Volume 1 – Arco 7

Capítulo 54: Problemas Para Sair

Diego abriu a comporta do duto e desceu em cima de uma das estantes. Tiago permaneceu, deixando claro que ficaria ali para puxar a corda amarrada em volta da cintura do rapaz caso fosse necessario, para tirar seu amigo dali o mais rápido possível.

Descendo cautelosamente, embora com muita ansiedade, o rapaz chegou no chão com auxílio das prateleiras, dessa vez sem deixar nenhum único arquivo cair.

Graças as luzes de seu capacete, foi fácil identificar os arquivos que queria e não queria. Ele pegou alguns falando sobre recursos importantes, ou ao menos assim julgava. Aquele sobre o Elixir do Ingênuo, com uma estranha marca de garra, ainda estava ali, escondido no meio dos arquivos que o rapaz havia anteriormente colocado.

E abaixo da prateleira, escondida como um tesouro, estava o que o rapaz tanto queria. 

Colocando os outros papeis dentro de sua bolsa, o rapaz se distanciou um pouco e, indo de um lado a outro da sala de modo a fingir estar procurando pelos documentos certos, começou a ler.

 

ATA DA REUNIÃO COMISSIONADA DA DIRETORIA DO CRAVEIRO DA SEDE: INSTITUTO C.R.A.V.O, CONVOCADO PELO REPRESENTANTE DA ORGANIZAÇÃO CENTRAL.
 
Ao dia 10 do mês de novembro do ano de 1998, no sítio do Craveiro, Espanha, Barcelona, foi dado início a comissão investigativa da infestação ocorrida no território dos Murdock, que ocorreu no dia 9 de novembro de 1998…

 

Aquela era uma data familiar. 9 de novembro era o aniversário de Diego, e foi a data em que seus pais haviam morrido também. Ele continuou a ler:

 

Tal comissão foi conduzida pelo representante fiscal, que confirmou a legitimidade deste. Além de mim e o representante fiscal da organização, estiveram presentes na investigação os suspeitos: Pedro Vinícius e Elizel Fidalgo Álvares D. Monte.
 
Os assuntos tratados na reunião foram: 
 
(1) A acusação do Sr. Monte ter possível envolvimento com a infestação de nocivos ocorridos no território dos primos, os Murdock…
 

“Sabia!”, pensou o rapaz, confiante de suas ideias. Pelo visto não estava tão errado com relação à índole do seu tio. Sem querer, ele acabou amassando um pouco do arquivo em suas mãos.

 
A suspeita foi determinada devido à discrepância de horários que ocorreram os ataques e o momento que o Sr. Monte diz ter chegado no local, muito próximas uma das outras. O ataque teve início por volta do anoitecer, mesmo horário em que o Sr. Monte diz ter chegado no local. 
 
(2) Também é de conhecimento do representante que o esquadrão do Sr. Monte foi eliminado pela infestação de nocivos. O que aparentou divergência, pois infestações de nocivos de nível inferior não trariam tantos danos a um esquadrão. A suspeita do representante fiscal é que Sr. Monte tenha aniquilado sua própria equipe.

 

Isso já estava começando a ficar mais estranho do que Diego poderia imaginar. Elizel havia aniquilado sua própria equipe, e junto dela a residência dos primos e todos que ali habitavam? 

Era fácil presumir que o tio tinha alguma espécie de rivalidade pessoal com seu pai e por conta disso, e com certeza outras coisas a mais, resolver dar um fim a sua vida. Porém, nunca imaginou que sua baixeza se estenderia ao ponto de matar até mesmo os seus próprios homens.

Mas isso não incomodou tanto o rapaz quando o terceiro ponto.

 

(3) Sr. Vinícius relatou que percebeu um, em suas palavras, “nocivo inteligente” que estavam atacando tanto ele quanto seu esquadrão de “maneira coordenada”, como se possuíssem coordenação para isso. Já o Sr. Monte nega essas afirmações…

 

Diego solta um enorme suspiro, triste e cheio de dor. “Nocivo inteligente”. Com certeza era o mesmo que estava lhe perseguindo. Talvez fosse o mesmo? Um nocivo inteligente no Craveiro, capaz de chegar naquela sala cheia de arquivos. Um nocivo inteligente, capaz de coordenar um ataque na casa de Diego.

Isso não explicava muita coisa, nem o motivo de não ter muitas memorias de casa. Só sabia que Elizel estava protegendo aquela informação, a informação de que havia um nocivo capaz de racionalizar e tomar decisões avançadas.

Um nocivo igual os dos seus sonhos, quando sonhava com A Besta.

 

 O Sr. Vinícius relatou que o comportamento do companheiro comandante estava alterado e por conta disso os dois brigaram no meio do salvamento. O Sr. Vinícius resolveu não prestar queixas, pois concordou que seu companheiro deveria estar alterado de mais no momento em que perdeu seus companheiros…

 

Pedro e Elizel brigaram. “Alterado”? Isso era uma coisa que o rapaz duvidava muito da parte do tio. Das poucas coisas que entendia do homem de sobretudo negro era que ele era frio, mentalista e que não dava ponto sem nó.

 

Após o encerramento de todos os argumentos, a comissão entrou em consenso com os presentes. O representante aprovou os seguintes apontamentos:
 
(1) O Sr. Monte foi considerado inocente até que se prove o contrário. Como não havia nenhuma testemunha ou qualquer evidência de que estivesse por trás do ataque ao território dos Murdock, o comandante não foi condenado. 
 
(2) Não obstante, o Sr. Monte perdeu seu cargo como Comandante devido à falha de perder toda sua tropa em um ataque de nocivos de nível mais baixo, mostrando incompetência em comandar uma tropa. Porém, a pedido do diretor do C.R.A.V.O, e como honra a família Monte, o Sr. Elizel permanece com o título familiar de Dragão Negro e todos os benefícios que tal dote carrega.
 
Nada mais a tratar, foram encerrados os trabalhos desenvolvidos na presente ata, a qual, após lida e aprovada por todos os presentes, segue assinada pelo presidente, que presidiu a reunião, e por mim, que secretariou a reunião e os demais membros presentes.
 
Assinaturas:
N. Kardama
Ali Mohamed Volge Nebeque.

 

Diego ficou um tempo encarando as assinaturas, enquanto tinha a mente nas nuvens. Nenhuma acusação contra seu tio havia sido aprovada, por falta de evidência. Teorias, não passavam de teorias criadas pelos membros daquela reunião. E graças ao diretor, Elizel não foi punido devidamente.

Depois de um tempo, ele guardou a ata em alguma estante da qual não prestou atenção, e voltou para o duto, quieto. Enquanto ele e seu amigo voltavam se rastejando, ele pensava.

Um nocivo inteligente, as intenções ocultas por trás das ações de seu tio. O diretor havia encarregado Elizel a uma missão na França super secreta, ou coisa do tipo. Mas o Sr. Rosa havia dito que ele não era de confiança, que estava fazendo experimentos estranhos com suas misturas de poções.

Diego era constantemente envenenado em sua casa. Havia um nocivo no Craveiro, atrás dele. Ele sonhava com A Besta. 

Então ficou claro em sua mente: Elizel estava por trás daquele nocivo inteligente, e os experimentos que o Sr. Rosa havia dito deveriam ser isso. O Dragão Negro estava criando uma forma de controlar os nocivos, só podia ser isso. E a cobaia perfeita seria Diego, o último da família Murdock que restou.

Um plano diabolicamente bem pensado, assim constatou o garoto. E aquilo o deixou muito irritado. Estava fazendo parte de um teste, um complô além de sua imaginação apenas para que outras pessoas se beneficiassem de uma arma: Um nocivo inteligente. Era igualzinho nos filmes em que assistia…

Infelizmente, o rapaz acabou se distraindo muito, e assim que saiu do duto, em cima da estante de madeira do seu professor Nemo, sem querer se desequilibrou e caiu de costas no chão, puxando seu amigo consigo.

— Você tá bem? — perguntou ele para o loiro, que só respondeu com um murmurio concordante.

Isso fez muito barulho, porém não o suficiente para chamar a atenção. O que chamaria a atenção era que a estante estava caindo em cima deles.

— Cuidado! — gritou Diego, arrastando o amigo para o lado.

E a estante tombou, se quebrando, e também outros pertences que estavam ali no meio. O barulho foi bem maior, o suficiente para deixar os dois rapazes em choque e parados observando tudo.

— Quem está aí? Alô? O que tá acontecendo? — perguntava Nemo, do outro lado da porta, tentando forçar a sua entrada. 



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