Aelum Brasileira

Autor(a): Marin


Volume 1

Capítulo 5: Cintia

GRIS

 

— Boa noite, Senhorita Cintia. Está bela como sempre — diz Valefar, assim que puxa um banco e senta próximo ao balcão do bar da estalagem. — Quero uma cerveja e, para o garoto, pode trazer um suco de...

Ele olha para mim, pois quer que eu escolha.

— Limão, uma limonada. Hehe — eu digo.

— Sempre bem direto e sem muitos rodeios, não é mesmo, Sr. V.? Uma cerveja e uma limonada saindo, mas e para comer, o que querem? Tem uma sopa de batatas muito saborosa que acaba de ficar pronta, que tal?

Cintia é a proprietária da Estalagem Alazão Selvagem, que fica em Lumínia. É uma mulher com uns vinte e cinco anos de idade, de cabelos pretos, um pouco mais baixa que a média de altura das mulheres, mas nada muito fora do normal. Porém ela aparenta ser maior do que realmente é, e não sei dizer o motivo.

Cintia tem boa aparência, e ela não usa um vestido como a maioria das mulheres, mas sim roupas um pouco mais masculinas. Seu cabelo é preso, creio que seja para trabalhar melhor. Todavia, esta forma de se vestir lhe cai muito bem.

Entretanto, o que mais me chama a atenção não é sua aparência, mas sim sua presença radiante e, ao mesmo tempo, ameaçadora.

— Novamente com essa de Sr. V.? — diz o professor.

— Já te falei: seu nome é muito estranho e não combina com você.

— E qual nome combinaria mais comigo então?

Hum... — Pensativa, com a mão direita apoiada sobre o quadril, Cintia coloca a ponta do indicador esquerdo em seu queixo, inclina a cabeça para o lado e conclui: — Vitor, você tem cara de Vitor. É um nome bem mais bonito. Se você quiser, eu posso te chamar assim de agora em diante.

— Bom, eu aprendi que não devemos desagradar quem prepara nossa comida, portanto me chame como achar melhor — diz Valefar, tentando falhamente fingir não se importar. — Por falar em comida, trouxe um presente para você.

O professor pega sua mochila e entrega boa parte da carne que trouxemos. Pelo que vejo ele não vendeu tudo.

— Ah! Me presenteando com carne, pois agora me sinto uma felina. Muito obrigada, Sr. Vitor, fico realmente agradecida. Todavia, por que tenho a impressão de que você vai me pedir algo?

— Você sempre troca o nome dos hóspedes?

Começo a perceber que o professor é bom em mudar de assunto.

— Só dos que dão cantadas ruins — diz Cintia, enquanto desliza uma caneca de cerveja até Valefar.

Engraçado, o professor normalmente é mais teimoso e ranzinza, porém, perto da Srta. Cintia, ele parece ser mais legal do que de costume.

— Que cara é essa aí, garoto? Não me faça passar vergonha.

Às vezes, eu acho que o professor consegue ler minha mente.

Ora, Vitor, não deveria tratar um garoto tão adorável desta forma. Você é um pai horrível, sabia?

Ela chamou o professor de Vitor de novo!

— Eu já te vi aqui antes, garoto. Toda semana praticamente, mas o Vitor parecia não querer que você se aproximasse de ninguém e, principalmente, ele evitava que você chegasse perto de mim. Entretanto, agora você está aqui, não é mesmo? Me diga seu nome.

De fato, não soou como uma pergunta. Ela realmente me ordenou a dizer meu nome. É fácil perceber isso, por conta do seu rosto sério e pelo dedo indicador que a Sra. Cintia pressiona contra meu peito.

— G-Gris, filho do caçador. — Eu me sinto bobo toda vez que tenho que falar isso.

— Gris... é um nome bem bonito, e nunca conheci um Gris antes. Imagino que saiba que significa cinza, não é mesmo? Isso só demonstra como seu pai não tem muita imaginação. Porém eu gostei, Gris, filho do caçador — comenta Cintia e depois ela volta a preparar a limonada.

— Pois bem, nós dois vamos precisar de um quarto, Srta. Cintia, com duas camas, pelo período de uma semana — diz Valefar, que olha para mim e completa: — Sim, mudança de planos, pois preciso resolver um assunto. Talvez não demore uma semana, mas precisarei de alguns dias. Enquanto isso, você vai ficar aqui na estalagem e não poderá sair de Lumínia, em hipótese alguma.

— Cruel como sempre, Vitor, por deixar seu filho sozinho. — Cintia fala isso e me entrega a limonada. Depois manda uma piscadinha.

— Mas é aí que você entra na história, Srta. Cintia, porque vou deixá-lo aqui, com todas as despesas pagas antecipadamente e peço que você fique de olho nele. Só posso confiar em você para isso. Quanto você cobraria? Ele é um garoto bom, vai te obedecer e não causará problemas.

Eu gostei da ideia de ficar aqui e queria mesmo passar mais um tempo em Lumínia, mas estou um pouco desconfortável. Afinal é a primeira vez que precisarei ficar longe do professor por tanto tempo.

— Bom... — Cintia coloca seus dois cotovelos sobre o balcão à medida que seus punhos sustentam seu rosto. Ela dá um sorriso maldoso e diz: — não vou cobrar nada para ficar de olho no seu garoto, mas você ficará me devendo uma. Na verdade, vocês dois ficarão me devendo. Entenderam?

Se eu responder que entendo, significará que concordei em dever um favor?

Em todo caso, olho para Cintia, ela parece ser confiável e o professor também confia nela. Além disso, eu noto algo diferente, pois Cintia carrega consigo um colar estranho para uma mulher, parece ser de prata. Nele há um símbolo de uma caveira e também uma balança.

— Por mim tudo bem — eu respondo.

— Certo, fico te devendo essa então, mas veja lá o que você vai me pedir.

— Muito bem, não vejo a hora de ficar a sós com o Gris, filho do caçador. Vou te ensinar a não ser desrespeitoso com mulheres, diferente do Vitor, pois não quero que você fique igual a esse xarope aí — diz Cintia ao passo que nos entrega as duas porções de sopa.

— Só não ensine a ele suas delicadezas, tendo em vista que qualquer fraqueza pode matar o garoto. Ele já é um adulto, pois consegue guiar alguém até certo ponto dentro da Floresta de Prata em segurança.

— Seu pai é um chatão não é, Gris? Fraquezas ele diz — afirma Cintia, enquanto cobre o rosto com a mão na direção de Valefar para que ele não a veja, porém claramente ele pode ouvir a provocação.

— O Vitor acha que a floresta mais perigosa do mundo é a Floresta de Prata, mas existem selvas piores por aí, garoto, e são as selvas de pedra. Já ouviu falar nelas? Nós as chamamos de cidades e nelas têm pessoas, várias delas, e cada uma tem potencial de ser mais perigosa que qualquer uma das bestas que vivem na floresta que vocês caçam.

Cintia nos observa fixamente e percebe que estamos acuados, pois não demonstramos intenção de discordar. Ela ganha mais força em seu argumento e continua:

— É verdade que as bestas e demônios são fortes, pois eles podem tirar sua vida em um instante, mas os maiores perigos do mundo são as pessoas e nem todas são tão boas como a mim e... — Cintia olha para Valefar, ela pensa e reluta em dizer que ele é bom — e como você, Gris. Isso porque, algumas pessoas vão tentar tirar sua vida, mas as mais perigosas vão tentar tirar tudo de você, menos sua vida. Até que não aguente mais perder e deseje ter sido morto por uma besta qualquer.

Cintia é assustadora! Será que ainda dá tempo de voltar atrás e dizer que eu não aceito ficar aqui?

— O que Cintia diz é verdade, Gris, portanto preste atenção. Pode não parecer, mas ela é sábia.

— Como assim, pode não parecer? Humpf! — Cintia vira o rosto de uma maneira bem teatral. Já eu balanço a cabeça em sinal de afirmação.

— Bem, pode me mostrar o quarto, Srta. Cintia? Preciso dormir, pois amanhã quero acordar cedo e partir.

— Mostrarei, sim, entretanto somente depois que você terminar de comer, pois aqui ninguém estraga comida.

Já vi o professor enfrentar monstros com dez vezes o seu peso, mas nenhum é tão amedrontador quanto Cintia.

 

Peço que deixem suas impressões (👍|😝|😍|😮|😢) e comentem o que acharam deste capítulo,

esse é o melhor presente que um escritor pode receber.

Clique aqui e siga Aelum nas redes sociais



Comentários