Volume 1
Capítulo 3: Um convite para o caos
Depois que a aula da tarde terminou, Raishin e Yaya deixaram a sala de aula.
Com Sigmund descansando sobre sua cabeça, Charl os assistia por uma janela no corredor.
O sol estava se pondo, e começava a escurecer do lado de fora.
Enquanto o crepúsculo descia, Raishin encontrou-se com Félix, e os dois atravessaram o jardim da frente.
As costas de Felix lentamente desapareciam devido à distância. Charl sentiu um calor por todo o seu corpo, ao mesmo tempo em que seu peito doía. Vê-los sair trouxe uma sensação insuportável.
— Você está interessada?
Sigmund lhe fez uma pergunta afiada.
— Na- na- na- na- não estou. Não diga essas coisas idi- idiotas.
— Você não tem que esconder isso. Ele realmente é um garoto interessante.
— E- e- ele não é interessante nem nada. Eu irei te alimentar com ervilhas a partir de agora.
— Eu não me refiro ao Felix. Estava falando do Raishin.
— Eh — Enquanto corava, Charl ponderava sobre as palavras de Sigmund.
— ... Sério? Ele não é só um pervertido insolente comum?
— Lembra-se. Na cafeteria ele perguntou sobre como eu estava me sentindo.
— E o que tem isso?
— Isso quer dizer que ele me trata como um igual.
— ...
— Pode ser por causa do autômato que ele mesmo possui, mas ele não trata outros autômatos como meras marionetes. Normalmente, ele não deveria ter se dirigido a mim, mas perguntado a você ‘qual a condição da sua marionete?’.
Agora que ele mencionava, era realmente estranho.
— Durante a aula de Física das Máquinas, seu autômato o agarrou pelo pescoço, correto?
— Você quer dizer durante a sua briga de casal?
— Ele estava sendo estrangulado. Os outros estudantes estavam rindo dele. Provavelmente porque pensaram que ele não fosse capaz de controlar bem o seu próprio autômato.
Charl repentinamente percebeu isso.
Sigmund estava certo. Aquele cenário não era possível, e ela sabia disso. Mesmo que ele fosse um pouco áspero por fora, ele ainda era um excelente marionetista— cheio de uma poderosa energia mágica.
Se ele quisesse, poderia ter parado Yaya a qualquer momento.
— Isso é o que eu acho — Ele é uma espécie de pessoa bastante sentimental.
Sigmund deu uma pequena risada enquanto falava.
Ele estava zombando de Raishin, mas era claro que tinha uma boa impressão dele. Era possível que Sigmund estivesse ele mesmo interessado em Raishin.
— Não acha que vocês dois se dão muito bem?
— ... Não há nenhuma maneira disso ser possível com aquele pervertido. Além disso, eu sou uma realista. Não me misturo com tolos sentimentais.
— Você é uma realista?
— ... Você está rindo?
— Não. Entretanto, deixe-me te fazer uma pergunta.
A voz de Sigmund tornou-se severa.
— Ele já ajudou você duas vezes. Primeiro quando ele ajudou você durante a luta, e a segunda quando ele a deixou ir. Se você tiver que enfrentá-lo em batalha, você terá a determinação para derrotá-lo?
Houve um breve silêncio.
Finalmente, após deliberar sobre uma questão tão séria, ela levantou a cabeça com firmeza.
— Eu sou Charlotte Belew, da nobre casa Belew, a quem a própria rainha concedeu o brasão de armas e conferiu as propriedades do Norte.
Havia orgulho em sua poderosa declaração.
— Eu irei eliminar qualquer um que fique no meu caminho, não importa quem seja.
— ... Não importa quem seja?
— Isso mesmo. Não importa quem seja.
Ela apertou firmemente o punho.
— Mesmo que eu tenha que sujar minhas mãos com sangue, há um sonho que eu preciso realizar a qualquer custo.
Outra vez, ela olhou pela janela.
O crepúsculo havia descido, e a figura de Felix desaparecido.
Raishin foi levado a um lugar reservado para uso exclusivo do Comitê Disciplinar.
Era uma área localizada no segundo andar do auditório central. Havia três cômodos no total: o gabinete do presidente, uma área de descanso e a sala de reuniões. Embora fosse uma simples reunião de alunos voluntários, o Comitê Disciplinar era um órgão importante, encarregado de defender a moral pública da Academia—Assim, eles eram favorecidos em razão disso.
Abrindo a porta do escritório, Felix os conduziu para dentro.
— Sente-se no sofá. Eu irei preparar um pouco de chá para nós.
— Ah, por favor, deixe que a Yaya cuide disso.
Felix virou-se na direção de Raishin, para confirmar se aquela era mesmo sua intenção.
— Se ela diz que irá fazer, pode deixar com ela. Eu posso garantir que ela é muito habilidosa.
— Então tudo bem, por favor.
Entregando-a o jogo de chá, ele instruiu Yaya sobre onde conseguir água quente. Depois de ter sido elogiada por Raishin, Yaya estava de bom humor e deixou a sala com entusiasmo.
Felix sentou-se diante de Raishin, com um sorriso no rosto.
— Em primeiro lugar, permita-me lhe dar as boas vindas. Devo assumir que você está aqui porque está interessado em minha proposta?
— Sim. Se você está me oferecendo uma Qualificação de Entrada, então não posso me dar ao luxo de recusar sua oferta.
— Portanto, em outras palavras, a minha estratégia foi um sucesso.
Ele riu em tom de brincadeira. Raishin estava começando a ficar cansado de ver o sorriso sincero em seu rosto bonito.
(As verdadeiras intenções desse cara são difíceis de se ler...)
Enquanto pensava que ele era uma pessoa difícil de se lidar, Raishin levava a conversa adiante.
— Então, de quem é a Qualificação de Entrada que você está me dando? Suponho que não seja a sua?
— Se resolvermos o problema que tenho em mãos, minha Qualificação de Entrada não é nada além de um pequeno preço a se pagar —
Um deslumbrante sorriso irradiava de seu rosto, o que fazia parecer que havia estrelas o iluminando ao fundo.
Quase imediatamente depois, as luzes desapareceram quando ele deu de ombros.
— É algo que não posso dizer. Eu tenho algum apego à obtenção do trono de Wiseman.
— Escutar isso é um alívio. Ao menos eu sei que você está sendo sincero sobre isso.
— Sua Qualificação de Entrada será patrocinada pelo Comitê Executivo da Festa Noturna. Uma vez que o Comitê Disciplinar concorda com isso, podemos enviar um encaminhamento ao Comitê Executivo, aprovando sua participação. Embora, para ser franco, mesmo sem a nossa aprovação —caso você cuide desse incidente, você se tornaria alguém tão grande que o Comitê Executivo não seria capaz de ignorar sua existência.
Seu discurso soou mais como uma previsão. Seu pedido era algo desagradável? Ele estava ficando cada vez mais desconfiado, mas, por outro lado, ficava também cada vez mais interessado, então ele perguntou.
— O que eu teria que fazer?
— Nós queremos que você derrote um marionetista.
Era uma resposta desapontadora. Ou melhor, mais do que desapontado, ele perguntou-se se Felix estava falando sério.
Derrotar um marionetista — Algo assim já era necessário, mesmo que isso não fosse dito, ele já teria que fazê-lo de qualquer maneira. O Comitê Disciplinar estava designando um alvo específico? No entanto, no que diz respeito à admissibilidade desta ação...
Enquanto ele estava imerso em seus pensamentos, Yaya retornou com o chá.
Desconfiada ao ver os dois imersos em pensamentos profundos, Yaya colocou as xícaras sobre a mesa.
Felix pegou uma xícara e levou-a elegantemente aos lábios. Raishin perguntou impacientemente.
— Quem eu tenho que derrotar?
— Canibal Candy.
Não importava o quanto vasculhasse em sua mente, ele não conseguia se lembrar de alguém com este código de registro entre os participantes da Festa Noturna.
Felix girou sua xícara de chá e falou felizmente.
— Seu autômato é mesmo hábil. O chá ainda mantém seu sabor aromático.
— Canibal—Quem é esse?
— Sabe, nessa Academia há pessoas que desaparecem todos os anos.
Não parecia que ele estava fugindo da pergunta. Raishin esperou em silêncio até que ele prosseguisse.
— A maioria desiste por conta própria. O currículo da Academia não é exatamente fácil, e pessoas que não conseguem acompanhar as aulas estão fadadas a, eventualmente, caírem no esquecimento. Além disso, as mensalidades daqui não são baratas. Existem inúmeras razões para querer sair.
— Eu não entendo. Se eles querem sair, basta entregarem um aviso de rescisão —
No meio do caminho, ele fechou a boca. Mesmo Raishin sabia a razão pela qual eles não entregaram uma rescisão.
— Exatamente. Devido a circunstâncias atenuantes, há alguns que não puderam enviar os pedidos de rescisão.
Como era a principal instituição do mundo mágico, era extremamente difícil de entrar na Academia. Aqueles que tinham cérebro e recursos podiam entrar por conta própria, mas aqueles que não os tinham precisavam encontrar patrocinadores que bancassem sua entrada.
Os exércitos de diferentes países, vários conglomerados, organizações religiosas e sindicatos provinham o capital financeiro necessário.
Deixar a escola no meio do caminho era como uma traição aos olhos dos patrocinadores.
Não apenas eles teriam que pagar o empréstimo, mas também uma indenização, bem como uma taxa por quebra de contrato —
No pior cenário, suas vidas estariam perdidas.
— Aqueles desse grupo que desistem, não tem outra escolha a não ser entrar na clandestinidade. Alguns também acabam manchando as mãos com crimes de magia herege. Existe uma grande demanda por alunos da Academia — e é claro que essa demanda não para apenas nos lugares iluminados pelo sol. Morbidamente ao contrário, os alunos da Academia ainda possuem valor mesmo que estejam mortos.
— ... Parece correto.
Raishin mesmo havia sido parte de um clã que desempenhava um trabalho tão sujo quanto.
— No entanto, desta vez as coisas são um pouco diferentes.
O tom de sua voz mudou. Felix continuou de forma excepcionalmente séria.
— Desde Outubro passado, que marcou o início do período escolar, ocorreram 26 desaparecimentos – Esses números são claros. Contudo, não é apenas isso. Nós também tivemos 12 casos em que descobrimos que os autômatos foram destruídos.
— Destruídos?
— Sim. Se fosse um simples caso de fuga, não haveria necessidade de destruir o seu próprio autômato.
Um autômato é o tesouro de um marionetista. Não apenas era a ferramenta de trabalho, mas se não houvesse mais necessidade de usá-lo por mais tempo, ele poderia vendê-lo.
Não havia qualquer razão para destruí-lo.
Se esse é o caso, então — Alguém está atacando-os — Há uma grande chance de esse ser o caso.
— Espere um pouco... Você o deixou se safar com isso até agora?
— Obviamente, não ficamos parados sem fazer nada. Nestes poucos meses, temos contado com a ajuda da segurança do campus e o número de patrulhas aumentou. É claro que também o temos caçado por nossa própria conta.
— E os resultados?
— Absolutamente nenhum. Nós conseguimos depoimentos de testemunhas oculares, mas havia muitas partes exageradas e isso se tornou uma lenda urbana nos arredores da cidade. É como se fosse um segundo Jack, o Estripador. Para ser exato, o que a Academia chama de Canibal Candy, parece possuir um desejo diferente para os autômatos.
— Desejo... Você diz?
O corpo de Yaya endureceu visivelmente. Para uma autômata feminina, a ideia de ser pega e comida tinha um certo tom que a tornava assustadora.
Felix abaixou sua xícara, e falou com seu sorriso normal de volta ao rosto.
— Agora, então, tenho certeza que você entende o que estou tentando dizer. Canibal Candy é uma séria ameaça para a Academia — alguém tem que derrotá-lo de qualquer jeito. Um adversário que irá elevar muito o seu perfil, caso você o derrote.
— Por que você está pedindo que eu faça isso?
— Existem duas razões. A primeira é que não há chances de que você seja o Canibal Candy.
— O que te faz ter tanta certeza?
— Todos os estudantes e professores são suspeitos. Até mesmo eu. Mas você é diferente. Você só chegou há Academia alguns dias atrás.
— ... E a segunda razão?
— Você é forte o bastante.
Era uma afirmação feita sem qualquer bajulação por trás. Ele disse com sinceridade real.
— A força do inimigo é equivalente a de um membro dos Rounds. Enviar alguém ordinário para caçá-lo apenas resultaria no predador virando à presa.
— Por que eu deveria levar suas palavras a sério? Eu sou apenas o Penúltimo depois de tudo.
— Você gosta de se colocar para baixo, não gosta?
Felix riu ironicamente.
— Mesmo em desvantagem numérica, você foi capaz de derrotar vários alunos. Você sabia disso? Os alunos que você derrotou estavam todos se aproximando dos cem primeiros lugares. Nós os chamamos de Benchwarmers. Sua verdadeira força não é algo para se desprezar.
— Mas a diferença entre os Rounds e eles é como a distância entre o céu e a Terra. Eu estou mirando o trono de Wiseman — ganhar deles não tem nenhum significado. Além disso,
Os lábios de Raishin torceram-se quando ele falou com sarcasmo.
— O que você está realmente tentando dizer é ‘Eu vou te dar uma Qualificação de Entrada, então pare de causar mais problemas por aí.’, não é?
— Correto.
Felix nem sequer hesitou.
— A menos que você destrua propriedade da Academia ou prejudique um espectador, nós não podemos interferir nas batalhas dos alunos — embora tenha dito isso, da perspectiva de alguém que tem como obrigação a defesa da moral pública, eu não posso apenas assistir em silêncio enquanto você testa o seu poder nas outras pessoas.
— Então você está atirando uma isca para domesticar um animal selvagem.
— Eu prefiro chamar de uma troca justa. Afinal, isso não é desvantagem para você de qualquer modo.
Desta vez, foi Raishin que riu ironicamente.
A fim de controlar o seu temperamento destrutivo, eles optaram por mandá-lo enfrentar o Canibal Candy. Se Raishin vencesse, então tudo terminaria bem. E se ele perdesse, não haveria qualquer perda para a moral pública. No fim, Felix era o único vencedor.
— Até este ponto, você tem alguma dúvida?
— A Festa Noturna tem cem participantes. Se for para eu ganhar uma Qualificação de Entrada —
— Obviamente, alguém terá que ser expulso. No entanto.
Felix ainda tinha um sorriso no rosto, mas ele falava como se estivesse casualmente descartando alguém.
— Nos duzentos anos em que a Festa Noturna foi realizada, nunca houve um caso em que o nonagésimos nonos ou os centésimos colocados tenham se tornado Wiseman. Mesmo que você forçasse alguém a sair, isso não afetaria muitas pessoas.
— Ele era mais — não, exatamente o sangue frio que Raishin pensara.
Em razão disso, Raishin sentiu que podia confiar nele.
Inesperadamente, tê-lo acompanhado parecia não ter sido uma má ideia... Assim que ele pensou isso,
— Felix!
— Sem nenhuma batida, alguém invadiu o escritório.
Com o cabelo, indo até altura dos ombros, que balançava dinamicamente, era uma garota de olhar inteligente atrás dos óculos. Ela tinha um ar aristocrático e aparentava ter tido uma excelente educação. No entanto, se comparada a Charl ou a Felix, era evidente que ela era mais simples que eles. Ela tinha uma braçadeira com a palavra Censura, e uma luva branca, o que significava sua participação na Festa Noturna.
Naquele instante, os cinco sentidos de Raishin gritaram que havia algo errado com ela.
... Entretanto, antes mesmo que pudesse confirmar que seus sentidos estavam formigando, o sentimento estranho desapareceu.
Percebendo que havia um visitante, a garota se deteve devido à surpresa. Seus movimentos rígidos a fizeram parecer uma boneca.
— deixe-me apresentá-la, Raishin. Esta é Liz, ela é praticamente o meu confiável cão de caça.
Recuperando os sentidos, a garota limpou a garganta.
— Perdoem a minha grosseria anterior. Eu sou a assistente do presidente, Lisette Norden.
— Akabane Raishin.
Felix continuou em tom provocante,
— Não é comum você estar tão agitada, Liz. O Canibal Candy apareceu ou algo assim?
— Sim.
Respondendo a sua piada com uma expressão séria, ela conseguiu tirar o sorriso de Felix.
Continuando na mesma forma séria, ela começou a fazer seu relatório de maneira eficiente.
— Uma marionete ‘devorada’ foi encontrada no bosque atrás do prédio de Vocações Técnicas. Parece ter sido ontem à noite.
Felix suspirou e, relutantemente, voltou-se para Raishin.
— Falando sobre um momento ruim... ou melhor, talvez eu deva dizer que foi em um tempo perfeito?
Encolhendo os ombros, ele bateu nos joelhos e se levantou.
— Vamos, Raishin. Hora de ir checar algumas sobras.
A primeira pessoa a notar a figura foi Yaya.
Eles estavam andando por uma pequena trilha que levava até o prédio de Vocações Técnicas. Enquanto caminhava em silêncio, Yaya repentinamente reagiu a alguma coisa e, como um gato em alerta máximo, ela olhou para algo a frente deles, desconfiada.
Dentro do bosque escuro por causa das árvores, uma multidão de estudantes começava a se reunir. Um pouco a frente deles, uma garota com um dragão na cabeça estava com uma expressão irritada no rosto.
— Olá Charl e Sigmund.
Raishin saudou-os com uma voz animada. ...Entretanto, os olhares que ela lançou em sua direção passaram direto por ele, indo se estabelecer em Felix, que estava atrás dele.
— Então, você também está aqui, Charl.
— Tinha uma comoção acontecendo, então...
Charl respondeu olhando para baixo.
Não me ignore, pensou Raishin. Mas ele não era tão infantil para verbalizar o pensamento.
Felix era o mesmo de sempre, com um sorriso amigável surgindo em seu rosto.
— Cheia de curiosidade ardente, como sempre. Ou eu deveria dizer que você tem orelhas afiadas?
— Na- não é como se isso fosse incomum. Canibal Candy ataca pessoas indiscriminadamente—mesmo para alguém como eu isso é arriscado. Não é algo que eu possa descartar como sendo problema de outra pessoa.
— Haha, acho que você está certa. Desculpe-me se a ofendi.
Felix passou por Charl e entrou no bosque com Liz as suas costas. Saudando os membros do Comitê Disciplinar que estavam de vigia, ele entrou no bosque.
Charl parecia desanimada após a saída de Felix. Parecia que ela estava se lamentando por ter dito algo desagradável.
Vendo sua atitude, mesmo alguém tão desinteressado em amor quanto Raishin, poderia dizer instintivamente.
— Você gosta dele, não gosta?
— O que—Eu—Você—
Ela ficou tão vermelha que era quase lamentável.
Ah, ela está corando.
Então ela podia fazer esse tipo de rosto, pensava Raishin enquanto ele se entregava a aquela linha de pensamento.
Charl agarrou-o pelo pescoço e sussurrou com raiva em seu ouvido, como se estivesse prestes a mordê-lo.
— Não fale sobre isso tão casualmente! Isso não é como essas emoções vulgares!
— Não há nada de vulgar nisso. Se apaixonar por alguém é um processo natural.
— Eu já disse para você ficar quieto! Ou você prefere que eu abra um novo buraco no seu peito?
— Desse jeito, Raishin.
Felix acenou para ele do outro lado da multidão. Charl apressadamente retirou suas mãos, cobrindo suas ações com um sorriso falso. Raishin decidiu não comentar, e caminhou em direção a Feliz, com Yaya, cujo humor estava repentinamente muito melhor, logo atrás.
Um pouco adiante no bosque, uma placa com as palavras ‘Fique longe’ havia sido pendurada. Os membros da Comissão Disciplinar reuniram-se na frente, para impedir os curiosos de incomodassem a cena.
Isto é quase como um caso de assassinado, pensou Raishin enquanto se abaixava para passar pela corda. Esse não estava totalmente errado, pois o que ele via diante de si mesmo era —
Um cadáver, por todos os intentos e propósitos.
Charl soltou um pequeno gemido. Raishin franziu a testa reflexivamente.
A metade superior do corpo havia sido separada da inferior.
A cavidade abdominal podia ser vista através da metade do corpo. Devido aos vários mecanismos internos que haviam sido construídos e alojados dentro dele, era como olhar para o interior do corpo de um ser humano. Olhar para as várias engrenagens e fios que saltavam do corpo era mais inquietante do que seria se fosse um ser humano de verdade.
A metade inferior de seu rosto havia sido esmagada, fazendo com que nada restasse de sua forma original. Algo semelhante a sangue estava espalhado por todo o corpo, fazendo parecer que alguma criatura havia se banqueteado com ele.
O detalhe mais o chamou a atenção, no entanto, era a curiosa ferida.
Um círculo perfeito havia sido feito no lugar em que deveria estar o coração.
A cicatriz era incrivelmente suave e precisa como se fosse um doce que derretera enquanto se lambia.
(Entendo, então é daí que vem a parte do Candy...)
Canibal por atacar os outros, e Candy por causa da cicatriz. Combinar as duas palavras era a forma perfeita de descrever suas características peculiares em uma única frase.
Raishin levou o punho até a mandíbula, imerso em pensamentos.
Ele já havia visto uma cicatriz parecida em outro lugar.
(Não poderia ser, mas...)
Lançando um olhar de relance para Yaya, ele viu que ela estava olhando para o corpo, o rosto um pouco pálido. — Parecia que ela estava um pouco assustada.
Raishin voltou a olhar para Felix, buscando a confirmação para algo que ele havia notado.
— O circuito mágico se foi, certo?
— Esta é sua marca registrada. Até agora, todas as vítimas tiveram seu coração—uma parte de seu circuito mágico removido sem falhas.
— Deixe-me adivinhar, quando você diz removida, você quer dizer que foram todas comidas, certo?
— Nós ainda não sabemos se é esse o caso. Ninguém realmente o pegou comento no ato até agora.
O ego de um autômato nasce do Coração de Eve. Enquanto o Coração de Eve estiver intacto, o autômato pode ser reconstruído. Sem mencionar os autômatos que se auto-reparam. Se você olhar isso de outra forma, então significa que, mesmo que o Coração de Eve tenha sido a única parte destruída, isso é o mesmo que dar uma sentença de morte para o autômato.
— ... De quem é esta marionete? O que aconteceu com o marionetista?
Quem respondeu não foi Felix, mas sim Lisette.
— Nós ainda estamos em processo de identificação do proprietário. No entanto, baseado nas informações que temos até o momento, acredito que este autômato é um portador da estrela da manhã— aquele contra quem você lutou e venceu ontem.
Ela provavelmente estava certa. Os pés do autômato destruído haviam sido amassados por uma bola de ferro que parecia familiar.
Entretanto — Aquilo não era um pouco estranho?
— Ei, Charl, o que você acha — Seus lábios estavam franzidos, seus ombros tremiam e seu olhar estava voltado para o espaço.
— O que há de errado com você?
Sem respondê-lo, ela virou-se, como se estivesse se preparando para ir a algum lugar.
Ela estava agindo de forma estranha. Raishin agarrou seu braço, tentando impedi-la.
— Ei. Espere.
— Saia. Tire suas mãos de mim neste instante!
— Você está planejando algo estranho, não está? Olha, agir de forma imprudente agora não vai te levar a lugar algum.
— Sigmund!
Houve uma transmissão de energia mágica. O pequeno dragão mostrou as presas e mordeu a mão de Raishin.
— Aaaaaaaaaaai!
Yaya correu em pânico até ele, agarrando sua mão com força.
— Mostre-me a ferida Raishin! Eu acho que está sangrando!
— Você só quer lambê-la! Vá ficar lá!
Enquanto os dois seguiam em sua rotina de palhaçadas, Charl desapareceu.
— ... Ela se foi.
— Ela é tão impulsiva quanto parece ser. Ter que se conter a irrita.
Felix interveio.
— Do mesmo modo, o meu sangue também está fervendo por causa disso.
Embora ele estivesse sorrindo como sempre—um brilho de aço irradiava de seus olhos.
— Você não irá me emprestar o seu poder, Raishin?
Ele olhou para Raishin. Seus olhos eram, normalmente, semicerrados, mas desta vez estavam completamente abertos. Pela primeira vez, Raishin notou que os olhos de Felix eram de um tom pálido de azul.
— Eu não acho que minha força seja tão grande para que eu possa emprestá-la aos outros...
Raishin parecia perturbado, então deu uma risada autodepreciativa.
— Mas devido as minhas circunstâncias, eu preciso daquela Qualificação de Entrada.
— Isso significa...?
— Deixe-me pensar nisso um pouco.
— É claro. Se vamos trabalhar juntos, eu prefiro faça isso por sua própria vontade.
Parecia uma previsão confiável. Provavelmente, Felix havia manobrado pelas costas de Raishin e estava segurando informações ou tenha entendido algo que ele não sabia.
— Vamos chamá-lo daqui a um dia, então. Tenho outros assuntos para tratar.
Com um ‘Estou ansioso por sua resposta favorável. ’, Felix retornou a cena do crime. A Academia era, em grande parte, autônoma, mas ainda estava sujeita a autoridade policial. Entretanto, se o crime não fosse tão grave quanto um assassinato, a polícia da cidade não iria interferir. Em vez disso, o Comitê Disciplinar levava nos ombros o fardo de ser a força policial da Academia.
Mesmo que ele fosse até lá para perturbá-los, nada de bom sairia disso. Raishin decidiu voltar para o dormitório.
Com Yaya atrás dele, ele fez seu caminho para longe da multidão de curiosos.
Saindo do bosque, ele começou o caminho de volta pela pequena passagem quando, de repente,
— Espere um pouco, Raishin Akabane.
Alguém o chamou por trás. Não era Felix, mas sim sua assistente, Lisette.
Rigidamente colocando seu rosto perto do dele, ela disse em seu ouvido.
— Tem algo sobre o que eu gostaria de conversar com você.
— É algo confidencial?
— Sim. Não é algo que eu possa discutir abertamente.
— Será que tem algo a ver com relações íntimas entre sexos opostos?
— Por favor, durma dizendo quando irá morrer. — Ah, eu cometi um erro. O que eu quis dizer foi — Por favor, morra.
— Onde exatamente está o erro nisso?
— Raishin...! Você fica excitado quando é insultado...!?
— E agora você está cometendo erros em vários níveis fundamentais, Yaya.
Raishin encarou Lisette com um olhar crítico.
Observando o seu corpo esguio e o olhar inteligente, ele finalmente falou:
— Yaya, vá na frente.
—Não! Yaya também vai junto!
— Não se preocupe, basta voltar para o dormitório. Não iria ser bom se não pudéssemos ter uma conversa rápida, certo?
Seu tom implicava que havia algo que ele queria que ela fizesse. Entendendo isso, Yaya concordou a contragosto.
— ... Entendido.
Os olhos de Yaya perderam a luz. Com uma voz monótona, ela continuou falando.
— Volte assim que puder... Antes do dormitório se transformar em escombros...
— Eu estou proibindo-a de fazer isso, ok? Não transforme o dormitório em escombros ou ruínas, entendeu?
Após observá-la ir, Raishin virou-se para encarar Lisette.
— Tudo bem então, vamos ouvi-lo. Este seu grande segredo.
Balançando a cabeça em concordância, Lisette assumiu a liderança e começou a andar na frente dele.
Até o momento em que Raishin voltou ao dormitório, uma hora havia se passado.
— Estou de volta. O quarto ainda está inteiro, Yaya?
Entrando cautelosamente na sala, Yaya correu até ele em prantos.
Agachando-se de repente, ela agarrou-se a cintura de Raishin.
Sem lhe dar nem uma palavra sobre o assunto, ela começou a abrir sua calça. Raishin bateu na cabeça dela, colocando um fim no ato de imprudência.
— O que há com você de repente? Ocorreu algum erro inesperado ou algo assim?
Implacável, Yaya continuou com seus olhos negros úmidos devido às lágrimas.
— Por favor, tire suas calças, Raishin! Nós podemos conversar depois disso!
— Você é algum tipo de ladrão de estrada!? E mesmo os ladrões de estrada dizem coisas menos censuráveis, sabia!?
— Só há uma maneira de saber se aquela megera fez alguma coisa. Eu terei que confirmar isso pelo cheiro!
— O inferno que você vai! O quanto deturpada é sua opinião sobre os outros?
Raishin vigorosamente empurrou Yaya, que havia se agarrado teimosamente a ele, para longe.
Yaya irrompeu em lágrimas, mas Raishin não estava com vontade de entrar no jogo dela, então a ignorou.
— Então, você conseguiu discutir as coisas com a Shouko?
— Uu, uu... Komurasaki enviou um recado de volta.
— Isso foi rápido. E?
Yaya fungou, enxugando os olhos, ela falou hesitante,
— Os militares do alto escalão emitiram um ‘Prossiga’ para o plano...
Para ser honesto, era inesperado. Raishin ficou em silêncio.
— Raishin... Você não está satisfeito com isso?
— Eu sou um cão do exército. Se eles me dizem para fazer isso, então eu tenho que... Embora,
Ele olhou na direção de Yaya para confirmação.
— Nós podemos confiar nele?
— Você está falando sobre o Felix?
— A coisa toda é suspeita. Ele disse que me seria concedido uma Qualificação de Entrada—eles tem até mesmo esse tipo de autoridade?
— Bem, de acordo com o que Komurasaki disse...
Yaya olhou para o teto, tentando se lembrar do que havia sido dito.
— No que diz respeito à família Kingsfort, eles possuem laços estreitos com o Departamento de Inteligência Britânico, e são membros influentes da Câmara dos Lordes. O chefe da família é o sir Walter. Após o falecimento tardio da Rainha, ele tornou-se um dos líderes do Grande Império Britânico, que possui um grande poder — Mesmo na Academia, este tipo de influência não pode ser ignorado.
Entendo, eles investigaram bastante em um espaço de tempo tão pequeno. Como esperado do exército. Naturalmente, eles haviam emitido o ‘Prossiga’ após uma cuidadosa análise.
Além disso, era exatamente como o próprio Felix havia dito. Mesmo sem o apoio do Comitê Disciplinar, se ele derrotasse o Canibal Candy, elevaria o seu status em um único golpe. O que significa que o Comitê Executivo da Festa Noturna não poderia apenas ignorá-lo.
Uma grande massa de estudantes se reunira no local do incidente mais cedo também. Mesmo sozinho, era claro o interesse que estava sendo construído sobre o incidente. Felix não estava mentindo.
Assim, em resumo — o problema estava em como ele iria fazer para derrotá-lo.
Ou melhor, a questão mais urgente era se ele realmente seria capaz de encontrar o Canibal Candy em primeiro lugar.
Se ele quisesse os detalhes mais precisos, teria que perguntar a Felix, mas se o Canibal Candy fosse alguém tão fácil de encontrar, os membros do Comitê Disciplinar (ou talvez a segurança do Campus) já o teriam capturado.
(Parece que eu terei que rastreá-lo... Eu consigo fazer isso antes do início da Festa Noturna?)
Perdido em um mar de pensamentos, ele foi atraído de volta a realidade por um som semelhante ao de um bater de asas.
Uma sombra de pássaro pousou no parapeito da janela e começou a bater no vidro.
Restringindo Yaya, que estava em alerta máximo, Raishin riu ao acolher o visitante.
— Yo, Sigmund. Será que a Charl o enviou até aqui em uma missão?
— Não, eu vim até aqui por minha própria vontade. Eu gostaria de me desculpar por antes.
Os olhos de Sigmund pousaram na mão de Raishin, na qual a marca de dentes ainda era claramente visível.
— Não se preocupe com isso. Em primeiro lugar, eu fui o único que tentou derrotá-los de qualquer forma — Espera aí, se você veio até aqui para se desculpar, onde está a Charl?
Naquele momento, Charl liberou energia mágica. Sigmund não tinha a intenção de mordê-lo; ele o fez devido à intenção de Charl.
Sigmund baixou sua pequena cabeça, suspirando em desculpa.
— Não pense mal dela. Normalmente ela não é o tipo de garota que usaria a força em mim.
— Ela provavelmente estava assustada. Nessas circunstâncias, mesmo um gato ou um cachorro teria mordido se fosse tocado.
— Um gato? Essa é uma perfeita descrição para ela.
Ele não sabia como ler a expressão de um dragão, mas podia jurar que Sigmund riu ironicamente.
— Charl é...
Era um assunto difícil de se falar. Eventualmente, Sigmund tomou sua decisão.
— Ela tem algumas circunstâncias únicas por trás dela. Ocasionalmente ela fica supersensível. Propensa a cometer erros. E ela nunca é honesta. No entanto, no fundo ela é uma garota amável e gentil, tem interesse em trabalhos manuais e é uma garota inocente.
Raishin duvidava de seus ouvidos. Trabalhos manuais? Trabalhos manuais queria dizer... Tricô e costura, certo?
Uau. Isso não combina nada com ela.
— Por que está me contando isso?
— Pergunto-me o mesmo. Acho que apenas quis contar a você, isso é tudo.
— O que isso deveria significar?
— Eu irei me retirar agora. Vejo você por aí, Raishin.
Sigmund arrancou do parapeito da janela. Seus leves e fáceis movimentos não se diferenciavam em nada dos de um pássaro. Quando estava em sua forma de pequeno dragão, parecia ser capaz de voar livremente sem o uso de energia mágica.
Observando a sombra desaparecer, Raishin se lembrou de sua discussão com Lisette.
— Eu me sinto um pouco desconfortável em dizer isso, mas — Mais cedo, dentro de uma sala de aula deserta, Lisette começou a falar hesitante.
— Por favor, tenha cuidado com a Charlotte.
— Por que?
— O Código de Registro dela é Tyrant Rex. Os estudantes a chamam de T-Rex—Você sabe o porquê?
— Não.
— Originalmente, esse nome não era usado para se referir a ela; era o apelido de seu autômato.
— Sigmund?
— Aquele autômato é uma bandoll.
Como esperado, Raishin ficou calado diante da revelação.
Bandoll. Escutar essa palavra sempre despertava lembranças desagradáveis dentro de Raishin.
— Há uma lenda transmitida de geração em geração na Família Belew. O primeiro líder da família Belew subiu uma montanha perigosa, na qual ele derrotou e domou o furioso dragão Sigmund, fazendo dele seu servo. Por seu sucesso, foi dado a ele o título de Visconde e, desde então, ele e seus descendentes tem lutado ao lado de Sigmund.
— Uma montanha perigosa, hum... Isso é meio clichê.
— Segundo as lendas, ele comeu pessoas, incendiou cidades e fez todas as maldades possíveis. Mesmo agora, ele precisa comer carne periodicamente para manter o seu corpo.
— Ele come frango.
Raishin disse em uma voz baixa, que mal podia ser ouvida. Ele já estava perdendo o interesse na conversa.
Em resumo, tudo o que ela disse não passava de boatos maliciosos, rumores ruins sobre Charl e Sigmund.
— Bandolls são existências amaldiçoadas; em termos de suas características, assim como as situações absurdas que eles criam.
— Esse não parece ser o caso.
— Coisas como beber sangue fresco, comer carne humana, apenas ser capazes de operarem durante a noite — ou desfrutar de massacres.
— Essa é uma forma muito indireta de se falar. O que, exatamente, você está tentando dizer?
— Você ainda não entendeu? O seu cérebro foi infestado por vermes?
— Você está tentando dizer que me odeia, certo? Você me odeia tanto quanto odiaria uma lagarta cabeluda?
— Chegamos à conclusão de que o Canibal Candy possa ser uma bandoll.
Ele se perguntou se era mesmo isso.
Por uma razão ou por outra, Raishin estava com um humor infeliz, de modo que desviou o olhar do rosto de Lisette.
— Você tem perguntas até agora?
— Sim, eu — Um ar frio violentamente tirou-o de seu devaneio.
Virando-se, ele notou Yaya olhando para ele, com olhos mais negros do que um eclipse solar.
— Raishin... você está pensando naquela megera, não está...
— ... Por que a sua intuição só é boa para coisas inúteis...
— Bem, então, o que você vai fazer amanhã?
— Iniciar a investigação. Agora que a situação chegou a este ponto, é hora de eu começar a caçar o Canibal Candy.
Rindo, Raishin balançou a cabeça enquanto ele mesmo se corrigia.
— É hora de nós começarmos a caçar o Canibal Candy. Está tudo bem, não é?
— Sim!
Uma energética Yaya levantou as mãos em apoio.
Depois disso, ela estreitou os olhos, desconfiada,
— Poderia ser... Você está interessado naquela megera...!?
— Ela realmente é alguém que não sabe como relaxar.
— ... Você vai ter que tirar as suas calças depois de tudo!
Cuidadosamente mantendo a distância entre os dois, eles terminaram em um impasse como se fossem uma cobra e uma fuinha que se enfrentavam.
Parece que esta também seria uma noite sem dormir.
Eram nove da noite. Dentro do escritório do presidente do Comitê Disciplinar, Felix havia espalhado diversos documentos sobre a mesa, e escrevia algo com uma expressão excepcionalmente séria.
Alguém bateu na porta duas vezes.
— Entre.
A pessoa que entrou foi Lisette. Felix sorriu para ela,
— Obrigado por todo o seu trabalho duro, Liz. Você tem assuntos a tratar comigo?
— Raishin Akabane nos contactou para dizer que oficialmente aceita nossa requisição.
— Isso é bom. Nesse caso, entregue isso a ele amanhã.
Ele a entregou o documento que acabara de terminar de escrever.
— O que é isso?
— É um contrato. Um assunto desta relevância deve ser tratado de forma cuidadosa e correta.
Os olhos de Lisette se arregalaram de surpresa. Passando o olho pelo documento, ela viu que o conteúdo era o mesmo que ela havia discutido com ele mais cedo. Se ele derrotasse o Canibal Candy, em seguida o Comitê Disciplinar iria apoiar seu impulso por uma vaga na Festa Noturna.
— Você já sabia que ele iria aceitar?
— Ele não tinha escolha a não ser aceitar. No mínimo, eu planejei de tal forma que ele gostaria de aceitar o pedido.
Felix respondeu, seu rosto mostrando que não achava estranho Raishin aceitar.
— Além disso, uma vez que se trata dele, eu tinha fé que ele aceitaria. É realmente uma sorte que ele tenha aparecido para nós neste momento — É quase como se fosse a divina providência.
— Você já sabia sobre ele?
— Não, essa foi a primeira vez que o encontrei. Mas eu já tinha algum conhecimento prévio.
Virando-se em sua cadeira, ele olhou pela janela.
— Você quer saber de algo interessante, Liz? No dia em que ele foi transferido, houve um acidente envolvendo a ferrovia na cidade.
— Acidente? Ah — você está se referindo ao descarrilamento, não é?
— Foi um pequeno e descartável artigo. Como havia apenas vinte pessoas com ferimentos leves, não havia sobre o que se escrever.
Ele estava falando de maneira indireta. Mas, mesmo assim, Lisette já podia adivinhar o que ele iria dizer.
— Poderia ser que ele estivesse naquele trem...?
— Sim. Ele estava a bordo. E também é possível que ele tenha sido o principal alvo do descarrilamento também.
Pensando nisso, uma simples coincidência era boa demais para ser verdade. Na verdade, era mais do que sorte ele estar a bordo daquele trem.
— No entanto, esse não é o problema. O que você acha que ele fez durante o acidente?
— ... O que ele fez?
— Ele parou o trem descontrolado. Com seu autômato.
— ...
— Para aqueles que anseiam entrar na Festa Noturna, seu autômato é o seu maior tesouro. Sinceramente, o cenário ideal é não permitir que ele sofra qualquer arranhão.
Um trem era, essencialmente, um pedaço enorme de matéria. Se um autômato fosse atropelado por ele, seria feito em pedaços.
— Entretanto, ele é diferente. Desafiando o risco de seu autômato ser destruído, ele parou o trem desgovernado — salvando a vida de muitos passageiros. Mesmo que ele pudesse ter escolhido fugir sozinho com seu autômato.
O rosto sorridente de Felix suavizou por um instante.
— Eu pensei comigo mesmo, se fosse ele, então ele iria me emprestar sua força.
Por um momento, um complicado olhar surgiu no rosto de Lisette, mas Felix pareceu não notar.
Deixando sua cadeira, ele caminhou até a janela, olhando para a escuridão da noite.
— Nós iremos derrotar o Canibal Candy sem falhas. Antes de a Festa Noturna começar, nós iremos expulsá-lo desta Academia, não importando que táticas desleais teremos que usar.
Contemplava o véu de escuridão que se abatia sobre o mundo exterior.
Hoje à noite, a terrível fera iria sair para jogar mais uma vez.
Na manhã seguinte, Raishin estava roncando na cama, quando foi despertado de seu sono pelo som de porcelana se quebrando.
— ... Yaya? O que você está fazendo logo pela manhã...
Lentamente, levantou-se e virou-se na direção do som.
Yaya estava de pé na entrada da sala. Ela tinha um copo de vidro em sua mão, e peças de um jarro de água estavam espalhadas aos seus pés.
Em pé, diante de Yaya, estava uma garota com um dragão no topo de sua cabeça.
Raishin esfregou os olhos por reflexo. No entanto, isso não parecia ser um sonho ou uma ilusão.
— ... O que você está fazendo aqui? Este é um dormitório masculino, sabia?
— Eu sei. Não me interrompa desnecessariamente.
— Tudo bem. Então, o que você quer?
Charl engoliu em seco e começou a agir de modo suspeito.
Ela olhou para sua direita, depois para a esquerda e, então, para a direita outra vez.
Respirando fundo para fortalecer a si mesma, ela finalmente conseguiu cuspir as palavras.
— Você iria...
— Eu iria?
— Você iria... em um encontro comigo?
Nesse momento, Yaya destruiu o copo que estava em sua mão.