Volume 1

Capítulo 32: O Deserto de Demônios

O guia se chamava Sanem. Ele vivia, muitos anos antes, em uma cidade do outro lado do deserto. Ainda quando jovem, aprendeu a ler a areia, descobrindo os caminhos seguros e perigosos.

Quando enxergou o valor das suas habilidades, tornou-se um guia reconhecido por muitos da região. Ao casar e ter uma filha, porém, abandonou a vida de viagens.

O grupo partiu quando o sol raiou. Sanem era quem controlava a carruagem dessa vez. Eles precisavam de um guia por uma única razão: O Deserto de Demônios e Sienna.

Entre eles e o objetivo, estava uma área específica do deserto a qual foi dada esse nome pela população. Era um resquício da guerra.

A maioria dos demônios desapareceu junto do Senhor da Guerra, mas alguns permaneceram pelo deserto e, especificamente, nessa área dele.

Sienna soube de sua aparência por um descrição simples de Morpheus, “vermes gigantes que devoram aqueles que caem em suas armadilhas.”

Assim a viagem continuou em um ritmo calmo.

— Qual nosso próximo destino?

— A cidade sob a montanha, Nildan — respondeu Morpheus.

Sienna acenou com a cabeça entendendo. Havia lido sobre o lugar anteriormente. Uma cidade que não pertencia a nenhuma nação.

Debaixo da cordilheira Dente de Dragão; ela estava lá.

— Esse vai ser o nosso penúltimo destino.

Com o estreitar do sol e o cair da noite, o grupo se juntou próximo de uma fogueira para se aquecer do terrível frio do deserto.

— Então o seu destino é realmente Nildan? — perguntou Sanem.

— Não. Nildan vai ser só parte do caminho.

— Ah! Entendo. Se é assim, tudo bem. O lugar está passando por uma série de problemas e um novo governador assumiu, então não é bom ficar por lá durante muito tempo. Ainda mais um senhor rico como você.

— Não se preocupe. Eu sei me cuidar. — Morpheus apontou para Ângela e Sanem não pode deixar de concordar com ele.

— Bem, irei dormir. Amanhã estaremos chegando ao sopé da montanha.

Sanem deixou o grupo e foi dormir tranquilo dentro da carruagem. Sienna aproveitou que estava sem sono para treinar um pouco sua magia.

Seguia todos os passos, mas ainda era muito difícil mover mais do que um grão de areia. Morpheus sentou-se ao seu lado e lhe explicou.

— Realize um encantamento antes de usar a magia. Sem um encantamento, a magia perde o foco.

— E como faço?

— Clame pelo poder. Magia é algo dado a nós pela natureza, mas ainda é dado por ela, então você precisa pedir; clamar. Deve incutir o desejo, o aspecto da magia e quanto maior o clamor, mais forte ela deve ser em proporção. Observe.

Morpheus se levantou, fez um pequeno corte no dedo e começou a encantar:

O vermelho percorre meu corpo. O sangue perfura meu inimigo. Magia de Sangue de baixo nível: Flecha de Sangue.

O sangue cresceu um pouco, tomou a aparência de uma flecha e voou pelo deserto até sumir dos olhos de Sienna.

— Incrível... — Foi a única coisa que disse.

— Como viu, um encantamento simples resulta em uma magia simples.

Apesar de parecer simples para ele, Sienna sabia da complexidade daquele feitiço. Foram executados quatro ou até cinco passos.

Ele precisou reunir mana interna e externa, adicionar o sangue como catalisador, aumentar sua massa e dar forma para ele.

Aquela magia poderia ser classificada como de baixo nível pela força, mas deveria ser mais poderosa que a maioria das magias da mesma classe, talvez até mais eficaz que as de classes maiores.

Entusiasmada, Sienna decidiu tentar. Ela primeiro pensou no que queria moldar m que era a areia e pensou no objetivo que era simplesmente fazer voar.

Ela também decidiu imitar o ritmo e escolha de palavras do homem.

A areia percorre a minha pele — Ela sentiu que não era o bastante que precisava demais. — Ela cria e molda o deserto ao seu bel prazer, controlando a vida de todos. Em meio ao frio da sua terra, imploro por seu poder.

Ela reuniu a mana externa e ergueu uma das mãos, apontando para cima. Imediatamente, um amontoado de areia subiu.

Surpresa e feliz com a situação, ela perdeu a concentração e a areia voltou a cair, mas ela ainda estava animada.

— Senhor Furlan, eu consegui! Você viu?

Até Morpheus não confiava nos seus olhos.

“Ela executou um clamor com quase perfeição e o seu controle de mana externa é incrível. Ela consegue reunir a mana externa até mais rápido do que eu.”

— Sienna, você fez bem — disse ele —, mas ainda precisa melhorar um pouco. A palavra “frio” é um indicador do elemento da água. Isto atrapalhou um pouco o encantamento, mas você fez um bom trabalho.

A garota escutou atenta a crítica sem dar desculpas e voltou a tentar, modificando e refazendo a cada vez para chegar a um equilíbrio bom.

Sabia que a sua magia não poderia nem ser classificada em algum nível, porém estava feliz por ver algum tipo de progresso.

E assim, ela continuou até dormir de exaustão.

Sienna abriu os olhos e estava naquele espaço branco onde conheceu a bela mulher, mas desta vez havia apenas ela ali.

— Olá...?

O corpo de Sienna se levantou e começou a andar sozinha na direção oposta a da carruagem. Ângela percebeu e começou a seguir a garota.

O caminhar era um tanto quanto confuso. Tropeçava e caia de joelhos várias vezes na areia, mas rapidamente voltava a se por de pé e a andar.

Ângela observava de longe as ações um pouco confusa e temerosa.

Sienna chegou no topo de uma duna e foi descendo devagar, enquanto Ângela escondeu-se no topo, observando.

Quando chegou ao centro da duna, um tremor ocorreu no solo.

— Droga...!

Ângela percebeu o perigo e ativou sua aura para agir, mas foi interceptada pelo poder glorioso que circulava Sienna.

Era uma energia prateada que a fazia parecer um anjo em pleno voo. O poder chegava a iluminar um pouco o deserto obscuro.

Logo, o motivo do tremor escapou do solo e ficou gigantesco na frente da garota. Uma pele marrom e seca, sem olhos ou braços, apenas um corpo cilíndrico com dentes em formas de serra.

No entanto, ele não atacou a garota. Ficou apenas parado ali com seus dezenas de metros, observando os movimentos da menina.

Até Ângela ficou paralisada.

De repente, Sienna arqueou um dos braços para cima da cabeça. Colocou a palma da mão na direção da criatura e fez um leve movimento do pulso como o bater de uma onda contra as rochas.

Como se obedecesse seus comandos, uma faixa de areia fina também voou, cortando o gigantesco verme ao meio. A criatura despencou e o sangue foi sugado pela areia.

Ângela então ouviu:

— E-eu me sinto tão fraca... Onde estou? — Era a voz de Sienna, mas em um tom um tanto quanto diferente.

— Sienna! — O grito da ogra alcançou os ouvidos da garota.

Ela lentamente se virou e a ogra instantaneamente deu um passo para trás. Os olhos vermelhos, cheios de vida e com pupilas enormes da garota simplesmente desapareceram.

Foram substituídos por finas pupilas de gato que pareciam lhe enxergar até a alma.

— Uma ogra? — comentou. — Uma raridade ver um monstro desse tipo no deserto... Bem, eu não tenho tempo para isso.

Sienna outra vez levantou a mão para fazer o mesmo movimento. Ângela sentiu os batimentos aumentarem e a tensão poderosa daquele ataque.

Ela instantaneamente aumentou sua aura apenas a tempo de desviar da rajada de areia.

— Cântico instantâneo! — exclamou ela.

— Oh! Então você não é uma simples ogra...

Sienna abriu um sorriso e então outra vez tentou atacar, mas sangue começou a sair do seu nariz.

— Hm. Realmente, estou muito fraca...

Antes que caísse no chão, foi apoiada pela ogra que se moveu como um raio para trás dela.

Ângela escutou os batimentos cardíacos e a respiração normalizarem. A aura prateada também desapareceu.

Ela então se jogou no chão, olhando para os céus. Desistiu de entender o que houve e guardou apenas para ela.

Ninguém poderia saber o que aconteceu naquele lugar

Ela limpou o sangue do nariz da menina e a carregou de volta para o acampamento. No caminho, encontrou com um Morpheus de pé.

— Onde foram?

— Apenas um passeio. Ela caiu no sono quando voltamos.

— Apenas um passeio, não é?

— É, apenas isso.

Morpheus deixou Ângela passar, mas a expressão no rosto dela ficou gravada em seus olhos. Olhos focados e passos pesados. Ela parecia carregar uma montanha nas costas.

 



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