Volume 1
Capítulo 26: O PLANO POR TRÁS DO PLANO
O lugar ficou repleto de guerreiros carmim, que portavam arcos enormes e flechas maiores ainda.
Eles eram altos em sua maioria. Mediam, talvez, mais de dois metros. Suas feições eram aquilinas, com olhos negros e afiados.
Tinham longos cabelos sedosos e tão negros quanto a escuridão.
Usavam vestes simples de um tecido que, à primeira vista, Kai imaginou ser organza.
Ele ainda segurava o mudanti desacordado pelo pescoço.
Arfava pouco, como se o nível de chi usado nessa batalha fosse mínimo. Tinha na cabeça o pensamento de que se o seu adversário tivesse usado a espada, o resultado poderia ter sido outro.
Entrementes, a quantidade de mudanti só aumentou.
Ele olhou para seus companheiros e ambos estavam irritados.
Liziero, com seu caráter mais simplório, tinha uma mistura de medo e raiva em seu rosto.
Ómra, por outro lado, tinha feito um guerreiro de refém e gritava ordens. Aquele rapaz realmente não tinha noção de nada.
– Vamos, se afastem. – Gritou. – Eu tenho um de vocês aqui comigo, querem mesmo que ele morra?
– Largue-o, garoto. – Disse um dos guerreiros carmim. – Estão cercados e, logo, logo, seus outros companheiros também estarão.
Kai apertou o pescoço do mudanti inconscientemente, que gemeu. Se fosse verdade o que ele havia dito, o número dos guerreiros carmim deveria superar o dos vitanti.
– Você aí – disse um mudanti, chamando a atenção de Kai. – Sugiro que solte o nosso capitão.
Kai franziu a testa, irritado.
– Pensei que o acordo era sem interrupções.
– Esse acordo foi entre você e ele. Nenhum de nós concordou com isso.
– Então é assim que os mudanti agem? Sua palavra realmente não vale de nada?
– E o que um qésserin saberia sobre nós? Até onde sabemos, o único que não se pode confiar aqui, é você.
Kai pigarreou.
– Pensei que embainhar a espada fosse considerado um gesto de paz.
– Bom, – o mudanti ergueu mais o arco e cuspiu no chão. – já ultrapassamos a quota de confiança deste milênio. E, não avisarei outra vez, qésserin, meus homens não hesitarão em matar os seus, portanto, afrouxe essa mão aí.
Kai não tinha outra alternativa, mas, mesmo assim, permaneceu segurando firme o pescoço do mudanti.
– Acho que podemos chegar em um consenso... – disse, respirando fundo. – A princípio, viemos aqui para conversar a respeito de...
– Não há conversa com vocês, qésserin, não entendeu ainda? – Ele berrou.
Sem ter outra alternativa, Kai levou a mão ao cabo da espada. Teria de lutar com todos ali e, quem sabe, criar tempo o suficiente para que os vitanti batessem em retirada. Teriam, no fim, falhado em sua missão.
– Deixe ao menos meus companheiros irem...
– Pra que? – interrompeu o mudanti. – Para que relatem o que aconteceu aqui? Eu acho que não!
Kai suspirou. No fim, fez de tudo para que outro caminho não fosse seguido. Quando começou a puxar a espada, a aura assassina vazando, ele sentiu uma fina assinatura se aproximando.
– Vamos ter muita calma por aqui, Ysgarlad.
Kai olhou para uma extremidade e, lentamente, vinha uma senhora em sua direção. Usava um vestido longo e branco, sua pele era mais clara em comparação à dos guerreiros. Estava num tom entre laranja e vermelho.
Tinha um cabelo muito branco e em tranças.
Todos os guerreiros caíram imediatamente de joelhos e baixaram a cabeça.
– Podem se levantar.
Os guerreiros se ergueram e tomaram suas posições de novo. Kai permaneceu segurando o pescoço do mudanti.
– Senhora, estes são os invasores dos quais informamos. Há, pelo menos, cerca de 60 ou um pouco mais na direção do rio súlimo.
– Decerto – ela sorriu. – E, falando neles...
Kai seguiu o olhar dela e, andando sob uma escolta de, no mínimo cem mudanti, vinha a unidade Fronteira. Não teria como ficar melhor.
Os soldados Fronteira andavam com as mãos erguidas e um tanto assustados. Somente os antigos Guerreiros Púrpuro mantinham uma feição dura.
Os olhos de Kai e Arjuani se encontraram e, em seguida, os dele e o de Fioled. Estavam assustadas.
Fioled encarou a cena e jurou ter visto perplexidade.
– Bom, como o líder deste grupo está aqui, acho que já podemos tratar disso sem mais preâmbulos. – Disse a senhora. Ela se virou para Kai e o seu sorriso vacilou por um segundo. – Poderia soltar meu filho, por favor? Acredito que ele ainda tem muito o que viver.
Kai sorriu.
– Logo depois que seus soldados abaixarem seus arcos e flechas. Não somos animais para...
– Você ousa falar assim com nossa senhora? – gritou Ysgarlad. – Não faz ideia de com quem está falando, não é? Esta é nossa Rainha da Tulipa Sagrada, a esposa de nosso caudilho e segunda pessoa mais importante de nossa tribo. Esta é Daisysia dos Montes Cádmios.
Houve breve murmúrio entre os soldados Fronteira.
– Títulos não me são importantes, mudanti – Kai apertou o pescoço do guerreiro carmim, que revirou os olhos sob as pálpebras. – Se não reparou, não sou um vitanti. Só estou cumprindo ordens. Minha missão, desde o início, não envolvia uma luta. Viemos em paz.
Daisysia olhou ao redor.
– Isto é verdade? – perguntou.
– Minha senhora...
– Responda. Sim ou não?
Ysgarlad começou a suar.
– S-sim. Em nossa defesa, foi seu filho que iniciou uma batalha.
– Entendo...
Kai soltou o mudanti no chão e se levantou. Limpou as pregas de suas vestes e bateu as mãos, tirando a poeira.
– E vocês descumpriram o acordo. – Kai olhou para Daisysia.
– Que acordo?
– Seu filho e eu concordamos com uma batalha no um a um, sem interrupções. Assim que ele perdeu, seus guardas apontaram flechas para mim – Kai deu uma pausa e apontou para Liziero e Ómra. – E para meus companheiros.
Ela fez uma rápida análise no lugar. Encarou o buraco feito pelo punho de Kai, em seguida o encarou. Depois olhou para seus próprios guardas e, por último, para seu filho.
– Ysgarlad, leve Key’inant para o vilarejo imediatamente.
– Mas, senhora...
– Isto é uma ordem. – Ela se virou para Kai. – Você queria conversar, vamos conversar.
Ela começou a andar em direção das árvores. Quando se virou, encarou Kai, que estava parado.
– Imaginei que este seria o momento que você me seguiria... – ela levou os braços para trás das costas e sorriu. – Então?
Ele piscou e coçou a bochecha, corado.
– Lamento, mas não sou o líder deste grupo, Senhora.
Ela ficou surpresa por um segundo; contudo, sua feição logo tornou a ser sorridente.
Entrementes, Arjuani deu dois passos à frente. Mais arcos foram apontados para seu rosto.
Daisysia ergueu uma mão e, simultaneamente – com certa cautela –, todos tornaram a abaixar.
Então a mudanti tomou sua caminhada e Arjuani e Kai seguiram lado a lado atrás dela.
Caminharam um pouco até que pararam numa clareira repleta de flores vermelhas.
De repente, um tronco apareceu do chão. Raízes brotaram e formaram bancos. Daisysia foi a primeira a sentar. Arjuani sentou em seguida, com Kai ficando em pé atrás dela.
– Aceitam algo para beber?
Kai não respondeu, mas a comandante o olhou de soslaio como se pedisse permissão. Ele achou o gesto engraçado.
Daisysia disse algumas palavras e um brilho apareceu na base do tronco que serviu, aparentemente, de mesa. Apareceram duas tigelas pequenas parecidas com xícaras. Daisysia bebericou um pouco de uma.
– Espíritos da floresta... – Arjuani balbuciou.
– Certamente. – Daisysia sorriu. – E então?
– Viemos em uma missão ordenada por Mael da linhagem Eblomdrude. – Disse Arjuani, sem rodeios.
A mudanti tomou um gole do que quer fosse aquilo e olhou por cima da borda da tigela. Ela estava encantada com o sabor do líquido.
– E o que, de tão importante, meu querido sobrinho queria tratar enviando uma unidade de soldados de elite?
Kai ficou surpreso ao saber do parentesco. Mas achou graça do fato dela pensar que a Unidade Fronteira era formada por soldados de elite. Se tivesse 20 Púrpuros ainda era muito.
– É algo que deveríamos tratar diretamente com o caudilho, senhora – disse Arjuani.
Daisysia fitou o rosto da moça e, mais uma vez, tornou a bebericar da tigela.
– Meu esposo está impossibilitado no momento... Eu sou a responsável por comandar os mudanti em sua ausência.
– E onde o caudilho poderia estar que não pode receber nem mesmo uma pequena Unidade de soldados de elite? – Kai indagou, irônico.
A mudanti ergueu o olhar; ela estava indecifrável.
– Eu poderia fazer a mesma pergunta a respeito do seu... O que Mael é para vocês?
– General. – Respondeu Arjuani, pressurosa.
– Ah... um título importante. Bom, é como eu disse antes: com a ausência de meu esposo, estou aqui para tratar sobre o que quer que queiram.
– Mael foi claro ao dizer que isso deveria ser...
– Há uma guerra chegando. – Disse Kai, sem rodeios. Arjuani lançou um olhar irritado para ele, que respondeu com o dar de ombros.
Sem ter para onde correr, a vitanti contou sobre tudo acerca dos últimos ocorridos. Daisysia continuou indecifrável, imutável. Tomava apenas do líquido enquanto nem exibia uma feição digna de leitura.
Por outro lado, no entanto, pareceu atenta quando a história acabou.
– São notícias preocupantes, de fato...
– Sim...
Ambas ficaram caladas por um bom tempo.
Kai teve a sensação de que Arjuani não sabia como conduzir uma negociação, uma vez que, após contar a história, ela ficou calada. Daisysia também não tinha nada a dizer já que quem tinha ido até ali eram eles.
A mudanti ergueu as sobrancelhas, esperando que Arjuani dissesse o motivo de sua ida. Quando não obteve uma resposta, ela olhou para Kai.
Ele revirou os olhos.
– Viemos solicitar a ajuda dos mudanti. Nossas tropas ainda estão em treinamento; temos motivos para acreditar que os números de Pele-pétrea são absurdos. Ele está conquistando a ajuda das tribos selvagens e esse número só vai crescer.
Daisysia suspirou, preocupação estampada em seu rosto.
– Temo não ter meios para aceitar esse pedido.
Era o que Kai temia. Havia, com toda certeza, um motivo por trás.
– Por que? – perguntou Arjuani.
Daisysia se levantou e a xícara sumiu. Ela colocou as mãos para trás e tornou a andar.
– Sigam-me.
***
Ao retornarem para o lugar de antes, Daisysia deu ordens para que os soldados carmim guardassem suas armas e escoltassem a Unidade Fronteira.
A primeira leva de soldados carmim sumiu por entre as árvores. Os outros, no entanto, seguiram as ordens de sua líder temporária. Os soldados Fronteira ficaram sempre juntos, com Arjuani e Kai a sua frente.
Daisysia caminhou até a rocha que Kai investigou antes; se virou para ele.
– Antes de lhes mostrar, gostaria de pedir desculpas pela recepção que tiveram, são tempos escuros...
Ela se virou para a rocha e pousou a mão num buraco. A rocha brilhou e uma passagem se abriu.
– Então era mesmo uma entrada... – Kai murmurou.
– Ou uma saída... – sussurrou Fioled; o cheiro de cacau e lavanda inundaram o nariz de Kai.
Ele ficou arrepiado.
Os soldados carmim entraram seguidos pela mudanti e pelos vitanti.
Havia um túnel largo de teto abobadado com candelabros e tochas fracas presas à parede. Um odor permeava o lugar, vindo como uma lufada de ar.
Por um tempo, apenas cochichos e o som dos passos eram ouvidos.
Chegaram num determinado ponto onde o caminho se estreitou. Haviam dois guardas parados em cada lado de uma enorme parede escarpada.
Prestaram continência.
Um dos guardas se virou para a parede e pousou a mão na rocha. Ela se iluminou com vários traços se ligando e conectando. Logo, as pedras começaram a recuar, abrindo uma passagem.
A comitiva de Daisysia foi a primeira a passar pelo arco.
Logo foi a vez de Kai e dos outros.
A visão o deixou de coração apertado.
Atrás do arco por qual passaram havia uma enorme caverna, repleta de pedras brilhosas no teto, parede e chão. Ao longo da caverna, haviam muitas tendas improvisadas.
Haviam mudanti de todas as idades, muitos deles bastante feridos.
Daisysia tornou a andar.
– Há uma semana fomos atacados por uma horda de batedores – começou a contar. – Nosso vilarejo foi destruído, completamente devastado. Nossas forças foram separadas, diminuídas. Eles aproveitaram um momento de distração...
– Distração?
– Recebemos uma mensagem, um pedido de socorro – ela se virou para Kai. – Vindo de Mael.
Kai cerrou o cenho.
– Disponibilizamos uma determinada quantidade dos Soldados Carmim. Key’inant foi o líder dessa tropa enviada. Então, quando ele saiu com os melhores guerreiros da nossa tribo, uma explosão destruiu nossos escudos. Junto, os ataques começaram; os principais alvos eram os jovens aspirantes a guerreiros... então meu marido, a fim de dar chance para os civis, entrou na batalha...
“Ele lutou durante um dia e meio. Os inimigos foram astutos, lançaram um feitiço, uma tela, onde raios de sol não entravam. Como bem sabem, batedores sentem aversão a luz solar.”
– E aqueles que atenderam ao chamado? – Kai indagou.
– Esta é a outra parte da história. Quando chegaram no suposto lugar, foram atacados por criaturas com duas vezes o seu número. Meu filho conseguiu organizar uma fuga... Quando voltaram, boa parte havia conseguido fugir, com alguns se escondendo pela floresta de Bulogg, com outros morrendo... meu marido, ele... bem, ficou gravemente ferido devido à quantidade absurda de batedores... ainda houve uma segunda onda comandada por caranguejos, mas estes foram facilmente sobrepujados.
Eles pararam em frente a uma tenda. Daisysia olhou para Kai e Arjuani.
– Eu adoraria ajudar; como bem sabem, apesar de discordar, Mael sempre teve uma ótima relação conosco. Só que nossos números são pequenos se comparados aos seus. Perdemos bons guerreiros... ainda estamos na tratativa de encontrar os mudanti perdidos. Até mesmo essa caverna é um dos muitos abrigos temporários dos antigos vitanti...
Era isso que Mael temia e, em parte, Kai também. Era óbvio que o tal mestre tinha mais de uma carta na manga. Atacar os postos avançados, o ataque ao acampamento vitanti, o ataque à principal tribo mudanti... fora tudo minimamente calculado.
– O interesse de Mael nunca foi aumentar suas próprias tropas... – Disse Arjuani. – Desde o início, ele sempre quis trazer de volta os vitanti perdidos... vocês, que mesmo distantes, mantiveram uma certa relação. O aumento da força vitanti é uma consequência, mas o objetivo maior é que fiquemos juntos, para que nenhum de nós morra longe do nosso próprio lar.
Kai ficou surpreso com o discurso da companheira. Ela estava certa.
Também surpresa, Daisysia se virou para um soldado e ordenou que ele levasse a Unidade Fronteira para um lugar, a fim de se acomodarem.
Em seguida, ela entrou na tenda, com Kai e Arjuani atrás.
Era um lugar um tanto bonito. Havia um tapete no centro e uma mesinha baixa com um mapa desenhado no tampo.
A chefe mudanti se apressou até uma extremidade e pegou uma lamparina. Havia um orbe rodando dentro, uma fraca luz emitida.
Ela se sentou sobre o carpete e pousou a lâmpada no tampo da mesa.
– Qual o estado atual do caudilho? – Kai indagou, se aproximando.
– Estivera pior. – Ela suspirou. – Pensamos em enviar um pedido de socorro à Mael, mas imaginamos que poderia ser interceptada.
– Entendo... – Arjuani suspirou. – O que planejam fazer?
– Nossa prioridade ainda é encontrar os mudanti perdidos. Não temos outro pensamento que não este. Veja, somos um povo orgulhoso, mas protetores. Há famílias perdidas por aí, que se caírem nas mãos erradas, só Bulogg sabe o que pode acontecer.
Algum tempo se passou, todos encarando o nada.
– Tenho uma pergunta. – Kai quebrou o silêncio. Daisysia concordou em aceno. – Mael nos deu uma bússola que mostrava a localização do vilarejo mudanti... se seu vilarejo foi destruído, como viemos parar aqui, que é um esconderijo?
– É simples – ela sorriu. – Mael me deu uma pedra. Essa bússola sempre há de apontar para a pedra que está conosco. Você deve ter notado que, em determinado lugar, o ponteiro da bússola estava enlouquecido.
– Sim...
– Bem, ela também localiza onde os mudanti estão, mas, devido a força maior da pedra, sempre acaba mostrando sua localização, no fim.
Kai pensou por um instante. Era bem engenhoso, na verdade. Era puro feitiço, sem ajuda de runas e matizes.
– E quanto à aura que esse lugar emana? É quase um chamariz.
– Bem, esse é nosso principal problema. Temos mudado de lugar, mas, infelizmente, sempre que ativamos a passagem de um esconderijo, não dura nem um dia para que comece a soltar essa aura. Acredito que seja devido o tempo de construção. Devem ter notado que está um alvoroço grande lá fora; estamos nos preparando para partir.
Então era por isso que haviam tantos soldados fora da caverna. Kai fitou o chão por um tempo.
– Tenho uma proposta, Daisysia.
A mudanti olhou para Arjuani depois para Kai; ergueu uma sobrancelha, curiosa.
– Vamos lá, não tenho mais o que perder.
***
Um soldado carmim escoltava Kai e Arjuani ao local onde os Soldados Fronteira foram alocados.
– Acha que dará certo? – Arjuani perguntou.
– Bom, tudo vai depender dele.
– Vocês não têm uma boa relação...
– Sim, mas não falarei com ele como um igual. E tenho minha comandante do meu lado, não é?
Arjuani sorriu.
– Não dê uma de galã.
Logo chegaram num lugar onde haviam muitas rochas brilhantes. Os Soldados Fronteira estavam espalhados.
Assim que Kai pisou ali, a mão de alguém lhe agarrou pela gola e segurou forte.
– É bom ir falando logo como conseguiu a espada, curoh’nekedoh. – Ómra estava irritado. Kai viu uma imensa raiva em seus olhos.
– Droga... – Fioled murmurou, se levantando.
Logo vários soldados Fronteira se prepararam para afastar os dois.
– Você sabe que isso é desacato não é, rapaz? – Indagou um Guerreiro Púrpuro.
Arjuani cruzou os braços. Liziero fez menção de separar, bem como Fioled, mas a comandante não deixou.
Kai segurou e apertou o pulso de Ómra.
– Se você me soltar, eu posso responder essa...
– VAMOS LOGO! – Interrompeu. – Diga! Diga que roubou a espada de meu pai, a espada do clã Echanti. Vamos... vou adorar quando...
A aura de Kai fluiu um pouco, intencionando suas emoções. Ele estava irritado com tanto ostracismo. Os soldados que ouviram a primeira conversa entre ele e a comandante logo se lembraram da promessa que ele fez.
Os Soldados Fronteira mais inexperientes se afastaram, o chi de Kai os sufocando. Mas era moderado, sua intenção era, no momento, mostrar sua posição. Não toleraria isso, mesmo que sua ideia inicial fosse conversar.
– Seu pai a deu para mim, Ómra. Ela me escolheu. Agora, como seu vice comandante, sugiro que me solte, ou teremos um sério problema.
Ambos se encararam, Kai apertando mais o pulso do outro a cada momento.
Depois de algum tempo, Ómra soltou Kai e se afastou, massageando o pulso.
A aura de Kai foi lentamente voltando, suavizando o ar. Os tessaya recém admitidos cambalearam. Teve quem não tivesse suportado a pressão e vomitado.
Para os mais experientes, essa era uma das raras vezes que viam uma aura causar tanto alvoroço. Esse rapaz se tornara poderoso em poucas semanas. Seria um monstro.
– E, já que todos estão aqui, vamos conversar somente esta vez, para que fique claro. Acredito que um líder não precise reafirmar sua posição, na minha terra isso é considerado fraqueza. Mas, isso não isenta o fato de que, quando necessário, uma posição deva ser tomada. Eu sou o vice comandante, estando abaixo apenas dessa pessoa. – Ele apontou para Arjuani. – Se tiverem algum problema, podem vir tratar comigo, ou, se acharem necessário, podem falar diretamente com Mael, que é seu general.
“Eu sei que existem guerreiros mais capacitados nesta Unidade que deveriam estar no meu lugar, devido a toda sua história e afins. Mas a decisão foi tomada, o que não significa que será para sempre. Sendo assim, não tolerarei mais nenhuma ação contra mim, qualquer que seja. Sejam respeitosos, e eu o serei. Sejam ardilosos, e agirei como o pior CUROH’NEKEDOH que já viram.”
Kai pegou o cabo da espada e a desembainhou. A lâmina bronze emitiu uma forte aura, como se esperasse o dia todo por aquilo.
– Quem se achar merecedor deste cargo, pode vir. Veremos quem tem mais sorte.
Zinério, que era um dos Púrpuros mais respeitados dentre estes, sorriu.
Este garoto tem culhões, pensou.
Arjuani reprimiu uma gargalhada.
As reações dentre os vitanti foram diversas, mas todos entenderam a mensagem. Poderiam odiá-lo, poderiam não gostar de sua posição; mas, quem quer que fosse, se agisse rudemente com ele, teria de arcar com as consequências.
Arjuani se adiantou, a fim de quebrar o gelo que se formara.
– Capitães, quero que se juntem aqui, temos coisas a tratar.
Fioled, que ficou calada, se adiantou e segurou na gola de um Ómra cheio de raiva. Kai segurou o pulso da garota.
– Ele também vai participar, Fioled.
Quando os três capitães se aproximaram, Kai retirou a bússola do bolso interno de seu robe.
– Temos uma missão dentro da missão.