Volume 3

Capítulo 2: Os Olhos Traiçoeiros (1)

Os termos “heráldica” e “materialidade” usados anteriormente, foram alterados para “brasologia” e “materialogia” respectivamente.


Menou acordou com os primeiros raios do sol da manhã.

Animais selvagens estavam começando a se agitar à luz do amanhecer. À medida que as criaturas começaram a se mover agora que o sol havia nascido e o dia começado, seus chamados e gritos interromperam o sono de Menou.

“Ah… é de manhã.”

Menou rapidamente passou de sonolenta para consciência plena.

A noite na qual Akari havia sido sequestrada—uma noite na qual Menou se meteu em uma encrenca considerável para resgatá-la—terminou. Assim que elas escaparam da base, Menou dormiu superficialmente o suficiente para que ela pudesse acordar e reagir de acordo caso algo acontecesse.

Agachando-se sobre um joelho e fechando os olhos, Menou sondou seus arredores, confirmando que nada estranho aconteceu desde sua última verificação antes de adormecer.

Akari, a vítima da noite anterior, estava dormindo profundamente ao seu lado.

Ela tinha em torno da mesma idade que Menou, mas seus traços faciais faziam ela parecer um pouco mais jovem, e ela parecia especialmente infantil quando estava dormindo. Embora elas tivessem quase a mesma altura, Akari era inexplicavelmente muito mais desenvolvida em certas áreas-chave. Seus cabelos pretos rebeldes geralmente eram domados por uma tiara com uma flor decorativa, mas ela a tirou para dormir. Era honestamente impressionante ela estar dormindo tão tranquilamente depois de tudo que ela passou na noite anterior.

Akari Tokitou.

Ela era uma perdida de outro mundo com um poder inacreditável chamado de Puro Conceito dentro dela.

“Ahhhh…” Akari grunhiu quando Menou cutucou sua bochecha, mas não demorou muito para ela rolar e continuar a dormir. Determinando que ela não acordaria por um tempo, Menou virou sua atenção para a outra companheira delas.

Sentada perto da entrada para a tenda estava uma garota usando um traje de freira, alguém que Menou havia resgatado na noite anterior.

Ela tinha cabelos prateados ondulados e uma aura serena sobre ela. Suas vestes de freira eram primariamente pretas, como era tradicional. O que Menou não havia notado na noite passada era que seu braço direito não era de carne e osso. Era um protético extremamente incomum, quase como uma manopla de prata.

Um protético Etéreo.

Não era um membro artificial comum. A Força Etérea extraia poder da alma, controlava-o com o espírito e o usava para preencher o corpo. Isso era um uso de engenharia reversa dessa natureza: O membro protético conectava-se do corpo à alma e usava o poder da alma para movê-lo tão naturalmente quanto um membro real. Era um receptáculo Etéreo altamente avançado.

Isso estava conectado a Sahara, que agora estava cochilando enquanto estava sentada na entrada da tenda.

Aliás, era para ser a vez dela de vigiar no momento.

“……” Menou silenciosamente agarrou o objeto mais próximo e o jogou na parte de trás do crânio de Sahara, aterrisando em cheio o meio de sua cabeça de cabelos prateados, a qual balançava sonolentamente. Sahara abriu os olhos e piscou confusa.

Quando a garota sacudiu a cabeça para acordar, ela avistou o projétil. Então ela franziu a testa e olhou para a culpada que parecia tê-lo arremessado.

“Mmm… e o que exatamente foi isso, Menou?”

Sahara bocejou enquanto reclamava e Menou respondeu com um sorriso ameaçador.

“Você não sabe mesmo porquê te acordei?”

Percebendo que havia cochilado durante a maior parte do seu turno de vigia, Sahara desviou os olhos, olhando para longe.

“Eh, não tem nada demais. Cochilar durante a vigia não é nada comparado à importância de ter uma boa noite de sono, na minha opinião. Além do mais, nada aconteceu. Isso significa que não causei mal algum por cair no sono, certo?”

Não havia um pingo de remorso nas justificativas de Sahara. Menou franziu a testa, mas também agradeceu suas estrelas da sorte por ninguém ter vindo atrás delas de imediato.

Talvez aquele grupo estivesse muito ocupado lidando com o presente de despedida que elas deixaram—um prédio explodido. Ou eles estavam planejando ficar à frente de Menou e companhia? Seja como for, ao menos eles não as atacaram durante a noite.

“Bom, vamos deixar isso de lado… por enquanto.”

Menou se levantou e verificou Akari. Tal como ela suspeitava, a garota não apresentou sinais de acordar mesmo enquanto Sahara e Menou conversavam próximas a ela. Ela geralmente tinha um sono pesado.

“Vamos sair por um momento, pode ser? Eu gostaria de ouvir uma explicação completa de você…”

“Sem problema. Contarei tudo a você, desde que me arranje uma tigela de costeleta de porco depois.”

“Se você puder me explicar como acabou com uma personalidade bizarra dessas.”

Levantando o retalho na frente da tenda, as duas foram para fora.

 

*

 

Havia formas que se assemelhavam a ondas no chão.

A areia fina esvoaçava de um lado para o outro, dançando ao vento. Se a superfície da areia era o oceano, as dunas crescentes eram grandes ondas que estavam imóveis. Olhando para os padrões ondulados nas areias distantes, era fácil imaginar que alguém estava em pé sobre uma superfície líquida.

Diante de seus olhos estava o enorme deserto que Menou e companhia tinham que cruzar: a Fronteira Selvagem no centro do continente, o Deserto Balar.

Era uma enorme região árida que a humanidade desistiu de tentar se assentar. Como a pouca chuva que caía ali evaporava mais rápido do que poderia se acumular, era praticamente inabitável até mesmo para plantas. O ambiente por si só tornou impossível para as pessoas viverem ali.

Areia dourada se estendia para todas as direções, repleta de ruínas antigas. Provavelmente era o deserto de areia mais pura de todo o continente.

Menou e Sahara ficaram uma pequena distância longe da tenda, o suficiente para que Akari não as escutasse mesmo se ela milagrosamente acordasse.

“De qualquer forma, é bom vê-la novamente, Sahara.”

“Sim. Digo o mesmo, Menou.”

Nenhuma delas sorriu enquanto trocavam formalidades.

Sahara, a freira. Menou ainda se lembrava de seus lindos cabelos prateados, seus olhos sonolentos e seu tom indiferente.

Sahara foi criada no mesmo monastério que Menou e Momo. Ela havia chegado lá um pouco antes delas, mas parecia ter a mesma idade que Menou. De certo modo, ela foi uma colega naquele lugar bizarro.

Sahara também foi uma das garotas que deixou o monastério quando Menou foi dispensada.

“Vez ou outra escuto rumores sobre você, Menou. Parece que se tornou uma Executora habilidosa, que resolve problemas para os lugares que visita em suas tarefas e seduz garotas no processo. Parabéns.”

Ela sorriu plácidamente, mesmo enquanto soava como se estivesse tentando provocar Menou.

Menou não ouviu nada sobre ela desde que ambas deixaram o monastério, mas evidentemente, ela se tornou uma pessoa… bastante agradável. Ela era um pouco mais normal quando ambas eram mais jovens.

Sahara colocou a mão esquerda no peito e continuou com graciosidade.

“Como uma bela jovem moça que sou, estou um pouco preocupada, mas… não me importo se for você, Menou. Afinal, nos conhecemos desde pequenas. Estou pronta para você.”

Argh!

Onde Sahara escutou esses rumores ridículos, ou ela mesma que os inventou? A única resposta adequada para essa declaração sem sentido foi uma punição em forma de rasteira que fez Sahara cair de cara na areia.

“Agora, sobre aquela base de ontem. Importa-se de compartilhar os detalhes?”

“Que curioso. Por que eu tropecei na areia agorinha…?”

Sahara franziu a testa, perplexa como se realmente não soubesse o porquê, enquanto se levantava e sacudia a poeira.

“Eu já te contei ontem à noite sobre os caras.”

Quais eram os objetivos daquele grupo com a base da noite passada? Por que eles vieram atrás de Akari? Baseada nas informações que Sahara deu de sua própria experiência sendo capturada por eles, Menou já estava formando uma teoria.

Tal como ela suspeitava, não foi por acaso que os homens tinham como alvo Akari.

Afinal, Menou era uma sacerdotisa. Ela usava um traje anil de sacerdotisa que deixava isso claro com um simples olhar. Embora ela tenha modificado o seu, adicionando uma grande abertura, ainda era óbvio para qualquer pessoa que Menou era uma integrante da Faust, a maior classe do reino no sistema social.

E ninguém neste mundo questionaria a superioridade de uma sacerdotisa escolhida pela Faust.

Mesmo assim, os homens de ontem planejavam sequestrar Akari, sabendo do risco de atacar uma sacerdotisa. Em outras palavras, era seguro assumir que eles sabiam do valor de Akari—sabiam que ela era uma Ádvena com um Puro Conceito.

As informações de Sahara apenas sustentavam essa teoria.

“A organização deles se chama Corrente de Ferro. Eles se autointitulam aventureiros, mas na verdade são delinquentes armados especializados em sequestros. Eles visam e sequestram indivíduos de várias cidades e os vendem por aí—eles são a escória do deserto.”

Tráfico humano era estritamente proibido em todas as nações.

No entanto, não foi totalmente eliminado. Nas sombras, pessoas ainda estavam sendo compradas e vendidas como objetos. E como a Fronteira Selvagem não pertencia a nenhuma nação, era o lugar ideal para realizar transações ilegais.

“Acredite ou não, eles alegam que só lidam com ‘recursos humanos de alta qualidade.’”

“Alta qualidade, é…?”

Se essa era a intenção autoproclamada deles, então provavelmente não estavam vendendo as pessoas para bordéis ou trabalho forçado. Afinal, este mundo tinha Conjurações de Pecado Original, as quais eram invocadas pelo sacrifício de humanos.

Comprar pessoas era uma necessidade para pesquisadores que realizavam conjurações tabu, as quais consumiam uma grande quantidade de corpos humanos. Aqueles com qualidades incomuns que poderiam servir bem para conjurações eram vendidos a preços altos.

“Entendo. Então é por isso que eles estão atrás de Akari.”

“Uhum. A informação deve ter vazado para eles de alguma forma. Esses caras estão de olho em vocês duas. O chefe da Corrente de Ferro é um criminoso sórdido que é procurado por todo o continente.”

Ádvenas do Japão eram considerados os materiais de mais alta qualidade para conjuração. Infelizmente, não faltavam pessoas que os compravam por valores enormes.

A viagem de Menou com Akari, uma Ádvena, já as havia envolvido em alguns esquemas elaborados.

Na capital ancestral de Garm, a Arcebispa Orwell—uma mulher que estava quase na posição mais alta da Faust—acabou por ser uma inimiga, visando Akari pelo seu Puro Conceito de Ádvena, e até mesmo Menou, que tinha suas próprias qualidades únicas, para realizar uma conjuração tabu. Uma inimiga formidável, que quase capturou ambas.

Quando elas chegaram na cidade portuária de Libelle, elas se envolveram em um incidente centrado em torno da monstrina, ocasionado por Manon Libelle da Nobreza, e acabaram tendo que lutar contra o lendário Erro Humano Pandæmônio. Como uma dos Quatro Principais Erros Humanos que outrora destruíram uma civilização orgulhosa e próspera, ela era incrivelmente poderosa apesar de ter a aparência de uma garotinha, proporcionando uma batalha extremamente intensa.

“Então por que você foi capturada?”

“Porque sou bonita.”

“……”

“Porque… sou… bonita.” Sahara repetiu, mas Menou não se preocupou em reagir.

Quando Menou a encarou com um olhar mortal, Sahara relutantemente falou outra vez. “Foi por causa disso.”

“Seu braço…” Menou olhou para a mão direita da freira.

Ela estava se perguntando sobre isso desde que se reencontraram. Parecia ser um membro protético altamente funcional que se movia quase que perfeitamente com seu corpo, mas claramente ainda era uma solução temporária. Sahara não tinha um protético quando elas viviam no monastério; ela deve ter, de algum modo, perdido seu braço desde o ombro durante o tempo em que estiveram separadas.

Sahara moveu o braço direito, parecendo despreocupada. Havia um pequeno e orgulhoso sorriso em seu rosto. “Ah, é. Bem legal, né?”

“…O que há com essa nova personalidade? É o seu mais recente mecanismo de defesa?”

“Não seja boba. Sempre fui assim.”

Isso obviamente era mentira. Menou franziu a testa, olhando para a mão artificial, a qual formou um sinal de paz.

“Enfim, este braço é a outra razão de eu ter pedido ajuda. Acontece que eu estava na linha de defesa contra a Sociedade Mecânica na Fronteira Selvagem do leste. Foi assim que perdi meu braço e acabei com este.”

Menou arfou. “A Sociedade Mecânica… Esse braço é um pedaço de um soldado conjurado e não um protético Etéreo?”

“Isso aí. Por isso quero que você destrua o Receptáculo que atrelou-se a mim. Se nada for feito, este braço direito vai me consumir e me transformar em um soldado conjurado. Tenho que fazer algo antes que isso aconteça. E lidar com essas caras que me capturaram por causa do meu braço no processo.”

……Menou silenciosamente colocou seus pensamentos em ordem. Ela sabia o que acontecia na Sociedade Mecânica. Por vezes, pessoas eram transformadas em soldados conjurados por lá. Aceitar a proposta de Sahara não era a escolha correta para uma Executora.

O que ela deveria fazer era matar Sahara, aqui e agora.

“Vai me matar?” Sahara olhou para ela firmemente. Por alguma razão, isso perturbou Menou.

“Tem alguma outra ideia de como resolver isso?”

“Eu queria perguntar isso a você. Esperava que uma Executora soubesse de algo.”

“Acho que você está ciente, mas…” Após outro momento de silêncio, Menou respirou fundo. “...Akari é minha maior prioridade.”

“Eu sei.”

Sahara deve ter adivinhado pela aparência de Akari que ela era uma perdida com um poder de Puro Conceito. Ela sabia tão bem quanto Menou que atividades relacionadas a Ádvenas eram prioridade maior que qualquer outro crime.

“Mas é o seguinte, Menou: Vocês duas serão alvos de qualquer jeito.” Sahara não mediu as próprias palavras ao salientar o problema que estava diante de Menou.

Ela estava certa, é claro. Aqueles homens atacaram Menou antes de virem para cá. Não se envolver com eles não era mais uma opção. Agora que Akari já havia sido capturada uma vez, seria imprudente tentar seguir em frente sem saber o que o inimigo estava planejando.

“Eu descobri enquanto era cativa deles que alguns cavaleiros estão investigando a Corrente de Ferro também. Se você se aliar aos cavaleiros, os malfeitores terão apenas duas opções: abandonar a base e fugir ou revidar com tudo que puderem.”

Executou a Arcebispa Orwell no Reino de Grisarika. Repeliu Pandæmônio. Com essas realizações, que pareciam maiores que a vida, o nome de Flarette se tornou amplamente temido no lado sombrio da sociedade, por bem ou por mal.

Se esse grupo descobrisse que essa Executora estava de olho neles, não seriam capazes de ignorá-la.

“Se eles tentarem fugir, você pode persegui-los. Os cabeças podem escapar, mas você ainda causaria um grande estrago.”

“E se eles partirem para ofensiva?”

“Então eles virão até nós com tudo que têm. Esses caras não fazem as coisas pela metade, então, se você jogar bem as cartas, provavelmente poderá acabar com todos eles.”

Se eles fugissem, isso era mais do que aceitável. Mesmo que os chefes provavelmente escapassem, elas poderiam causar dano o suficiente para prejudicar seriamente suas atividades. Se eles escolhessem lutar, seria uma batalha difícil, a julgar pelo que Menou viu na base deles. Mas Sahara estava dizendo que se elas se unissem aos cavaleiros, poderiam vencer.

De qualquer modo, certamente não era pior do que Menou e Akari agirem sozinhas.

“Essa parece ser nossa nova rotina desde que comecei a viajar com Akari.”

Menou era uma Executora. Isso significava que ela geralmente estava na ofensiva, caçando tabus, mas agora ela estava na defensiva. É como se eu fosse uma guarda-costas agora, ela pensou com um suspiro.

Claro, também havia a opção de simplesmente tentar fugir sem olhar para trás, mas elas não estavam em uma posição muito boa para fazer essa escolha no momento.

Enquanto ela estivesse viajando com Akari neste ambiente, seria difícil ganhar distância suficiente. Se havia uma chance delas serem alvos de outro grupo de criminosos habilidosos enquanto tentassem cruzar o deserto, era melhor parar e lidar com o problema diretamente.

O que significava que havia somente um lugar para onde elas poderiam ir.

“Sahara. Nos preocuparemos com seu braço depois, mas, por ora, imagino que deveríamos ir ao oásis para encontrar os cavaleiros investigando a Corrente de Ferro.”

“Isso parece razoável.”

Imaginando o mapa que havia memorizado, Menou sabia qual era o destino delas. No meio do enorme deserto estava uma área de suprimentos com um oásis especial.

A parada de abastecimento do deserto: Oásis Balar.

Menou pegou sua escritura e a abriu.

Força Etérea: Conectar—Escritura, 1:4—Invocar [A vontade do Senhor é transmitida por todo o céu e a terra, reinando vastamente.]

Usando sua Força Etérea, ela ativou uma conjuração de comunicação usada para enviar mensagens entre escrituras conectadas. A escritura de Menou estava conectada com a de Momo, sua colega mais jovem do monastério e atual ajudante. Não funcionaria se a outra escritura estivesse muito distante, mas por um golpe de sorte, elas estavam dentro do alcance.

Sahara franziu a testa quando viu a comunicação da escritura, uma técnica exclusiva da Faust. “Está contactando a Momo?”

“Claro. Afinal, nossos planos mudaram.”

“…Se importa de não mencionar que estou aqui?”

“Por que não?”

“Pensei que soubesse…” Sahara pausou, parecendo séria. “A Momo e eu não nos damos bem.”

“……”

“Nós realmente, reeealmente não nos damos bem.” Sahara repetiu enfaticamente.

Claro. Menou se lembrava disso. Na verdade, ela nunca viu Momo ser amigável e aberta com ninguém além da própria Menou, mas ela tinha uma relação excepcionalmente ruim com Sahara. Menou sabia disso, incluindo a razão pelos atos de Momo.

“Se ela descobrir que estou aqui, pode até vir nos atacar pessoalmente. Isto é, me socar.”

“Eu não… acho que ela faria isso…”

As duas tinham uma relação tão ruim que Menou não conseguia nem rir e descartar essa possibilidade completamente.

Momo era uma assistente extraordinária, mas tendia a ficar um pouco emotiva, especialmente quando Menou estava envolvida. E de fato, a própria Menou era precisamente a razão por trás da inimizade entre Momo e Sahara. Momo disse isso a ela.

“…Vou apenas dizer a ela que resgatei uma freira que estava em uma missão e concordei em ajudá-la. Não irei mencionar seu nome. Está bom para você?”

“Ótimo. Como símbolo da minha gratidão, deixarei você usar meu corpo da maneira que preferir. Um excelente negócio, se me permite dizer.”

“Obrigada por oferecer sua mão-de-obra. Me certificarei de que trabalhe até a exaustão.”

“Que interpretação cruel…”

Menou ignorou a expressão entristecida de Sahara, terminando sua explicação da situação para sua ajudante com letras de Força Etérea. A resposta foi imediata, e ela continuou se comunicando com Momo via essas mensagens. Em uma breve conversa, elas entenderam a situação uma da outra e formularam um plano de ação.

“Momo entrará em contato com alguém da Ordem dos Cavaleiros que deve nos ajudar a lutar contra a Corrente de Ferro.”

“Legal.”

A última coisa que elas precisavam era conflitos internos. Menou suspirou, exausta pela atitude teimosa de Sahara em relação a Momo, e voltou para a tenda. Dentro, Akari ainda estava a ressonar.

“…Akari. Acorde.”

Mmn-awhuh…” Akari rolou e emitiu um grunhido incompreensível.

Ela ainda parecia longe de acordar.

Akari se moveu durante o sono e agarrou o braço de Menou antes de puxá-lo para seus seios. Menou tentou se livrar dela, mas a garota dorminhoca só agarrava com mais força. Akari aninhou-se no braço de Menou, talvez confundindo-a com um travesseiro de corpo.

Assistindo a esta cena reconfortante, Sahara se inclinou e sussurrou no ouvido de Menou. “Cara, ela realmente é apegada a você.”

“…Conseguir a confiança do alvo faz parte da minha missão. Se ela tivesse dúvidas, não viajaria comigo.”

“Agora, essa é uma desculpa patética. Acho que os rumores sobre você ser uma mulherenga são verdadeiros.”

Menou ignorou Sahara.

Nesta posição, ela não conseguia nem ficar reta. Sem dizer uma palavra, Menou usou sua mão livre para agarrar a bochecha de Akari e dar-lhe um bom puxão.

“…Mn-ahh.” Akari jogou e virou a cabeça. Sua bochecha escapou do agarrão de Menou, mas ela ainda não acordou.

Menou não conseguiu evitar de rir do rosto adormecido de Akari e seus murmúrios sem sentido. Ela certamente tinha um sono pesado, e os eventos da noite passada não poderiam ter ajudado. Dado o quão emocionalmente exausta ela devia estar, não era de se admirar que ela não fosse capaz de acordar pela manhã.

“Mas não posso te deixar dormir mais.”

Elas tinham que chegar ao oásis antes do meio-dia.

Tendo solto a bochecha de Akari, Menou lhe deu um peteleco no nariz. Era a maneira mais fácil de acordar Akari quando ela dormia feito uma pedra, como frequentemente fazia.

Awf?

“Bom dia para você também.”

Efetivamente, Akari abriu os olhos. Esfregando seu nariz, ela se sentou e olhou para Menou, sonolenta.

“Bom dia, Menou. Já é hora de acordaaar? É tão ceeeedo…”

“Sim, já tem um tempo que amanheceu. Partir cedo é regra básica de uma peregrinação… Aliás, você não vai querer atravessar um deserto no meio da tarde. Nada mais lógico do que começar a caminhar antes que o sol caia sobre nós.”

Menou cutucou a bochecha da garota para dar ênfase.

“Estou impressionada que tenha conseguido dormir tão profundamente logo após ter sido sequestrada. Você tem um espírito incansável, tenho que reconhecer.”

“Bem, claro, porque você estava ao meu lado… Enquanto Menou estiver comigo, estou segura…”

Akari começou a adormecer novamente. Mesmo sentada, o sono ainda estava levando a melhor sobre ela. Não demorou muito até ela cair se apoiando em Menou. Como a temperatura do corpo de Akari estava naturalmente mais alta, Menou sentiu seu calor.

“Mm, Menou, você é agradável e fresquinha…”

“Alô? Poderia acordar de uma vez?”

Mmmgh. Nããão obrigadaaa. Você é tão gentil, Menou… Tenho certeza que vai me deixar descansar um cadinho mmwah…” Ela adormeceu no meio da frase.

Voltar a dormir era uma completa perda de tempo valioso. Menou beliscou o nariz de Akari e manteve seus lábios fechados para garantir. Enquanto ela se segurava na esperança de que Akari teria que acordar se não pudesse respirar, Sahara se intrometeu aproximando a cabeça.

“Você é tão gentil, ela diz. Talvez possa ceder um pouco de gentileza para mim também?”

“Mas não vou.” Menou balançou a cabeça.

Gentil era uma maneira extremamente errônea de descrevê-la.

Ela tem viajado com Akari há dois meses. Menou estava acostumada a ter alguma interação com seus alvos, mas seu papel nunca foi ser uma guarda-costas.

Ela era uma assassina.

Na verdade, Menou lidou com a maior parte dos seus alvos anteriores em um curto espaço de tempo. Não eram apenas os vilões diabólicos, que geravam incontáveis vítimas, que eram considerados entidades tabu. Qualquer perdido como Akari, que vinha de outro mundo, também era um alvo, mesmo se este pessoalmente não tivesse feito nada de errado.

“Esta garota é uma perdida, e você uma Executora… Deveria mesmo ser tão íntima?”

“É claro. Faz parte da missão.”

Não era papel de Sahara se preocupar com isso, especialmente quando elas acabaram de ser reintroduzidas na vida uma da outra. Era verdade que Menou nunca havia passado tempo interagindo com alguém que ela deveria eliminar antes, e sua jornada com Akari tem sido extremamente imprevisível, mesmo para os padrões de uma Executora como Menou.

Isso só significava que Menou sabia muito bem o quão perigoso um Puro Conceito poderia ser.

Pandæmônio, a quem elas encontraram em Libelle, era o exemplo perfeito. Ela era a própria encarnação da maldade, um Erro Humano que esqueceu até mesmo seu próprio nome. Até ela já foi uma garota normal.

Puros Conceitos corroem impiedosamente os Ádvenas que os hospedam, roubando suas memórias e sua personalidade. Uma garota até disse que esse fenômeno era a maneira do mundo exigir que os Ádvenas desempenhassem um papel, provocassem mudanças.

Menou tinha que matar Akari. Ela tinha que pôr um fim em tudo enquanto a garota ainda era ela mesma.

Ela tinha que matá-la para o bem dela mesma.

Mas dito tudo isso…

“…Ela se recusa a acordar.”

Menou estava começando a se preocupar um pouco com a possibilidade de Akari morrer sufocada enquanto teimosamente se agarrava ao sono.

 

*

 

Enquanto isso… Tendo recebido a mensagem de Menou e chegado cedo ao oásis para tratar de seus assuntos, Momo estava de mau humor.

Tudo em seu pequeno corpo irradiava desagrado. Seus olhos estavam estreitos, seus lábios formavam um biquinho e ela não fazia nenhum esforço para disfarçar. Agitado dentro dela estava o conflito entre saber o que tinha que fazer e querer fazer literalmente qualquer coisa, menos isso.

De modo geral, Momo odiava outras pessoas. Pode até ser correto descrevê-la como misantrópica. Ela nunca confiou em ninguém além de Menou e nunca gostou de ninguém além de Menou também.

O trabalho de Momo era seguir Menou em sua jornada e apoiá-la nas sombras. Como integrante da Faust, ajudante de Executora, e acima de tudo, como subordinada de Menou, Momo nunca questionou sua função.

Ela finalmente tinha acabado de recuperar o tempo que perdeu estando ferida em Libelle. Agora que seu cronograma estava de volta aos eixos, ela estava ansiosa para fazer seu trabalho e fazê-lo direito. Ela nunca recusaria um pedido de Menou. Momo não perdeu tempo em levantar as mangas e voltar ao trabalho.

Não demorou muito até ela coletar informações suficientes para identificar esses cavaleiros que supostamente as ajudariam a lutar contra a Corrente de Ferro. E ainda por cima, a líder deles era uma conhecida de Momo.

Em suma, não era ninguém menos do que Ashuna Grisarika.

Momo estava dividida. Ela e Ashuna tinham história. Deixando de lado suas perguntas sobre o que a Princesinha estava fazendo aqui para começar, Momo não conseguia levar-se a se aproximar dela.

A razão era sobretudo porque Momo simplesmente odiava Ashuna, mas havia algo mais em sua mente.

“Eu não posso ser a primeira a falar com a Princesinha…!”

Era uma questão de orgulho.

Até então, todos os seus encontros foram iniciados por Ashuna. Então o que aconteceria se Momo, que sempre expressava seu desprazer sobre isso, fosse a que se aproximaria de Ashuna dessa vez? Não importa como Momo fizesse contato com ela, não importa quais motivos ela apresentasse, ela podia imaginar a satisfação de Ashuna muito claramente, e isso era simplesmente insuportável.

Que pessoa gostaria de fazer feliz alguém que ela odeia?

Momo odiava outras pessoas, especialmente Ashuna. No mínimo, ela desejava o infortúnio do mundo para ela.

Mas ela não tinha escolha.

Após muitos minutos de enrolação, Momo lembrou-se de que essa era sua missão e resolveu contactar Ashuna estritamente por razões profissionais. Foi uma escolha sofrida, e ela ponderou cuidadosamente sobre qual abordagem mais aborreceria Ashuna. Momo vestiu uma expressão perfeitamente dissimulada e aproximou-se do hotel onde Ashuna estava hospedada.

“Que prazer vê-la novamente, Sua Alteza.”

“…?”

Quando ela veio a porta e Momo a cumprimentou no mais educado dos tons, Ashuna piscou, confusa.

“Oh? Oh-ho-ho. Ora, se não é a Momo! Fico contente em ver que está bem. E que raro prazer de você vir até mim! Mas não há necessidade de se conter. Pode me chamar de Princesinha como sempre!”

“Do que está falando? Como uma pessoa que serve ao Senhor, eu nunca devo falar tão rudemente com alguém. Tanto a Faust quanto a Nobreza servem ao Senhor e assim sustentam a ordem social. É apenas tradição que devemos nos dirigir uns aos outros com respeito.”

Momo entrou no quarto e sentou-se, ainda no seu modo profissional completamente insincero.

Como a misantrópica que ela poderia ser, Momo tinha talento para manter as aparências. Talvez fosse resultado do seu treinamento de Executora, ou simplesmente um dom natural. De qualquer modo, ela se sobressaia em impedir que seus pensamentos fossem exibidos em seu rosto com uma atuação impecável.

“A propósito, Momo…”

“Sim, o que seria?”

“Sobre aquela sua ‘querida’...”

“Olha a boca, verme.”

A atuação se desfez num instante.

Ashuna sorriu. “Agora sim. Enfim, que bom que está bem.”

Tsk… Eu estava bem até me deparar com você, Princesinha. Como vai me compensar, hein?” Momo fez uma careta abertamente. “O que diabos você está fazendo aqui afinal? Por favor, não me diga que está nos seguindo.”

“Não seja ridícula. Quem geralmente chega nos lugares primeiro sou eu. Cronologicamente falando, é você e sua querida que dão as caras depois de mim. Não faz sentido nenhum as atrasadas me chamarem de perseguidora agora, faz?”

Querida.

Enquanto tamborilava os dedos na mesa irritadamente, Momo franziu a testa para este apelido.

Ela sabia que Menou e Ashuna lutaram juntas em Libelle, a cidade onde Momo foi vítima de envenenamento. Como elas tinham um inimigo em comum, acabaram unindo forças.

Mas o fato de Ashuna ter se referido a Menou como querida deixou óbvio que foi Momo quem indiretamente vazou informações sobre Menou para a Princesa. Isso certamente aborreceu Momo.

“Desta vez, eu realmente tenho assuntos a tratar com sua querida.” Ashuna adicionou.

“…Que tipo de assuntos?”

“Hmm… Bem, suponho que posso te contar, Momo.” Ashuna pensou por um momento, e então explicou seu objetivo. “Não sei se você escutou sobre isso em suas viagens, mas um grave incidente está acontecendo em minha terra natal neste momento. A maior parte das informações estão sendo mantidas em sigilo, mas… o antigo Diretor da Fourth escapou da prisão. E a pessoa que orquestrou a fuga foi uma garota de dezesseis ou dezessete anos com cabelos de cor anil presos em uma trança, usando um kimono.”

“Mas essa parece…”

“Eu sei. Parece que devemos assumir que Manon Libelle ainda está viva.”

Momo franziu ainda mais. “Mas me disseram que ela estava morta.”

Manon Libelle.

A mente que devastou a cidade portuária de Libelle. Momo também passou por um nível de estresse considerável por causa dela.

Até onde Momo sabia, no entanto, Manon morreu nos eventos que se desenrolaram lá. Ela duvidava que Menou pudesse confundir os vivos com os mortos.

“Sim, provavelmente estava. Mas Pandæmônio estava com ela quando a mesma morreu, certo? Pelo que investiguei, Pandæmônio deve ter ressuscitado Manon como um demônio… um ser vivo de Força Etérea.”

Por definição, uma vida requeria três componentes: corpo, alma e espírito. Seria incrivelmente difícil interferir com o equilíbrio praticamente milagroso mantido entre esses três elementos. Recriá-los do zero seria ainda mais ridículo.

Mas se alguém podia fazer isso, era Pandæmônio, uma dos Quatro Principais Erros Humanos. Com seu Puro Conceito, ela era capaz de mexer com o corpo, a alma e o espírito como se fosse argila.

“Entendo. Então ela conseguiu preservar a alma e o espírito de Manon Libelle de seu cadáver e criar um novo corpo com algo mais?”

“É o que parece.”

Hrm.” Momo assentiu, agindo desinteressada. Por dentro, sua mente estava agitada, tentando descobrir que efeito esse fato teria sobre Menou.

“Portanto, quero encontrar-me com sua querida para dar essas informações à ela, dentre outras coisas. Poderia entrar em contato com ela para mim?”

“Perdão? Por que eu deveria deixar você ver a minha querida, Princesinha? Se tem uma mensagem para ela, desembucha. Eu irei repassar.”

“Bom, eu tenho o local perfeito. O Reino de Grisarika é dono de algumas terras ao longo da orla do Oásis Balar. Quer vir, Momo?”

Momo já estava fazendo cara feia para a sugestão de Ashuna, mas isso mudou no momento em que ela soube onde essas terras se localizavam. Sua atitude virou do avesso e ela agarrou a mão de Ashuna com força.

“Esta é a primeira que sou grata por sua existência, Princesinha!”

 

*

 

Na parte oeste do continente havia uma bela cidade.

No alto da Torre de Água—a fonte da nascente cristalina que abastecia os moradores da cidade—havia um jardim. A estrutura já era deslumbrante no exterior, com a cachoeira que corria por todos os lados, mas no interior, a vista era praticamente mística.

Um pouco mais acima do piso de pedra do teto, a água formava um arco sobre a superfície e criava um forro, aparentemente produzido do nada. Através da bênção da veia celeste, não da veia terrena, esta instalação tornou-se uma fonte de água. Era um enorme resquício de tempos antigos e que estava funcionando há pelo menos mil anos.

No topo, Manon Libelle caminhava ao longo das laterais.

“Que vista maravilhosa.”

“Não é? Não chega nem perto daquela Sociedade Mecânica velha e empoeirada. Este lugar é muito mais belo e de bom gosto.”

Andando ao lado de Manon, cujas mangas do kimono ondulavam ao vento, estava uma garotinha—Pandæmônio, a mesma menina que estava na Fronteira Selvagem no lado leste do continente momentos antes.

“É tão brilhante, como se você pudesse estender a mão e agarrar a luz.”

“Ora, mas que adorável escolha de palavras.”

A garotinha, que parecia ter em torno de dez anos, estendeu a mão na direção da água que formava um teto em cúpula. Embora sua fala a fizesse soar como uma criança precoce, ela tinha um ar refinado. As duas davam as mãos enquanto caminhavam pelo jardim no terraço.

Envolto em água, o teto da torre era um lindo espaço desligado do ruído do mundo abaixo. Além dos canteiros transbordando com flores de todas as cores, havia uma clareira gramada que se conectava a uma trilha florestal onde as folhas balançavam com a brisa.

Como a fonte de água extraia Força Etérea da veia celeste, havia um suprimento infinito de chuva feita a partir da cintilante Luz Etérea. Acima, a luz brilhava através da água límpida e borbulhante, com partículas de fulgor flutuando abaixo da superfície.

Era tão lindo quanto contemplar a superfície do oceano por baixo.

Um jardim de água e céu, mais cativante que as estrelas cintilantes.

“A longa e árdua jornada do Reino de Grisarika valeu muito a pena.”

“Você gosta de coisas bonitas, Manon.”

“Ah, sim. Amo coisas bonitas. Por favor, lembre-se disso. Não gostaria que você esquecesse.”

“Mm? Você me odeia, então?”

“Ora, por que odiaria?”

“Porque sou feia, não sou?”

Manon parou e olhou para a menina. E então, ela abriu um sorriso caloroso, ajoelhou-se e olhou diretamente nos olhos da garotinha.

“Você entendeu tudo errado. Sou capaz de amar ambos os extremos e, além disso, amo você e a beleza grotesca que você esconde dentro de si.”

“Mm, fico feliz em ouvir isso.”

Se mais alguém estivesse aqui para vê-las conversando e sorrindo, essa pessoa provavelmente assumiria que o par eram irmãs muito apegadas.

Manon segurou a mão de Pandæmônio e liderou o caminho até o centro do jardim. Havia um pequeno chalé e uma mesa posta com doces e um jogo de chá. Próximo a mesa, estava um homem que usava um fraque preto e um monóculo, e que parecia estar nos seus cinquenta e tantos anos. Ele educadamente saudou Manon e Pandæmônio. Completo com uma bengala em forma de J, ele parecia um perfeito cavalheiro, mas havia algo suspeito em seu sorriso.

“Espero que o jardim seja do seu agrado.”

“Sim, muitíssimo. Agradeço por ter nos apresentado a um lugar tão maravilhoso.”

Oh-ho, fico encantado em ouvir isso!”

Este lugar era uma relíquia antiga ainda em funcionamento e a fonte de abastecimento de água da cidade. O terraço não era acessível a qualquer um. Foram as conexões pessoais deste homem que permitiram a Manon andar por aqui.

“Acontece que conheço algumas pessoas importantes aqui que me farão um ou dois favores.”

“Não acredito que pudemos ver um lugar tão lindo… Pela primeira vez, estou realmente feliz por tê-lo tirado da prisão!”

“Não foi nada demais. Vocês duas já são como filhas para mim. Por isso, se quiserem me chamar de Papai—er, disse ‘primeira vez’?”

“Sem dúvida! Desde que nos conhecemos no Reino de Grisarika, achei seus maneirismos tão repulsivos que pensei que seria melhor abandoná-lo em algum lugar.”

O homem de monóculo estremeceu quando Manon disse aquilo com um sorriso sincero. Ele limpou a garganta para disfarçar o choque. Depois ele sorriu e se humilhou para a garota que era jovem o suficiente para ser sua filha.

“Por favor, abstenha-se de tais comentários, Senhorita Manon. Se não fosse pela senhorita, eu ainda estaria trancado naquela prisão escura. Desejo apenas retribuí-la com todo o amor que eu daria à minha própria filha!”

“Sim, isso é o que acho medonho.”

Sua reação foi instantânea. Desta vez, porém, o Diretor simplesmente assentiu com um olhar de grave compreensão.

Ha-ha, agora entendo. A senhorita está nos seus anos de rebeldia adolescente. É dever de todo pai acompanhar a filha em tal fase, portanto aceito o desafio de cabeça erguida.”

Mm-hmm. Este não é nem remotamente o problema.”

Talvez as pessoas que prenderam este velho perverso estavam certas em fazê-lo? Atipicamente, Manon encontrava-se arrependendo-se ligeiramente das suas ações.

“Em todo caso, mesmo que a Arcebispa Orwell tenha falecido, sua habilidade de escapar da percepção da Princesa mais velha do Reino de Grisarika é notável.”

“Foi apenas um pouco de sorte e uma ajuda da minha amiga aqui. Minhas contribuições mal são dignas de menção, Diretor.”

Enquanto falava, Manon dirigiu seu olhar para Pandæmônio, que já havia se sentado e começado a comer os doces. Ela encheu as bochechas com um bolinho e mastigou, parecendo contente.

Manon sentou-se e pegou um doce também.

Ha-ha-ha. Não há necessidade de ser modesta. A senhorita é a primeira pessoa em mil anos a andar de mãos dadas com um dos Quatro Principais Erros Humanos. Embora eu não esperasse menos de minha filha. Magnífico!”

“Novamente, não sou sua filha.”

Manon se considerava uma filha fiel aos seus pais. Sim, ela sacrificou o pai, todo o seu clã e seus seguidores durante o incidente em Libelle, mas isso não estava relacionado. Ela ainda estava determinada a não reconhecer qualquer falso vínculo parental com o Diretor.

“Vamos começar? Apesar de tudo, foi muita gentileza sua nos trazer a este lugar encantador. Devemos pôr fim ao esquema de uma certa pessoa, especialmente pelo bem da vida pacífica de Menou.”

“Uma excelente proposta.” Pela primeira vez, o sorriso desprezível desapareceu do rosto do Diretor. “Vale muito a pena transformar uma cidade inteira em uma armadilha se isso significa derrotar aquela maldita mulher que me jogou na prisão e destruiu os ideais da Fourth. Senhorita Manon, tenho um pedido.”

“Qual seria?”

“Como recompensa por toda esta preparação, se a senhorita me chamasse de Papai uma única vez—”

“Nem morta.”

Tendo os ombros caídos com a rejeição final, o Diretor afastou-se do jardim lentamente, e Manon balançou a cabeça enquanto o observava partir.

Hrmm. Talvez tenha sido uma má ideia libertá-lo, afinal?”

“Acha mesmo? Ele é meio divertido.”

Ela pode ter sido indiferente a sangue e violência, mas o coração de Manon ainda era muito delicado para lidar com um pervertido. Enquanto ela expressava seus pensamentos, um grande cão apareceu, como se para substituir o homem que acabara de sair.

Era um animal de aparência inteligente, mas, estranhamente, olhou para a garotinha inocente e rosnou. Então, com um uivo, saltou em direção a frágil menina.

Pandæmônio foi derrubada no chão com pouca resistência.

O cão tinha quase a mesma altura que um humano e, considerando o quão selvagemente estava atacando, seria impossível para uma menina tão pequena revidar. Não importava o quanto ele a pressionasse e estalasse seus dentes para ela, Pandæmônio não gritava e nem resistia. Sua tranquilidade era simplesmente anormal, mas o cão não percebeu com seus instintos de caça primitivos.

Ele rasgou a carne da menina. Como se estivesse possuído, o cão devorou a garotinha, sem deixar um único grão para trás.

“Manon, você pode cuidar do resto, certo?”

“Sim. Apenas deixe comigo.”

A voz da criança devorada falou com Manon, que assentiu. A partir deste momento, uma verdadeira atrocidade iria se desenrolar diante delas. Afinal, a carne e o sangue de Pandæmônio eram o Puro Conceito de Maldade.

Com uma inocência que não se importava com ética, a garotinha desejava somente por caos e usava seu poder para transformar suas visões distorcidas em realidade.

Tendo consumido o corpo da garotinha, o cão deixou a torre e desapareceu na cidade. Este animal seria o paciente zero de uma nova epidemia. O que aconteceria em seguida? Pandæmônio já havia explicado para Manon os eventos trágicos que as aguardavam.

“E isto é pela distante Menou…”

Embora a outra garota provavelmente nunca sentisse o mesmo—e na realidade poderia muito bem achar isso um transtorno rídiculo—Manon sinceramente considerava Menou uma querida amiga.

Razão pela qual ela estava genuinamente fazendo isso pelo bem de Menou.

“Suponho que está na hora de destruir esta cidade.”

Menou e Akari.

Manon atirou a primeira pedra com a intenção de descarrilar o destino delas.

 

*

 

A primeira vez que Menou conheceu aquela criança foi durante o treinamento no monastério.

“Nossa.”

Elas estavam praticando artes marciais com as mãos nuas. A disputa entre as crianças terminou rapidamente com a vitória de Sahara.

“Você é surpreendentemente fraca.”

Menou não ficou particularmente irritada quando a garota com os olhos sonolentos a chamou assim.

Seria difícil descrever os resultados de combate de Menou como excepcionais por qualquer extensão da imaginação. Em um monastério cheio de garotas que foram escolhidas como as melhores das melhores, as habilidades de Menou estavam abaixo da média. Quando ela chegou pela primeira vez, especialmente, ela raramente vencia nas disputas.

Por outro lado, as habilidades de Sahara estavam no topo entre as outras crianças.

“Bem, você é…”

“O quê?”

“Você é forte.”

“Não, você é fraca.”

Sahara não disse aquilo para ser rude; ela estava apenas fazendo uma simples declaração, expressando um fundo de verdade.

“Eu te odeio, sabia? Você não parece se importar consigo mesma.” Sahara se levantou e olhou para Menou, que ainda estava sentada. “Não se preocupa com sua própria segurança porque é indiferente consigo mesma. Pode encarar a morte sem hesitar porque nada em sua vida jamais importou para você.”

Seu cabelo curto prateado balançava.

“Auto-sacrifício casual. Não há nada de especial nisso.”

“Eu não… entendo.”

Sahara parecia desapontada com a reação de Menou. Ela ergueu sua postura, soando irritada. “Não sou como você. Eu serei especial.”

Ela tinha grandes sonhos, uma atitude abrasiva, nenhuma ressalva em derrubar outra pessoa e, acima de tudo, ela desprezava Menou assim que a via.

“Não fique cheia de si só porque a Mestra Flare está de olho em você.”

Era assim que a garota chamada Sahara era.

Pelo menos, costumava ser.

Mas a Sahara atual era tão diferente daquela nas memórias de Menou que ela estava seriamente preocupada.

O calor gritante. O sol escaldante as castigando impiedosamente de cima. No mundo de areia dourada que as rodeava, Menou estava batalhando com algo muito mais exaustante que a luz do sol.

“Permita-me apresentar-me. Sou Sahara, a freira. Menou e eu compartilhamos uma história longa e íntima.”

Só escutar isso fez Menou querer socá-la para calá-la.

Menou considerava-se bastante autocontida, mas algo no comportamento bizarro de Sahara a irritava. Ela estava surpresa com a força de seus impulsos violentos.

“Sahara. Entendi. Sou Akari. Muito prazer.”

Enquanto Sahara sorria para ela, Akari virou na direção de Menou. Seu sorriso estava estranhamente rígido, como uma boneca pintada.

“……Bom? Qual é a história, Menou?”

“Não há o que contar.” Era um absurdo sem fundamento. Menou não tinha nada pelo que se sentir culpada. “Você não pode levar nada do que a Sahara diz a sério. Apenas ignore-a e…”

“Não se preocupe, Akari.”

Toda vez que Menou tentava resolver as coisas pacificamente, Sahara se intrometia e as tornava mais complicadas.

“Sei muitas histórias sobre a juventude de Menou. Então tenho certeza de que podemos nos dar bem.”

“Vamos ser amigas, Sahara!” Akari caiu como um patinho.

Esta nova aliança trazia todos os tipos de problemas para Menou. Se ela as deixasse por conta própria, as coisas poderiam tomar um mau caminho, portanto Menou forçadamente as interrompeu.

“Ei, Akari, está aguentando bem?”

Ehhh… Estava empolgada com o deserto no início, mas está bem claro que este não é um lugar para humanos. Estou exausta.”

Elas caminhavam pelo deserto, com a areia afundando mesmo sob o peso leve das garotas e deixando pegadas para trás.

“Bom, naturalmente. Faz parte da Fronteira Selvagem porque as pessoas não podem viver aqui.”

“Verdaaade…”

Como o ar estava muito seco, o calor não seria insuportável se a pessoa pudesse apenas evitar a luz do sol. Em outras palavras, a luz solar era o que tornava as coisas ruins. As garotas estavam usando mantos com capuz para sua jornada pelo deserto, sem os quais seria ainda pior.

“E você, Sahara? Tudo bem com o seu braço?”

“É, mais ou menos. Algo do tipo ‘tome cuidado, por que se me tocar, pode se queimar, gatinha.’”

“Isso não me parece bom…”

O braço protético parecia ser de metal. Além de ser pesado, ele pode até queimar a carne à qual estava atrelado.

Haviam se passado três dias desde que elas entraram no deserto. Até mesmo Akari estava ficando sem energia; sua voz não tinha o nível habitual de entusiasmo. No início daquela manhã, ela estava quase que irritantemente grudenta, mas até ela aparentemente não queria tocar outra pessoa no calor escaldante do deserto.

“Pode fazer uma brisa boa e fresquinha com magia ou algo do tipo, Menou? Preciso de algo frio… Divide um pouco da sua frieza comigo.”

“É conjuração, não magia. E como sempre te digo, conjurações estão limitadas a restrições pré-escritas. Não se pode fazer o que quiser. Se tentar forçar, enfrentará uma reação proporcional.”

“Ou seja?”

“Ela não pode conjurar ar frio sem preparação. Sinto muito, você não pode se refrescar.”

“Entendi…”

Quando Sahara resumiu as coisas, os ombros de Akari caíram.

Conjurações não são uma fonte ilimitada de milagres. Muitas pessoas que não podiam usá-las entendiam mal isso, não apenas Ádvenas como Akari. Era mais como um sistema tecnológico, que só podia ser usado seguindo regras e regulamentos rígidos que foram estudados para segurança. Conjuração usava brasologia e materialogia como base para extrair fenômenos específicos de várias Dimensões de Conceitos. Era especialmente perigoso tentar manusear grandes quantidades de energia e certamente não podia ser feito sem nenhuma preparação.

Enquanto Akari se curvava infeliz, Sahara ofereceu um pouco de consolação.

“Não é uma boa ideia confiar demais em conjurações. Lembra o que Menou disse sobre reação? O que você vê aqui também é reação de uma conjuração.”

Hrmm? O que este deserto tem a ver com conjuração?”

“Tem muito a ver. É dito que esta região já foi usada para alguns experimentos de conjuração em larga escala. Um deles falhou e resultou em um flagelo dracônico.”

“Flagelo dracônico? …O que é isso?”

Como uma Ádvena, era natural que Akari não estivesse familiarizada com os fenômenos exclusivos deste mundo. Menou frequentemente lhe ensinava tais conhecimentos durante suas conversas, mas é claro que ela não havia aprendido tudo.

“A maior parte das conjurações em larga escala usam a veia terrena.” Agora Menou explicava. “Mais energia do que qualquer ser humano pode fornecer é necessária para os trens Etéreos que andam para circular dinheiro e mercadorias, funcionalidades que protegem instalações das cidades e assim por diante.”

“Ah, sim. A veia terrena é aquela coisa, não é? Aquela que você se conecta às vezes quando usa um golpe especial.”

“Um ‘golpe especial’... Bem, suponho que isso não está errado.”

O entendimento de Akari parecia um pouco fora, mas corrigi-la não valia o esforço. Pelos padrões normais, Menou foi abençoada com uma quantidade considerável de Força Etérea, mas ela ainda estava dentro do âmbito de uma pessoa comum. Quando ela invocava conjurações em larga escala, às vezes extraia a energia da veia terrena para compensar a Força Etérea que lhe faltava.

“Há muito tempo, houve um experimento aqui usando a veia terrena, a qual se desfez nesta região e causou uma quantidade devastadora de danos. O resultado é este deserto árido. Não há mais fluxo da veia terrena por aqui.”

Era dito que sem a energia que fluía pela terra, esta região tornou-se um deserto infértil. Naturalmente, isso também significava que Menou não podia acessar a veia terrena para proporcionar Força Etérea extra como havia feito na capital ancestral de Garm e na cidade portuária de Libelle.

“…Então sem a veia terrena, as regiões viram desertos?”

Akari parecia ainda mais confusa; evidentemente, ela não absorveu essa explicação.

Suponho que isso seja compreensível, Menou pensou, procurando por outra maneira de explicar as coisas. O flagelo dracônico era um fenômeno universalmente compreendido neste mundo, mas era território desconhecido para alguém que foi evocado de outro mundo.

“É mais como se não ter a veia terrena dificultasse a existência de vida aqui… por falar nisso, já expliquei a definição de vida neste mundo para você?”

“A definição de vida…? Isso soa filosófico.”

“Veja, é bastante simples. A definição de vida é ‘uma alma e um espírito contidos dentro de um corpo.’ Os três elementos podem ser configurados de qualquer maneira; a definição é imutável.”

“Pergunta, Professora Menou!”

“Sim, minha aluna?”

“Entendi o corpo, mas não a alma ou o espírito!”

“Foi o que pensei.” Menou já havia levado isso em consideração. “O papel da alma é produzir energia, e o papel do espírito é controlar independentemente essa energia. Incidentalmente, um corpo é o receptáculo que contém essas duas coisas. Neste mundo, acredita-se que a fonte da vida seja a energia—ou seja, a Força Etérea.”

Toda atividade vital era obra da Força Etérea.

“A alma é a fonte, o espírito é o leme e o corpo é o receptáculo dessa energia. Neste mundo, qualquer coisa sem Força Etérea não está viva.”

Isso ainda não parecia fazer sentido para Akari, que contorceu o rosto e inclinou a cabeça para o lado. Menou sorriu suavemente enquanto observava isso e seguiu para sua conclusão.

“Então mesmo que o corpo seja inorgânico, se tiver um espírito e uma alma, ainda é considerado uma vida. E um dragão é formado quando uma alma e um espírito habitam nas veias terrena ou celeste e se tornam autônomos sem um corpo.”

“Acho que isso faz sentido, mas o quão grande é a escala estamos falando?”

“Quão grande? Bem, vejamos…”

Menou nunca havia de fato testemunhado um flagelo dracônico por conta própria. Na verdade, mesmo Menou, que testemunhou muitas cenas horríveis na vida, não queria deparar-se com um.

Bem, como posso explicar isso…? Ela tocou o queixo.

“Nós falamos sobre o monstro em Libelle, certo?”

“Sim.” Akari respondeu.

O exemplo de Menou era um monstro enorme que destruiu uma ilha inteira apenas ao surgir. Era tão imenso que uma pessoa não conseguiria nem enxergar toda a criatura de perto.

“Então imagine enormes aglomerados de Força Etérea por volta daquele tamanho enxameando juntos, voando pelo céu e destruindo tudo à vista. Seres vivos de Força Etérea têm os corpos feitos de poder, então são essencialmente imortais, como demônios.”

“Nossa… Espera, quê? Então como podem ser derrotados?”

“Não podem.” Menou respondeu simplesmente.

Seres vivos feitos de Força Etérea podiam ser amplamente divididos em três categorias: demônios, fantasmas e dragões. Embora tenham sido criados de maneiras diferentes, todos eram seres de poder, criaturas sobrenaturais e imortais com vontade própria. Dragões, especialmente, eram inacreditavelmente poderosos.

“Você só tem que observar e esperar até que eles se acalmem por conta própria. Depende da escala, é claro, mas existem poucos exemplos preciosos de alguém parando um flagelo dracônico. Felizmente, eu suponho, dragões existem somente em lugares onde a veia terrena se desfez, então a solução mais fácil é evacuar.”

Incidentalmente, a Arcebispa Orwell, contra quem Menou lutou em Garm, era uma figura importante que parou um flagelo dracônico. Essa conquista ajudou a alavancá-la ao topo.

Flagelos dracônicos são um tipo diferente de desastre dos Puros Conceitos que perdem o controle.

Mesmo assim…, Menou pensou.

Em Libelle, Pandæmônio mencionou um Dragão no oeste. Ela disse que foi a Espada de Sal que destruiu o Puro Conceito de Dragão. Menou pretendia tentar usá-la para executar Akari.

“Deve ser coincidência… Ou pelo menos espero que seja.”

Talvez até mesmo os flagelos dracônicos que causaram danos a tantos lugares ao longo da história fossem parte de um Erro Humano. Enquanto ela mentalmente explorava esta possibilidade, o ar mudou de repente.

Não era mais o ar seco de um deserto que arranhava a garganta. A umidade grudou em sua pele. Olhando para o horizonte, além do extenso mundo de areia, ela viu uma vegetação exuberante que poderia protegê-las do sol forte.

O oásis no centro estava criando essa nova e agradável mudança.

Era um lago muito maior do que se esperaria ver no meio de um deserto—a parada de abastecimento, o Oásis Balar.

“Enfim, precisamos de uma pousada. Depois podemos pedir informações e fazer um pouco de turismo no processo.”

“Hã? A primeira coisa que normalmente fazemos é visitar a igreja. Por que não estamos fazendo isso desta vez?”

“Não há igreja nesta cidade, Akari.” disse Sahara. “Ninguém da Nobreza também, a propósito.”

“Ah, é?”

Sahara estava correta, embora Akari provavelmente não entendesse o quão estranho era para uma cidade não ter nenhum membro da Faust ou da Nobreza. E daí? seu rosto parecia dizer.

“O ponto crucial é que esta cidade fica na Fronteira Selvagem, o que significa que não faz parte de nenhuma nação. Às vezes, é dito que a cidade de Balar foi criada por aventureiros. A lei comum também não se aplica aqui.”

“Uau! Uma cidade de aventureiros? Agora, isso sim é empolgante!”

“Como assim?” Menou sorriu educadamente, inclinando a cabeça. Os aventureiros eram basicamente desordeiros da Plebe. Sua declaração sobre eles deveria ser um aviso, mas Akari parecia ter interpretado da maneira errada.

“Bom, não é tão perigoso quanto parece, então devemos ficar bem.” Menou continuou. “Eles são muito abertos a viajantes, já que é uma cidade feita por e para aventureiros e um oásis no deserto. Mesmo estando no meio da Fronteira Selvagem, é um ponto central importante para distribuição, então raramente há distúrbios que afetem forasteiras como nós.”

“Bem, agora você jogou mau agouro. Melhor termos cuidado.”

“Te entendo. A Menou tem essa tendência de cair em clichés.”

Sahara e Akari estavam conversando, quase que intimamente, sobre uma estranha observação mútua. Menou decidiu ignorá-las.



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