Volume 2 – Arco 5: Laboratório
Relatório 42: A Criatura
29/04/2002, 18:40 da noite…
Fuga realizada com sucesso! Agora que nem mesmo Alex era mais capaz de enxergá-lo, Hector disparou instalação adentro, determinado a gravar todo e qualquer detalhe naquele mente que nunca esteve tão sã desde que se lembrava.
Fingindo não estar perdido naqueles corredores de metal, seu olhar passeava para além das fissuras, focando também em toda e qualquer porta que surgisse em seu caminho. No entanto, havia um pequeno problema nesse plano.
“Nenhuma! Não tem nenhuma porta por aqui!! Será que o andar inteiro é feito apenas de corredores!?”
Cada curva realizada, toda arfada que escapava de seus pulmões, todo aquele esforço era lentamente jogado no vazio. Todas as paredes eram isentas de qualquer abertura que uma pessoa seria capaz de passar. Apenas aquelas fissuras faziam presença, em todo e qualquer canto daquele inacabável lugar.
Conseguiu o que queria, despistar Alex, mas essa recompensa trouxe a inesperada condição: Perdido! Como exploraria um local cuja arquitetura era totalmente desconhecida!?
Dentre todos os lugares, o único que genuinamente não desejava voltar era para onde estava aquele ser gigantenorme escondido nas sombras. Entretanto, a lembrança de várias entradas espalhadas na área trouxe a necessidade inevitável de retorno.
Suas passadas rapidamente encurtaram, dando espaço para que o cérebro tentasse se lembrar da rota para retroceder até aquela enorme área escura. Porém, a curva seguinte acabou com seu raciocínio.
GRAAH!! Um lagarto gritou em sua direção — um bem grande, por sinal!!
Hector saltou pra trás num susto, inevitavelmente caindo contra o chão. Para aumentar sua infelicidade, aquilo que aparecera não fora apenas um lagarto, quem dera fosse! Havia com ele nada menos que duas pessoas!
— Hum? Esse cara… nunca vi ele por aqui.
“Merda! Esses fudido tão me vendo!!” Seus olhos arregalaram, expressão rapidamente disfarçada pelo franzir do cenho. “Como exatamente eles estão me enxergando? Eu tenho o mesmo uniforme preto ou estou vestindo o terno branco? Não tem como saber!”
Inútil! Ele exclamou em seu interno. Como uma habilidade que o próprio usuário não via os efeitos poderia ser utilizável!?? Seu ódio caiu contra Yellow, que provavelmente estava rindo de sua desgraça naquele momento.
Ambos os homens trajavam o uniforme branco e gravata amarela. Um era baixo e gordo, outro magro e alto. Uma dupla tão genérica que um pouco de decepção era notável no rosto do detetive.
— Ele deve ser um novato de algum setor fora daqui — disse Glen, pensativo. — Qual seu nome, companheiro?
O cartola hesitou, lentamente recuperando a postura. — Jo-Jonas! E de fato, sou um novato aqui. Me desculpe pela colisão.
O magricelo, Jorge, intrometeu-se. — De qual área você é? Polícia? Hospitalar? Explorador ou… quem sabe um dos Fantoches?
!! A última palavra deu-lhe um tique, levando a mão em direção ao queixo. Em contraponto, o cérebro se pôs a pensar imediatamente. Aquela “desaceleração” do tempo pareceu se fazer presente, mas fora apenas o rápido raciocínio do detetive.
— Ainda não decidi minha área! — Infelizmente, o raciocínio era rápido, mas não verdadeiramente eficiente.
Tanto Glen quanto Jorge arquearam as sobrancelhas, até mesmo o lagarto que o magricela carregava pareceu imitar o ato, seguido de um olhar fixo mantido sobre detetive.
Hector fitou aquelas três figuras com afinco, querendo que aquela gota de suor desaparecesse de seu rosto o mais rápido possível. O animal, em especial, pareceu notar aquela pressa, inclinando a cabeça em sua direção.
— Ah! Entendi! — disse Glen, murmurando para Jorge. — Acho que ele acabou de sair do Aprimoramento! Olha só o Billie Jean!
Ele disse isso apontando para o lagarto, que se inclinava cada vez mais na direção de Hector. Curioso. Devia ser um Dragão de Komodo, mas um pouco menor. Aquela língua de cobra pendia para o cartola constantemente, identificando mais do que meros olhos humanos eram capazes de enxergar.
“Que bosta esse calangão tá querendo? Não é um animal que vai tirar o meu disfarce! Sai daqui, desgraçado!!”
Jorge seguia a inclinação do animal, no entanto, esse mesmo tombar do corpo de Billie Jean foi repentinamente cessado. Um esbranquiçar atravessou até mesmo suas resistentes escamas, tornando seu corpo antes escuro e esverdeado no de um fantasma animalesco.
GRIAAH!! Debateu-se fortemente e, ao se libertar dos braços de Jorge, o Dragão de Komodo se colocou em duas patas e partiu em disparada em direção ao interior da base. Tudo que ecoou pela instalação foram os berros desesperados do animal.
— BILLIE JEAN! — chamou Glen. — Porra, volta aqui!!
Os dois saíram correndo atrás do Dragão, abandonando o novato no corredor sem qualquer palavra extra.
Conveniente, Hector poderia dizer, mas apenas se aquela estranheza não inflasse sua cabeça ao ponto de quase explodi-la.
Aqueles efeitos eram novamente presentes, provavelmente causados pelo Fator B que usava sem nem saber o que fazia. Dentre tantas funcionalidades que encontrou até o momento, a verdadeira natureza da habilidade permanecia um mistério.
“Acho melhor esquecer isso por enquanto. tá funcionando, é isso que importa!!”
Levantou-se rápido como a fuga do animal, seguindo na direção da qual Glen e Jorge estavam vindo antes de colidir consigo.
Até onde corria, era basicamente mais do mesmo. Metal branco moldava as paredes, uma aura estranha escapava de fissuras negras e uma porta parecida com a de um elevador o aguardava no final de um longo percurso. Esse foi o mesmo cenário que perseguiu seus olhos por um certo tempo, até que, enfim, o esforço colocado nas pernas lhe trouxesse um resultado diferente.
Por mais repetitivas que suas ações pudessem parecer inicialmente, devia se lembrar que a única coisa que se autocopiava ali eram os corredores. Estava se movendo! Havia se esquecido disso, e o choque para aquela realidade veio mais forte do que esperava.
Após aquela fatídica porta, deparou-se com uma sala. Poderia muito bem estar num zoológico, pois logo à frente havia uma larga (e muito provavelmente densa) parede de vidro, que de forma alguma impedia os olhos esmeralda de alcançar o verde que se encontrava do outro lado.
“Ma-mas que bosta é essa? Uma… floresta!??”
Misturada em estruturas metálicas, um ambiente natural foi o que encontrou. Plantas, árvores, vinhas e até mesmo um pequeno lago estavam presentes. O chão terroso tinha sinais de escavações animalescas, assim como pegadas podiam ser vistas naquele pequeno pedaço do vasto perímetro.
Não havia como estipular um tamanho certo, mas se fosse chutar, deveria caber ali manadas de elefantes, leões e alguns mamíferos no mesmo espaço, sem que se dessem conta do ambiente limitado, muito menos conflitassem uns com os outros.
Hector tentou enxergar mais adiante, mas falhara. Sua atenção então voltou ao pequeno espaço observável, inevitavelmente focando no pequeno lago.
“Que tipo de animais eles guardam aqui?”, pensou, buscando identificar as pegadas.
Não parecia de um mamífero, e a distância dificultava a ideia de tamanho do ser vivo. Ainda por cima, a deformação na lama tornou a pegada arredondada, mas havia sinais de dedos protuberantes e, quem sabe, garras.
Vasculhou as árvores, buscou tocas e até mesmo inspecionou o “céu”, que nada mais era do que uma pintura mal feita no metal com um tom de azul bastante incoerente com o horizonte original.
Porém, fora deste mesmo “falso céu” que uma estrela cadente caiu, atendendo ao seu pedido de descoberta.
Carne. Um grande pedaço cortado em bife. Não sabia que tipo de criatura daria uma massa tão grande como aquela. Deveria alcançar o seu próprio tamanho, e isso apenas de altura em pé, pois em largura deveria ter o equivalente para duas pessoas coladas uma na outra.
Fitou aquela massa vermelha e carnuda por alguns instantes, não tardando para que os resultados de seu surgimento fizessem preseça.
Do meio das matas, algo começou a surgir. Focinhos compridos e sem qualquer fraqueza aparente. Apesar de uma pele pouco resiliente ao clima, não parecia o tipo de criatura que se poderia vencer ao simplesmente tacá-la num frigorífico. Sim! Para no mínimo arranhar aquela coisa, poderia contatar direto um batalhão inteiro fortemente armado.
Eram todos bípedes. Os dentes tão afiados quanto as garras nos pés e patas de três dedos. A movimentação levemente corcunda trazia o ar de guarda sempre alta, típico de um predador nato, pois era exatamente isso que eles eram. Predadores! Os mais aptos e resistentes que a face da terra já conheceu, criaturas que, mesmo nos dias de hoje, a existência não passa de uma teoria, visto o medo que geraria se sua vivência fosse realmente confirmada.
Chamados de Grandes Lagartos, eram também comumente chamados de…
— Di-di-di-dinossauros!!??
Seus olhos não podiam enganá-lo (só se estivessem dourados, o que não era o caso, felizmente!!), aquelas coisas eram, de fato, seres pré-históricos!
— Aquela espécie é… um Velociraptor?
Em questões que voavam longe dos setores investigativos, Hector era como uma mãe nomeando as coisas. Qualquer criatura amarela que aparecesse em algum desenho seria automaticamente chamado de Pikachu. Convenientemente, Velociraptor ainda era o melhor nome para aquela aparência que surgira. O tamanho, pelo menos, não remetia ao suposto para um tão aclamado T-Rex.
“Eles reviveram essas criaturas? Mas porque estavam vindo daqui carregando um Dragão de Komodo?”
Vorazmente, saltaram sobre o pedaço de carne e começaram a devorar. O olhar de Hector rapidamente caiu sobre uma placa no canto da sala. “Sessão 23”, era o que estava escrito. Caso existisse uma ordem ou coisa assim, seu medo provavelmente não o deixaria descobrir o que havia nas outras 22 sessões.
Pelo menos aquele lugar! Definitivamente não poderia deixar seu cérebro arremessar as memórias em direção ao lixo! Isento da possibilidade de anotar tudo em algum lugar, teve de confiar nessa ordem para si mesmo.
“Certo! Eu não posso ficar impressionado com a primeira coisa que vejo! Tenho que continuar!!”
Afinal, encontrar dinossauros nem era seu objetivo! Além disso, o que era encontrar seres pré-históricos perto de se deparar com um sombra gigante que te encarava? Se esse lugar fosse perto do inferno, passar por lá seria molezinha para o detetive paranoico.
Sessão 23, ela foi deixada para trás rapidamente ao passo que a corrida de Hector acelerava uniformemente, parecia um carro cujo velocímetro não conhecia limites.
Por pouco, essa mesma velocidade não o impediu de visualizar uma segunda sala que chamou-lhe a atenção. Foram necessários apenas alguns minutos de corrida e cerca de 29 curvas pelos corredores.
— Jardim… de Éden? — leu a placa, curioso.
Uma palavra totalmente desconhecida. Éden? O que isso significava? Não parecia ser uma palavra aleatória, muito menos algo da linguagem mais antiga, a Kanemuri! Devia ser algum termo interno usado pelas pessoas do exército.
Se fosse para descobrir mais, só entrando para saber, não é? Foi exatamente isso que o cartola fez.
Abriu a porta sem qualquer hesitação. Não havia ninguém por perto, e mesmo que tivesse, a habilidade não os deixaria notá-lo.
“É um Fator B bem conveniente, parando pra pensar.” Hector interrompeu o movimento da porta e ponderou. “Será que o Yellow sabia disso? Não, eu tenho que me perguntar há quanto tempo ele planejava isso?”
Outra vez, medo. Aquele arrepio lançou as dúvidas e especulações para longe, levando-o de volta ao presente antes que percebesse.
Enfim, abriu a porta. Um quarto normal, aparentemente (claro, com metal em tudo que era canto). Com isso confirmado, adentrou o local, incapaz de não notar uma estranha sensação.
Hum!? Parecia ter atravessado uma camada fina de plástico, como quando se trombava o rosto numa teia de aranha. O rosto inteiro coçou, inevitavelmente.
— Quê isso? Uma… barreira? Parece bem fraca.
Ele tocou com o indicador, vendo o próprio ar dobrar levemente ao fazer, revelando aquela fina e imaculada parede invisível. Se uma mosca estivesse por ali, será que também passaria? Na verdade, a tal barreira não parecia ter “furado” ou se danificado após atravessá-la.
!! Ele percebeu! Estava se distraindo de novo! — Sem enrolação! Hora de investigar essa budega!!
Paredes de metal, nada em especial, o que se destacava mesmo eram os móveis espalhados ali. Poltrona, televisão, rádio, um baú com brinquedos transbordando, etc. O chão se decorava, em suma, com um carpete vermelho bem agradável, sendo que um pequeno canto havia um jogo de Amarelinha colorido infantilmente.
— Não devia ter uma criança aqui? — especulou, procurando a citada.
Entretanto, ao invés de um morador, o que encontrara foi uma segunda porta, divergente de qualquer outra que havia visto até então. Não parecia um elevador, na verdade, era literalmente uma porta dupla feita de madeira escura, destoando e MUITO do ambiente branco.
Poderia ser o quarto “verdadeiro” do morador daquele recinto, e foi com esse exato pensamento que Hector arrombou aquela porta com suas mãos. Porém…
— Isso…!! Ma-Mas… que desgraça é essa!? Isso é realmente… o subterrâneo?
Céu, aquele era definiticerteiramente o céu. Ao longe, estrelas se tornavam visíveis, e até mesmo uma lua minguante se fazia presente. Mas isso era o de menos, pois o que realmente impressionava era a paisagem abaixo dessa vastidão azul.
Montanhas, planícies de gelo, desertos, taigas, tundras!! Vários tipos diferentes de biomas, coexistindo um ao lado do outro em quadrantes impecáveis. Se fosse dar um nome para aquela visão, seria…
— Uma Maravilha de Natureza.
Sem dúvidas! Mesmo com aquele semblante inóspito de gratificação, uma curta apreciação não poderia lhe fazer mal. Ele se perguntou a razão de tanta falta de surpresa, e novamente culpou sua habilidade desconhecida (no fundo, xingava Yellow).
Ainda infeliz pela falta de respostas, deixou aquela distração de lado e fechou a porta. O ar fresco foi cortado, e o odor metálico invadiu seu corpo de novo. Intoxicado. Seu sangue já devia estar entupido com ferro à essa altura.
“Não tem nada nessa área. Talvez eu consiga algo se conseguir pegar o elevador e descer mais fundo!”
Parecia uma boa ideia, ótima, na verdade. Porém, sua mente talvez tivesse sofrido uma leitura, e um oposto ao seu plano surgiu de repente no caminho.
Quando alcançou e abriu a porta para sair do quarto, uma aura intensa acertou todo o “ser” de Hector. Paralisou! Algo que nunca havia sentido em toda a sua vida, nem quando era Yellow o encarando.
“Isso vem das fissuras!?? Não! É mais forte! É como se juntassem uns três daquela coisa enorme que me encarou no começo!!”
Ele procurou pela sala, com o pescoço travando em cada centímetro. O tempo ficou mais lento ou era impressão? Apenas tinha a certeza de que não era o SEU Fator B atuando, então o que era??
Grurrrg! Não foi ele que encontrou a resposta, foi totalmente o oposto.
Há quanto tempo ele estava ali? Desde o começo? Não tinha como saber, apenas se colocava lá, de cabeça para baixo, tal como um morcego.
Nenhuma parte notável do corpo era visível, tornando-o visualmente em uma elipse negra. Como era possível saber sua orientação? Simples, os olhos, grandes e completamente vermelhos. A forma destes não era humana ou animalesca, era algo novo. Alongados, abertos e firmes, um triângulo retângulo bem curioso, inicialmente.
Lá ele observava, completamente estático, até um mínimo movimento lhe desse uma razão para se mover.
“MAS QUE CRIATURA É ESSA!??
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