpresa inesperada, Novah já se encontrava lá, acordada e preparando vários pães acompanhados de três jarras imensas, cheias de um líquido, que pelo cheiro, aparentava ser café. Por estar mais familiarizado com Paragor, o homem-cão ficou sem reação, mantendo-se por alguns segundos parado na porta da cozinha, somente olhando para ela durante seus afazeres matinais.
– Pega aquele jarro para mim. – Falou Novah para o homem-cão.
Tomando um susto com o repentino pedido de Novah, o homem-cão procurou, de maneira desastrada, o jarro que Novah havia pedido para ele.
– Aquele com tampa do seu lado. – indicou Novah
O homem-cão, agora vendo o jarro que Novah queria, o pega e o entrega a ela ainda tampada, e assim ela o pega, e o destampa, sem demonstrar as dificuldades que eram aparentes antes de sua cura da cegueira.
Quando viu que Novah conseguia executar todas essas tarefas com mais facilidade, ele resolveu começar uma conversa, se baseando nesse novo acontecimento na vida de sua benfeitora.
– Nossa! as gemas funcionam mesmo, né? – Falou o homem-cão impressionado.
– Porque está impressionado!? Você já não tinha visto ontem!? – respondeu Novah.
– Há é… É verdade… he!he!...
Assim, o homem-cão envergonhado por acreditar que fez uma pergunta um tanto boba, tenta se redimir, pegando uma das bandejas de pães que já estavam preparados, e estavam à frente de Novah.
– Hãããã… Pode deixar que eu distribuo isso!
– NÃO PRECISA! – Exclamou Novah.
No entanto, do movimento de pegar a bandeja, até as palavras em ênfase de Novah, que tentou se movimentar para o impedir, os dois culminaram em um encontro cara a cara, convenientemente cruzando seus olhares mais uma vez, o que deixou o homem-cão ainda mais envergonhado.
Ao mesmo tempo, Novah sentia seu coração acelerar mais e mais, o que forçava seu rosto pálido a ficar cada vez mais vermelho, quase se confundindo com um morango recém colhido na relva, além disso, seu corpo flutuava levemente, a levando em uma viagem pelas nuvens de seus sonhos, cada vez mais em direção à sua metade recém descoberta. Mas todo esse sonho acaba quando o homem-cão esbarra em um talher próximo a ele, o deixando cair e trazendo Novah de volta a si.
Ela, sem saber o que fazer de tanta vergonha, virou seu rosto, e afastou o homem-cão com sua mão, dizendo de maneira um pouco ofegante.
– SAAAIII! NÃO CHEGUA TÃO PERTO!
O homem-cão se afasta no máximo de sua vergonha, e fala completamente sem jeito.
– Ai me desculpa! Me desculpa! Eu não queria ter feito isso! Foi sem querer! Me desculpa por favor!
Novah, tentando voltar a sua postura séria e despreocupada, mas ainda um pouco ofegante, responde ao homem-cão.
– … Fica quieto!... Não precisa pedir desculpas… Agora vai conversar com o velho.
– … Tá… Tá legal… Hãã… Eu… Eu tô indo então... – respondeu o homem-cão.
E dessa forma ele sai da cozinha, ainda com fome e muito envergonhado, indo em busca de Paragor, como Novah o havia falado.
Ele olhou em meio aquela grande quantidade de camas que dominavam todo salão central, e observou que já não haviam tantas pessoas acamadas como antes, logo era mais fácil identificar se Paragor estaria ali ou não. Assim então, sem encontrar seu anfitrião, o homem-cão resolve se aventurar por dentro dessa enorme mansão em ruínas, que agora era o lugar mais próximo de um lar que ele poderia ter até aqui.
Primeiro ele foi em um quarto que ficava no topo de uma grande escadaria, ao fundo do salão em que estava. Essa escadaria era feita de madeira velha e ferro enferrujado, o que a fazia ranger a cada passo que o homem-cão dava. E Chegando lá, ele bate na porta, esperando ouvir uma resposta de alguém que poderia estar lá dentro. Porém, ninguém responde. Então o homem-cão coloca sua mão na maçaneta e verifica se o cômodo estava realmente trancado. E ao gira-la, só para testar, a porta se abre, fazendo um barulho alto de juntas velhas e enferrujadas. Isso assusta o homem-cão, que se encolhe por temer tomar outra bronca ,agora do próprio Paragor.
Entretanto, ninguém o repreende após todo aquele barulho. Isso deixou o homem-cão aliviado, e fez com que sua curiosidade se inflame novamente, o motivando a continuar o seu passeio pelos cômodos da mansão de Paragor.
Já lá dentro, ele viu um monte de roupas velhas e alguns baús empoeirados que pareciam estar ali por vários e vários anos.
– Aproveita e pega as mochilas que estão no baú lá no fundo!
O homem-cão dá um pulo para frente com seu coração quase saindo de sua boca. Mas ao olhar para trás, com seus olhos arregalados de medo, ele só vê Paragor atrás dele em pé na porta, com um meio sorriso no rosto, esperando o homem-cão se recompor para ir pegar as mochilas que ele havia pedido.
– Me desculpa!! – falou o homem-cão – É que a Novah falou pra eu procurar o senhor... Aí eu não achei ninguém conhecido no salão… E eu não conhecia esse lugar. Então eu fui procurando e procurando até que vim aqui ver se o senhor estava aqui… Mas eu não peguei nada!!
– Eu sei que você não pegou garoto! mas agora vai pegar! Pega aquelas mochilas que eu acabei de falar, garoto.
O homem-cão então olha para o baú que Paragor havia lhe falado, e vai até ele, o abrindo e vendo além de duas mochilas, uma faca enferrujada, uma corda em pedaços e um pequeno lampião quebrado. Assim, Paragor falou para o homem-cão.
– Não precisa pegar mais nada além das mochilas! O restante das coisas já estão todas ferradas!
Dessa forma, o homem-cão somente pega as mochilas e as entrega a Paragor.
– Garoto! Vocês vão ter que cuidar muito bem de tudo que levarem dentro dessas mochilas! É muito sério! A diferença entre a sua vida e a sua morte na maioria das vezes pode estar dentro de sua mochila, entendeu!?
O homem-cão balançou a cabeça concordando, enquanto prestava atenção nas dicas de Paragor. Mas após esse rápido conselho, Paragor não falou mais nada, somente ficou olhando fixamente nos olhos do homem-cão com uma expressão intrigada e atenciosa.
Intregado, o homem-cão ficou esperando cada vez mais Paragor falar mais algum ensinamento ou qualquer outra coisa que quebre aquela situação constrangedora, porém nada acontece. Isso fez com que ele perguntasse a Paragor.
– … Hããã.... Então… agora vamos fazer o que?
– Vem! Vamos fazer as malas e preparar você para a viagem da sua vida!
Mas ao sair do cômodo Paragor fala.
– Mas antes, toma!
E entrega uma das mochilas ao homem-cão falando novamente.
– Vai no outro quarto ao fim desse corredor, e pegue umas duas cordas decentes que tem lá! Eu vou chamar Novah pra ajudar.
Dessa forma, o Homem-cão obedece seu anfitrião e vai até o quarto pedido. Enquanto Paragor desce as escadas e vai até onde Novah ainda preparava o café da manhã de todos os que se abrigaram ali.
– E aí menina!? Está animada para viver de novo!?
– Estaria melhor se não tivesse que ser babá de ninguém no caminho! – respondeu Novah.
– Há! Para de implicar menina! Até que o cachorro tem algumas coisas interessantes você não acha!?
– … Não! – respondeu Novah.
– Sério!? – Indagou Paragor – Você já olhou nos olhos dele!?
– O QUEE?! COMO ASSIM!? DA ONDE VOCÊ TIROU ISSO!? EU NÃO FIQUEI PARADA IMAGINANDO NADA NA FRENTE DOS OLHOS BRILHANTES DELE! QUER DIZER… QUEM FICA SONHANDO ACORDADA COM COISAS SÓ DE OLHAR PRA ALGUÉM!? EU NÃO!!... EU… Eu… eu não!
– Calma menina!! – falou Paragor. – Eu estou falando da aura dele! Você viu a aura dele?
– Hã!? O que que tem a aura dele? – perguntou Novah.
– O que que tem, é que ele não tem!... Ele não tem aura!! – Falou Paragor espantado.