Volume 4

Capítulo 1

 

Primeiro dia <A> Quarto de [Kazuki Hoshino]

…*crinch*

Estão esmagando. Mãos transparentes encontram seu caminho para dentro do meu corpo e esmagam meus órgãos. Estou sendo esmagado, diminuído, encolhido… para caber dentro desse jogo. Sinto meu corpo todo rodando e me deixando tonto, como se tivesse sido jogado em uma máquina de lavar com outras roupas.

Enquanto suporto o desconforto fisiológico dessa experiência, me torno transparente, como aquelas mãos. Me torno leve, como se tivesse perdido todo o meu corpo, e lentamente abro os meus olhos, que não lembro de ter fechado.

A primeira coisa a entrar em meu campo de visão é o teto branco de concreto e a lâmpada presa ao mesmo. Meu coração fica acelerado. Novamente sou trazido a esse quarto que lembra uma cela de prisão.

…Não, isso não está certo. Para ser preciso, essa é a primeira vez que estou aqui de verdade. Vou lutar em uma batalha em que realmente não posso me dar ao luxo de cometer um erro sequer.

Me lembro da promessa que fiz com o Daiya.

 

«Você pode sobreviver se ninguém matar ninguém, durante os oito dias.»

«E… se você conseguir alcançar esse final, irei destruir a ‘Game of Idleness’. Esse é o “justo” do qual você esteve falando, certo?»

 

Meu objetivo é destruir a ‘caixa’, salvar a Maria, e retornar ao mundo real. Nós conseguimos resolver à ‘Rejecting Classroom’ e à ‘Sevennight in Mud’ encontrando seus respectivos ‘portadores’, e os persuadindo a entregar suas ‘caixas’. Mas isso não vai funcionar dessa vez.

Daiya, o ‘portador’ da ‘Game of Idleness’, não pode ser persuadido. Seria perda de tempo tentar convencê-lo, então tenho que derrotá-lo. Devo liderar o grupo, para que ninguém mate ninguém. Devo alcançar um final, onde todos sobrevivem.

Olho ao redor. Assim como das últimas vezes, encontro um vaso sanitário e uma pequena pia nesse quarto apertado. Além disso, há um monitor de aproximadamente vinte polegadas, uma mesa, e uma mala em cima da mesa. O conteúdo da mala também é o mesmo. Uma caneta, um bloco de notas, um relógio azul, sete porções de alimento, um terminal portátil e uma faca.

Contudo…

«Muito – prazer»

O urso verde nojento, Noitan, me cumprimenta dessa forma.

… “Muito prazer”, hein.

É meio estranho, mas é o cumprimento correto. Posso sentir como se já tivesse encontrado ele várias vezes, mas na realidade, esse é nosso primeiro encontro. Apenas meus NPCs, minhas cópias, já o encontraram até agora. Só passei por esse encontro na forma de uma [experiência indireta].

«Gufufu – muito – prazer – Kazuki-kun, – muito bem, – agora você irá – escolher sua [classe]»

— …? Posso escolher minha [classe]?

«Sim – [Kingdom Royale] é designado – de forma que o jogador – tem a vantagem – sobre os npcs, – isso se aplica – a posição psicológica superior – que você está por – saber que os outros são npcs – e também as – [experiências indiretas], – pelas quais foi capaz – de aprender sobre o comportamento deles»

— E poder escolher a própria [classe] é uma dessas vantagens…

«Exato»

A imagem do Noitan some, e as classes aparecem na tela.

 


[Rei]

[Príncipe]

[Dublê]

[Feiticeiro]

[Cavaleiro]

[Revolucionário]


 

— …Hm?

Percebo que [Rei], [Feiticeiro] e [Revolucionário] estão acinzentados.

«As [classes] em cinza – são as que – você não pode escolher! – Isso porque – elas já foram – usadas pelos – outros jogadores»

A explicação dele serve para responder minha dúvida.

[Classes] já escolhidas, hein. Daiya era o [Revolucionário], Yuuri-san era o [Rei], e [Feiticeiro]… não tive a chance de descobrir, mas deve ter sido a Iroha-san.

— Mas por que tem uma regra dessas?

«Porque os jogadores – que jogaram primeiro - teriam uma – desvantagem muito grande – sem essa regra! – Afinal – eles têm – menos informações – de [experiências indiretas], – por isso - nós os damos mais liberdade – na escolha de [classe], – para manter o equilíbrio.»

Entendo …Bom, apesar de que ainda acho que o primeiro jogador tem uma grande desvantagem. De qualquer forma, isso quer dizer que posso escolher entre [Príncipe], [Duble] e [Cavaleiro] …Como esperado, as [classes] restantes não são ideais para controlar o fluxo do jogo.

— Ah…

Acabo de perceber algo. Só posso escolher uma dessas três [classes]. Isso também significa que as [classes] mais perigosas: [Rei], [Feiticeiro] e [Revolucionário] com certeza irão para os outros.

Me lembro do segundo round, em que a Yuuri-san era a jogadora. Daquela vez, acabei sendo o [Revolucionário]. Mesmo assim, uma tragédia aconteceu, mas… o que teria acontecido se Koudai Kamiuchi fosse o [Revolucionário]?

Tenho certeza que teria sido ainda pior. Provavelmente não teria conseguido sequer salvar a Maria. Se Daiya ou Koudai Kamiuchi se tornarem o [Revolucionário] dessa vez…

— …Uh…

Meu corpo estremece. Se isso acontecer, não serei capaz de concluir o jogo pacificamente, sem nenhum incidente. …Não, não devo ficar hesitante. Ainda preciso guiá-los ao bloco <E>, do oitavo dia, sem nenhuma morte.

«Escolha – logo»

Apressado por Noitan, volto minha atenção ao monitor.

[Príncipe], [Dublê], [Cavaleiro] – qual desses me dá uma melhor chance de liderar o grupo sem qualquer morte? No final, acredito que o caminho que devo seguir, é restringir o [Revolucionário]. Portanto… Estendo minha mão para pressionar o botão escolhido.

«Tem – certeza?»

Ele estava me apressando e ainda está fazendo perguntas!

— …Tenho!

A [classe] mais adequada para se aliar ao [Revolucionário], já que suas condições de vitória são parecidas. E também a [classe] que, além disso, tem poder de restringir o jogo. É… Aperto o botão para escolher [Cavaleiro].

A tela muda imediatamente, e os gráficos do Noitan reaparecem.

«Muito bem, – Kazuki-kun acaba de se tornar – o [Cavaleiro]. – Espero que – você esconda seus desejos – de vingança contra os outros – como diz a descrição da [classe], – engane-os e corte-os – com sua espada»

Ao ouvir meu murmúrio, os lábios do urso se separam, formando um enorme sorriso.

«Não, você guarda sim rancor contra aqueles caras que te enganaram e te assassinaram brutalmente, não é mesmo? Eles tentaram te matar para salvar suas próprias vidas! Hehehe»

Sem gaguejar, ele disse essas palavras doentias sem qualquer distorção. Me lembro. Esse urso verde feio pode falar fluentemente quando quer.

— …Você não poderia estar mais errado! Não guardo rancor algum!

«Pare de bancar o santo, seu pedaço de merda! Ou você conseguiria perdoar imediatamente qualquer um, sorrindo feito um pateta, enquanto está prestes a ser morto, seu masoquista de merda? Você acha que são eles que merecem morrer e qualquer forma, certo? É claro que acha. Afinal, eles pensaram isso também enquanto acabavam com a tua raça.»

— Não tem como eu pensar des…

Mas paro de falar nesse ponto. É claro que não guardo rancor contra eles. Também não quero me vingar. Não tenho vontade de fazer isso. Contudo… Yuuri-san e os outros, realmente «me» mataram. Embora aquele fosse, obviamente, apenas minha cópia.

Não tenho como alcançar meu objetivo sem arriscar minha vida. Portanto, estou preparado para me arriscar para proteger os outros. Podem ter situações em que precisarei me tornar o escudo deles, assumindo toda a responsabilidade.

…Pelo bem de proteger as pessoas que me mataram várias vezes.

Posso fazer isso sem hesitar? Sem criar dúvidas? Honestamente falando… não estou tão confiante. Será que essa pequena dúvida, irá me impedir de alcançar o meu objetivo?

Chacoalho minha cabeça. Não tem sentido pensar dessa forma. Só preciso fazer tudo o que estiver ao meu alcance, para construir um consenso onde todos possam confiar uns nos outros. Se conseguir isso, ninguém matará ninguém.

— …Não.

Talvez isso não esteja completamente certo. …Não, não está certo. Isso não seria o bastante. É claro que uma relação de confiança mútua é necessária. Mas apenas isso, não é nem perto do bastante. Koudai Kamiuchi ainda vai agir como bem entender, Yuuri-san ainda trairá para sobreviver, Iroha-san só irá fazer o que acreditar que é certo e Daiya não irá cooperar de qualquer forma.

Então o que devo fazer?

«Ouça o que estou te dizendo! Apenas massacre aquele bando em um frenesi sanguinário e vai dar tudo certo, seu assassino traiçoeiro!»

— Calado!

«Você acha que pode dar as mãos com todos sabendo que tem um assassino entre eles? Desista! Você tem que comandá-los, como se fossem seu bando de escravos sujos!»

— …Calado. Escravos, o caramba! Eu jamais poderia…

…Não, ele está certo? Eu realmente não tenho outra escolha? Não estou dizendo que a única solução para esse jogo é matar uns aos outros. O que estou pensando, é que não tem como resolver isso apenas confiando uns nos outros. Certo, em outras palavras, para vencer…

Preciso comandá-los.

— …Haha…

O que é isso? Para poder escapar desse jogo, alguém tem que reinar sob os outros como um «Rei», assim como o título do jogo implica: [Kingdom Royale]?

 

Então posso vencer se me tornar o «Rei»?

Sequer sou qualificado para isso? Não é uma opção realista, não tem como eu conseguir fazer isso. Mas ao mesmo tempo, percebo, essa é a única maneira de garantir que ninguém vá matar.

Se é assim que a banda toca…

«No [Kingdom Royale], sou apenas uma garotinha fraca»

«…Mesmo assim, quero te proteger, mesmo que precise pagar com minha própria vida.»

…Vou fazer isso. Para proteger a Maria, que é apenas uma princesa indefesa nessa ‘caixa’, farei isso.

«Vamos lá, – é hora – de cumprimentar os colegas – que te mataram»

Noitan desaparece após dizer isso, e a porta se abre. Desejos sujos oscilam nessa escuridão. A malícia que devo enfrentar está lá fora. Cerro meus punhos.

É… eu entendo!

— Eu vou…

Me tornar «Rei».

 

Primeiro dia <B> Sala de Reunião

Nós seis estamos reunidos nessa sala que lembra um hospital.

Como no segundo round, Daiya impede a Iroha-san de continuar com as ameaças, então não tenho uma faca pressionada no meu pescoço. Graças a isso, o clima de tensão não é tão forte e os eventos estão progredindo de forma similar a segunda rodada. Como daquela vez, decidimos nos apresentar por sugestão de Koudai Kamiuchi.

Enquanto ouço a apresentação de cada um, imagino como posso ganhar controle da pessoa em questão.

— Me chamo Iroha Shindou. Meus hobbies são…

A presidente do conselho estudantil, Iroha-san. O relógio dela é laranja. É extremamente talentosa. De acordo com ela, sua extraordinária habilidade de concentração é o que a faz ser similar a uma super-humana. Ela tem uma personalidade bastante franca, e quase nunca mente. Parece ser um pouco insensível em relação às sutilezas de suas próprias emoções e as dos outros, o que provavelmente se deve ao fato de que ela normalmente está acima de todos. Se tiver determinação o bastante, pode até mesmo suprimir as próprias emoções e se tornar uma assassina.

Ela gosta da Yuuri-san, mas para mim, essa parece ser apenas a forma com que ela racionaliza as próprias emoções, para conseguir lidar com os sentimentos negativos derivados daquele problema amoroso. Em outras palavras, existe uma bomba escondida na relação dela com a Yuuri-san.

Não acho que ela irá me trair se eu conseguir ganhar sua confiança. Ela também tem o poder de controlar o humor do ambiente, o que faria dela uma aliada muito útil.

— E… eu me chamo Yuuri Yanagi.

A melhor aluna da classe 3-1, Yuuri-san. Seu relógio é bege. Ao contrário da Iroha-san, é bastante sensível em relação às emoções dos outros e é capaz de controlar a impressão que passa. Além disso, tem uma personalidade tão determinada que é capaz de se aproveitar dos sentimentos dos outros por ela. Como as emoções que ela mostra abertamente, são na maioria falsos, é bem difícil notar isso.

Mas no fundo, ela é apenas um gato assustado, e na verdade tem boas intenções. Então ela absolutamente não irá cometer um pecado se não houver necessidade. Parece que ela não pensa na Iroha-san simplesmente como uma boa amiga. Em outras palavras, a relação dela com a Iroha-san também é instável do lado dela.

Ao invés de ganhar a sua confiança, é importante acalmá-la, mostrando os benefícios que ela ganha ao cooperar conosco.

— Koudai Kamiuchi, prazer em conhecê-los.

Koudai Kamiuchi, primeiro ano. Seu relógio é verde. Ele é alguém que não hesita em matar, chegando ao ponto de gostar da situação em que estamos. Já que suas ações são determinadas pelo que ele acha «interessante», e ele é indiferente quanto a sua própria vida, é difícil prever suas ações. Por alguma razão, está acostumado com a violência. Nem Maria ou Daiya teriam chances contra ele, em uma luta mano a mano.

Ele tem interesse na Yuuri-san, mas isso não quer dizer que tem consideração por ela. É inútil confiar nele, então certamente não serei enganado. Ele é o único inimigo claro. Para superá-lo, provavelmente terei que construir um ambiente em que ele seja incapaz de cometer assassinato.

— Daiya Oomine.

Seu relógio é preto. Ele é o ‘portador’ da ‘Game of Idleness’, mas sua posição em [Kingdom Royale] não é clara. Obviamente, não faço ideia de como lidar com ele.

— Maria Otonashi, primeiro ano.

Seu relógio é vermelho. A princesa.

— …Eh, ah!

Me atrapalho. Parece que estive tão concentrado, que relaxei inconscientemente com o fim da apresentação da Maria.

— O que você está fazendo, Kazuki? Está tentando parecer um personagem cabeça de vento?

Maria está me observando com os olhos entreabertos e a Yuuri-san começa a rir. Contudo… não posso evitar, é claro, mas não me sinto bem em analisar os outros como se estivesse tentando concluir algum jogo… bom, embora eles de fato sejam NPCs… Mas ainda acho que isso não importa. Mesmo que eles não se lembrem dos últimos três rounds, mesmo que a morte deles aqui não afete os reais… os NPCs ainda são exatamente a mesma pessoa que seus verdadeiros.

— É sua vez.

Maria me apressa.

— Eh? Que vez?

— Não é “que”. É sua vez de se apresentar.

— Aah, entendo.

Todos os olhares naturalmente se concentram em mim. Estou para abrir minha boca… mas paro…Certo. Não devo simplesmente me apresentar. Se seguir o ritmo deles e agir como se não soubesse de nada agora, isso levantaria a questão do porquê guardei segredo, e ganharia a desconfiança deles mais tarde.

Por outro lado, também é perigoso dizer a eles tudo o que sei agora. Se disser algo que não deveria, vão me considerar como alguém suspeito.

— …Kazuki, por que você não diz nada?

— Ah, não…

Mas agora é a melhor chance que tenho de contar a eles sobre a ‘Game of Idleness’ sem levantar suspeitas, já que o Noitan ainda não explicou as regras. Preciso revelar algo. O problema é escolher qual informação devo revelar. Me decido e abro a boca.

— Sou aluno do segundo ano, Kazuki Hoshino. Sou colega de classe do Daiya e conheço a Maria desde antes de ela entrar na escola. Além disso…

Engulo minha saliva e continuo.

— …Sou o [Cavaleiro].

Pontos de interrogação aparecem em seus rostos.

— …Kazuki-kun. Com «Cavaleiro», você quer dizer algum tipo de «Cavaleiro» medieval? — Iroha-san pergunta.

— Acho que sim.

— Aah, você me assustou. Quase achei que você tivesse sido declarado como cavaleiro por uma rainha ou algo do tipo. Então, «Cavaleiro» é uma metáfora para alguma coisa, ou…

Ela é interrompida.

«Yaa yaa yaa, já que alguém parece estar revelando coisas arbitrariamente, irei explicar a vocês sobre o [Kingdom Royale] imediatamente!»

 

«Então, – desejo a todos vocês – uma boa luta! Só não terminem – o jogo de – uma forma chata – como se tornarem – todos múmias – ok?»

Ao terminar de nos explicar as regras de [Kingdom Royale], Noitan desaparece.

— Podemos receber uma explicação agora, Hoshino-kun?

Iroha-san pergunta. Ela me lança vários olhares carregados de suspeita durante a explicação do Noitan.

— Por que apenas você sabia sobre o [Kingdom Royale] nesse ponto? E por que você conhece a sua [classe], apesar de que ninguém deveria saber disso ainda?

Certo, é isso o que significa revelar minha [classe]. Sou a pessoa mais suspeita por saber uma informação que ninguém deveria saber ainda. Sou o personagem suspeito, que Iroha-san esteve procurando em cada rodada ao nos ameaçar com sua faca.

— …Mas…

É Yuuri-san, não eu, que reage.

— Ele não ganha vantagem alguma em nos revelar sua [classe] como ele fez, certo? Seria muito melhor para ele se manter em silêncio e nos enganar se quisesse vencer o jogo…

— Faz sentido.

— Então acho que ele propositalmente fez algo que o coloca em desvantagem, para provocar o mandante por trás do jogo.

Estou aliviado. Pelo menos alguém realmente entende o porquê de eu ter revelado ser o [Cavaleiro].

— …Ele propositalmente fez algo que o coloca em desvantagem, hein. …É, talvez.

Iroha-san deixa sua expressão séria relaxar.

— Mas a questão é, por que fez isso?

Dizendo isso, ela volta seu olhar afiado em minha direção. Diante desse olhar, concordo em silêncio e começo a falar.

— Tem algo que quero que vocês acreditem.

Quero dizer a outra condição de vitória.

«Você pode sobreviver se ninguém matar ninguém, durante os oito dias.»

Foram essas as palavras do Daiya.

— Existe uma forma de escapar do [Kingdom Royale] sem completar as condições de vitória.

Percebo que todos prendem a respiração.

— Não existe um final em que todos se tornam múmias. Em outras palavras, se todos nós conseguirmos sobreviver até o bloco <E> do oitavo dia, o jogo será abortado.

Esse é o meu objetivo, e ao mesmo tempo a solução que todos devem desejar. Não é como se algum deles quisesse matar em [Kingdom Royale]. Eles apenas não podem evitar assassinar para conseguir sobreviver ou para proteger os outros. Yuuri-san e Iroha-san apenas cometeram assassinatos quando eram as jogadoras porque concluíram que era a única solução.

Mostrar a eles que existe outra solução além de matar uns aos outros é a melhor maneira de prevenir mortes. Por isso, absolutamente preciso revelar isso a eles.

— Agora que você disse… o Noitan-san não disse algo nesse sentido? Que não deveríamos fazer algo entediante como nos transformarmos todos em múmias. Se invertermos o significado disso… pode ser que… o que o Hoshino-san disse tenha algum fundamento.

Yuuri-san murmura. Ela está procurando uma base para acreditar no que eu disse, porque essa informação lhe é favorável. É apenas natural aceitar facilmente informações que são convenientes. Portanto, só preciso contar a eles a verdade pouco a pouco até finalmente poder contar os detalhes, sobre as ‘caixas’ e sobre Daiya ser o ‘portador’.

Isso, estou na direção certa. Se todos nos focarmos no mesmo objetivo, será impossível acontecer assassinatos. Isso é…

 

— Sinto dizer que não posso consentir ainda.

…se não tivesse essa pessoa incômoda.

Koudai Kamiuchi está aqui. E ele se sente incomodado quando não há matança, já que ele quer aproveitar o [Kingdom Royale].

— Você tem uma objeção ou o que?

Ao ouvir a pergunta da Iroha-san, ele forma um sorriso frívolo e responde, coçando a cabeça.

— Bom, obviamente, concordo que Hoshino-senpai está relacionado ao [Kingdom Royale]! Mas isso significa que nós automaticamente devemos acreditar na solução proposta por ele?

Posso claramente ver a agitação se tornando mais densa no rosto da Yuuri-san.

— Essa solução poderia muito bem ser uma mentira, não é verdade? Talvez o Hoshino-senpai seja beneficiado de alguma forma se nós acreditarmos nele, não poderia ser?

— Isso… não é verdade!

— Então nos diga seu fundamento para provar que isso não é só uma invenção sua.

Hesito. Como devo explicar? O quanto preciso explicar para que ele me entenda, quando sequer sei se eles acreditarão em mim se disser a verdade?

— Por que você não pode explicar? Você não deveria ser capaz de nos contar tudo sem exceções, se você realmente quer nos guiar de boa vontade?

Como falho em fazer uma objeção, ele aproveita para me atacar ainda mais.

— Você não pode explicar, hein? …Entendo, acabo de encontrar uma explicação plausível!

—…Eh?

— Você é um espião. Se o Hoshino-senpai for um espião que está tentando nos confundir, tudo faz sentido.

Apenas essa palavra é forte o bastante. Apenas essa palavra vira tudo o que eu disse ao contrário e os faz suspeitar de mim. Os olhos da Yuuri-san agora estão cautelosos. Iroha-san está franzindo a testa. Não tem como essas duas determinarem se acreditam em mim ou em Koudai Kamiuchi, já que elas não se lembram das rodadas anteriores.

— …Uh…

Isso é mal. Se continuar assim, não terei chance de me tornar o «Rei» já que eles não vão sequer acreditar em mim para começo de conversa. Pior, eles podem me ver como um inimigo. Sendo o foco de olhares frios, reflexivamente abaixo minha cabeça. Não consigo pensar em nenhuma maneira de resolver essa situação.

Já é tarde demais? Eu já perdi? Realmente não posso vencer a ‘Game of Idleness’? Koudai Kamiuchi esboça um sorriso como se já estivesse certo de sua vitória, mas…

 

— Corte essa palhaçada de uma vez, Kamiuchi.

 

O sorriso dele é apagado pela voz dela. Maria. Me acalmo apenas pelo fato dela erguer a voz. E sorrio. Certo, ela sempre me ajuda. Não preciso mais me preocupar. Estou seguro ago…

— …Ah.

…Não, isso não é bom. Por que estou me acalmando? Foi esse tipo de dependência que nos levou aos finais ruins. Não aprendi isso em primeira mão nas rodadas anteriores? Mas… mesmo estando ciente disso… mesmo sendo eu quem deveria salvar Maria, não o contrário… aceito a ajuda dela de novo.

— Pare de tentar fazer o Kazuki parecer o vilão.

Koudai Kamiuchi arregala os olhos e abre os braços exageradamente.

— Uou, por favor, não diga coisas estranhas. Não é óbvio que Hoshino-senpai está tentando nos enganar?

— Então me diga, por que você está tentando criar confusão?

— …O que você quer dizer?

— Não entende? Então isso prova que você não tem uma personalidade adequada.

— Espere, espere… por quê?

— Eu te digo, se você pensasse como uma pessoa normal, você iria querer seguir a proposta do Kazuki, deixando de lado se você acredita ou não. Além disso, por você fazer parecer que a proposta dele é suspeita. Não é assim que alguém normal agiria.

— Sério? Não é normal questionar o Hoshino-senpai, quando ele é o suspeito?

— Normalmente não. Isso é porque o Kazuki está tentando prevenir um massacre com a proposta dele. Mesmo sem saber as intenções do Kazuki, você deveria querer que essa proposta seja verdade. Independente disso, você está propositalmente negando o Kazuki. Você está propositalmente negando a pessoa que fez uma proposta para prevenir um massacre.

Koudai Kamiuchi fecha a boca.

— Você tem consciência de que suas ações são perigosas? De uma forma, isso poderia se tornar a fagulha que dará início a uma matança. Se você apenas queria fazer os outros prestarem mais atenção, você precisaria ser mais cauteloso. …Bom, é claro que é outra história se você quiser nos encorajar a iniciar esse jogo.

Após ser silenciado, ele começa a se defender novamente com um sorriso fraco.

— …Claro, posso ter ido longe demais. Mas então, por que o Hoshino-senpai não pode nos explicar nada?

— Até mesmo você consegue entender que esse lugar é anormal, certo?

Ele espreme os lábios ao ouvir essas palavras inesperadas.

— Bom, sim…? E daí?

— Esse é um local que foi criado por aliens de Sirius com o propósito de observar o estilo de vida de nós, habitantes da terra.

— …Hã?

Tenho certeza que essa era a reação que ela queria provocar. Maria ergue o canto dos lábios.

— Você acredita em mim?

— …Não tem como acreditar!

— Então que tipo de razão para esse incidente você aceitaria?

Ele franze o rosto ao ouvir essa questão.

— Não me importa se é mentira ou ficção… apenas nos de uma razão para a existência desse espaço, de forma que possamos entender e concordar.

Ele pensou por alguns instantes, antes de responder:

— Não consigo.

— Então vamos assumir que o Kazuki saiba a verdade, mas essa verdade é algo tão absurdo quanto minha história sobre aliens de Sirius… você realmente acha que ele poderia nos contar tudo, agora, nessa situação? Ele poderia dizer, mesmo sabendo que ficaria em desvantagem e seria alvo de dúvidas?

— …

Sendo silenciado dessa forma, Koudai Kamiuchi olha em minha direção. Ele está sorrindo como sempre, mas em seus olhos…

—…Uh…

…Existe um brilho contendo loucura que é incapaz de esconder. Eu mesmo só vi isso por um instante, então provavelmente sou o único que percebeu essa loucura. No instante seguinte, ele mostra um sorriso tranquilo e abre os braços afetuosamente.

— Certo, certo, perdi. Estava tão absorvido em tentar trazer minhas dúvidas à tona que não pensei o bastante nos outros. Realmente sinto muito!

Percebi Yuuri-san e Iroha-san relaxando um pouco ao ver o sorriso dele. Mas conheço o perigo por trás desse sorriso. É um sorriso que esconde habilmente sua loucura. Eu sei, porque já fui enganado por esse sorriso antes e perdi. Mas por hora, podemos evitar a pior situação possível em que acabaríamos como inimigos.

Contudo…

«Não se preocupe. Vou te proteger, Kazuki.»

Cerro meu punho…Isso não é bom. Nem um pouco! Se continuar sendo tão fraco a ponto de ser facilmente arrasado por Koudai Kamiuchi, definitivamente serei derrotado pela ‘caixa’. E Maria será morta pela ‘Game of Idleness’.

 

Primeiro dia <C> Quarto de [Kazuki Hoshino]

«Sua [classe] é [Cavaleiro]»

Essa mensagem óbvia está em meu monitor. Os outros já devem ter visto essa tela a essa altura. Só posso rezar para que as [classes] tenham sido distribuídas em meu favor.

«Ei, seu bastardo, o que há de errado com você, expondo os fatos por conta própria?! Como vai me compensar se as coisas ficarem entediantes por causa da sua maldita hipocrisia! Se isso acontecer, vou querer meu dinheiro de volta!»

Noitan começa a me xingar assim que apareceu, mas como sempre, não consigo fazer nenhuma retórica.

«Escolha logo o seu parceiro para o [Encontro Secreto], seu merda.»

O irritado Noitan desaparece e a foto de seis pessoas assume seu lugar na tela.

[Encontro Secreto], hein. Sei exatamente quem escolher. Estendo minha mão quase que reflexivamente em direção à foto de Maria… mas paro no meio do caminho.

Realmente é uma boa ideia escolhe-la? Não é um erro escolher a Maria. Para salvá-la, certamente precisarei da cooperação dela.

Mas… estendo minha mão reflexivamente. Quase sem pensar. Isso é porque inconscientemente conclui que essa seria a escolha certa?

…Até parece. Mesmo depois do que acabou de acontecer, estou inconscientemente tentando depender da Maria de novo. Portanto, não devo escolher ela, não importa se é certo ou errado selecioná-la. Vou eliminar minha dependência.

— Vou lutar, sozinho.

Portanto, vou escolher a primeira pessoa que vou derrotar. Volto a mover minha mão.

Escolho…

«Hoho – essa é – uma reviravolta - inesperada»

…«Iroha Shindou»

Vou me tornar o «Rei».

Para conseguir isso, vou primeiro colocar Iroha-san em meu comando.

 

[Iroha Shindou] ->

[Yuuri Yanagi]

15:00~16:00

[Yuuri Yanagi] ->

[Iroha Shindou]

15:00~16:00

[Daiya Oomine] ->

[Kazuki Hoshino]

15:00~15:30

[Kazuki Hoshino] ->

[Iroha Shindou]

16:20~16:50

[Koudai Kamiuchi] ->

[Daiya Oomine]

16:20~16:50

[Maria Otonashi] ->

[Daiya Oomine]

15:40~16:10

 

Primeiro dia <C> [Encontro Secreto] com [Daiya Oomine], Quarto de [Kazuki Hoshino]

Já me preparei para o [Encontro Secreto] com a Iroha-san, mas o com Daiya vem primeiro. O que significa que ele me selecionou mais rápido do que selecionei a Iroha-san. Como estou pronto para falar com a Iroha-san, isso é meio desanimador, mas me recomponho imediatamente. Preciso ser cuidadoso.

Daiya entra imediatamente em meu quarto no horário marcado. Antes de sequer se sentar na mesa, ele me encarou com um olhar frio.

— …Ei, você é realmente Kazuki Hoshino?

— Eh?

Uma pergunta inesperada. Na verdade, os outros é que não podem ser considerados reais, já que são cópias, mas ele não sabe disso. Não, mas o fato dele me perguntar isso, significa que ele não está ciente de ser o ‘portador’ da ‘Game of Idleness’. O NPC do Daiya luta nas mesmas condições que os outros NPCs.

…Espere. Isso que dizer que…

— …Daiya. O que você pensa sobre essa ‘caixa’?

— Você tem coragem para ignorar minha pergunta e vir com uma própria. …Tanto faz, vou te dizer.

Ele continua, mostrando abertamente seu desconforto.

— Essa ‘caixa’ é um lixo.

Como imaginei.

— Não tem significado na existência de uma ‘caixa’ inútil que só existe com o propósito de fazer os outros jogarem um jogo sobre matar uns aos outros.

Esse Daiya pensa exatamente da mesma forma que o Daiya do segundo round. Na verdade, suas palavras são quase as mesmas que no segundo round. É óbvio agora que penso nisso. O NPC do Daiya não se lembra de nada. É apenas natural que ele tome as mesmas ações já que a quantidade de informação dos dois é a mesma. E se minha memória estiver certa, no segundo round ele…

— Quem é estúpido o bastante para jogar um jogo tão patético quanto [Kingdom Royale]?

…Tentou impedir o [Kingdom Royale].

Em outras palavras, meu objetivo de impedir o [Kingdom Royale] combina com o objetivo do NPC do Daiya. Então, ele pode ser considerado um «Aliado». Não, Daiya não é o meu único «Aliado». Exceto por Koudai Kamiuchi, nenhum dos outros NPCs querem matar também. Na verdade, apenas os jogadores fizeram isso para sobreviver, porque sabiam que os outros eram NPCs e concluíram que era a única solução.

…Acabo de perceber uma chance de vitória.

— Daiya, tem algo que quero te dizer. Tudo bem?

— O que é?

— Você está na posição mais perigosa.

Ele franze a testa.

— …Mas que…? Claro, posso parecer alguém perigoso do ponto de vista dos outros. Afinal, eu sou capaz de matar alguém se necessário. …Mas e daí? Por que você tem que dizer isso agora? Você quer me persuadir porque pareço ser perigoso?

— …Não. Não estou tentando dizer que você é perigoso, mas que você é o que está em maior perigo. Em outras palavras, você está em perigo de ser morto.

— Não fale merd…

Ele para instantaneamente.

— Não, não está completamente errado, hein. Deixando de lado se realmente corro o “maior” perigo, concordo que posso facilmente me tornar um alvo por causa da minha personalidade. Porque pareço perigoso para eles!

— Essa não é a única razão.

Ao me ouvir, Daiya me encara sem dizer nada.

— Mas também porque você é o ‘portador’.

— Hah? Não tente tirar uma com a minha cara! Claro, sou um ‘portador’, mas definitivamente não sou o ‘portador’ dessa ‘caixa’.

Pensando nisso, ele também chamou essa ‘caixa’ de sem sentido ou algo do tipo no segundo round. Estou impressionado por ele conseguir dizer isso, apesar de estar a usando como forma de acabar com o tédio…

Ou também é uma mentira que essa ‘caixa’ só serve para matar o tédio? Ele realmente tem algum objetivo escondido que eu não saiba? E nem mesmo seu NPC é capaz de descobrir a real intenção do Daiya?

…Não sei, mas é melhor esconder informações que tornariam isso tudo mais confuso.

— …Não importa qual seja a verdade, Maria acredita que você é o criador do [Kingdom Royale]. Portanto, acredito que existe uma grande possibilidade de que os outros assumam falsamente que destruir a ‘caixa’… ou seja, matá-lo… resolveria esse caso quando descobrirem sobre isso.

Na verdade, no segundo round ele foi o primeiro a morrer exatamente por isso.

— …Bom, é possível. Mas ainda assim, é engraçado não estar sendo avisado para «não matar ninguém», mas para «não ser morto por ninguém».

Dizendo isso, ele me encara.

— Como pensei, você está estranho de alguma forma. Nosso bom garoto Kazuki Hoshino não seria capaz de pensar nisso normalmente. Mesmo que você realmente chegasse a essa conclusão, você jamais me diria isso com tanta confiança. Que atitude é essa? É quase, como se você já tivesse

Ele para.

— …Entendo… finalmente tudo faz sentido. É por isso que sua atitude em relação a Shindou e os outros me pareceu estranha, hein. Ei… não é a primeira vez que você está jogando [Kingdom Royale], certo?

Esse é o Daiya que conhecemos. Ele é capaz de chegar à verdade apenas com essa pequena informação, embora existam várias outras possibilidades. Sua capacidade é realmente incrível.

— …Julgando pela sua expressão, parece que estou certo. Bom, a verdade não me importa. Só preciso saber o que você quer que eu faça agora que respondi sua pergunta. Então, tente me contar seus planos.

Com um tom arrogante, ele continua.

Mas esteja preparado para ser usado por mim.

Fecho minha boca inconscientemente. Nesse [Encontro Secreto] originalmente queria apenas descobrir como ele iria se mover. Colocado de outra maneira, não tinha nenhum plano concreto sobre o que fazer em relação a ele.

Contudo, acabo descobrindo que temos os mesmos objetivos. Essa não poderia ser a maior chance que tenho? Serei capaz de trabalhar junto com o Daiya. Quero dizer, não pode haver outra situação em que ele me ouvirá com a mente mais aberta do que agora. Se ele acreditar em mim, podemos fazer algo sobre a situação de alvo fácil dele. E acima de tudo, vou ter acesso à sua incrível inteligência. Isso seria um enorme passo em direção ao meu objetivo.

É claro que existem riscos. Se ele quiser, pode facilmente me usar como ele disse. E não acho isso apenas porque estou me acovardando, mas porque passei por isso durante o primeiro round.

Mas…

— Eu conheço muito bem o sistema da ‘Game of Idleness’.

Não posso mais ficar em silêncio. Acho que isso já tinha sido determinado no momento em que revelei ser o [Cavaleiro].

— Tem várias coisas que quero te contar, mas primeiro, vou te explicar como progrediram as últimas três rodadas de [Kingdom Royale]! No primeiro round…

E assim, começo a explicar. Daiya me ouve em silêncio, quase sem me interromper. Incapaz de contar a ele tudo durante o tempo restante, o [Encontro Secreto] termina e o resto da história é marcada para o próximo [Encontro Secreto].

 

Primeiro dia <C> [Encontro Secreto] com [Iroha Shindou], Quarto de [Iroha Shindou]

Ainda não sei se a cooperação com o Daiya vai dar certo. Mas por hora, vou me concentrar no assunto a seguir.

Minha parceira para o próximo [Encontro Secreto] é a pessoa que preciso derrotar primeiro… preciso controlar primeiro… Iroha Shindou. Já decidi o que dizer a ela para alcançar esse objetivo.

O motivo de querer controlá-la logo de cara, é porque ela tem o poder de controlar o ânimo do grupo melhor do que qualquer um. Portanto, preciso agir antes que ela faça algo desvantajoso para mim.

Pelo menos ela não deve rejeitar completamente o que tenho para dizer, julgando pela atitude dela mais cedo. Está tudo bem. Me reafirmando, entro no quarto dela.

— …

E mesmo assim, me pergunto o porquê dessa atitude. Iroha-san está em pé, inexpressiva e de braços cruzados, quase como se estivesse esperando a chegada de um inimigo.

— Posso perguntar? Qual o motivo de você ter me selecionado para o [Encontro Secreto]?

Ela não tinha demonstrado essa cautela toda mais cedo, na sala de reunião. Um pouco ansioso, respondo à pergunta.

— Porque queria torná-la minha aliada primeiro, Iroha-san!

Não é uma mentira.

— …«Iroha-san»?

Desconfiada, ela estreita os olhos.

— Humm, algum problema?

— …Sabe, a maioria das pessoas que acabaram de me conhecer, me chamam de «Kaichou». Por isso é meio estranho ser chamada pelo primeiro nome logo de cara. Parece que as pessoas têm dificuldade de se aproximar de mim.

Agora que ela menciona, eu realmente a chamava de «Kaichou», até ela me pedir para parar…

— De qualquer forma… por que você iria querer se aliar comigo primeiro? …Espere, melhor não dizer. De qualquer forma você percebeu que estou tentando controlar o clima, certo?

— …Eh?

Fico perplexo com o entendimento incrivelmente rápido dela.

— Você não gosta quando arbitrariamente faço algo que acaba piorando sua posição. Portanto, você quer me tornar sua aliada rapidamente, certo?

— Bom, sim…

Que diabos? É quase como se ela tivesse previsto o que eu ia dizer.

— Vamos assumir que você siga comportadamente as ordens de outra pessoa, como uma criancinha, e isso acaba nos levando a um bom resultado, certo? Mesmo que as coisas deem certo por sorte, não consigo apreciar esse tipo de pessoa. Porque veja bem, isso significa que você simplesmente parou de pensar e deixou sua vida nas mãos de outra pessoa. Não concorda?

— …Err…

— Isso simplesmente não combina comigo. Obedecer às instruções de alguém, dançar ao ritmo imposto… isso não tem graça. …Humm, onde estávamos? Você disse que quer me controlar, sob o pretexto de me fazer uma aliada?

Como pensei.

Como pensei, ela já percebeu minhas intenções.

— Mas como disse, prefiro não agir de acordo com sua liderança. Nós escolhemos agir, pensando por «nós mesmas».

— …Nós?

Ela não responde essa pergunta óbvia. Só tem uma pessoa que uniria forças com a Iroha-san a essa altura. Yuuri Yanagi. Só pode ser a Yuuri, a mesma que uma vez tentou matar a Iroha-san usando [Feitiçaria].

…Não tem como isso ser um bom progresso.

— Honestamente, eu basicamente queria acreditar o que você nos disse na sala de reunião!

— …Eh?

— Mas sabe, durante nosso [Encontro Secreto], Yuuri me fez perceber que você parece nos conhecer muito bem. Bom… é claro que as pessoas ouvem sobre nós até certo ponto através de boatos, mas ela disse que você não está apenas nesse nível, você parece nos conhecer em detalhes mais específicos.

— Isso é porque…

Ela não me deixa interrompe-la.

— Não me importo o quanto você sabe sobre nós. Isso é porque sei que você está em uma posição especial. Mas quer saber, o problema é que você escondeu esse fato. Você não nos revelou logo de cara que tem informações que te dão vantagens nesse jogo.

— E… eu não tinha essa intenção…! Não, só não falei porque não era algo que podia dizer logo de cara!

— É. Talvez. Mas isso não serve como garantia. Não sei se você é o responsável, ou um apoiador, ou inimigo desse jogo. Quero acreditar que é o último, mas se estiver errada, são nossas vidas que estão em jogo. Você não acha que é muito arriscado simplesmente obedecê-lo?

E por isso, ela não irá me seguir. Aah, merda… essa é uma consequência óbvia.

— Não se preocupe. Não vou ignorar sua opinião, Hoshino-kun. Vou ouvir o que você tem a dizer! Mas «nós» decidimos se acreditamos ou não. Nossa vida depende disso, então não podemos simplesmente seguir alguém às escuras. Portanto, não vou me tornar sua «aliada». Sinto muito.

Concordo que o julgamento dela é apropriado, também concordo que essa parece ser a melhor opção para elas. Também é uma situação em que parece ser possível conseguir algo. Mas apenas parece… Não posso mais.

Esse já é um beco sem saída.

— …Iroha-san.

— O que? Você ainda quer tentar me persuadir? Sem problemas. Sou toda ouvidos!

— …

Para dizer a verdade, achei que poderia revelar quase tudo a ela, como fiz com o Daiya. Porque achava que ela iria comparar e aceitar a minha história como favorável, já que ela consegue fazer decisões sem perder a calma. No mínimo achei que ela iria me apoiar, mais ou menos, em meu objetivo de «terminar o jogo sem que ninguém morra».

— …Eu mudei de ideia.

…Mas isso não vai mais funcionar.

— Entendo.

Afinal, Iroha-san contaria tudo a Yuuri-san. E assim que a opinião da Yuuri-san se misturasse, tudo mudaria, definitivamente. Isso porque, diferente da Iroha-san, que consegue ver as coisas de forma objetiva, Yuuri-san não acredita em nada que não seja favorável a ela.

Por exemplo, não acho que ela iria acreditar que é um simples NPC no momento, ou que ela carrega o pecado de assassinato nos ombros. O que Yuuri-san faria ao ouvir minhas palavras que são desfavoráveis a ela? Posso imaginar claramente. Ela iria negá-las. Iria me considerar um inimigo. E então ela iria tentar vencer o [Kingdom Royale], usando a Iroha-san.

Em outras palavras… ela iria matar.

Portanto, esse já é um beco sem saída.

— …

Ainda há algum tempo sobrando. Mas não consigo encontrar mais nada a falar.

 

Primeiro dia <D> Sala de Reunião

E sou forçado a ver as consequências da minha falha imediatamente, da pior forma possível.

— Acho que precisamos de grupos.

Iroha-san espera pelo momento em que todos estão se sentando para dizer isso. Não consigo entender imediatamente sua intenção. Iroha-san e Yuuri-san estão cooperando, afinal de contas. Por que ela precisa comunicar isso para todos?

Mas vendo-a sorrir para mim, finalmente compreendo. Isso é uma forma de constrição. Uma constrição contra mim e contra «a pessoa que sabe os motivos por trás de [Kingdom Royale]», que ela acredita existir.

Iroha-san me coloca do lado inimigo por causa da minha falha em conseguir qualquer coisa em nosso [Encontro Secreto].

— Parece que preciso explicar. Primeiro, deixe-me confirmar nosso objetivo. Naturalmente, é sair daqui sem que ocorra qualquer incidente fatal. Estou certa?

Ninguém contesta.

— Certo, Hoshino-kun nos propôs um método para conseguirmos isso. De acordo com ele, nós automaticamente somos liberados se todos sobrevivermos. Isso certamente soa como uma proposta atrativa, sério! Mas vocês não acham que é muito perigoso acreditar cegamente e nos mover como ele quer, sem saber quais são suas reais motivações?

Após confirmar que todos ouvem seriamente, ela continua.

— Mas bem, não temos qualquer outro bom plano, certo? Nós sequer podemos dizer com certeza se ele está ou não dizendo a verdade. Mas isso também significa que nenhum assassinato vai acontecer. Por quê? Porque ninguém iria cometer um assassinato para vencer o jogo, quando temos essa proposta atrativa que pode ser verdade.

Ao ouvir Kamuichi Koudai concordar, quase não consigo suprimir minha voz «Você é o único ao qual isso não se encaixa!».

— Em outras palavras, acabaríamos seguindo o objetivo do Hoshino-kun. Sem acreditar completamente nele, e gastaríamos oito dias sem fazer nada.

— Talvez. Mas no final, podemos ser salvos como ele disse, e de qualquer forma, é muito melhor do que matar uns aos outros em um jogo, não é verdade?

Iroha-san respondeu à pergunta da Maria.

— Sim, claro, mas tem alguém que não pensa dessa forma, certo?

— Quem?

Sem alterar sua expressão, Iroha-san declara:

— O responsável pelo jogo.

A pessoa que ela vê como seu inimigo. Ela não está errada sobre quem considerar inimigo. Mas não é possível derrotá-lo… porque a versão original dele, não está aqui.

Portanto, Iroha-san está desviando do caminho correto a ser seguido.

— Não sei quais são as intenções dele, mas o responsável com certeza quer assistir a cena repugnante de nós matando uns aos outros. Ou vocês podem ver algum outro objetivo em um jogo tão insignificante?

Ninguém diz nada. Porque todos podem concordar com o que ela está dizendo, mesmo sem provas definidas. E eu sei que ela está certa. Essa ‘caixa’, criada pelo Daiya apenas para acabar com o tédio, realmente não tem a intenção de deixar que nada aconteça. Mas me deixe repetir isso: ele não está aqui.

— Portanto, alguém… alguém que apoia o responsável… certamente tentará mudar o rumo das coisas para que haja mortes.

Ao dizer isso, ela está claramente olhando em minha direção. Ela confundiu seu inimigo.

— …Você está insinuando que o Kazuki vai fazer isso?

— Não, não é isso. Só quero dizer que pode existir alguém entre nós que quer alterar o rumo das coisas. E que será perigoso se ele conseguir fazer isso. Portanto, vamos nos dividir em «grupos».

 

— «Nós» e os «manipuladores».

 

Entendo. Achar que existem «manipuladores» não é o único erro da Iroha-san.

— Sim. Por que não?

— Acho que… nós precisamos fazer isso, também.

Seu erro mais grave é achar que ninguém daria início ao jogo, além do «manipulador». É justo. Quando eu era um NPC, também não quis acreditar que existiam pessoas como Koudai Kamiuchi que querem realmente jogar esse jogo-assassino. Também não percebi que Yuuri-san seria capaz de matar alguém. Essas são coisas que não teria percebido sem ter passado pelo segundo round.

Não é algo que ela possivelmente saiba, sem se lembrar das rodadas anteriores. Iroha-san continua sua explicação, sem saber de nada disso.

— Nossa maior preocupação agora é o que o responsável irá tramar. Mas podemos evitar os planos dele desde que não façamos o que ele quer. Não, melhor, devemos entender as intenções dele e usá-las contra ele para conseguirmos alcançar um final onde ninguém será morto.

Com a expressão séria, Maria pergunta:

— E é por isso que você quer nos dividir em «grupos»?

— Exato. Acredito que se agirmos separadamente, alguém irá fazer exatamente o que nossos inimigos querem. Além disso, todos temos nossos próprios interesses. O pior cenário que posso imaginar é os mais fracos começarem a suspeitar dos outros e cometerem o grave erro de tirar a vida de alguém. Mas se nossas vontades estiverem unidas? E se todos tivermos uma única vontade que não pode ser abalada, não importa o que aconteça? Os planos dos «manipuladores» serão degradados a uma mera piada! Portanto, estou dizendo que devemos criar um «grupo» com um único objetivo. É claro, os «manipuladores» que querem nos enganar não serão capazes de fazer nada.

— Hmpf — Daiya desdenha. — Posso entender sua lógica, mas como você planeja construir esse «grupo»? Para começo de conversa, como você pode distinguir entre os manipuladores e os outros?

— Não tem como eu distinguir entre eles, tem?

Iroha-san responde como se fosse óbvio.

— O que? Então…

— Portanto… Apenas tomarei a liberdade deles. — Ela continua sem deixar o Daiya continuar.

— …Não estou te entendendo. Você irá ameaçar todos os que não concordarem com você, ou o que?

— O contrário!

Daiya ergue uma sobrancelha.

— O contrário?

— Sim, o contrário. Não tomarei a liberdade dos que não seguirem o meu plano, mas daqueles que concordarem comigo.

Não apenas Daiya, mas todos nós arregalamos os olhos.

— Não permitirei nenhuma objeção contra mim de ninguém que pertencer ao meu «grupo». Os farei jurar obediência absoluta a mim. E vou matar aqueles que me traírem.

— Ma… matar… ei…

Quando digo isso, ela olha diretamente para mim e explica.

— Deixe-me contar a vocês como farei isso. Primeiro, farei aqueles que concordarem comigo, me entregarem seus suprimentos de comida. Se pudermos acreditar naquele Poohfeioso, nós definitivamente vamos morrer e virar múmias se não comermos nada no bloco <E>, certo? Portanto, irei jogar a comida de todos no vaso assim que alguém sequer mostrar algum sinal de traição. Se me obedecerem corretamente, irei entregar uma porção para cada um em cada bloco <D>. Bem, como podem ver, controlando a comida é possível alcançar o mesmo efeito que o [Revolucionário] tem com [Assassinato].

— Espere um pouco.

Daiya interrompe a explicação dela.

— Por que alguém iria querer se juntar ao seu «grupo», sabendo dessas condições?

A pergunta dele faz Iroha-san formar um sorriso gelado no rosto.

— Todos os que pertencerem ao meu «grupo» vão jurar obediência absoluta. É claro, eles não podem fazer nada. Eles também não podem começar esse jogo assassino. Portanto, irei julgar que todos os que pertencem ao meu «grupo» são vítimas que foram envolvidas nesse jogo contra a própria vontade ou como perdedores que desistiram de lutar contra mim. Por outro lado, irei considerar que todos os que não pertencem ao meu «grupo» são inimigos que tem a intenção de me enfrentar.

Ela para para respirar fundo. Então, ergue os cantos dos lábios levemente e declara:

 

Se querem provar que não são meus inimigos, então é melhor começar a me bajular!

 

Todos ficam sem palavras diante dessa rude declaração — até mesmo o Daiya. Resumindo, Iroha-san está dizendo que não é opcional se juntar ao «grupo», mas todos são forçados, quem não obedecê-la será eliminado por ela.

Após analisar nossos rostos silenciados, ela continua sem alterar a expressão.

— Descobri o método para derrotar esse jogo. Alguém com os objetivos corretos precisa dominar os outros. Mh, bem, pode-se dizer que é como se tornar o «rei» temporariamente.

Se tornar o «rei». A mesma conclusão a qual cheguei.

— Eu sei que acabei de dizer algo extremamente egoísta. É claro, existe a possibilidade de que eu faça uma decisão errada. Também é possível que alguém morra por causa dos meus erros. Admito essa possibilidade! Mas tenho certeza de que todos concordam que isso é muito melhor do que agir separadamente, criar um caos e acabarmos desconfiando uns dos outros, certo?

— Qual a necessidade de você fazer isso?

— Nenhuma.

Ela responde francamente a pergunta do Daiya.

— Mas não acho que tenha alguém mais qualificado do que eu — acrescenta confiante.

Daiya coça a cabeça após ouvir isso e continua.

— Esse não é o único problema. Do nosso ponto de vista, nós não podemos negar a possibilidade de que você própria seja a manipuladora. Antes de aceitarmos seguir suas ordens, você precisa nos provar que é digna de confiança.

— Entendo. Tinha esquecido, já que não sou um dos «manipuladores» …É óbvio que você não vai acreditar quando digo dessa forma, hein. Bom, não posso fazer nada, vou mostrar a vocês.

Dizendo isso, ela ergue a saia.

— Minha determinação em me tornar o «rei»!

Mostrando uma faca.

— O… o que você…

Me ignorando, ela finca a faca na mesa. Yuuri-san se encolhe por causa do barulho alto e bruto.

— Deem uma olhada, pessoal! Isso é o que vocês chamam de determinação!

Ela tira o lenço do uniforme e enrolou com força ao redor do próprio mindinho esquerdo a ponto de quase fazer o fluxo de sangue parar. Mas o que diabos ela está… Minha compreensão não consegue acompanhar as ações dela. Mas ignorando completamente minha situação, ela pega a faca diante dos olhos com a mão direita. Com olhos inacreditavelmente afiados e determinados. Ela ergue o canto dos lábios e respira violentamente. Um suor frio começa a aparecer em sua testa.

— I… Iroha?

Ela faz Yuuri-san recuar apenas com a força de seu olhar. E então…

— Uh, UAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAH!!!

Ela rugiu e…

— Ha! Ahaha, ahahahahahahaha!!

…Corta o próprio dedo.

— Ah, aah…

Ignorando a Yuuri-san que fica pálida e sem palavras ao lado dela, Iroha-san continua a rir.

— O… O que você está fazendo…?!

Maria, também incapaz de reagir a esse desenvolvimento inesperado, corre para o lado da Iroha-san, arrancou um pedaço de sua camisa branca e parou o sangramento. Iroha-san não a impede, mas está respirando violentamente com os lábios contorcidos. Então, ela apontou seu olhar determinado e inspirador em minha direção. É claro que estou aterrorizado com isso!

— Que tal? Vocês acham que alguém que só quer aproveitar um jogo patético como esses seria capaz desse tipo de determinação? Por acaso eu, que sou capaz de cortar o próprio dedo por pura determinação, pareço ser alguém tão idiota?

— Uh, uuh…

— Claro que não, há! Haha! Eu! Com certeza! NÃO tenho interesse nesse jogo! Sou a mais forte e não vou me render…! Sou uma líder por natureza! Entenderam, rapazes?!!

Somos completamente derrotados. Vendo ela assim, não temos outra escolha senão obedecer. Certo. Essa é… Iroha Shindou. Essa é… a determinação de Iroha Shindou em se tornar o «rei».

— Entreguem a mim! Suas vidas, suas almas! …Entreguem-nas a mim apenas durante esse jogo! Suportarei tudo por vocês! Assumirei toda a responsabilidade e a suportarei até que eu quebre!

Ela joga o mindinho fora. Para nos mostrar que ela não tem mais qualquer apego àquela coisa.

— Sigam-me pessoal! E meus inimigos que se preparem! Tolos, jamais deixarei que façam o que quiser! Irei dominar esse lugar! Certo, eu…

Com uma voz afiada:

 

Me tornarei o «rei»!

 

Essa força. Não consigo impedir minha própria timidez. Só pode haver um «rei». Não podem haver dois ao mesmo tempo. Em outras palavras, de um jeito ou de outro, definitivamente vou ter que enfrentá-la, essa super-humana.

Isso é absurdo! Não tem como vencer. Meu imenso medo de repente dá origem a novas ideias dentro de mim.…Não posso simplesmente deixá-la ser o «rei»? Não importa quem seja o «rei». Desde que haja alguém capaz de comandar a situação e no final ninguém mate ninguém, vou ter sucesso em meu objetivo de proteger a Maria. Então não está tudo bem em deixá-la tomar conta de tudo?

— …

Eu sei. Isso é impossível. Quero dizer, ela não pode derrotar o inimigo dela. Ela é um mero NPC, e a versão real dela já terminou a própria luta. Olho ao redor. Yuuri-san está tremendo, seus olhos começando a ficar vazios. Koudai Kamiuchi parece calmo, mas não é capaz de esconder completamente o divertimento em seus olhos.

Mas Iroha Shindou não percebe isso. Por causa de sua natureza ofuscante, ela é incapaz de perceber os delicados sinais do coração humano. Se ela se tornar o «rei», apenas acabará sendo traída e morta como o personagem do [Rei] no cenário de [Kingdom Royale].

Certo, por isso, tenho que tomar providências. Não posso depender da Iroha-san. Não posso depender da Maria. Não posso depender de ninguém nessa quarta rodada de [Kingdom Royale]. Afinal de contas, sou o único aqui. Nesse momento sou o único que está realmente enfrentando o Daiya, que está naquela câmara escura.

 

Olho para o dedo que ela jogou fora. Iroha-san, compreendo o tamanho de sua determinação. Também sei que você é uma pessoa incrível. Mas mesmo assim… você não é adequada para isso. Você não pode virar o «rei». Você é uma criança vergonhosa que está tentando se tornar o «rei» enquanto possui apenas um papel insignificante aqui… suma.

O único que tem o direito de se tornar «rei»… sou eu!

 

Primeiro dia <F> Quarto de [Kazuki Hoshino]

Depois daquilo, Yuuri-san e Koudai Kamiuchi se uniram ao «grupo» dela. Deixando Yuuri-san de lado, não esperava que Koudai Kamiuchi fosse aprovar isso tão facilmente. Bom, embora ele provavelmente não tenha pensado muito sobre isso.

Maria e Daiya deixaram para decidir depois. Já que Iroha-san também parece achar que obediência absoluta não é algo simples de se aceitar, ela irá esperar até o terceiro dia… ou, mais precisamente, até o bloco «D», quando estivermos todos reunidos.

Mas desde já, somos suspeitos de estarmos do lado dos «manipuladores». Não apenas Iroha-san, mas Yuuri-san certamente também está em guarda contra nós, mesmo que ela não demonstre em sua expressão. Já estamos nos opondo uns aos outros.E não tem como alguém acreditar nas palavras de alguém que está no «grupo» oposto.

Mas, bem, é claro que preciso agir. Preciso destruir a ilusão dela de se tornar o «rei». Para começo de conversa, não tem como o jogo ser impedido com um sistema de «grupos». As ações de Koudai Kamiuchi não podem ser suprimidas por tal coisa, e também não acho que a Iroha-san seja capaz de controlar as ações da Yuuri-san. Aqueles dois podem ter se juntado ao «grupo», mas não se submeteram completamente. Iroha-san não tem como saber sobre isso sem ter informações das rodadas anteriores. Portanto, preciso destruir esse sistema de «grupos».

Mas não acho que seja possível conseguir isso atacando ela, agora que ela chegou a uma resolução. Se tornar o «rei» já se tornou o objetivo dela. Sei muito bem que ela não será mais abalada por nada, uma vez que tenha determinado seu objetivo. Experimentei isso em primeira mão durante o terceiro round e também com a atitude dela de cortar o próprio dedo agora a pouco. Então, não tenho escolha a não ser atacar outra pessoa.

— …que é…

A pessoa que devo atacar aparece em minha mente naturalmente. Yuuri Yanagi. Não será fácil persuadi-la. Mas só posso destruir o «grupo» através da Yuuri-san. Isso, certo. Vamos atacar a Yuuri-san amanhã.

 

Paro de pensar e me deito na cama. Acho que a situação não acabou muito bem. Também acho que fui totalmente fraco. Preciso conseguir mais determinação para agir melhor. Mas por hora…

Primeiro dia, nenhuma vítima.

 

Segundo dia <B> Sala de Reunião

— Certo, entreguem tudo.

Ao comando da Iroha-san, Yuuri-san e Koudai Kamiuchi colocam suas porções de comida, facas e, por alguma razão, os relógios sobre a mesa. Iroha-san os toma os coloca em seu braço esquerdo que tem um dedo a menos. De alguma forma entendo que isso é para ser um sinal de que ela está no controle deles.

…Mas mesmo assim, me parece estranho ela conseguir permanecer com essa expressão séria, como se não tivesse aquele mindinho para começo de conversa …Ainda não está doendo?

— Ah, e nem tentem falar com eles, certo? Eu limitei o que eles têm permissão de dizer.

Agora que ela menciona, esses dois não abriram a boca, exceto para nos cumprimentar. Julgando pelo estado das coisas, tenho certeza de que eles também revelaram suas [classes] para ela.

— Bom, «nós» não temos nada para dizer a vocês, então se precisarem de algo, me chamem.

Maria olha em minha direção, mas não abre a boca no final. Maria sabe que isso tudo é obra de uma ‘caixa’. Ela sabe que nós vamos sem dúvida conseguir chegar a uma solução se pudermos fazê-los entender esse fato. Mas ela não pode dizer.

Agora que a Iroha-san montou «grupos», não importa mais se é a verdade ou não. O que importa é se a Iroha-san pode acreditar ou não. E se ela não acreditar, será muito difícil nos recuperarmos depois.

Pelo menos Maria não conseguirá agir até saber por que eu já tenho conhecimento sobre a ‘Game of Idleness’. Portanto, era inevitável a Iroha-san ter começado a falar com nós unilateralmente, agindo calmamente como se nada tivesse acontecido. Ela parece interessada em nossos cotidianos e alegremente puxa assuntos sobre nossos hobbies ou o que fazemos nos dias livres. Mas nós sabemos do perigo de nossas palavras serem interpretadas da forma errada. É quase como se o promotor e o acusado estivessem comemorando um reencontro no tribunal.

Durante todo esse tempo, estive olhando para Yuuri-san, enquanto respondia cuidadosamente as perguntas da Iroha-san. Ela manteve a cabeça baixa o tempo todo. Se ela começar a agir…

Me lembro da segunda rodada. Diferente da Iroha-san que age abertamente, Yuuri-san atua por trás dos panos. Já será tarde demais quando as ações dela forem reveladas. A Yuuri-san realmente fará alguma coisa? Sendo tão calculista, não acho que ela tomaria atitudes precipitadas se acreditar que o plano da Iroha-san é a melhor opção para ela sobreviver.

Subitamente, ela percebe meu olhar e ergue o rosto. Mesmo estando um pouco nervosa, ela mostra um fraco sorriso como se estivesse simpatizando comigo. Seus sorrisos indefesos ainda carregam o charme de um pequeno animal, então não consigo evitar achá-la adorável.

Adorável? Ela está tentando me fazer achá-la adorável? Ela não está me evitando, mas tentando me fazer de aliado nessa situação?

— …

Não, estou desconfiando demais. Mesmo ela não produz cada expressão propositalmente. Sei disso. Sei disso… mas percebo outra coisa. Acabei de pensar se ela irá ou não agir? Por que ainda estou tão tranquilo a ponto de me perguntar sobre essas coisas? A situação já passou desse estágio.

No segundo round, ela começou a agir imediatamente assim que chegou… bom, ser a jogadora pode ter acelerado as coisas. Mas as ações dela sempre são rápidas. Ela já está planejando algo para essa rodada também. Yuuri Yanagi começou a agir há muito tempo.

 

Segundo dia <C> [Encontro Secreto] com [Yuuri Yanagi], Quarto de [Yuuri Yanagi]

 

[Iroha Shindou] ->

[Maria Otonashi]

15:00~15:30

[Yuuri Yanagi] ->

[Iroha Shindou]

15:40~16:10

[Daiya Oomine] ->

[Koudai Kamiuchi]

15:00~15:30

[Kazuki Hoshino] ->

[Yuuri Yanagi]

15:00~15:30

[Koudai Kamiuchi] ->

[Iroha Shindou]

16:20~16:50

[Maria Otonashi] ->

[Kazuki Hoshino]

15:40~16:10

 

Pelo desenrolar das coisas, sou forçado a ter um [Encontro Secreto] com a Yuuri-san imediatamente. Portanto, sou incapaz de manter meu compromisso com o Daiya. Mas não posso evitar.

Entro no quarto da Yuuri-san. Ao me perceber, ela imediatamente se levanta da cama e se curva repetidamente.

— Sinto muito, Hoshino-san. Não tenho permissão para falar com você no [Encontro Secreto] também. Então temo que não poderei falar com você, mesmo que queira conversar comigo…

Essa atitude.

Yuuri-san definitivamente deve estar me vendo como um dos «manipuladores» e estar em guarda contra mim. Isso é certeza. E mesmo assim, ela está tentando dar a entender que está apenas seguindo as ordens da Iroha-san sem ter nada contra mim em particular. Para poder fazer de mim um aliado caso seja necessário…Mas mesmo que ela seja tão astuta, preciso dar um fim a isso.

— …Iroha-san não está aqui! Você vai seguir as ordens dela mesmo assim?

— Hum… eu também preciso mostrar a ela meu terminal portátil.

Iroha-san realmente não deixa escapar nada. Mas isso estava dentro das minhas expectativas. Portanto, tenho um plano de contra-ataque.

— Vou ser franco, você realmente está bem com isso?

— Hu… uhmm… como eu disse… não posso te responder. Sério.

— Você acha que o plano da Iroha-san vai funcionar?

— Hu… humm…

Quando ela começa a olhar ao redor por estar se sentindo incomodada, o olhar dela para sobre a mesa. Porque ela percebeu que algo está escrito no bloco de notas que coloquei ali.

 

«Nossa conversa não irá vazar se escrevermos»

 

Mensagens escritas no bloco de notas não serão gravadas no terminal portátil. Isso é algo que percebi durante a segunda rodada quando recebi uma mensagem anotada de Koudai Kamiuchi.

Yuuri-san arregala os olhos e me encara. Parece que ela entende o significado disso. Estendo a caneta para ela. Mas parece que ela não consegue decidir sobre o que fazer imediatamente. Ela não se move nenhum pouco, se não para segurar as mãos em frente ao peito.

— …Entendo! Você não pode dizer nada, certo? Então também não vou falar nada. Aah… ah, que porcaria. Então apenas gastei um [Encontro Secreto], hein…

Para enganar a Iroha-san, digo essas palavras e então movo minha mão.

«O que você realmente quer fazer? Vai obedecer a Iroha-san desse jeito?»

Quando termino de escrever, estendo a caneta para ela novamente. Mas ela apenas chacoalha a cabeça sinalizando que não pode fazer isso.

«Não importa como?»

Tento escrever isso, mas ela ainda me dá uma resposta negativa…Bom, nada para ficar surpreso. Ninguém iria imediatamente aceitar algo de alguém contra quem se está em guarda. Portanto, vou tentá-la. Vou tentá-la para que ela não consiga mais se manter calma. Escrevo as palavras que vão conseguir isso.

«Você sequer o amava.»

Surpresa por essa súbita sentença misteriosa, ela me encara com os olhos arregalados. Mas não vou parar agora. Vou continuar incomodando-a e garantir que ela, com certeza, terá que me responder.

Continuo.

 

«Você saiu com o garoto que a Iroha-san gostava, certo?»

 

— …!!

O efeito é devastador. Os ombros dela começam a tremer com força e o seu rosto fica horrivelmente pálido. Com uma expressão composta ofereço a caneta para ela mais uma vez. O olhar da Yuuri-san fica alternando entre mim e a caneta várias vezes até chegar à conclusão de que não pode mais rejeitar e a aceita com os olhos cheios de lágrimas.

Mas pelo que parece, ela ainda quer bancar a desentendida, ela escreve «Do que você está falando?» com a mão tremula. Dou a ela o tratamento de silêncio sem demonstrar qualquer reação, o que a fez imediatamente arrancar a folha e amassá-la. Então ela começa a escrever com uma lágrima solitária escorrendo pelo seu rosto.

«Por que você sabe disso?»

«Devia ser impossível de perceber.»

«A própria Iroha não deve ter notado ainda.»

Ao terminar, ela me devolve o bloco junto com a caneta. Limpando a lágrima do rosto, ela volta os olhos em minha direção…Há, não vou ficar comovido com a sua expressão!

«Você mesma me contou.»

Para ser exato, ouvi sobre isso da Iroha-san, mas seria um incomodo explicar isso agora. A mão dela treme como se ela estivesse a ponto de ficar apavorada.

«Não te entendo! Nunca te disse algo assim. Do que você está falando?»

Até agora tudo como esperado. Era meu objetivo fazê-la perguntar esse «Por quê?». Graças a isso, posso finalmente escrever o que quero.

«Não é minha primeira vez jogando [Kingdom Royale].»

Ela lança um olhar ansioso em minha direção, parece que ainda não entende completamente. Mas se eu colocar dessa forma, ela deve ser capaz de entender com sua mente brilhante.

«Já joguei várias vezes com os mesmos jogadores. Agora é a quarta vez.»

Os olhos dela se arregalam. Mas então, posso perceber um pouco de compreensão em sua expressão, ao mesmo tempo ela começa a tremer de medo.

«Portanto, também te conheço muito bem.»

Ela chacoalha a cabeça freneticamente como se quisesse negar o que eu escrevi. E então ela mesma pede a caneta.

«Não importa! Jamais contaria a ninguém sobre meu ex!»

«Em circunstâncias normais, sim. Mas você realmente tem confiança de que não diria nada a ninguém em uma situação anormal como essa?»

— …Gh!

«Estive com você por três jogos. Portanto, acredito que a conheço muito bem.»

«E é por isso que percebi algo.»

Por que Iroha-san de repente se tornou tão difícil de se aproximar durante nosso [Encontro Secreto]? Descobri ao checar o nome da pessoa com quem ela teve um [Encontro Secreto] antes de mim.

 

«Você convenceu a Iroha-san a criar grupos, não foi?»

 

— O que…

Ela rapidamente cobre a boca com a mão esquerda antes de deixar mais alguma coisa escapar. Sem remover a mão dessa posição, ela começa a escrever nervosamente.

«O que você está dizendo? Quer insinuar que é minha culpa as coisas terem acabado assim? Tudo? Não tem como eu ter feito isso!»

«A Yuuri-san que eu conheço pode fazer isso.»

É claro, não é como se ela soubesse de tudo. Ela jamais teria previsto que a Iroha-san ia cortar o próprio dedo. Mas conhecendo a personalidade da Iroha-san tão bem, ela devia pelo menos ser capaz de ter previsto o seguinte:

«No mínimo você devia saber que a Iroha-san iria tentar nos colocar sob o comando dela.»

Yuuri-san deixa seu olhar cair em direção ao chão e fecha os lábios.

«A Yuuri-san que conheço usa os outros para sobreviver.»

«Até mesmo a Iroha-san.»

Quando ela não tem outra escolha para sobreviver. Isso porque diferente da Iroha-san, ela não tem como se tornar o «rei» ela mesma. Com a personalidade dela, é impossível comandar os outros e unir a vontade de todos os membros.

Contudo, ela pode controlar a pessoa que se tornou o «rei». Por isso ela quis que Iroha-san se tornasse o «rei». Ela estava tentando nos controlar indiretamente. E planejava garantir a própria segurança com isso. Ela ainda está em silêncio sem erguer a cabeça.

Depois disso, ela não se move por algum tempo. Mas antes que eu possa perceber, a respiração dela volta ao normal.

— …

Movendo seu braço tranquilamente, ela começa a escrever algo no bloco de notas.

«Acredito que você já passou por esse jogo três vezes. Também acredito que você me conhece muito bem.»

Ela lentamente arranca a folha e começa a escrever na próxima.

«Mas e daí?»

 

Ela ergue o rosto.

— …Uh.

Eu congelo. Porque os olhos dela são os mesmos olhos vazios que já vi antes.

«Se eu pedir desculpas agora e chorar dizendo “vou fazer o que você mandar”, ficará satisfeito? Se for, posso fazer isso o quanto quiser!»

E então, realmente, lágrimas aparecem nos olhos dela. Após fazer essa expressão triste realmente comovente, ela escreve o seguinte:

«É brincadeira de criança.»

— …

Ah, uau. Eu já perdi.

«Escute, isso não é o que eu»

Ela sequer está mais olhando para o que estou escrevendo. Após ficar em silêncio, ela coloca um meio sorriso no rosto e deita na cama.

— Uh…

Eu planejava fazê-la se render a… não, não precisava ir tão longe. Só queria fazê-la perceber a verdade e se tornar minha aliada. E então eu faria algo sobre a Iroha-san usando isso como base. Mas obviamente confundi os meios.

Claro, se simplesmente tivesse contado a verdade, ela não teria acreditado. Mas esse era realmente o único meio? Por que, de todas as coisas, decidi atacar essa garota assustadora?

«Não, você guarda sim rancor contra aqueles caras que te enganaram e te assassinaram brutalmente, não é mesmo? Eles tentaram te matar para salvar suas próprias vidas! Hehehe»

Me lembrei do que o Noitan disse.

Talvez ele estivesse certo? Eu inconscientemente preferi considerá-los como inimigos a serem derrotados ao invés de amigos a serem salvos? E foi por isso que a ataquei?

Então… posso já ter sido pego na armadilha dessa maldita ’Game of Idleness’.

 

Segundo dia <C> [Encontro Secreto] com [Maria Otonashi], Quarto de [Kazuki Hoshino]

Maria entra no meu quarto, mal-humorada, com os braços cruzados.

— …Finalmente. Finalmente posso falar com você direito. Caramba… o que está se passando na sua cabeça? Você devia ter vindo diretamente discutir as coisas comigo primeiro. Mas não, você…

Ela para de falar e franze a testa.

— Que cara deprimida é essa?

Então no final das contas meu rosto parece tão deprimido? O choque de ter falhado foi tão grande que estive sentado na minha cama com a cabeça abaixada.

— Hah… você está transbordando desânimo. Então, o que houve? Foi rejeitado pela Yanagi?

— Rejeitado, hein… bom, sim, algo desse tipo, eu acho.

Ela parece surpresa por um instante já que só estava brincando, mas então deixa escapar um longo suspiro.

— Você já estava dando em cima dela…? Bom, acho que é isso que significa ser um mulherengo natural, hein. Você achou que conseguiria algo já que ela parece ser tão indefesa? Que engano constrangedor. Com aquela aparência, ela deve ser a idolatrada por um monte de garotos. Alguém como você que gosta de usar roupas femininas não tem qualquer chance.

…Não, foi você quem me forçou a vestir aquilo. Mas não tenho energia o bastante para dizer isso então apenas fico em silêncio, com o rosto ainda baixo.

— …Em primeiro lugar, como você pode se apaixonar por uma garota que conheceu ontem? Se pelo menos fosse a Mogi…

— Eh…?

Ergo meu rosto em reflexo porque ela fica em silêncio de repente. Maria coça o nariz e me encara, depois se senta perto de mim com mais energia do que o necessário. Sem dizer nada ela dá um soco no meu ombro.

— Kazuki, me compre uma torta de morango.

E está tentando me extorquir por alguma razão.

— …

— Não me olhe assim. Estou dizendo que vou te fazer companhia porque você perdeu de forma tão vergonhosa. Serei tão gentil a ponto de ouvir suas desculpas patéticas que perdedores rejeitados usam o tempo todo. Tipo como você não se importava realmente com ela, ou que ela não era tão bonita assim. Uma torta de morango na verdade é um preço bem baixo se você pensar nisso como pagamento para aguentar seu ânimo deprimente.

— …Não, err…

— Não sei quanto a Yanagi, mas vou te fazer companhia. É o que estou dizendo.

Ela diz com uma expressão despreocupada. Acabo ficando surpreso com essas palavras gentis, já que ela diz tão bruscamente como se não fosse nada demais. Mas então acabo sorrindo por ela se preocupar tanto.

Certo. Não é hora de ficar deprimido. Realmente, eu perdi. Mas ainda não deve ser tarde demais. Ainda tenho opções para usar — sem cometer erros dessa vez. Para proteger a Maria.

— Desculpe Maria. Não é como se eu tivesse me confessado para ela e tivesse levado um fora.

— …Eu sei. Não tem como você ter coragem o bastante para isso. Foi só uma piada para te animar.

Ela não estava surpresa um instante atrás…?

— Então, o que aconteceu entre você e a Yanagi?

— Eu falhei em persuadi-la.

Ela ergue uma sobrancelha.

— Yanagi? Não a Shindou?

Concordo. Diante da minha resposta, Maria segura o queixo com a mão e começa a pensar por um tempo.

— Por quê? Por acaso você chegou à conclusão de que essa era uma ação necessária considerando a informação que você tem? …Ah, certo. Para começo de conversa, quero te perguntar o que diabos você sabe.

— Ah, sim…

— Ponha tudo para fora.

A expressão dela me diz que ela está completamente convencida de que vou depender dela e contar absolutamente tudo. É claro. Tendo passado uma vida inteira ao meu lado, ela pode me ler perfeitamente. Contudo…

— …Desculpe, mas prefiro não te dizer.

Eu vivenciei várias tragédias das quais ela não tem conhecimento. Fui confrontado várias vezes com o fato de que devo protegê-la.

— …O que… você está dizendo? Não vai me dizer? Por quê?

— Acho que não devo depender de você sempre.

— …Por que isso? Esse não é um problema de depender ou não, é? Não é óbvio que é melhor tentar encontrar uma solução juntos!

Parece perfeitamente lógico. Com minha inteligência, posso acabar cometendo um erro que nem antes. Estou consciente de que minhas próprias habilidades não são confiáveis. Mas o que aconteceria se eu contasse para ela nossa situação? Por exemplo, se contasse para ela que ela é apenas um NPC? Ela certamente veria a si mesma como descartável e se negligenciaria mais do que já o faz!

Não posso contar isso a ela. Todos precisam sobreviver. A forma como ela se sacrifica… é um obstáculo no caminho do meu objetivo. Portanto, não posso esclarecer as coisas para ela. É melhor que a Maria atue o mínimo o possível.

— …

Com uma expressão triste, ela abre a boca.

— …Feri seu orgulho te ajudando o tempo todo? Você acha que eu o menosprezo? Se agi de uma forma que fez parecer isso, sinto muito.

— Eu jamais pensei dessa forma!

— Então…!

Ela provavelmente não tinha a intenção de gritar dessa forma. Ela desvia o olhar envergonhada e continua mais calmamente.

— …Então… dependa de mim!

— …Maria.

…Talvez, antes eu veria essas palavras como fortes e confiáveis. Mas não consigo mais pensar dessa forma. Na verdade, me parece ser exatamente o contrário. Afinal de contas, eu sei. Sei que a Maria está consciente de que isso é apenas o egoísmo dela. Portanto, a declaração dela:

— Eu vou te salvar!

… É na verdade apenas um choro de lamentação. Bom, essa é a forma como eu vejo, mas não muda o que tenho que fazer.

— …Maria, você pode manter segredo sobre a ‘caixa’ por um tempo? Acho que é perigoso falar sobre isso para a Iroha-san.

— …Você não tem qualquer intenção de me esclarecer?

— …Não.

Ao ouvir minha resposta, Maria deixa o olhar cair e cruza os braços.

— …Entendo. Você deve ter pensado sobre isso, então não tem jeito, eu acho.

Suprimindo os próprios sentimentos, ela tenta aceitar. Contudo, ela não é capaz de evitar que a amargura de seus sentimentos apareça em seu rosto. Maria me encara, de forma inexpressiva. Nossa relação não é tão superficial a ponto de eu não perceber a tristeza em seus olhos. E então, ela diz.

 

— Você é… o Kazuki, certo?

 

Ela, que sempre conseguiu ver através de mim como se pudesse ler os meus pensamentos — e que durante a ‘Sevennight in Mud’ até disse ser capaz de me reconhecer através dos movimentos dos meus músculos faciais — diz isso.

— …Eh?

E então, chocado… chocado por ela dizer tal coisa, sou deixado completamente atordoado. Maria desvia o olhar. Com o olhar desviado, ela sussurra em uma voz fraca.

— …Não é nada. Por favor, esqueça.

 

Segundo dia <F> Quarto de [Kazuki Hoshino]

Desde o [Encontro Secreto] a atitude da Maria não parece particularmente alterada. Tenho certeza de que o que ela disse foi apenas um leve deslize. Como prova disso, ela não falou a ninguém sobre as ‘caixas’.

Como ninguém agrava a situação, as coisas continuam da mesma forma. Mas isso é apenas por hoje. Iroha-san exige uma resposta, sobre nos unirmos ao «grupo» ou não, até o terceiro dia. Mas de qualquer forma, o dia de hoje acabou.

Desmaio em minha cama.

Segundo dia, nenhuma vítima.

 

Terceiro dia <C> [Encontro Secreto] com [Daiya Oomine], Quarto de [Kazuki Hoshino]

 

[Iroha Shindou] ->

[Daiya Oomine]

15:40~16:10

[Yuuri Yanagi] ->

[Iroha Shindou]

16:20~16:50

[Daiya Oomine] ->

[Kazuki Hoshino]

15:00~15:30

[Kazuki Hoshino] ->

[Yuuri Yanagi]

15:40~16:10

[Koudai Kamiuchi] ->

[Iroha Shindou]

15:00~15:30

[Maria Otonashi] ->

[Daiya Oomine]

16:20~16:50

 

— …Eu realmente disse que destruiria minha própria ‘caixa’ se ninguém morrer até o bloco <E> do oitavo dia?

— Sim.

Daiya começa a pensar em silêncio depois que afirmo. Finalmente consigo terminar de contar a ele tudo sobre a ‘Game of Idleness’. Originalmente, não planejava contar que ele é um NPC, mas Daiya percebeu imediatamente que estava escondendo algo, então não tive escolha a não ser contar. Mas Daiya não se preocupou tanto com isso. Na verdade, ele parecia estar mais preocupado sobre ser o portador da ‘Game of Idleness’.

— …Ei, Kazu. O que eu te disse antes de você partir?

— Por que você quer saber isso?

— Pare de ficar se preocupando com detalhes inúteis e me diga logo, Kuzu¹-Kazu.

O que? Agora os insultos dele até rimam?

— …Humm, quando te disse que ia vencer, você respondeu «Absolutamente impossível». Essas devem ter sido as últimas palavras que ouvi de você.

— Ah claro, você me derrotar é tão impossível quanto a terra começar a girar dez vezes mais rápido que o normal.

Esse cara não acabou de dizer algo extremamente rude?

— O que significa que o «verdadeiro eu» acredita ser impossível ninguém matar ninguém em [Kingdom Royale], hein.

— …Acho que sim.

Ainda incapaz de entender tudo, Daiya cruza os braços. Já que ele parece estar pensando se acredita em mim ou não, pergunto relutante.

—…Você acredita em mim?

Daiya ergue o rosto e responde sem relaxar a expressão.

— Se você é realmente Kazuki Hoshino, então não tenho outra escolha. Afinal, o Kazuki Hoshino que conheço não é capaz de pensar em uma história assim do nada, e não consegue mentir além disso.

…Resumindo, ele acredita em mim?

— …Mesmo assim, se você realmente é Kazuki Hoshino… você mudou bastante.

Palavras inesperadas.

— Sim, você ainda é uma existência que repele os “desejos” dos outros, mas sinto que a razão por trás disso mudou um pouco. Uma vez disse que você parece estar flutuando, certo? Esse sentimento diminuiu um pouco.

— …Por que… diminuiu?

— Sei lá! Talvez algo tenha acontecido nessa ‘caixa’ que te fez mudar?

— Nessa ‘caixa’…?

A primeira coisa que me vem à mente é Yanagi Nana. Mesmo achando que tinha esquecido ela, tendo evitado essas memórias por tanto tempo, estive preso por ela esse tempo todo — pelo meu primeiro amor.

Acho que não estou completamente livre dela mesmo agora. Vou acabar tentando esquecê-la para me libertar novamente. Mas realmente, percebo que não posso fugir. Percebo isso claramente. Por causa dessa pequena mudança, pareço tão diferente para os outros?

— Para mim, parece ser um objetivo… não, você criou um desejo. Se for assim, talvez você não seja mais capaz de dominar a ‘caixa’ completa…

Daiya para antes de terminar.

— …Algum problema?

Como se minhas palavras não pudessem mais alcançá-lo, ele continua petrificado com os olhos arregalados.

— …Dominar a ‘caixa’…? Entendo… então isso…

— Daiya…?

Daiya segura o queixo, absorvido em pensamentos, e me ignora. Quando desisto de esperar por uma resposta, os cantos dos lábios dele se erguem de repente.

— Heh, hehe…

Não faço ideia de qual o sentido dessa risada.

— Obrigado, Kazu!

— Eh?

— É realmente fácil entender os próprios pensamentos. Graças a isso, acabo de entender o que o «verdadeiro eu» está pensando.

Ele tem um sorriso triunfante ao dizer isso. Vendo essa expressão, não consigo evitar me sentir um pouco ansioso…O que? Daiya está planejando algo? Mas o NPC Daiya deveria ter o mesmo objetivo que eu. Ele deveria acreditar em mim sobre a condição de «vitória se ninguém morrer até o dia 8».

Então, me pergunto. Por que parece que ele não será mais meu aliado?

 

Terceiro dia <C> [Encontro Secreto] com [Yuuri Yanagi], Quarto de [Yuuri Yanagi]

O jogador está completamente sozinho.

Apenas ele tem informações que o colocam em vantagem no jogo, mas é incapaz de dividi-las com os NPCs. Portanto, no final ele só pode usar essa informação para enganá-los. Então pode ser natural que ele lute sozinho. Matar os NPCs para sobreviver, enquanto é esmagado pelo sentimento de culpa.

Tenho certeza que essa é a maneira certa de se lutar nesse jogo. Mas estou aqui para evitar isso. Porque essa é a única maneira de salvar Maria. Porque de outra maneira sentiria que fui derrotado pela ‘caixa’. Mas… é realmente possível fazer isso? Nesse [Kingdom Royale] no qual não se pode fazer aliados?

Entro no quarto de Yuuri Yanagi com um clima pesado. Ela sequer olha em minha direção. Mesmo sabendo que é fútil, escrevo uma mensagem numa folha do bloco.

— …

Yuuri Yanagi rasga o papel, amassa e o joga longe sem sequer ler. Então ela não tem mais a intenção de me responder. Mordo meu lábio. Como posso controlá-la se sequer consigo me comunicar com ela? Devo tentar fazê-la me ouvir apenas deixando claro que só quero salvá-la? …Não, seria inútil. Eu mesmo comecei a duvidar disso, então não tem como transmitir essa mensagem apropriadamente.

— …

Cerro o punho e olho para o chão. Yuuri-san percebe meu desânimo, mas ainda não olha em minha direção. Não tem mais saída? Eu já perdi? No próximo bloco <D>, Iroha-san irá nos forçar a entrar no «grupo». Se for como ela planejou, não serei mais capaz de me tornar o «rei».

De repente, percebo um bloco de notas em cima da mesa, que provavelmente pertence a Yuuri-san. Nele está escrito:

 

«Iroha-san é o [Revolucionário]»

 

Percebo o significado disso imediatamente. Em outras palavras, Yuuri-san está dizendo:

Se você tentar algo, eu te mato.

Acho que ela está dizendo a verdade. Iroha-san só foi capaz de se proclamar como líder porque não tinha que se preocupar em ser morta… em outras palavras, porque ela é o

[Revolucionário]. Além disso, acredito que Yuuri-san seja ou o [Rei] ou o [Feiticeiro]. Após descobrir a distribuição de [classes], Iroha-san certamente concluiu que não seria morta. E uma garota capaz de cortar o próprio dedo pode me matar se for preciso.

Confirmando minha situação atual. Tornei praticamente todos meus inimigos. Yuuri-san é óbvio, mas Iroha-san e Koudai Kamiuchi também são inimigos, e sequer sei o que o Daiya está pensando, como sempre. E não posso me permitir ser dependente da Maria, que é supostamente minha única aliada.

Em tal condição, tudo o que eu fizer se voltará contra mim. Então, não posso mais me tornar o «rei»?

— … Ugh…

Mesmo dizendo para mim mesmo não desistir, não consigo pensar em uma forma de reverter essa situação. É desesperador demais. Finalmente caio de joelhos. Não tem mais jeito. Vou deixar o trono para Iroha-san. Não acho que isso acabará bem, mas é melhor do que tentar agir por mim mesmo. Devo obedecer Iroha-san e rezar aos céus para que Daiya e Koudai Kamiuchi não tentem nada. Devo agir como uma mera pedra e não fazer nada, apenas estar ali. Eu já… fui derrotado.

Ergui meu rosto para implorar por perdão. E então, eles entram em meu campo de visão. Os olhos da Yuuri-san que estão me olhando de cima se tornam claros para mim.

 

Olhos vazios entraram em meu campo de visão.

 

— …Ah.

Graças a isso, finalmente percebo.

«Não, você guarda sim rancor contra aqueles caras que te enganaram e te assassinaram brutalmente, não é mesmo? Eles tentaram te matar para salvar suas próprias vidas! Hehehe»

De repente descubro a resposta para essa declaração.

…Não. Eu não guardo nenhum rancor contra eles. Mas…vou esmagá-los até eles se renderem a mim.

 

Quanto ataquei a Yuuri-san ontem, achei que tinha feito aquilo por já ter caído nas garras dessa ‘caixa’.Mas isso não é verdade. Desde o começo, eu já não sabia claramente? Minha missão não é ser gentil com essas pessoas que são meros NPCs. É resgatar os verdadeiros.

«Por favor, me mate.»

Durante o segundo round, a «verdadeira Yuuri-san» me disse isso. A ‘Game of Idleness’ a acuou tanto que ela chegou a me pedir isso. Mas a ‘Game of Idleness’ foi realmente a única razão para o sofrimento dela? Não, não foi. Algo já a estava atormentando, mesmo no mundo real. Sei disso agora. Porque aprendi uma coisa dentro dessa ‘caixa’ inútil e sem valor.

Não se pode desfazer o que foi feito. O pecado da Yuuri-san por ter matado a Iroha-san e os outros não irá desaparecer. Mas não é possível analisar e resolver os problemas que ela trouxe do mundo real? Fazer isso não diminuiria a dor dela, pelo menos um pouco? Por esse propósito, vou vencer.

E não vou hesitar em esmagar os NPCs.

Isso se tornará prova de que não perdi foco da realidade, do meu cotidiano. Se tornará a prova de que não fui derrotado por algo como a ‘Game of Idleness’. O que significa.

— …Hehe.

Que não perdi ainda.

Me levanto. Os jogadores nesse jogo estão realmente sozinhos. Mas não me importo nem um pouco. Sou o único aqui que pode destruir a ‘Game of Idleness’, não importa o quão desesperadora seja a situação. Além de mim, ninguém pode salvar os outros. Então… farei isso. Vou salvar todos, e fazer Yuuri-san se render é o primeiro passo.

— …Que sorriso é esse?

Ela ainda está me encarando com esses olhos vazios.

Obrigado. Só consegui perceber tudo isso graças a esses olhos. Percebo que ela está sofrendo por estar cansada de reprimir sua verdadeira personalidade. Consigo perceber que quero fazer algo quanto a isso.

Ainda sorrindo, arranco a folha que diz «Iroha-san é o [Revolucionário]» e a desfaço em pedaços diante dos olhos dela, fazendo o máximo de barulho o possível. O vazio dos olhos dela é substituído por espanto.

Sim, é assim que tem que ser. Não vou deixá-la ficar com aqueles olhos vazios novamente!

— Yuuri Yanagi.

Ela arregala os olhos e me encara ao me ouvir chamá-la pelo nome completo do nada.

Você se tornará sustento para a verdadeira Yuuri-san.

Como a conheço tão bem, sei exatamente como ela vai reagir.

— …Ah…

Aah, como esperado, você fez seu rosto ficar pálido, sua medrosa. Você não está mais composta o bastante para me ignorar, certo?

— Por esse objetivo, irei destruir o sistema de «grupos» da Iroha-san. Primeiro, vou começar agora mesmo fazendo você sair do grupo.

Após ficar sem palavras por vários segundos, ela finalmente consegue formar uma objeção.

— O… o que você… Nã… não tem como eu sair! Além disso, não posso!

— Eu disse que vou “fazer” você sair.

— Se eu contar isso a ela… Vo… você será morto pela Iroha-san, sabia…? Ela que pode realmente… não, ela definitivamente fará isso, sabia?

Parece que ela não tem mais compostura para perceber que essa conversa será passada para a Iroha-san de qualquer forma.

— Eu sei!

— E… então por que você está dizendo algo assim?! Isso é suicídio!

— Porque também vou derrotá-la, é claro. Dessa forma não serei morto.

Yuuri-san arregala os olhos. E chacoalha a cabeça com força.

— Impossível… isso é absolutamente impossível. Se você soubesse… se você soubesse quantas vezes já confirmei isso…

Certo…É isso.

Finalmente encontro a origem do sofrimento dela no meio dessa lama toda que está presa a ela.

— Então, se eu derrotar a Iroha-san…

A origem daqueles olhos vazios.

Se eu derrotar a Iroha-san, será capaz de superar a inveja que sente por ela?

 

…Seu complexo de inferioridade em relação à Iroha-san.

 

É um sentimento que posso entender muito bem, sendo próximo à Maria e Daiya. Precisamos perceber o tempo todo que não podemos nos comparar a eles, e encarar o medo de parecermos tão insignificantes ao lado deles.

Pior, diferente de mim, ela é o “número 2”. Deve ter sido ainda mais difícil de aguentar, estar sempre um mísero passo atrás. A distância entre ela e Iroha Shindou — parece estar tão perto, mas mesmo assim não consegue alcançá-la.

Quão humilhante deve ser sentir isso o tempo todo?

«No final, uma idiota como eu deveria ter ficado quieta… pessoal, desculpem por incomodá-los.»

No primeiro round, ela chamou a si mesma de idiota. Ela sempre pareceu estar insegura, apesar de parecer inteligente e respeitável do meu ponto de vista. Isso porque ela sempre esteve comparando a si mesma com uma pessoa que não pode alcançar.

— …Ah.

Então ela estava ciente disso, no final das contas? Ela está tremendo com tanta força que é quase digna de pena.

— Você queria derrotar a Iroha-san em algo, não importa o que, certo?

Ela se encolhe ao ouvir isso.

— Você queria derrotar a Iroha-san. Sempre quis vencer. Portanto, também queria vencer nesse jogo. Decidiu por si própria que poderia reclamar uma vitória se fosse capaz de controlar a Iroha-san. E agiu de acordo com isso.

Tenho certeza que foi por isso que ela enganou a Iroha-san quando foi a jogadora e a fez sofrer falando coisas sobre seu ex.

— Pa…pare de falar como se você soubesse de tudo…

Perturbada, ela quer negar, mas agora que não está em condições de atuar, é muito fácil ler sua expressão.

— Mas mesmo agora que tudo ocorreu como planejado, você não ganhou o seu sentimento de vitória.

— …!!

— Você foi completamente esmagada. Porque foi forçada a perceber o quão simplório é o seu plano comparada a determinação inacreditável que a deixou cortar o próprio dedo.

— …Pare.

— E após vislumbrar a supremacia dela, tudo o que pôde pensar foi em sobreviver, dependendo dela. Porque ela a fez perceber o quão fraca e sem importância você é.

— Pare.

— Em primeiro lugar, sempre foi claro que você não podia vencer. Afinal, já sabia que algo como isso jamais seria o bastante para eliminar seu complexo de inferioridade, que não desapareceu mesmo depois de ficar com o garoto que ela gostava.

— Eu já não disse para você parar!?

Junto com esse grito, senti uma dor percorrer meu rosto… Ela acabou de me dar um tapa? Não posso acreditar por um momento. Não, quero dizer, Yuuri-san me deu um tapa? Ela, que é capaz de se controlar melhor do que qualquer um?

E ela mesma arregala os olhos em surpresa pelo que acaba de fazer. Agora ela está encarando a própria mão, em silêncio, enquanto a abre e fecha repetidamente.

— …Ah…

Então os ombros dela começam a tremer.

— E… eu sinto muito…

Antes de conseguir terminar o que ia dizer, lágrimas começam a se formar em seus olhos.

— …Me… desculpe. Mas, por favor… pare com isso… por favor, não diga mais essas coisas cruéis… por favor, não machuque mais os meus sentimentos… por favor… por favor…

Aposto que é difícil. É difícil encarar seus próprios sentimentos imorais. Afinal, é algo que ela não conseguiu me confessar quando me revelou os planos dela durante o segundo round. Mas…

— Não.

Por que deveria me importar? Exatamente por ela estar me implorando para não fazer isso, devo ferir os sentimentos dela ainda mais.

— Uh… aah…

Ao ouvir minhas palavras frias, Yuuri-san se ajoelha, ainda chorando, e esconde o rosto.

— Se parar agora, não vou conseguir fazer nada pela verdadeira Yuuri-san. Então, não me importo se você esconder o rosto, mas não tape os ouvidos, tudo bem?

— Uh, uuh…

É claro que é doloroso vê-la sofrer dessa forma. Mas, mesmo os meus próprios sentimentos não importam mais.

— Você quer saber o que fez durante o segundo round quando estava no meu lugar?

Esse é o golpe final.

— Você matou a Iroha-san.

Os soluços dela param, e ao mesmo tempo ela me encara com seus olhos vermelhos.

— …O… o que você está dizendo…?

Fico em silêncio propositalmente.

— …Ma… matei ela…? Jamais iria tão longe! É verdade… sou uma covarde… mas não seria capaz de fazer algo assim!

Ela honestamente acredita nisso, sem sombra de dúvidas. E tenho certeza de que está dizendo a verdade. Ela só conseguiu fazer aquilo porque era a jogadora e os outros, incluindo Iroha-san, apenas NPCs.

Mesmo assim, ela ainda a matou. Iroha-san conheceu a Yuuri-san que planejou pelas costas dela, a enganou e matou. Esse fato não irá mudar. Ela deve ter percebido que estou dizendo a verdade após olhar em meus olhos, sendo tão boa em ler os sentimentos dos outros. Ela apenas fica em silêncio e continua a derramar lágrimas em um estado de estupor. Mas continuo falando com ela.

— Yuuri-san. Vou te contar os detalhes em outra hora, mas você e Iroha-san, ambas venceram quando foram jogadoras, então vocês já conseguiram sobreviver.

Ela reage levemente a essas palavras. Já que ela parece compreender o que estou dizendo, continuo.

— Mas se não fizermos nada, Iroha-san não vai perdoar você por tê-la matado. E você não será capaz de perdoar a si mesma também. Pode parecer duvidoso, mas quero te ajudar com isso!

Então eu digo.

— Pensei em uma solução para isso!

Ela ainda está derramando lágrimas, mas parece que conseguiu se recompor um pouco. Seus olhos estão apontados em minha direção.

— Se agarre ao seu objetivo. Abra seu coração nessa rodada, mas depois disso vocês precisarão voltar a confiar uma na outra. Você apenas precisa agarrar esse objetivo! Se as duas conseguirem voltar a confiar uma na outra nesse jogo, vocês ficarão bem no futuro. Iroha-san com certeza será capaz de te perdoar, Yuuri-san.

Digo tudo calmamente.

— Portanto, você tem que dizer tudo a ela. Coloque todos os seus sentimentos com relação à Iroha-san em palavras.

Espero pela resposta dela. Ela finalmente abre a boca após se manter em silêncio por um longo tempo.

— …Não, entendo.

Sua voz parece sem vida.

— Já termos conseguido sobreviver, ou precisarmos voltar a confiar uma na outra… nada disso faz sentido para mim.

— …Entendo.

É justo. Ela não sabe quase nada sobre as circunstâncias, não tem como ela ter entendido.

— Mas…

Ouvindo essa reação contraditória, ergo meu rosto. Ela está sorrindo levemente.

— Não me importo mais em não entender. Estou no meu limite, não aguento mais pensar em coisas tão cruéis apenas para sobreviver… já basta disso.

Dizendo isso, ela me abraça de repente.

— Então… posso depender de você?

Aparentemente ela não consegue controlar a força do abraço direito, está doendo. Essa força incontrolada dela, me parece ser desamparo. E isso me deixa surpreso.

Não importa o quão difícil foi, ela sempre lutou sozinha, com seus próprios métodos. Mesmo estando ansiosa todo esse tempo, ela continuou lutando e aguentando a pressão em seu peito. Mesmo quando era a jogadora, ela enganou todos os NPCs, os acuou, matou, e quando estava sendo esmagada por seus sentimentos de culpa, recuperou sua vontade de lutar para vencer no final.

Yuuri Yanagi é uma garota incrivelmente forte.

— Me… salve.

E apesar disso, ela não pode fazer mais nada além de depender de mim. Ela não pode fazer nada além de se apegar a frágil esperança diante de seus olhos, sem controlar ninguém.

A condição dela me faz lembrar de alguém. Me fez lembrar de «Yanagi Nana». Mas não confundirei mais «Yuuri-san» e «Yanagi-san». Determinado a salvar não outra que não a «Yuuri-san», correspondo o abraço dela e digo:

— Vou salvar todos, definitivamente!

 

Terceiro dia <D> Sala de Reunião

Você pode estranhar isso, mas eu era extremamente autoconfiante até o fim do ensino fundamental. Minhas notas eram sempre as melhores e eu sabia tocar piano tão habilidosamente que cheguei a ganhar prêmios em vários concursos! Eu era o membro principal do clube de instrumentos de sopro e a presidente do conselho estudantil ao mesmo tempo. Era cercada por pessoas que me adoravam o tempo todo.

Talvez seja por isso que inconscientemente me considerava como alguém especial. E estava convencida de que isso não mudaria mesmo quando fosse para o ensino médio. Mas aquele assento «especial» não estava reservado para mim em lugar nenhum. Porque Iroha Shindou estava ocupando esse assento desde o momento em que fez o discurso de recepção dos novos alunos durante a cerimônia de abertura.

Mas naturalmente, não desisti imediatamente. Estava confiante de que poderia recuperar aquele lugar. Na verdade, estava feliz por ter uma rival. Com a confiança de que iria superá-la rapidamente e voltar a ser a número um, comecei a me esforçar ainda mais do que durante o fundamental. Aumentei meu tempo de estudos ao máximo o possível. É claro, não aumentei apenas os horários de estudo, também tentei várias técnicas para aumentar minha efetividade ou aumentar minha concentração.

Mas mesmo assim, não consegui superá-la.

Foi então que finalmente comecei a ficar nervosa. Já que queria superá-la pelo menos nas notas, parei de tocar piano, algo que fazia desde o fundamental I, também parei de ir para o clube de literatura qual tinha entrado, reduzi o tempo que passava com meus amigos, passei a dormir menos e até estudava durante os intervalos sob o risco de ser chamada de nerd.

Mas mesmo assim, Iroha-san continuava fora de alcance. Mesmo participando das atividades de clube, estando ocupada com o conselho estudantil e dormindo nas aulas, parecendo não estar fazendo nenhum esforço tão grande quanto o meu… ainda não conseguia alcançar Iroha-san.

Mas na verdade aquilo não era tão estranho. Em exames simulados, sempre tinham em média 100 pessoas com notas melhores que as minhas, apesar dos meus esforços. Sempre tinham pianistas melhores do que eu, e apenas ligando a televisão eu veria mulheres muito mais belas, uma atrás da outra. Certamente não era apenas Iroha-san quem eu não podia alcançar. Portanto, não foi estranho as coisas terem acabado daquela forma.

Ela simplesmente me ensinou que não passo de uma pessoa comum. Que não sou especial. Graças a Iroha-san, fui capaz de superar minha autoestima constrangedora. Acho que teria percebido isso mais cedo ou mais tarde mesmo sem a Iroha-san. Mas mesmo assim, foi mortificante. Terrivelmente mortificante. Por que eu não era a especial?

E por ter demorado tanto tempo para perceber, acabei perdendo tudo. Perdi meus amigos, meus hobbies, minhas habilidades, e em troca me tornei uma garota chata, mais ou menos inteligente e nada mais.

Naquela época, percebi que a Iroha estava apaixonada por alguém. Ela tentava esconder, mas para mim aquilo era mais do que óbvio. E no mesmo instante que percebi os sentimentos da Iroha, aquele garoto me pareceu incrivelmente atraente. Porque achei que ele precisava ser incrível para conseguir roubar o coração da Iroha.

Se ele pudesse escolher entre mim e a Iroha, quem ele escolheria…?…Quando pensei naquilo, uma ideia repugnante passou pela minha mente.

 

Se aquele garoto me escolher…

Isso não significa que sou mais atraente do que a Iroha?

Eu sabia que meu plano era horrível. Mas mesmo assim, não pude me impedir de prosseguir com ele. Porque eu queria ser! Queria ver a Iroha, que sempre esteve fora do meu alcance, ser a perdedora pelo menos uma vez e ter inveja de mim. Queria que ela percebesse. Percebesse que existem pessoas abaixo dela que estão desesperadas porque não conseguem alcançá-la não importa o que façam.

 

E então consegui sair com ele. Fingi estar tomada de alegria e contei a Iroha-san com um rosto inocente, como se não tivesse ideia do que ela sentia por ele. Em minha mente, eu estava rindo porque esperava ansiosamente que ela fosse ranger os dentes amargamente. Me faz querer vomitar quando penso em como eu era naquela época.

“Vamos Iroha, sinta-se magoada! Me inveje! Me odeie!”

…Tudo estaria bem. Tudo estaria bem se ela simplesmente tivesse sentimentos negativos por mim. Contudo, a reação dela foi completamente diferente do que eu esperava.

 

— Parabéns!

 

Ela disse com um sorriso gentil e acariciou meu cabelo. No final, Iroha… me parabenizou pelo meu amor correspondido. Ela me parabenizou. A mim! Mesmo eu estando sempre pensando em como machucar ela.

Incapaz de acreditar naquilo, não querendo acreditar naquilo, continuei tentando. Continuei usando ele, fingindo não perceber que meu amor por ele não passava de um engano. Mas mesmo assim, não importa que tipo de conselho eu pedisse dela, nem mesmo quando contei que tínhamos terminado… ela continuou torcendo por mim.

E cada vez que ela fazia isso, ficava claro para mim. As coisas que eu fingia não perceber — o quão nojenta sou, o quão mesquinha sou, o quão miserável sou — ficava claro e óbvio para mim, graças ao brilho da Iroha.

Aah, eu sei, eu sei. Não importa o quão doloroso fosse para mim… eu não era nenhuma pobre vítima, mas sim a repugnante vilã. Mas não consigo parar. Não consigo recuar. Porque não quero admitir que me rebaixei de uma pessoa comum para uma covarde sem salvação após ter cometido tantas maldades.

Não estou achando que o que fiz será perdoado e que deixarei de ser uma covarde se derrotar a Iroha. Mas não tenho mais nenhuma outra escolha. Não há mais volta. Quero dizer, não é verdade?

Eu sinto muito. Eu sinto muito. Sei que meus pecados são grandes demais para serem perdoados apenas com essas palavras.

 

— E isso deveria me fazer perdoá-la?

Todos estão reunidos na sala de reunião, onde Iroha-san está rindo sem qualquer emoção. Acho que ela deve ter ouvido a confissão da Yuuri-san que ficou gravada no terminal portátil.

— Você acha que vou perdoar tudo o que você fez só porque está se fazendo de miserável agora?

Maria, Daiya e Koudai Kamiuchi podem apenas assistir já que não sabem as circunstâncias.

— Eu não vou, sua vadia!

Dizendo isso ela cuspe na Yuuri-san que é forçada a se ajoelhar vestindo apenas suas roupas íntimas brancas. Yuuri-san está apenas olhando para baixo e tremendo sem dizer nada. O lado esquerdo de seu rosto está vermelho… acho que ela apanhou da Iroha-san no quarto dela.

É doloroso assistir isso. Afinal, sabia que isso poderia acontecer. Portanto, é minha responsabilidade também. Mas se não puder aguentar nem isso, não vou conseguir me opor a Iroha-san.

— …Ei, Shindou, o que foi que aconteceu?

Sem conseguir aguentar mais essa situação, Maria pergunta.

— Não é nada demais, sério. Isso é apenas o que acontece quando você se junta ao meu «grupo», jura obediência a mim, e mesmo assim vai contra minhas ordens.

— Mas isso não é severo demais…?

Como se estivesse desafiando Maria, Iroha-san pressiona a sola do sapato na cabeça da Yuuri-san. Ao ouvir Yuuri-san reflexivamente soltar um — Uh… —, Iroha-san estala a língua e sem dizer nada colocou mais pressão contra o rosto da Yuuri. Colocando mais força na perna ela conseguiu forçá-la a encostar a testa no chão. Pela posição, Yuuri-san parece estar fazendo uma genuflexão.

— Quem disse que você tem o direito de abrir a boca? Você deve apenas abaixar a sua cabeça como um ornamento. Preciso te ensinar até isso a força para você entender?

— Pa… pare, Shindou!

— Não vou …De qualquer forma. Vocês já sabem, certo? O tempo acabou. Vocês vão virar meus servos nesse bloco. Ainda é o melhor método que consigo pensar, não importa o que essa vadia suja esteja pensando.

Sem tirar o pé da cabeça da Yuuri-san, ela então declara.

— E então me tornarei «rei» e acabarei com esse jogo para vocês.

Certo, Iroha-san é esse tipo de pessoa. Ela trata alguém que considerava uma amiga querida até agora a pouco da maneira que for necessária para cumprir com seu objetivo.

É claro, não é como se ela não estivesse sentindo nada ao fazer isso. Ela deve estar profundamente ferida e magoada. Mas ela pode bloquear essas emoções, ela é capaz de ignorar temporariamente todas as emoções para alcançar seu objetivo.

Isso é algo que percebi no terceiro round quando ela matou todos no primeiro dia para vencer o jogo. Sim, graças a isso fui capaz de prever isso. Fui capaz de prever que ela tomaria uma ação dessas.

Portanto, vou…

Impossível.

…derrubá-la de seu falso trono.

Lentamente, Iroha-san tira o pé da cabeça da Yuuri-san e lança um olhar afiado em minha direção. Sem dúvida existem intenções assassinas nesse olhar ardente.

— …Isso por acaso quer dizer que você não planeja se unir ao meu «grupo»? Que pena. Você vai morrer!

— Não, não foi isso que quis dizer. Estou apenas dizendo a verdade! Quero dizer, alguém tão suave quanto você jamais poderia controlar os outros!

— Suave? Do que você está falando?

O olhar dela realmente me dá arrepios. Mas relaxo minha boca com a intenção de parecer o mais calmo o possível.

— Estou falando de sua reação fraca diante da traição da Yuuri-san! Você apenas arrancou as roupas, bateu, cuspiu e pisou na cabeça dela? Isso é o que todos chamam de suave!

Iroha-san também mostra um sorriso para mostrar sua compostura.

— Então o que preciso fazer para que você fique satisfeito?

Para tirar esse sorriso do rosto dela, eu digo:

— Mate-a!

Como esperado, o sorriso dela desaparece e seus olhos se arregalam.

— Logo no começo… você não ameaçou atirar todas as porções de comida na privada assim que alguém desse sequer um sinal de te trair? Mas você não fez isso, fez? Você especialmente fez esse showzinho deixando ela só de roupas íntimas, então estou apostando que você não cumpriu sua promessa, certo?

Um sorriso torto apareceu em seu rosto.

— …Haha. Então isso é só um show já que eu não dei descarga nas rações dela? Sua forma de pensar é meio distorcida, hein? Por que você não pode entender que aquilo de jogar os alimentos no vaso foi um exagero? Você não entende que era algo que precisava ser dito naquele momento, mesmo que não tivesse realmente intenção de fazer?

— Mesmo que seja assim, você não está praticamente mostrando para nós que seu «grupo» não tem mais força de contenção ao nos mostrar esse tratamento suave em relação à Yuuri-san?

— …O que você está tentando dizer? Você quer que eu mate a Yuuri?

— Claro que não. Só estou salientando que…

Disse as próximas palavras da forma mais clara o possível.

— …um sistema de «grupo» desses é falho desde o princípio.

— …

Ela cruza os braços silenciosamente. Com sua compreensão rápida, ela deve saber que será esmagada por mim se não puder dar uma resposta. Mas ela pode pensar o quanto quiser. Não tem mais como virar o jogo! Isso porque o que eu disse está 100% correto.

— …Então, o que exatamente é falho?

Sua voz parece um pouco mais fraca do que antes.

— O «grupo» é baseado na confiança em você. Mas nunca houve nenhuma confiança. Você bolou esse plano se baseando em algo que nem sequer existe. É por isso que é falho. Ou estou errado?

— …

Só mais um empurrão. Só mais um empurrão deve ser o bastante para derrubar Iroha Shindou — a garota que foi capaz de matar todos rapidamente, que foi capaz de cortar o próprio dedo para persuadir aos outros — de seu falso trono.

…Mas ainda assim, ainda assim, Iroha-san ergue os cantos dos lábios. Para mostrar que ela está tão fria quanto gelo.

— Sim, pode ser difícil manter o sistema do «grupo». Admito isso! Mas e daí? Se é tão difícil criar o «grupo», então só preciso abandonar esse plano e criar um novo. Ou você acha que não sou capaz disso?

— …

Essa foi uma resposta que não tinha previsto. Ela não está desistindo apenas por ser acuada até aqui.

— De qualquer forma, não tem porque me render a você.

Acho que sim… Não tem como ela se render por algo desse nível. Isso porque Iroha-san é aquela que deve ser derrotada primeiro, e… o inimigo mais forte. Se apenas puder fazer algo em relação a esse inimigo mais forte, posso alcançar meu objetivo. O objetivo do Daiya deve ser o mesmo que o meu afinal de contas, e com a ajuda da Iroha-san e da Yuuri-san, devemos ser capazes de suprimir as ações de Koudai Kamiuchi o suficiente para ele não chegar a matar ninguém.

Dar a partida é sempre o mais difícil. Mas assim que isso for concluído, o resto é bem simples. E o primeiro obstáculo que preciso superar para dar a partida é superar a Iroha-san. Se conseguir isso, vou conseguir alcançar o meu objetivo. Então, definitivamente não irei recuar. Sem dúvida alguma consegui acuá-la, então definitivamente não vou recuar.

Começo a procurar por aquele último empurrão.

— …

Olho para Yuuri-san que está tremendo e ainda está com a testa pressionada contra o chão…Aah, entendo. Nem importa mais o quanto Iroha-san tente persistir, importa?

— …Então, você vai abandonar a Yuuri-san? Para salvar a si mesma e os outros?

Afinal de contas, ela já está ciente da própria derrota.

 

Ela responde sem hesitar.

— Sim.

Que é a afirmação que eu esperava. E que é obviamente uma mentira. Uma mentira que ela está implorando para que eu perceba.

— Você não pode me enganar assim.

Então vou dar um fim a isso agora.

— Já te disse, não foi? Mate a Yuuri-san.

— …

— Se você realmente pretende abandonar a Yuuri-san, nos mostre agora. Você apenas precisa fazer nós nos rendermos usando sua força… matando-a, assim como você cortou seu dedo.

Iroha-san deve estar pensando que é a mais qualificada para se tornar «rei». Por pensar dessa forma ela toma a iniciativa. Ela está fazendo tudo isso porque acredita que é o caminho mais provável para alcançar seu objetivo.

Mas e se ela aceitasse que outra pessoa é mais qualificada para se tornar o «rei»? Aposto que ela iria entregar o trono a essa pessoa. Por isso ela está me testando. Ela está testando se sou qualificado para o trono, se posso ver através de uma mentira tão descarada.

— …Haha…

Ela começa a rir.

— …Muito bem, não posso! Portanto, não posso mais ser o «rei».

 

Simples assim…Iroha-san me entrega o trono.

 

Ela se senta sozinha em uma cadeira vazia, com os lábios espremidos. — Hah… — ela suspira artificialmente e sua expressão muda novamente para um sorriso torto.

— …Iroha, perdeu…?

Vendo Iroha-san sentada e derrotada, Yuuri-san arregala os olhos. Então se levanta e caminha para o lado dela, observando-a por cima.

— …Por quê? Por que você não me mata? Você faria isso, não faria…? Se for para alcançar seu objetivo, você faria isso, não faria?

O sorriso torto volta ao rosto da Iroha-san ao ouvir isso.

— Yuuri. Qual é o meu objetivo? — ela perguntou desviando o olhar e com o cotovelo apoiado na mesa.

— Eh? Se tornar o «rei»… certo?

— Claro que não! Isso era apenas o meio para alcançar meu objetivo.

— En… entendo. Mas então…

Iroha-san então explica para a confusa Yuuri-san, com um sorriso no rosto, como uma mãe pacientemente ensinando multiplicação para uma criança.

— Meu objetivo é te proteger, Yuuri.

Yuuri-san fica ainda mais confusa. Já que isso é completamente inesperado para ela. Mas eu já sabia. No último momento, antes de morrer no primeiro round, ela me disse «…Sinto muito, por não ter conseguido salvá-lo…», apesar de ser o último instante de sua vida. Essas palavras me revelaram que o objetivo dela é proteger a Yuuri-san.

É claro, ela também tentou proteger a nós e a sua própria vida. Mas considerando seu estilo de vida, ela certamente priorizaria os outros. E ela certamente preferiria salvar a Yuurisan acima de outras pessoas que ela acabou de conhecer.

Portanto, ela jamais mataria a Yuuri-san, mesmo que isso signifique se tornar incapaz de continuar mantendo seu sistema de «grupos».

Yuuri-san chacoalha a cabeça, incapaz de acreditar.

— I… isso é mentira! Vo… você entende que eu a traí? Não foi por isso que você ficou irritada e me fez ficar sem roupa e me bateu e…

— Yuuri, você está tirando uma com a minha cara?

— Eh?

— Você está querendo dizer que eu mudaria meu objetivo por causa de um deslize emocional? Você acha que sou uma pessoa tão simplória? Simplesmente precisava puni-la simbolicamente de alguma forma por ter cooperado com o Hoshino-kun para manter o «grupo». Tirar suas roupas não foi uma boa performance, fácil de se entender visualmente e tudo o mais?

— …

— Bom, mas foi em vão. Eu estava convencida de que você me obedeceria sem dizer nada, sabia? Não imaginei que você poderia cair nas garras do Hoshino-kun. Portanto, já tinha perdido!

Yuuri-san está olhando intensamente para Iroha-san… mas ainda parece não entende e chacoalha a cabeça novamente.

— …Não entendo! Proteger minha vida é seu objetivo? Mesmo que fosse isso no começo, não tem como você continuar pensando assim após ouvir sobre a minha traição. Você jamais salvaria uma pessoa abominável como eu.

— Quer saber, Yuuri? Você é boba.

Iroha-san suspira.

— Eh…?

— É tão simples que você nem deveria precisar pensar sobre isso.

Mas Yuuri-san continua perdida, o que faz Iroha-san coçar a cabeça.

— …Aah, que coisa! Me diga, você alguma vez tentou se colocar no meu ponto de vista?

— Seu ponto de vista…?

— Sim. Yuuri, você disse que suas notas sempre foram as melhores. Era o mesmo comigo! Eu também sempre tive as melhores notas!

Ainda perplexa, Yuuri-san parece não entender aonde Iroha-san quer chegar.

— Também queria ficar naquele lugar! Mas imagine que tem alguém te perseguindo em alta velocidade. Você não tem outra escolha senão se esforçar o máximo, certo? Você não iria querer perder, certo? Quanto você acha que me esforcei em segredo para proteger o meu lugar?

Agora o rosto da Yuuri-san está com uma expressão de surpresa.

— Você não podia me alcançar mesmo se esforçando o máximo porque eu sou especial? Não é nada disso! Na minha opinião, você apenas não estabeleceu uma meta concreta. Yuuri, se perguntar o que você quer ser e até onde você quer chegar com seus estudos, você seria capaz de me responder imediatamente? Aposto que não! Isso porque você só estava pensando em me derrotar e nada mais.

— Eu…

— Não tem como você me derrotar com ambições tão fracas. Você fez todo o possível? Você não está em posição de dizer isso! Não é nem de perto o bastante! Pessoas que realmente fazem todos os esforços não dizem merda como se não fossem nada!

— …Então, posso me tornar como você se me esforçar mais?

— Aah, droga! Você sequer está me ouvindo? Não tem como você se tornar como eu, tem? Eu sou eu. Você é você. Todos têm suas próprias qualificações e habilidades, então é absolutamente impossível se tornar exatamente como outra pessoa não importa o quão invejável esse alguém seja. Não importa o quão invejável eu seja, você não pode ser eu!

— Acho que você está certa. Alguém como eu jamais…

Ao ouvir essas palavras, Iroha-san se levanta e faz uma carranca. Então segura os ombros trêmulos da Yuuri-san com uma expressão sanguinária no rosto.

— A… ai!

— Sim! Não importa o quão invejável…

Ela grita.

 

— Eu não posso ser você!

 

A expressão de dor desaparece do rosto da Yuuri-san e ela não pode fazer nada além de olhar para Iroha-san com olhos arregalados.

— Eu parecia calma quando ouvi sobre você ter começado a sair com ele? Parecia que eu estava apenas comemorando por você? Então, minha atuação foi um sucesso. Não dar meus parabéns a uma querida amiga que teve seu amor correspondido seria uma desgraça, afinal de contas.

— I…Iroha…?

A expressão firme da Iroha-san já não existe mais. Mesmo tendo mantido a calma enquanto seu sistema de «grupos» era destruído, ela seriamente perde o controle agora.

— Você realmente acha que alguém não ficaria arrasada ao ver quem ela gosta ser tomado por outra? É claro que fiquei arrasada, sim eu fiquei! É claro que invejei você. Mas o que eu devia ter feito? Ele escolheu você afinal de contas! Minha reação ao ouvir aquilo foi «Bem, é claro». Você consegue entender a minha mentalidade naquele momento? Você consegue entender o que se passava na minha cabeça ao não ficar sequer surpresa por ele ter escolhido você? Ou você acha que não fiquei arrasada a me ver daquela forma? Mas não sou você, Yuuri, então não tive outra escolha a não ser desistir!

— O que é isso Yuuri? Mesmo você sendo tão boa em ler a expressão dos outros, por que você não consegue entender isso? Você queria que eu tivesse inveja de você? Você não está sendo completamente idiota? Eu… eu! Desde a cerimônia de abertura, desde o primeiro momento que te vi…

Segurando os ombros da Yuuri-san com ainda mais força, ela grita.

 

— Eu tive inveja de você!

 

Ainda sem conseguir entender, Yuuri-san está apenas olhando para a Iroha-san. Aposto que é inacreditável para ela. Aposto que não é fácil para ela acreditar que a pessoa que ela sempre considerou como uma super-humana, completamente fora de alcance, a invejava desde o início.

…Desculpe, Yuuri-san. Mas eu já sabia.

«A primeira pessoa que respeitei e achei invejável… e provavelmente, sentia ciúmes, foi a Yuuri.»

Sabia desde o primeiro round. Portanto, também sabia que o que perturbava as duas é a forma como elas confundem uma a outra.

— Até eu gostaria de poder depender de alguém! Mas por alguma razão não consigo fazer isso. E toda vez que penso nisso… vejo seu rosto em minha mente!

Ela diz, largando dos ombros da amiga. Repentinamente, o rosto da Yuuri-san que está olhando fixamente para a Iroha-san começa a mostrar sinais de espanto.

— Iroha… por que você está choran…

— Haha, do que você está falando? Não tem como eu…

Provavelmente com a intenção de acompanhar o que ela achava ser uma piada, Iroha-san toca o próprio rosto. E arregala os olhos. Porque percebe que está realmente chorando.

— Não pode ser… estou chorando…? Não me lembro de já ter chorando nenhuma vez. Não tem como eu chorar, especialmente na frente dos outros, e ainda assim…

Mas ela está derramando lágrimas. Ela realmente está derramando lágrimas. Sem qualquer sombra de dúvidas Iroha-san está chorando. Sua expressão se desfaz em pedaços.

— Uh…

Seu rosto sempre rígido se desfaz como o rosto de uma criança.

— Uah… uaaaaaaaaaaaah! Aaaaaaaaaaaaaaaaaaah!

Ela está chorando alto. Aquela Iroha-san está chorando. Iroha-san que pode cortar o próprio dedo para cumprir seu objetivo. Incapaz de controlar suas emoções, ela está chorando como uma criança.

— I…Iroha…?

— Uaaaaaaaaaaaaaah! Yuuri sua boba boba boba boba! Eu confiei em você! Eu… estava confiante como uma idiota de que você jamais me trairia!

Ela está derramando uma enorme quantidade de lágrimas e com nariz escorrendo.

— E mesmo assim, mesmo assim! Uma super-humana! Quem? Não brinque comigooo! Por que você não me entendee! Eu também não quero virar um «rei»! Estou apavorada com esse jogo assassino! Foi doloroso cortar meu dedo! Eu queria que tivesse alguém para me proteger! Mas tive que fazer aquilo mesmo sem querer, certo? Achei que fosse a mais adequada para me tornar «rei», então não tive outra escolha a não ser assumir a responsabilidade, certo?! Não queria que todos morressem porque dependi de alguém, Yuuri, então eu não tinha escolha, certo?

Não há nem um traço de sua personalidade incrível nessa aparência dela se lamentando como uma criança. Ainda espantada, Yuuri-san pergunta:

— Iroha… o que te fez querer proteger alguém como eu?

Ao ouvir essa pergunta estranha, Iroha-san novamente faz uma carranca com os olhos vermelhos.

— Não é óbvio?!

 

Subitamente me lembrei de algo que ouvi da Iroha-san durante o primeiro round.

«O que você acha? Eu realmente… me importava com a Yuuri?»

Eu não sabia a resposta para essa pergunta até agora. As experiências do terceiro round apenas não foram o bastante para compreender as verdadeiras intenções da Iroha-san, que ela é capaz de controlar a ponto de eliminar qualquer emoção inconveniente. Mas finalmente descubro. Testemunhando suas emoções de frente, finalmente descubro. Iroha-san realmente…

Porque você é tão incrivelmente preciosa para mim que quero te proteger, é claro!

…Ama a Yuuri-san.

— Porque você é tão preciosa para mim que eu teria de convencer a mim mesma que te odeio se não for capaz de te proteger, apenas para suportar!

Após ficar todo esse tempo perplexa, finalmente alguma emoção começa a aparecer no rosto da Yuuri-san.

— Ah…

No instante seguinte, lágrimas começaram a escorrer pelo seu rosto. Assim como a Iroha-san, as lágrimas da Yuuri-san também estão escorrendo em grande quantidade e em pouco tempo estão cobrindo todo o seu rosto.

Essas duas… admiraram tanto uma a outra, por tanto tempo, que acabaram ficando com inveja uma da outra. Essa talvez também seja a origem de algumas falhas que aconteceram dentro dessa ‘caixa’, mas esses sentimentos fortes por natureza foram o que as fizeram ter uma determinação tão forte.

— Iroha… Irohaa…

Yuuri-san a abraça.

As duas garotas, ainda chorando, se abraçam.

— Eu sinto muito… sinto muito…

— Não quero ouvir isso! Não quero ouvir um pedido de desculpa! Não vou te perdoar por uma coisa daquelas! Tem algo que quero ouvir muito mais do que isso.

Yuuri-san fica perdida apenas por um instante, mas entende com seu rosto sujo de lágrimas e o nariz escorrendo. Ela esboça um sorriso atrapalhado, que ninguém mais chamaria de adorável, e gentilmente sussurra, colocando todas as suas emoções nas palavras.

— Eu também, gosto muito de você do fundo do meu coração…

Aah. Essas palavras finalmente me fizeram perceber. O significado da Yuuri-san usando o relógio da Iroha-san no segundo round. E o motivo dela ter confessado o que fez em relação ao garoto que a Iroha-san gostava para ela.

«…Por favor, me mate.»

Para Iroha-san conseguir matá-la mais facilmente. Acho que querer derrotar a Iroha-san também fazia parte do motivo. Mas foi porque ela queria facilitar para a Iroha-san conseguir matar o NPC dela que ela especialmente disse aquilo, apesar de saber que a Iroha-san seria a jogadora futuramente. Ela tentou salvar a amiga mesmo estando preparada para ser odiada por ela. Não é fácil fazer isso. Ela não seria capaz de fazer isso…

— Eu sempre… te amei!

…Se não amasse a Iroha-san. Heh.

Nem é mais uma questão de perdoar ou não. Afinal de contas, isso não importa enquanto elas se amarem. É claro que a relação entre elas na realidade não irá melhorar por causa disso. Essas duas são apenas NPCs, não são as duas que estão em desespero nesse momento. Mas eu acredito. Posso facilmente acreditar que elas não terão problemas em fazer as pazes novamente e acabar com esse desespero.

E assim, outra coisa também passa pela minha cabeça.

Tendo derrotado minha inimiga mais forte e tendo dado o primeiro passo certeiro em direção ao meu objetivo, estou convencido.

Eu consegui. Sem dúvida alguma estou no caminho certo e agora posso alcançar meu objetivo. Não tem mais como eu ser derrotado.

Certo…

Eu derrotei o Daiya.


Nota:

1 – Kuzu: lixo, resíduo.



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