Volume 1

Capítulo 48: O Alarde de um Relógio Parado

— Tire as mãos dela! — gritou Koza.

A criatura se atirou sobre as costas de um dos oradores que enrolava as correntes no carretel de madeira e forçava os membros de Celina a serem esticados ao máximo em direção opostas, provocando na garota a dor que fazia com que Tolson tremesse em frenesi e prazer diante de seus sete lacaios sobre o altar em meio aquela espécie de anfiteatro.

Com a velocidade e o seu próprio peso, Koza empurrou a nuca do homem desavisado ao carretel fazendo-lhe perder o equilíbrio. O anfíbio impulsionou-se com suas patas traseiras sobre o pescoço do orador e se atirou para o segundo homem. O primeiro se debruçou sobre o chão após o impacto enquanto o segundo se surpreendia com a pequena criatura voando em sua direção.

O segundo orador teve seu rosto tomado por Koza, ele pousou sobre a face do homem e grudou suas patas de forma ávida. O lacaio perdeu o seu senso de direção enquanto tentava desesperadamente tirar a criatura que interrompia sua respiração e seus gritos de socorro que saiam abafados de sua boca tapada pelo corpo estranho. A essa altura, todos os outros já haviam sido alertados.

— Mas que merda é essa? — perguntou Tolson ao centro do altar, o líder logo tomou providencias: — Ajudem-no, matem essa coisa!

Um dos oradores de sobretudo branco veio ao auxilio do homem. Fechou o punho e preparou um golpe na direção da criatura. Socou.

Koza era mais ágil, saltou do rosto do lacaio sobre o punho do homem de branco se esquivando virtuosamente. O soco forte do orador não parou no vazio, acertou em cheio o rosto do outro lacaio que ainda estava desesperado. O fogo amigo foi o bastante para fazer aquele ser atirado para além do altar, caiu já inconsciente.

Koza, mais uma vez estava nos ares, mas dessa vez, quando estava prestes a cair sobre a cabeça de outro inimigo para continuar com seus golpes, foi prontamente segurado por um segundo homem de branco. O orador alcançou o anfíbio e interrompeu a sua sequencia de ataques, o capturou com uma das mãos enquanto a outra já retirava uma faca acoplada ao seu cinto.

— Droga... — grunhiu Koza vendo a lâmina ser levantada sobre o seu corpo tão de perto. Ele não possuía força para se soltar da agarra do homem e seria condenado por isso.

O orador não deixaria a chance escapar, rapidamente levaria a lâmina de sua faca até a sua outra mão onde a criatura estava completamente rendida e acabaria com aquilo em instantes, mas algo não permitiu.

Um brilho, um flash de luz, originado em meio aos assentos do anfiteatro que pensava-se estar vazio. Um raio de luz retilíneo foi desenhado atravessando toda a sala, só parou quando encontrou a orelha direita do homem que carregava a criatura e a faca. Ele emperrou seu movimento de imediato, não possuía mais consciência, já era apenas um corpo vazio.

Em meio a luz e o som característico de um disparo de revólver de Sathsai, Koza se soltou e caiu sobre a mesa onde a garota estava aprisionada. O restante dos homens sobre o altar notara, não só o estrondo da arma, mas também o sangue que escorria da cabeça do orador, levaram seus olhos para fora do altar, lá estava um conhecido. Um conhecido que já podia ser nomeado como traidor.

Goro esperava a sua arma dissipar o calor gerado pelo disparo de energia do cristal de Sathsai. Assim como os rifles, o revólver possuía um tempo considerável necessário entre um disparo e outro para o cristal esfriar e possibilitar um novo disparo.

— Matem o traidor!!! — Ordenou Tolson ao entender a situação. Apontou em direção a Goro com a ferocidade de um animal. — Acabem com a escuridão desse coração podre!

O rapaz se viu alvo de três oradores armados com revólveres padrões da polícia de Albores, prontamente dispararam em sua direção, mas não o acertaram, Goro já havia se escondido atrás da pilastra que sustentava a superfície e os tiros acertado o concreto.

Um dos homens se preparava para deixar o altar e dar a volta na pilastra, mas ao dar o primeiro passo em direção ao objetivo, sentiu algo tocar o seu pescoço por trás. Não teve tempo de se virar para entender o que era, adormeceu graças a magia de Anima.

Colth era o responsável por aquele ataque sorrateiro, pressionou a palma de suas mãos sobre o pescoço do lacaio e deixou que a luz de sua magia brilhasse. Diferentemente das vezes anteriores, sentiu dificuldade de usa-la. Era a segunda vez no mesmo dia que fazia o uso da magia. De forma inédita sentiu uma fadiga diferente do habitual, uma fadiga não física.

Ficou pensativo sobre, por um misero segundo, foi o suficiente para ser surpreendido por outro dos lacaios. Um homem magricelo de rosto tão feio que assustava até os mais bravios correu em direção a Colth e saltou para derrubar o rapaz.

Ambos caíram ao chão do altar, o lacaio sobre o corpo de Colth que foi surpreendido e agarrado ao mesmo tempo que os tiros dos revólveres eram disparados em direção a Goro acuado.

Colth não pensou duas vezes, se debateu agarrado pelo magricelo que tentava impedir qualquer movimento seu. Esbaforido, rapidamente levou a palma de sua mão à testa daquela face disforme. A luz brilhou mais uma vez e o rapaz sentiu imediatamente o seu vigor se esvaindo. Pior para o orador que simplesmente caiu no sono como uma criança após um conto de ninar.

Ainda restavam os dois homens que mantinham suas armas apontadas para Goro escondido atrás da pilastra e o líder intimidado ao centro do altar.

Colth respirou fundo, estava tão cansado que teve dificuldades de tirar o corpo inconsciente do magricelo de cima do seu e, quando estava prestes a se levantar, foi notado por um dos homens armados na lateral do altar.

O rapaz exausto, ainda de joelhos a se levantar, arregalou os olhos ao ver o lacaio feroz mirar o seu revólver na sua direção.

Colth estava completamente rendido, e o homem com a face odiosa não tinha motivos para não puxar o gatilho.

Enquanto isso, Goro estava encurralado atrás da pilastra por um dos lacaios que o mantinha em sua mira, não podia arriscar em colocar o rosto para fora enquanto aquele militar permanecia com os seus olhos sobre o apontar do revólver. Colth não podia contar com a ajuda de seu amigo.

O rapaz previu sua própria morte, nem o mais rápido de seus aliados poderia fazer algo naquela situação, ninguém teria tempo de interceptar aquele lacaio antes que o próprio finalizasse o seu disparo na direção de Colth.

Click. O gatilho foi pressionado, o martelo se movimentou e acertou a munição de pólvora que explodiu imediatamente, a bala saiu do tambor e percorreu o cano da arma até encontrar o ambiente caótico do anfiteatro. Zuniu pelo ar em direção ao altar e ao peito do seu alvo e, no meio de sua viagem que deveria durar menos do que um suspiro, parou.

Não só o projétil congelou no ar, tudo e todos daquela grande sala paralisou. Apenas uma pessoa se mantinha ativa e consciente naquele cenário congelado de guerra.

Celina havia acabado de ter suas mãos livres das correntes que as prendiam. Graças a Koza, que se manteve concentrado em destrancar os grilhões acoplados aos pulsos da garota, a guardiã de Tera pôde enfim agir. Se levantou da mesa, juntou as palmas de suas mãos iluminadas por um brilho esverdeado frente ao peito e usou a sua magia apenas com o fechar dos olhos. O projétil da arma do orador parou no ar após ser disparado e, quando a guardiã abriu os olhos novamente, o tempo correu e tudo voltou. Tudo, menos uma única coisa. O projétil do revólver percorreu o caminho inverso.

Colth viu a bala de chumbo chegar próximo de si e, após simplesmente parar por um segundo repousado no ar, voltou para trás acelerada. Como se estivesse sendo sugado pelo próprio revólver que o disparara, o projétil entrou pelo cano da arma violentamente e, se não bastasse, a arma explodiu na mão incrédula do lacaio que a portava.

O outro orador se virou assustado com a repentina explosão sobre o peito do seu companheiro, quando o fez, deixou a guarda baixa. Goro perspicaz saltou para fora de sua cobertura e utilizou de seu revólver de Sathsai para disparar contra o peito do homem confuso. Derrubou mais um.

Só restara o líder. O famoso burguês Tolson, o ministro da Defesa.

— Que merda foi essa? — perguntou ele incrédulo dando passos para trás.

A mesma questão se passava na cabeça de Colth, se perguntava se aquilo era algum tipo de milagre, mas entendeu logo em seguida. Ouviu o tossir desajeitado da garota ao centro do altar e levou sua atenção até ela.

A guardiã respirava ofegante para recuperar seu vigor levado pela sua magia recém utilizada.

— Então, isso é o poder da magia de Tera? O poder da guardiã do tempo? — levantando-se, Colth sussurrou como se não conseguisse manter os seus pensamentos presos em sua cabeça e, ao ouvir o que falou, se preocupou imediatamente: — Espera... Se a magia de Tera foi usada, então... Celina!

Blast! O som ecoou pela câmara subterrânea. O som que Colth reconheceu de imediato.

Um flash de luz tomou o anfiteatro e, assim que se dissipou, revelou três pessoas frente à mesa ornamentada do altar. Um homem tatuado encapuzado, uma garota utilizando um colar de pedra de Sathsai e uma poderosa mulher imponente de vestido vermelho com olhar destemido.

— Muito bem, índigo. — disse Lashir inabalável para o encapuzado. — Estava certo, a guardiã realmente está aqui. Você é mesmo um farejador incrível.

— Não foi difícil — disse sereno o guardião de Véu —, sabendo de onde partir a busca e com tamanha demonstração de poder de Tera, fica fácil para as minhas criaturas acharem.

— E Garta — A mulher de vermelhou sorriu presunçosa sobre a garota ao seu lado —, como é bom ter a sua magia ao nosso lado para podermos agir tão prontamente. O seu deslocar é bem útil, mas a sua informação, foi imprescindível.

— Garta... — sussurrou Colth pessimista em direção a garota ao lado da poderosa líder.

A guardiã de Finn virou o rosto retraída.

— Bom, vamos acabar logo com isso — proferiu Lashir imponente. Mirou seus olhos vermelhos em direção a Celina que ainda recuperava o seu fôlego. — Guardiã de Tera, junte-se a nós.



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