A Mansão de Alamut Brasileira

Autor(a): Safe_Project


Volume 2 – Arco 3: Dia do Tarche

Relatório 23: Enrrascada

O Festival seguia alegre e comemorativo quanto nunca! A movimentação repentina dos helicópteros de vigilância até chamou a atenção dos civis, mas não demorou para que estes voltassem sua concentração para a comida e a música sem fim.

Talvez, apenas talvez, fosse por essa distração que um evento incomum passou despercebido. De uma parede vazia que elevava uma rua morro acima, uma protuberância emergiu num piscar de olhos!

Saímos!! Comemorou Lucas, que puxava Isaac e Lívia pelo braço. Diferente dos dois protegidos, seus braços e pernas estavam cobertos por mais daquelas marcas não identificáveis; das quais o sangue era capaz de escapar para banhar o resto do corpo.

— Lucas, a multidão, corre pra multidão!!

— Entendi! Não soltem a minha mão de jeito nenhum!!

Ao contrário do Isaac, Lívia se via sendo literalmente arrastada pela velocidade anormal do Homem Intangível.

— Eu sabia!! Tem algo muito errado com as pessoas, não! Tem alguma merda acontecendo nessa cidade inteira!!

Não deu um segundo para que o próprio mundo lhe desse uma afirmação. Do chão surgiu uma abertura aos pés dos três fugitivos, uma grande porta dupla que levava não aos dutos de esgoto, mas para uma paisagem cujo brilho impedia sua visualização.

De imediato, Isaac usou a pouca força que tinha para atirar Lívia fora do alcance da armadilha.

— Saia daqui o mais rápido possível! A gente se vira por aqui!!

A garota assentiu do jeito que podia, arremessada para fora do buraco.

Assim que os dois caíram, a porta fechou e desapareceu como fumaça. E agora de volta ao chão, Lívia continuou a correr, superando na força do puro desespero a tremulação de suas pernas.

“Igor, cadê você!?”

 

***

 

Enquanto ela procurava pelo colega, um outro que infelizmente desconhecia se encontrava nas proximidades.

De olhos vidrados mas que lentamente sucumbiam ao cansaço acumulado de incontáveis dias, Victor fitava todo o desenrolar da situação em um beco não muito distante das barracas.

“Eles se concentraram lá? Aquele era o Lucas? Não me diga que ele ainda tá com aquela ideia doida na cabeça!!”

Provavelmente.

— E você cala a boca.

Kehe! Tá falando bastante pra alguém à beira da morte. Você sabe que só tá vivo por causa de mim, né?  Sabe quantas vezes já morreu? Cerca de vinte e sete. —

— Incrível…

Parecendo um cadáver, o detetive se levantou. Uma, duas… levou cinco tentativas para que o ato se concretizasse. O corpo desidratado já não mais suava, o próprio sangue tinha de escorrer para que o exterior ficasse minimamente hidratado.

Mais uma vez! Ao seu chamado, uma descarga elétrica partida da cabeça percorreu todo o corpo.

E com essa são vinte e oito mortes. —

— O quê? Eu teria morrido por uma carga de vitalidade? — Massageou a testa franzida. — Urgh! Que se foda também, não é como se eu tivesse tempo pra pensar nisso.

Os passos de um homem revigorado ressoaram pelo beco, mas nada atraindo além do miado de gatos que passeavam por ali. O tamanho da determinação não importava hoje, pois nada além de inimigos iriam notá-lo.

De cabeça erguida e passos largos, o detetive se infiltrou entre os civis. Disfarce poderia não ser seu forte, mas desta vez sua nota era um zero absoluto!! Em meio aos fantasiados, sua roupa permanecia sendo o terno marrom de sempre, nem mesmo máscara vestia.

Ousadia ou apenas burrice? Era uma questão difícil.

“Se Lucas estiver ali, a situação fica completamente diferente!” Trombava nos outros sem parar, focado na localização dos helicópteros. “Se alguém como ele estiver aqui, então com certeza há perseguidores!”

Pela primeira vez, seu olhar passeou entre as pessoas mascaradas. Cada uma levava o olhar ao detetive por poucos milésimos de segundo, outras focavam por mais tempo, e poucas simplesmente não desviavam até serem encaradas de volta.

“O assassino está aqui! Eu sinto que está!!”

O punho que uma vez agarrou o citado alvo se cerrou. A doce sensação de missão cumprida tomou-lhe o coração, assim como os arrepios de pensar na possibilidade de ser notado primeiro. De longe, esta era uma possibilidade bem alta.

— Yellow, quantos inimigos estão por aqui?

Virei a internet por acaso? Eu só estou aqui para assistir esse filme de perto. Acha que pode mandar um Ok Yellow e eu vou te responder? —

Maldito! Gritou internamente, sabendo que a privacidade não existia nem ali, dentro de sua mente. Sem dúvidas tudo era um filme para ele, no caso, um filme interativo. O demônio tratou de continuar:

Eu literalmente só estou aqui pra ver todo mundo morrendo. Até mesmo eu preciso me entreter para não ficar mais louco. —

— Você não se importa com isso? Nunca perdeu ninguém importante para você?

Eu sou obrigado a ter? —

Uma curta dúvida permeou a mente do humano, rapidamente arremessada para escanteio quando um rosto familiar caiu em seu campo de visão.

Ao longe, perto do grande Escudo de Bronze, um grande homem musculoso parecia rezar para o monumento. Em seu ombro, uma criança procurava ao seu redor ansiosamente, travando ao encontrar o olhar de Victor.

“Aquele… é um dos colegas do Hector!! Será que ele também está aqui!?”

Iniciou uma procura imediatamente, mas frustrou-se ao encontrar apenas cabeças de cervo na multidão. Não importava o dia, a hora e muito menos o lugar, Hector não tiraria sua cartola por nada nesse mundo, então se não estava à vista, definitivamente não seria encontrado nestas bandas.

O investigador desanimou novamente, roendo a unha do polegar enquanto trocava a atenção entre os seus arredores e o rosto familiar que acabara de descobrir.

As tentativas de aproximação deram-se num fracasso atrás do outro, de maneira que parecia ter saído de um filme. Pessoas entravam na sua frente, outras o empurravam parecendo que eram cegas para não terem o visto e, por mais estranho que pudesse soar, alguns olhares estavam constantemente sobre si, olhos que não conseguia dizer onde estavam exatamente.

Saiam da frente!! Avançou com uma maior violência, mas uma curta pontada no pescoço trouxe um tapa instintivo até o mesmo local. Ao retirar a mão, encontrou uma abelha.

“O quê? De onde essa coisa surgiu?”

A voz ressoou: Vinte e nove.

O rapaz deu um salto para trás. Outra morte!? E por causa da porra da picada de uma abelha? O que havia virado, um bebê??

Por mais que o choque de adrenalina houvesse lhe dado a energia de um atleta de classe mundial, uma tontura repentina o atacou. Cambaleou de um lado para o outro, pressionando a própria cabeça enquanto tentava mirar o olhar que sentia grudado em si.

“Mas que bosta…! Desde quando abelhas são tão letais!?”

Obrigado a desistir de seu avanço em direção à Igor, ele se deixou levar pela correnteza de pessoas. Em poucos instantes, uma brecha na passeata deu-lhe a oportunidade de se embrenhar entre algumas das barracas de comida.

Suor quente escorria pelo rosto, e uma coceira estranha passou a incomodar no lugar que fora picado.

— Que merda — suspirou, coçando ainda mais. — Yellow, qual foi a da morte? Tá zoando com a minha cara?

Abaixe-se.

A mesma adrenalina de antes atingiu seu cérebro em cheio, fazendo o corpo saltar para o lado. Um mero instante depois, o som de pano rasgando foi a única coisa que ouviu em suas costas.

Numa rápida recuperação, levantou-se e fitou o causador do som. Ora, ora! A voz debochada sobressaía à todo o barulho do festival, da mesma forma que o brilho da lâmina dourada superava o de todas as outras.

Abrindo uma fenda na barraca, uma figura trajada de forma tão diferente quanto Victor surgiu. Uma mulher de farda camuflada, carregando não armas de fogo, muito menos cassetetes, e sim uma espada.

“Quem é essa mulher?”

Vai saber. Ah, e aquela ali foi a trigésima.

Colocando-se como barreira para a saída do rapaz, a soldada apontou sua arma na direção do detetive. A pele branca contrastava com a farda marrom nada conveniente para o festival, a franja curta deixava exibir um par de olhos castanhos, cintilantes ao brandir da lâmina.

— Mesmo depois de tantos dias ainda te resta energia pra desviar assim? Impressionante.

O êxtase em sua expressão atraia muito a atenção, mas não tanto quanto o item em seu pescoço. Um colar curioso, no mínimo, de cordão dourado que se mesclava com detalhes vermelhos ao se aproximar do item pendente sobre os seios de sua portadora.

Um coração de ouro? Ele ajeitou a postura o máximo que conseguiu, estufando o peito e dando passos para trás.

— Carregar armas cortantes dessa forma vai contra as leis, moça…

— Engraçadinho. Para ter tanta disposição depois de tanta perseguição, deve ter feito um pacto e tanto com algum demônio.

Quem dera, pensou ele, um pacto ainda o garantiria algum tipo de vantagem. No momento ele só estava a mercê do interesse do demônio em questão.

— Pelo jeito que fala, então você conhece o do olho amarelo.

Ela deu uma curta risada, a animação crescendo.

— Seria estranho se eu falasse que não. Na verdade, eu fiz questão de encontrar primeiro só para colocar algumas teorias à prova…

Graças às luzes do festival, a mudança na lâmina foi notória. O brilho refletido pelo dourado esvaiu-se lentamente, reduzido à uma fraca reflexão que o preto avermelhado era capaz de gerar.

— Todos vivem falando do quão perigoso Dr. Yellow é, mas eu pessoalmente nunca vi ele em ação, então estou aqui para testar. — Alpina aumentou o sorriso e estreitou o olhar, quase que clamando para que a batalha começasse. — Vamos comparar! O poder de um demônio secular contra a tecnologia moderna!!

 

 


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