A Mansão de Alamut Brasileira

Autor(a): Safe_Project


Volume 2 – Arco 3: Dia do Tarche

Relatório 27: O Primeiro Encontro

                                                                                                    

Em lugar desconhecido

                                                                                                    

Dentro da grande sala, a pouca luz que afastava a escuridão provinha de várias telas logo à frente do rapaz sentado na poltrona. Aproveitava o chão de praticamente todos os ângulos possíveis, e ao mesmo tempo  que o filme de ação rodava ao vivo, saboreava uma pipoca com manteiga.

Infelizmente sua sessão tranquila foi interrompida. O rapaz ao seu lado analisava as mesmas telas com uma apreensão que estava longe de atingir o outro.

— Líder… a gente devia mesmo deixar as coisas correrem dessa forma? Acho que devíamos pedir reforços.

— Tá tranquilo! — Encheu a boca com pipoca. — Vai dar tudo certo… Provavelmente.

Se-Senhor!? O rapaz apoiou a mão na poltrona e fitou o rosto despreocupado do líder. Por mais que seus sussurros soassem cômicos como sempre, aquela não era uma situação onde ele brincaria daquela maneira.

O líder ajeitou o cabelo loiro e complementou: — O investimento na Barreira foi realmente muito bom. Graças a isso, nenhum civil vai perceber o caos que está acontecendo enquanto o sistema permanecer intacto.

— Eu entendo que é bem protegido, tem o cão de guarda e tudo mais, mas será tem certeza de que é seguro colocar tanta confiança na ideia de que nada vai acontecer?

Hahahaha! Bem, nada é garantido. Estamos lidando com um herdeiro de um Fator B de séculos atrás, então vai saber do que ele é capaz de fazer. — Encheu a boca uma segunda vez. Ao engolir, um sorriso empolgado brotou. — Além disso, eu tenho a leve sensação de um “fator” desconhecido se escondendo no meio da multidão… o que será que é?

Seu olhar ficou ainda mais fixo nas telas, obrigando que seu acompanhante fizesse o mesmo.

Pelas câmeras aéreas, o desenrolar da situação era transmitido para uma grande quantidade de pessoas aliados ao líder. No entanto, a visão era totalmente diferente para alguém mais próximo de todo o caos.

 

***

 

                                                                                                    

Praça do Escudo de Bronze

                                                                                                    

“Onde? Eu não enxergo nenhum dos dois? E o que foi aquele estrondo de agora pouco? Será que eu devia me preocupar? Argh! É tanta coisa pra pensar!!”

Romanov procurava incessantemente ao seu redor. Com visão privilegiada, era capaz de observar a praça de uma ponta à outra, só não ultrapassando as barreiras criadas pelas barracas em alguns pontos.

Xeps… Alpina… Onde os dois haviam se metido!!? Mesmo para dois inimigos jurados dentro da organização, não era do feitio de nenhum dos dois esquecer de fazer o contato contínuo.

“Será que eu deveria procurá-los? Não… O plano era para ficarmos em posição independente do que acontecesse. Não acho que o líder conseguiria livrar minha barra dessa vez.”

Procurou, mais veloz. Com um toque no peito, o brilho de seu colar transmitiu o mesmo tom amarelado aos seus olhos.

“Nada! Eles realmente não estão na praça, ou será que esconderam a energia dos colares? Porra! É nisso que dá não compartilhar informações, XEPS!!”

Seus punhos fecharam de repente, levando socos fantasmas até o rosto do General, por mais longínquo que pudesse estar. Ignorar ordens era uma coisa, mas fazer isso por um motivo tão banal quanto…!

Aff~! Seu suspiro fora confortado por uma mão alheia alisando sua cabeça. Uma boa sensação, deveria dizer. Quanto tempo fazia que não experimentava tal? Não era apenas sobre si que tinha essa dúvida, e essa lembrança reergueu seu ânimo.

“Não posso me abalar! O Informante vai chegar a qualquer instante, e assim que o encontrar é só guiá-lo até o QG! Eliminar essas pessoas é apenas parte do plano… Sim! É necessário! Necessário!!”

Outro suspiro, acompanhado agora do fechar de seus olhos. O barulho ao redor diminuiu gradativamente, as vozes, os tambores… retomando o silêncio mais que memorável do campo cinzento. O cheiro de carne fresca substituído pelo de metal. Carvão. Um ambiente quente, mas que de maneira alguma aquecia os nele presentes.

“É necessário! Tudo…. Tudo pela Frieda!!” Abriu os olhos novamente, no momento mais que perfeito.

Andando desesperada entre as pessoas estava uma garota ligeiramente familiar. Vestido azul combinando com os olhos, longos cabelos negros e uma beleza que mesmo a pressa no semblante era incapaz de destruir.

“É aquela médica. Hum É uma boa oportunidade para tentar capturá-la, mas já tenho coisas demais pra me preocupar.”

Desviou sua atenção para os arredores outra vez, mas foi inevitavelmente atraído de volta ao notar a rápida movimentação da garota.

“Ela está vindo pra cá? O que essa doida está pensando!? Merda… Eu preciso me esconder…!!”

— IGOR!! — Seu grito estridente ensurdeceu aqueles ao lado. — Finalmente te encontrei!

Tendo que ficar na ponta dos pés, sua mão caiu sobre o largo ombro do colega. Uma pequena perna se afastou. Com dificuldade, Albert lhe encarou por debaixo do grande chapéu de cervo.

Yo! Lívia! Hum? O que aconteceu? Tá suando que nem um cavalo.

— Igor! A gente tem que sair daqui! Lagarto! A Rose é um…!

— UEPA! Calma aê!! — Tapou a boca da garota com a mão. — Olha, não sei onde você comprou esse bagulho, mas sendo uma médica, acho que não devia ficar brisada não, ein. Vai pegar mal pra sua imagem.

Ela estapeou o braço musculoso. A exata mesma sensação de bater numa parede, a diferença era que essa se moveu por conta, quase que para agradar.

— Não é hora pra besteira!! A gente tem que dar o fora daqui e ir pra algum bem longe!!

Seus braços finos envolveram o tronco de baobá que era o do colega. Com todos os 62 Kg de seu corpo, se assemelhava com uma formiga tentando mover um ônibus. Sério! Era tão desproporcional que algumas pessoas chegaram a rir da cena.

O atleta não se importou, usando do braço livre para segurar Albert e impedir a queda do pequeno já desequilibrado.

— Vamos nos sentar em algum lugar. Acho que você tá precisando descansar.

Ela negou. — Temos que sair daqui!! Você é surdo ou o quê?? Tem a mínima noção do que eu acabei de passar!! Eu literalmente quase tive minha cabeça arrancada por uma besta que parecia a porra de um DINOSSAURO!!!

Pela primeira vez, o grande corpo do moreno recuou, abalado pela ventania gerada por aqueles gritos. Ela continuou:

— Eu já sabia que tinha algo estranho nessa cidade, mas eu desisto de descobrir!! Que se foda qualquer conspiração! Eu só quero me sentir segura de novo! Exatamente como antes do Hector me pedir pra investigar aquela merda de flor roxa!!

“FLO-FLOR ROXA?”

Para o inquietante azar da médica, suas palavras alcançaram os piores ouvidos possíveis. Aquele par de olhos arregalados caiu sobre si, conectando no alvo uma linha que fez seus pelos arrepiarem da cabeça aos pés.

“Flor Roxa…!? Ela… Ela investigou!? Não, ela disse que Hector quem pediu, mas…” Romanov baixou a cabeça, abafando o ranger de seus dentes e escondendo o franzir de todo o rosto. “Uma pessoa que parece um réptil!? Eu me lembro de ter ouvido isso!”

Não tardou para que o termo viesse à mente. Contenção! Era disso que Xeps falava! Assim como o líder havia lhe dito certa vez:

A Contenção é uma equipe especial da organização, não usamos ela muitas vezes por que os agentes são um pouco… sangue frio! Kahahaha!

O senso de humor estranho, se não fosse por isso já teria entendido tudo no momento que Xeps comentasse! De um jeito ou de outro, o que importava agora era a tão esperada captação da mensagem, e em sequência, a reestruturação de todo o plano.

“A garota não fugiria da Contenção sozinha, ela com certeza teve ajuda. Então… se está aqui, eu devo considerar que Xeps ou Alpina encontraram os alvos!” Sua atenção retornou à garota, e outro arrepio ela sentiu. “Será que eu me intrometo? Se eu apenas fizer um movimento discreto, posso tornar num acidente…”

Seus punhos cerraram. Na ponta do cordão vermelho ao redor do pescoço, pendendo para fora da camisa, o losango dourada brilhava, hesitante.

“Vamos lá, Romanov!! Eu já fiz isso várias vezes, não é agora que vou estragar tudo!”

Decidido, o brilho dourado aumentou. Do bolso esquerdo da roupa que vestia, retirou um alfinete. Com uma encarada, confirmou para si mesmo: Cabeça verde. Exceto por uma ligeira extremidade do item, uma estrutura nova se criou.

Ganhando massa e tonalidade diferente, o prateado escureceu e, ao mesmo tempo, listrou-se em amarelo. Um par de folhas transparentes brotou, assim como uma infinidade de lentes e pequenos pelos, além de duas protuberância em forma de antena, que guiariam a arma viva ao alvo certo.

“Uma ferroada! Apenas uma ferroada dessa abelha deve bastar! VAMOS LÁ!!”

Ele ordenou com uma simples encarada, o suficiente para o inseto levantar o voo e começar a zumbir na direção de sua vítima. Fossem pessoas, ventania, poderia até mesmo começar a chover, nada seria capaz de interromper o míssil em miniatura.

— Vamos logo!! Eu tenho uma péssima sensação desse lugar!! — insistiu ela, mas era inútil.

Os olhos de Igor não mostravam alegria, tristeza, sequer pena. Eram vazios, isentos de qualquer luz, mesmo as do festival, que deveriam estar sendo refletidas. Ao invés disso, escuridão tomava conta de sua íris.

“Por quê!? Ele não se move nem mesmo um centímetro!!” Ao invés de puxar, Lívia agora tentava apenas se livrar da mão que agora lhe segurava.

O bombado nem se mexia mais, tornara-se numa estátua de pedra.

Bzzz! O zumbido irritante não merecia sua atenção neste momento. Quem dera tivesse recebido.

Sentiu algo pousar em seu pescoço. Incômodo. Um rápido reflexo de estapear a área surgiu, mas o alvo continuou sendo o braço do colega.

— ME-ME SOLTA… IGOR!!

Seu grito atraiu a atenção dos civis. Simultaneamente, pensamentos apressados do autor das ações quase sobrepujavam os tambores.

"Morra! Morra! DEPRESSA, MORRA!!"

S          L          A          P!

Então, um tapa cessou com todo e qualquer som. Antes fosse em seu rosto, lamentava Romanov no fundo de seu coração ao conseguir processar aquela cena.

A mão que se pressionava contra o pescoço de Lívia — travando esta —, se retirou tão rápido quanto o cadáver da pequena abelha despencou em direção ao chão.

“MAS QUE…!! DROGA! EU TENHO QUE SAIR!! TENHO QUE EVACUAR IMEDIATAMENTE!!”

Romanov se contorceu onde estava, à todo custo buscando se livrar da mão que lhe prendia. Falhou. E esse resultado gerou um sorriso, não em seu rosto, muito menos no de qualquer um que visse a situação.

Ainda que parcialmente cegada pelas luzes e ensurdecida pela música, Lívia viu o anjo — se é que alguém conseguisse chamá-lo assim — surgir, um cujas cores e voz sobressaía qualquer ruído e perturbação ao seu redor.

O largo sorriso arrogante e disfarçadamente enfurecido, o sobretudo fedido e os detalhes verdes que combinavam não apenas com a mecha de cabelo, como também com os olhos e a cartola que estava sempre em sua cabeça.

Os olhos azuis da médica brilharam, passeando pelo rosto do colega até pousarem no que sua mão direita apontava para quem menos esperaria.

— He-Hector!! O que você tá fazendo!!?

As pessoas se afastaram, imediatamente criando um círculo para cercar somente os envolvidos na cena.

Um homem adulto, de aparência e atitudes certamente duvidosas apontava sua arma não para o grande homem moreno à sua frente, mas para aquele que repousava em seu ombro.

Com o cano da arma beijando o centro de seu rosto, Albert travou tanto quanto Igor. Ao fitar o detetive, observou o par de esmeraldas cair sobre seu pequeno peito, onde repousava um pequeno losango dourado, cujo brilho decaiu imediatamente.

Gegege!! A risadinha cínica atormentou os ouvidos do pequeno prestidigitador, mas em nada se comparou com o ecoar da cansada e mais que determinada voz.

— Te achei, seu fudido!

 

 


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