Volume 1
Capítulo 12: Os Segredos do Goblin Yaga
Enquanto todos se preparavam, Yaga fazia o mesmo, no entanto, arrumando o chão.
Primeiro ele usava algum tipo de magia para criar vento e esse empurrava para longe a poeira e terra do lugar. Repetiu o processo até que o solo apresentasse apenas uma rocha sólida e reta.
Era estranho para Meril um goblin saber tanto sobre escravos, ainda mais aquele tal Pacto de Sangue. Ela o observava de canto de rosto sempre que podia e enquanto os outros não estavam vendo, parecia anotar mentalmente inúmeras notas pessoais.
Desde que sei, goblins não costumam ser tão inteligentes, ao menos, no senso comum criado pelas histórias de fantasia da Terra, e, pelo que pude notar com estas poucas experiências que tive, eles de fato não são. Porém, quando vejo este goblin, ele se destaca, tanto que às vezes me pego repetindo as mesmas ações que Meril.
Depois do combate, recebi um trapo velho que me lembra um cobertor e agora estou o usando no lugar daquele vestido. E pensar que as goblins tiveram um trabalho imenso para costurá-lo, o pobre coitado se tornou cinzas como se fosse nada.
Não dá para esperar que as roupas tenham as mesmas capacidades de resistência de seu usuário. Não é como se fosse as roupas do super-homem.
Analisei meu corpo e minha pele. Não havia nenhum sinal de transgressão. Nem arranhões ou feridas. Isso porque recebi as magias quase que diretamente, se eu conseguisse esquivar de acordo como tanto queria, seria ainda mais estranho sair do combate como se nada tivesse acontecido.
E, apesar do que aconteceu, as garotas não me encheram de perguntas, o que para mim era algo bom. Se eu tivesse que criar desculpas, provavelmente as coisas iriam desandar. Porém, se considerar que já deixei claro que não faço parte desse mundo, não há muito o que explicar, né...
Parando para pensar, o quão comum é alguém vir do outro mundo? Quero dizer, elas aceitaram numa boa sem tanta resistência.
Yaga aparentemente terminou de arrumar o que precisava e fez um sinal para que eu me aproximasse.
Ele continuou dando mais detalhes sobre a conversa de antes:
— Um Pacto de Sangue, diferente de uma escravidão usando a Pedra de Escravidão, é algo imutável, baseado nas condições iniciais. Não pode ser alterado, porém, desfeito ou destruído. Ainda que esse último seja quase impossível de ser feito.
— Deixa eu ver se entendi — comentei, me aproximando dele. — Isso significa que as condições iniciais são as que mais importam, certo?
— Sim. — Yaga confirmou com a cabeça e deixou seu cajado flutuar no ar antes de continuar: — Por isso ele não pode ser comparado a escravidão comum. E como eu disse antes, ele requer um alto custo de mana, igual ao poder oferecido.
Meril também se aproximou e entrou na conversa:
— Isso mesmo, Yami. E neste caso, cada contrato requer seu custo. Enquanto ele estiver ativo, o mestre não poderá utilizar daquela mana.
— Se antes não havia distinção entre mestre e escravo, como funcionava?
Meril olhou para Yaga que parecia saber muito mais sobre o assunto. Além disso, pude ver que ela estava aproveitando a situação para aprender coisas que não tinha lido nos livros antigos.
— Neste caso... — disse Yaga. — As condições e a mana usada deveriam ser basicamente as mesmas. Imagine como uma balança. Se as duas partes colocarem o mesmo peso, nenhuma terá o controle sobre a outra.
— Ainda não entendo, se basicamente estão pondo o mesmo esforço, que vantagem tem isso? O que estou lhe entregando é o mesmo que estou recebendo, não? — perguntei de maneira fria, nada o que dizem faz muito sentido, para mim, é como se eu estivesse apenas trocando notas de mesmo valor.
— Lembre-se, Yami, esse pacto é, inicialmente, uma jura para que um não traia o outro. Depois vem a questão do poder — comentou Meril.
— Certo... continue, Yaga.
— Passando para o próximo estágio, viria a concessão de poder. Nesse caso, o Mestre entregaria parte de seu poder, sua mana, para o Escravo ao mesmo tempo que lhe colocaria certas condições.
Fiz um sinal positivo para que ele continuasse.
— Esse poder é como uma energia amorfa, sem forma, e poderia servir tanto para amplificar as habilidades que o escravo já possuía quanto receber a forma de uma habilidade do mestre para ser entregue-lhe diretamente.
— Isso seria o que você pretende fazer, Yami, de dar a capacidade de entendermos uns aos outros.
Sheyla e Ninx não pareciam compreender o que estávamos discutindo, mesmo assim, não tiraram os olhos nem perderam a atenção as nossas palavras. Para elas, que não possuíam características de conjuradores, aquilo provavelmente era assunto de outro mundo.
Ainda que em suas habilidades Sheyla possuísse algumas relacionadas a recuperação e Ninx a mobilidade e ocultamento, isso estava além do que poderíamos chamar de normal. Quero dizer, do meu normal.
— Então, resumindo... se duas pessoas realizam o Pacto de Sangue, o que importa é as condições. Se elas forem iguais, habilidades podem ser repassadas um para o outro sem que algum lado perca.
— Algo como isso... — Meril me encarou. — E pensar que você entenderia tão rápido.
— E... — Continuei. — Se eu oferecer mais do que você, isso significa que eu passo a ser o Mestre e você meu escravo, certo?
— Sim — afirmou Meril.
— Neste caso, como a pedra funciona? Nós temos alguma aqui?
Yaga fez um sinal negativo. Meril, vendo a situação, se prontificou a me responder:
— Pedras de Escravidão possuem um alto índice de mana acumulada, logo, se um conjurador usa a mana das pedras ao invés de sua própria, ele pode manipular a magia para que reconheça seus traços de mana.
Fiz um sinal negativo e cruzei meus braços. Apesar daquele cobertor estar me cobrindo, ainda era um pano maltrapilho, por isso, estava me incomodando. Suspirei profundamente e olhei para Yaga.
— É... apesar de entender um pouco sobre a base, ainda me faltam muitos detalhes. Vamos deixar isso para mais tarde. Yaga, por favor, me mostre como se faz.
Yaga foi até aquele lugar onde ele tinha arrumado e apontou para o chão. Depois disso, segurou seu cajado fazendo-o voltar para suas mãos.
— Vou explicar como faz agora, Yami.
Yaga manipulou seu cajado como se fosse um pincel e a partir dele uma luz roxa brilhou de sua ponta. Com essa mesma luz, algo como um traçado de pincel, feito de uma tinta mágica e brilhante. Com seus movimentos, um círculo foi criado diretamente no chão, tão perfeito que até me trazia certo desconforto.
Depois disso, de sua bolsa de couro avermelhado, tirou uma pedra cristalizada. Essa pedra era vermelha como o sangue. Ele tinha me explicado sobre ela um pouco antes de dar mais detalhes sobre essa magia.
A pedra era um Cristal Mágico que se encontra dentro de cavernas preenchidas com mana, e, pasmem, também dentro de algumas criaturas de poder mágico abundante. Quando ele me disse aquilo, senti um aperto no peito pensando que até mesmo “eu” poderia ter algo assim dentro do meu corpo. Será que tenho uma também?
Continuando no ritual, aquela pedra cristalina recebeu algumas pequenas vibrações e estilhaçou-se em milhares de pedaços, tal como se transformasse em um pó mágico. Yaga soprou o pó por cima do chão e uma pequena névoa avermelhada pairou alguns centímetros acima do chão e daquele círculo.
O círculo brilhou ainda mais, dando a toda cena um brilho roxo-avermelhado.
Depois disso, Yaga segurou seu cajado com as duas mãos e fez o mesmo que Meril, começou a recitar algum tipo de cântico.
— Aqua, pura e cristalina, apoie meu chamado e ajude esse coitado, Cântico D’Água.
Sistema: [Você possui uma nova Habilidade à Aprender: Cântico D’Água].
Após suas palavras da ponta de seu cajado criou-se um vórtice de água e ele espalhou pelo chão e junto ao pó e ao círculo, um emaranhado de caminhos foi se formando. Bem diante de mim, o que era apenas um círculo, se transformou em um complexo desenho de runas antigas.
Meril deu alguns passos para frente, ficando ainda mais perplexa.
— Corta essa... que tipo de goblin é você para saber uma magia de alto nível?
E isso é magia de alto nível?
— Me perdoe se eu pareço estranho com meu conhecimento. A verdade é que há muito tempo fui escravo de um poderoso necromante.
— Espere... — Meril tentou se recompor. — Você está querendo dizer... que você e esse tal necromante realizaram o Pacto de Sangue?
— Ele deve ter se apegado a mim, já que sou bem carismático — Yaga disse aquelas palavras sorrindo, como se estivesse brincando. — Como já disse, não sou seu inimigo, portanto, não se preocupe.
— Hmmm, isso explica o porquê de você ter tantas habilidades — respondi como se fosse um pensamento alto.
Sistema: [Yaga – Habilidades]
- [Analisar] • [Apaziguar] • [Aura Demoníaca] • [Conhecimento: Aritmética] • [Conhecimento: Druídica] • [Conhecimento: Necromancia] • [Conhecimento Negociação] • [Conhecimento: herbologia] • [Contrato Demoníaco: Nobrious Deyinard (Morto)] • [Cântico D’Água] • [Fortalecer] • [Linguagem Comum] • [Linguagem de Monstros] • [Contrato Demoníaco] • [Palavra de Cura: Rest] • [Palavra de Cura: Soma] • [Palavra de Cura: Vitta] • [Punhos de Terra] • [Ventos Bravos] • [Vinhas da Terra] • [Globo de Luz] e muitas outras...
Agora que vejo, esse [Contrato Demoníaco: Nobrious Deyinard] é o tal Pacto de Sangue? Apesar de ter um nome diferente, pela descrição, só pode ser esse.
Sistema: [Contrato Demoníaco – concede à outra parte deste contrato, parte de seus poderes ou conhecimento em troca de lealdade às condições impostas].
— Como esperado da Princesa Yami. — Yaga sorriu.
— Espere aí... — disse Sheyla, se aproximando. — Um necromante? Quem?
— O que foi? — perguntei, surpreso pelo repentino interesse.
— São muitos poucos aqueles que recebem título de necromante, e esses poucos ficaram conhecidos por suas tentativas de trazer caos ao nosso mundo. — Sheyla parecia um pouco enfurecida.
Seja lá o que tenha acontecido no passado, só pelo fato de ouvir tal palavra, ela ficou muito mais séria e até mesmo ganhou um ar intimidador. Espero que ela não resolva atacar o Yaga por causa dos seus comentários.
— Não é como se eu estivesse tentando esconder isso de vocês, de qualquer forma ele se chamava...
— Nobrious Deyinard, certo? — o interrompi, trazendo a atenção para mim — Não se preocupe Sheyla, ele já está morto.
— Oh. Então você já sabia? —perguntou Yaga, depois fez um sinal negativo — Não... é claro que que sabia, foi por isso que não nos atacou, certo?
— Quê? Ah... sim? De qualquer forma, Sheyla pode se acalmar?
— Me desculpe, Yami... é só que muitas coisas ruins aconteceram por causa daqueles autodenominados necromantes.
Sheyla olhou para Meril e pude sentir um ar ameaçador no ar.
— Não precisa me encarar assim, líder-comandante de Lóthus, minha família não representa mais perigo para ninguém.
— Como é? — o que foi isso de repente?
— É uma longa história...
— Ah! Agora me lembrei — gritou Ninx, assustando todos nós. — Por isso eu achava que tinha te visto de algum lugar... Quem diria, vocês duas são bem famosas na Cidade da Fronteira...
— O que há com isso agora? Quer um autógrafo? — disse Meril de maneira sarcástica.
— Ei, garotas, deixem essas brigas para depois.
As garotas pediram desculpas e Yaga tomou a liderança da conversa.
— Obrigado, Yami. Voltarei a explicação. Isso que você me viu fazer é um glifo arcano, usamos para rituais ou magias de encantamento longo. Ele não só nos ajuda no desenvolvimento do fluxo mágico, como também permite a gente maior controle do que pode acontecer.
Fiz um sinal como se entendesse – mas, não fazia a mínima ideia do que ele estava falando. Glifos, Rituais, Fluxo Mágico, Controle... todos termos em que estava escutando pela primeira vez.
— Entendi, e agora, Yaga?
— Agora precisamos do escravo.
— Oh?
— Togo — gritou Yaga e fez um sinal para um goblin que estava próximo de nós, mas não participando daquela reunião. — Peça que Bigo venha até aqui.
Togo acenou positivamente e foi até aquele pequeno goblin. O goblin chamado Bigo era bem mais jovem que os outros e apesar de ser do sexo masculino, não estava atrelado a nenhuma classe. Além disso, seus status eram muito baixos até mesmo para um goblin.
Bigo se aproximou rapidamente e como se estivesse super empolgado, não parecia conter sua felicidade por ser chamado pelo Líder do clã.
— Bigo vir! Líder Yaga, Bigo aqui.
Yaga apenas acenou para que ele fosse até o círculo e ficasse sobre ele. O coitado sem pensar duas vezes foi até o círculo e fez um sinal de positivo. Yaga deu um sorriso ligeiramente macabro e olhou para mim como se quisesse dizer “Veja bem, Yami”.
— Oh, deusa dos acordos, deusa das promessas: Yman Tuaei! Conceda a este poder de selar um contrato. — Ele fez alguns movimentos com seu cajado e apontou para Bigo. — Você: Bigo, irá lutar ao meu lado sem questionar, morrerá se eu ordenar, e com isso terá meu poder. Oh, Yman Tuaei, confirme comigo os votos e faça desse acordo perpétuo... Você confirma, Bigo?
Bigo olhou de um lado para o outro. Mesmo que ele não parecesse entender o que era todo aquele cântico, esboçou um grande sorriso no rosto. Um verdadeiro sorriso de orelha a orelha e logo começou a balançar a cabeça positivamente.
— Sim! Líder Yaga, eu confirmo!
E assim que o coitado disse “sim”, do círculo correntes emergiram em fúria e o cercaram. Essas correntes tinham a mesma coloração roxa e avermelhada e o rodearam por alguns segundos antes de enrolar em seus pulsos, pernas e pescoço. A última que surgiu diretamente debaixo dele foi como uma lança de tão reta, fincando em seu coração.
Mesmo que eu estivesse vendo tudo aquilo de um lugar privilegiado, foi algo que me surpreendeu devido a sequência de fatos. Olhei para as garotas e elas não pareciam ter notado a cena, ao menos, não da forma como eu tinha visto.
— Era para acontecer algo? — perguntou Ninx.
— Cale-se, não atrapalhe o goblin — comentou Meril.
Do nada o círculo iluminou-se mais que as próprias tochas e tanto Bigo quanto Yaga entraram em um tipo de transe. Ainda que o tempo desse transe fosse extremamente curto, Bigo se ajoelhou perante Yaga. Toda aquela velocidade não enganou meus olhos, eu consegui ver claramente quanto a corrente em seu pescoço o trouxe para baixo, forçando-o naquela situação.
Sistema: [Você possui uma nova Habilidade à Aprender: Contrato Demoníaco].
Hã, que, só isso?
Não é como se isso fosse algo “normal”, porém, esperava que haveria muito mais dado o nome dessa habilidade. Contrato Demoníaco? Não era para ser Pacto de Sangue?
Bigo se levantou e depois sorriu.
As mulheres humanas realmente não perceberam o que aconteceu aqui? Elas parecem meio indiferentes, ainda que atentas às ações do Yaga.
Yaga, por outro lado, retirou de sua bolsa uma adaga pequena e entregou para Bigo.
— Bigo, está vendo essa adaga? Quero que corte seu pescoço com ela — comentou Yaga.
— S-sim? — perguntou Bigo surpreso pelo pedido.
O que é isso? O que diabos isso significa?
— Espere. Yaga, você não precisa pedir que ele faça isso, eu já entendi como funciona.
Bigo estava claramente confuso com o pedido e pelo que percebi, ele realmente não queria fazer aquilo. Assim que o recusou, rapidamente uma coleira seguida de uma corrente surgiu de seu pescoço e ela emitiu uma descarga elétrica, derrubando-o de dor.
Os choques não cessavam e Bigo começou a estremecer, agonizando.
Yaga estava olhando tudo aquilo com calma e serenidade e por mais surpresa que fiquei, acabei me lembrando que, no final de tudo, ele ainda era um monstro.
— Espere... o que está acontecendo com o goblin, Yami? — Sheyla perguntou, perplexa.
— Parece que está sentindo um pouco de dor — ironizou Ninx.
— Pode parar com isso, Yaga! — gritei.
Yaga olhou para mim, e fez um sinal positivo.
— Ignore a última ordem, Bigo.
E assim que ele disse aquilo, Bigo sentiu-se aliviado, ou melhor, deixou de sentir aquelas dores agudas de antes.
— Entendi. Seja lá o que o goblin ordenou, aparentemente o menor deles estava sentindo dor ao recusar o comando. Esse contrato não é como eu conheço.
— Quê? E isso está tudo bem? Achas mesmo que eu aceitaria isso depois do que acabei de ver?
— Acalme-se Sheyla — disse Ninx, sorrindo. — Não é como se fosse uma boa apresentação, mas precisa lembrar que quem o fez foi o verde aí, e não a garota.
Yaga sorriu, e olhou para Meril.
— Isso porque esse pacto foi alterado pelos conhecimentos do meu mestre.
— Interessante — respondeu Meril.
— E como faz para quebrar essa habilidade? — perguntei.
— Se estivermos falando do Pacto de Sangue, o jeito mais fácil seria derrotar o mestre do escravo. Porém, essa habilidade há um diferencial... uma peculiaridade extra. Por exemplo, se eu morresse agora, ele… — apontava para o Bigo. — Iria morrer junto. No entanto, se ele morrer, seu poder não seria perdido.
— Como assim? O que você quer dizer com isso? — indagou Meril, surpresa.
Ainda que eu também tenha minhas dúvidas, não estou entendendo muita coisa além do básico. Por isso mesmo, o máximo que posso fazer é tentar acompanhar a discussão sem que eu me perca tanto.
— A morte é um dos princípios básicos para acabar com um poder, ainda mais se esse poder for de uma criatura viva. No entanto, esse pacto impede que o poder desapareça com a morte dos escravos.
— Isso é assombroso, significa que ele poderia usar os corpos dos próprios escravos fortalecidos pelo contrato, mas não receberia os efeitos negativos — disse Meril, cruzando os braços e encarando Bigo por um momento.
— Ainda não entendi muito bem, estamos falando da mesma coisa? — perguntei olhando para Meril.
— Pense que, se eu concedo parte do meu poder para alguém, enquanto ela estiver viva, eu não posso usar esse poder, certo? Se ela morrer, normalmente o poder voltaria para mim. O que o... Yaga disse... Significa que o poder continuaria preso ao corpo do escravo.
— E não só isso, pelo fato dele ainda estar imbuído com esse poder, a força do próprio escravo não desaparecia com sua morte. Um peão único, certo?
— Epa, espere aí, eu não queria fazer ninguém meu escravo, imagine então ter um exército de mortos-vivos... Não comecem a ter essas ideias de loucos. — Afirmei enquanto fazia um sinal negativo com as mãos. — Se pretendem continuar com essa loucura, eu vou recusar tudo que vier de vocês.
— Não, Yami... Foi apenas uma brincadeira — comentou Meril.
— Que brincadeira de mal gosto, Meril. E você também, Yaga.
— Me desculpe, Princesa Yami.
Ah, que merda... eles falando isso tão naturalmente me fez ficar ainda mais curioso com a situação. Isso significa que eu poderia ter peões... merda, o que estou pensando agora... Esquece essa porra.
Inspirei e respirei por algum momento, tentando acalmar meus pensamentos. Quando normalizei, olhei para eles.
— Certo. E como eu faço para quebrar esse pacto?
— Se tirarmos a morte do mestre da equação, princesa, para quebrar a habilidade você precisaria de uma [Purificação], [Remover Maldição] ou [Luz Divina]. Mesmo que você consiga usar Magias Brancas, aconselho não as usar, pois isso poderia feri-la gravemente. — Yaga deu uma pausa, antes de continuar: — Ainda que seu poder mágico esteja a um nível nunca visto, por favor, não faça esse teste.
— Certo. Entendi.
— Tem outra coisa, Yami — comentou Meril.
— O que seria?
— Imagine que magias de contrato são como cadeados e correntes que prendem os indivíduos. Se houvesse um poder ainda mais forte que a própria magia, esse poderia ser suficiente para romper o cadeado ou a corrente. — Depois de dizer tais palavras, Meril olhou para Yaga. — Mas, creio que seu mestre tenha feito contramedidas, certo?
— Sim. Se quem tentar tirar a habilidade for de nível menor que o mestre, pode ser que ele seja aprisionado junto ao contrato. Claro que, com uma versão mais fraca que o original, mas, ainda capaz de aplicar as mesmas condições e punições.
— E pensar que você consegue usar essa habilidade... uma magia capaz de mudar o rumo de uma guerra. — comentou Meril. — Isso significa que seu mestre não era alguém comum. Nobrious, certo? Quem seria ele?
— Talvez vocês humanos o conheçam como “O Necromante”, aliado do Senhor das Trevas, aquele que disputa com o Rei Demônio o poder dos infernos e dos outros reinos. Apesar de ter sido um poderoso mago ainda durante as primeiras eras, foi em sua solidão pós-guerra a aquisição de seu título, de necromante.
— Nossa... Muita informação, não?
— Eu já escutei falar sobre ele — comentou Sheyla, colocando as mãos no cabo da sua espada. — É dito que esse homem causou a destruição do antigo reino de Scossy. E você está me dizendo que ele era seu mestre?
— Bem, sim.
— “O Necromante”... as histórias diziam que ele era um homem ou um elfo-negro. Antes de ser derrotado pelo Paladino Radiante, escondeu-se nos Reinos das Sombras. — Meril colocava o polegar entre o lábio e seus dentes.
— Ei, garotas... eu sei que o papo está bom, mas, eu não estou entendendo nada.
— Ah, me desculpe, Yami — disse Meril.
— De qualquer forma, Yaga, você diz que seu mestre foi o antigo Necromante das Lendas? Mesmo que Yami esteja aqui e tudo para mim não faça mais sentido algum, ainda acho isso uma mentira.
— Acredite no que quiser — comentou Yaga. — Mas, se não fosse, como explicaria o que acabei de fazer?
— Sim. Você tem razão.
— Se isso for verdade, significa que você não tem algumas centenas de anos? — perguntou Ninx.
Todas ficaram surpresa pelo comentário e até eu tive minha parcela nesse sentimento, encaramos Yaga por alguns segundos.
— Se pensar dessa forma... realmente sou velho, não?
— Quem iria imaginar que iríamos encontrar um dos escravos do Necromante aqui... E pensar que você ainda está vivo.
— Bem... o muito que aprendi também serviu para me proteger. Quando as guerras terminaram, não tinha mais sentido ficar envolto naquela loucura.
— Então você não deseja seguir os passos do seu mestre... como controlar o mundo e coisas do tipo?
— Não. Apesar de eu ainda ser obrigado a seguir o Acordo Demoníaco, se a Yami for aquela que me liderar, não vejo problemas.
— Ganhaste algum tipo de culpa pelo que aconteceu? — perguntou Sheyla.
— Não sei se seria culpa ou algo semelhante... De qualquer forma, já vivi bastante, tanto em tempos sombrios, quanto que me escondendo.
— Pode me contar mais sobre esse Nobrious? — perguntou Meril.
Ela não consegue esconder a curiosidade sobre o assunto e aparentemente o outro – da escravidão – parece que foi deixado de lado.
— Nobrious adorava contar suas histórias, ainda mais quando eu e algumas servas estávamos na biblioteca fazendo companhia. — Yaga parecia lembrar algo interessante e começou a esboçar um sorriso no rosto. — Nem sempre ele foi um Necromante. Uma de suas histórias, a que ele mais gostava de compartilhar, foi quando ele se encontrou com um demônio, ganhando seu novo propósito de vida.
— Interessante... seria esse demônio igual a Yami? — perguntou Ninx.
— Não saberia dizer. Porém, por causa desse encontro, após anos de pesquisa sobre a necromancia, Nobrious já dominava todas as habilidades conhecidas da morte. Um elfo-negro que almejava vencer a morte...
— Então ele era um elfo-negro, não humano?
— Sim, ele era um elfo-negro. — Suspirava. — Só que ele não gostava de se chamar assim. Melhor, ele parecia estar desacordo com seus semelhantes. Sempre que podia deixava claro o quanto desgostava deles.
Togo que estava organizando a volta dos goblins para a arena e o chamado dos outros, se aproximou de nós.
Ele fez um sinal de reverência para Yaga e para mim.
— Líder Yaga. Todos estão aqui. Inclusive as humanas chegarão em breve.
— Oh, certo. Yami... parece que chegou a hora.
Fiz um sinal positivo e olhei para as humanas.
— Então, irei prosseguir com o uso desse ritual. Não se preocupem com nada, não irei obrigá-las a aceitar e mesmo que vocês recusem, manterei minha promessa. Aquelas que decidirem sair dessa caverna, não irei ficar contra. Porém, peço que respeite a decisão daquelas que aceitarem esse acordo.
— Bem, Yami... mesmo que diga isso... pretendo confiar em você — comentou Sheyla, fazendo um sinal positivo com a cabeça.
— Além de ter perdido o duelo, vejo que há coisas aqui que me ajudariam com minhas pesquisas... é claro que você já tem minha resposta — disse Meril.
— Ganhar poder de graça? Por que não? — afirmou Ninx.
— Estamos a sua disposição, Princesa Yamitsuke — comentou Yaga.
Certo... Só por garantia, vamos por todos os pontos nessa nova habilidade de... escravidão. Obrigado por compartilhar esse segredo comigo, Yaga. Não se preocupe, vou tirar o máximo de proveito dos seus conhecimentos... de todos vocês.