Volume 1

Capítulo 4: Batalha Contra o Corvo

O maior dos corvos começou a descer em alta velocidade, com uma expressão nítida de raiva. Ao ver isso, Ângela entrou em uma situação difícil, de forma alguma poderia lutar em um ambiente como aquele, ainda mais tendo que proteger Sienna.

 Sem outras opções, decidiu ir pelo caminho mais difícil. Ela se virou para o tronco da Árvore do Mundo e lhe deu um leve soco, sabia o que precisava fazer. A ogra começou a reunir uma grande quantidade de mana.

Ventos fortes sobraram enquanto pequenas distorções de massa se comprimiam e se expandiam ao redor das duas. Uma energia sem cor começou a ser puxado, com Ângela sendo o alvo, o seu epicentro.

O epicentro era, em teoria, um espaço ilusório dentro do corpo de todos os seres que não possuíam núcleos de mana. Como um espaço ilusório, por fora, ele parecia ter apenas alguns centímetros, mas por dentro era muito maior.

Ficava abaixo do peito e acima do umbigo, não poderia ser visto ou tocado, mas ele existia e todos que um dia já usaram mana tinham certeza desse fato. Apesar de ser algo chamado de Ilusório, o epicentro era o porto seguro de qualquer guerreiro ou mago.

Naquele momento, Ângela começou a respirar a energia e absorver o poder para dentro do corpo. Sendo uma mana pura e selvagem, era um processo complicado lidar com esse poder, contudo, Ângela sabia o que estava fazendo.

Frenesi do Ogro! — O rugido dela ressoou.

A ogra ficou com quase o dobro do seu tamanho, a sua pele verde se avermelhou pelo sangue que ali circulava, veias saltaram por toda a extensão do seu corpo e o ar se distorceu ao redor dela.

O tronco que Ângela segurava, que antes era resistente, agora se desfazia como se fosse areia. Sienna não conseguia nem observar a ogra, por conta das rajadas de vento quente que o corpo dela expelia.

Apertando o punho com força, desferiu um soco contra o resistente tronco. A marca do punho ficou gravada na madeira junto do sangue e a situação de maneira alguma ficaria assim.

Ângela continuou socando o tronco múltiplas vezes, o som, mesmo abafado, dos impactos eram destruidores. Sienna encarou aquela cena em desespero, cada soco dado pela ogra fazia com que a mão dela ficasse ainda mais destroçada.

Sienna não conseguia nem imaginar a dor que Ângela passava naquele momento, tudo para protegê-la.

Enquanto socava a árvore, o pássaro se aproximava cada vez mais. Os seus grunhidos ressoavam com força naquela enorme espaço aberto.

“O que eu posso fazer? Se continuar assim seremos mortas”, pensou em desespero.

A mente dela trabalhava com força em busca de uma solução, entretanto, sendo apenas uma criança jamais conseguiria pensar em um jeito de fugir, portanto, ela estava passando por um pânico imensurável.

Os socos de Ângela continuavam imparáveis, o pássaro se aproximava cada vez mais rápido e o sangue já escorria, cada gota caindo e manchando a madeira que era resistente como pedra.

“O que eu posso fazer por você, mãe? Por favor... Alguém...”

Sienna estava em negação profunda. A sua inteligência era alta, o seu raciocínio rápido, porém, ainda era uma criança. Encarando o livro à frente, Sienna desejou nunca ter partido de casa.

Lágrimas voltavam a surgir em seus olhos, até que, de um momento para outro, todo o espaço ao redor sumiu e ela se viu de volta aos seus pesadelos. O espaço branco expandia diante dela, o lugar que visitou anteriormente e, de frente para o seu corpo, estava aquela bela mulher outra vez.

— Ah... pequena, você prometeu não chorar... — disse a mulher carinhosamente.

— Por favor! Minha mãe! 

— Eu sei... Deixe eu assumir daqui, mas me prometa de coração. Você nunca mais irá chorar, tudo bem?

— Eu prometo... Por favor! Salve minha mãe!

Um impacto foi dado no corpo e caindo devagar, ela outra vez perdeu a consciência. Fora daquele espaço, no mundo real, Ângela continuava em sua tentativa desesperada, distribuindo socos contra a árvore, tudo com apenas um pensamento em mente:

“Não importa o que aconteça comigo... Ela precisa ficar bem. Não posso deixar que nada aconteça com a minha querida.”

A ogra concentrou a sua atenção ainda mais, tudo à frente tomou um tom de preto e branco, ela estava focada. Presa naquela torturante tarefa, nem ao menos percebeu uma enorme quantia de mana que reunia-se atrás de si. 

O Grimório flutuou lentamente, ficando de frente para o rosto dela. Uma energia prateada e brilhante começou a ser expelida dele. O livro se abriu até parar em um encantamento específico.

— Criar um epicentro aqui vai ser difícil. Eu ainda não estou pronta para isso. — A voz meiga e suave de Sienna se tornou mais madura e alguns tons mais graves. — Eu resolvo isso em outro momento... Agora eu preciso apenas dar tempo para minha mãe.

A seriedade na expressão da jovem se intensificou, os olhos grandes e meigos dela tornaram-se finas pupilas vermelhas que queimavam com puro ódio e poder. A mana, coletada anteriormente, começou a ser absorvida pelo corpo dela.

Toda essa massiva quantidade era sugada, Sienna era um buraco negro.

— Esse corpo pode comportar muito mais mana do que eu imaginei... Isso não é bom!

Chamar Sienna naquele instante de buraco negro não era exagero algum, a mana que a jovem absorvia no ar estava em uma escala dezenas de vezes maior que a de Ângela, entretanto, algo começou a escorrer pelo nariz dela, um sangue vermelho forte.

— Eu não vou aguentar tanto poder... Preciso cortar a ligação agora, ou  Isso vai me causar problemas! Essa é minha única escolha!

Um estalo ressoou e a mana se dispersou no ar, a ligação foi cortada por completo e, instantaneamente, Sienna sentiu o impacto, sangrando ainda mais e também cuspindo o líquido carmesim.

Ao levantar a mão, tentou realizar um feitiço, o pássaro já havia chegado.

Arte da espada, que o poder dos reis esteja em minhas mãos. Magia de Nível Rei: Claymore da Rainha de Gelo

Uma longa espada começou a ser formada no ar. A temperatura ao redor da lâmina foi diminuindo, até o ponto que a respiração podia ser vista a olho nu. Aquela espada tinha duplo gume e era quase transparente, além de ter mais de 10 metros. Na lâmina estavam gravados fios que se estendiam até a guarda, onde a imagem simples do rosto de uma rainha repousava solene.

Sienna segurou as mãos, como se estivesse brandindo uma espada de verdade. Todo movimento que realizava era repetido pela gigantesca lâmina transparente. Ao encarar o pássaro, os olhos vermelhos dos dois se encontraram e um feixe de luz vermelho piscou dos de Sienna.

Nesse momento, o pássaro parou seu ímpeto em pleno ar. Ele ficou parado, travado em uma mesma posição e encarava com medo e choque os carmesins olhos brilhantes da menina.

Assim, Sienna moveu sua mão devagar para baixo, concluindo com calma o ataque. Ao contrário da calmaria da jovem, a gigantesca Claymore cortou em alta velocidade para a mesma direção. Um ferimento profundo surgiu no peito do animal que gemeu de dor e voou um pouco para cima.

Mais um pouco de sangue vazou do nariz de Sienna, dessa vez até mesmo a esclera dos seus olhos também ficou vermelha.

— É muito poder para esse corpo... Não teve nem metade do efeito que eu desejei...

A espada gigante se desfez em várias partículas de luz branca e Sienna outra vez caiu, mas desta vez foi rápido. Ao levantar, a garota voltou a assumir uma expressão de medo em sua face, o desespero havia retornado, junto de suas grandes pupilas redondas. 

— Por favor! Alguém nos salve! — gritou ela outra vez.

O pássaro logo retornou seu ataque ainda mais raivoso e com as penas sujas de sangue. Contudo, Ângela já havia terminado o seu trabalho. Assim que o pássaro grunhiu, um último soco foi dado no tronco.

Um som alto de algo se quebrando foi enviado pelos arredores.

— Se segure Sienna! — exclamou a ogra.

Sienna nem ao menos percebeu, ela continuava em pânico.

Um buraco enorme havia sido aperto na madeira. Agarrando Sienna com força, a ogra pulou para dentro da árvore. Do lado de dentro, a garota viu algo que achou impossível.

Uma grande quantidade de água escorria tronco abaixo em cascadas. O espaço de dentro era todo aberto, uma pequena esfera verde cobriu o corpo de Sienna, impedindo-a de se molhar.

As duas estavam em queda livre e o pássaro já havia passado pelo buraco enquanto as perseguia em pleno ar. Ângela agarrou o cesto e colocou Sienna de frente para si, encarando com um sorriso gentil.

— Tudo vai ficar bem!

— Dona Ângela?! — A ogra envolveu outras várias barreiras pelo corpo de Sienna e arremessou a menina para uma das cascadas. — Dona Ângela!!!

Ao olhar para cima, Sienna viu os punhos de sua mãe destruídos por completo e o pássaro lhe agarrando. Logo depois, as gotas de chuva cobriram os dois, que se enroscavam em uma luta desesperada em pleno ar. 

Sienna estendeu a mão e socou a estranha barreira verde, mas nada ocorria. Ela logo perdeu a ogra e o pássaro de vista, as correntezas a levaram para baixo junto da gravidade.

Após isso, Sienna acabou perdendo a consciência com sangue vazando por todo o seu rosto.



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