Volume 4
Capítulo 181: Digna
No topo de uma colina ao norte do Reino do Leste, um homem assistia inutilmente o sol surgir no por detrás da grande escuridão que cobria o continente inteiro. Olhos fixados em direção ao extremo oriente, ele parecia até capaz de ver através da névoa densa que cobria os céus.
Sua postura relaxada contrastava com sua expressão de tristeza, sem contar com as roupas que mais pareciam ter saído de um filme de época. Apesar de que aquele homem sequer saberia o que era um filme, dado que ele passou os últimos quatrocentos anos trancafiado.
Era Hermes, o deus ladrão. Originalmente ele era o deus do tempo, mas ao usar seus poderes para roubar dos outros deuses, foi condenado a passar a eternidade preso junto à pilha de tesouros que acumulou durante sua vida.
Sua vida de mortal, diga-se de passagem. Bem antes de ser escolhido pelo guardião do mundo para ser um dos trinta e dois escolhidos, Hermes era apenas um ladrão, mas não um ladrão comum, ele era o melhor.
Lembrar dos seus tempos de glória o fez sorrir.
— E pensar que você conseguiu sair! — Uma voz irritante chegou aos ouvidos de Hermes.
Ao se virar, ele viu um homem usando uma capa desgastada por cima de uma armadura de couraça com saiote. Ao lado dele estava uma mulher de cabelos cacheados, com uma capa que cobria todo seu corpo.
— Também não sei como consegui sair. — Hermes disse — Mas se estão aqui, acredito que chegou a hora.
— Queremos falar com “ele”... — o homem de saiote disse.
— Precisamos falar com ele! — A mulher corrigiu.
Hermes olhou cada um de cima a baixo, depois olhou para os outros dois que estavam mais longe. Após um momento de silêncio, o deus ladrão disse:
— Passaram séculos me condenando por amar um dos filhos do vazio, agora vêm a mim pedindo ajuda para falar com ele?
— Vai nos ajudar ou prefere que façamos o mesmo que fizemos com Jafah? — A mulher perguntou, enquanto dava um passo à frente.
No mesmo instante que a mulher se moveu, uma brisa fria pareceu sair de seu corpo, provocando um chiado agudo. Os olhos dela brilharam em um tom esverdeado e seus cabelos ficaram levemente eriçados.
— Por que precisa dessa atitude brava, Lithy? Os deuses do vento e do raio vêm a mim pedindo ajuda para encontrar o deus do fogo, mas o deus do espaço e o “invulnerável” não se aproximam... — Hermes ponderou em voz alta — Será que é devido o meu poder ser um dos poucos que podem afetar o espaço e a invulnerabilidade deles?
— Não tem medo do que o meu poder pode fazer a você? — O homem de saiote, agora coberto de raios, perguntou, com um sorriso amedrontador — Seu tempo está acabando.
— Tempo? É sério que você fez esse trocadilho, Brahat? — Hermes sorriu — Então me deixe lhe apresentar uma charada: Se o tempo é igual para todos, por que estamos nos movendo enquanto o resto do mundo está parado?
Lithy, a deusa do vento olhou para os lados e percebeu que o mundo parecia inteiramente congelado, com exceção dela, de Hermes e de Brahat, o deus dos raios. Sua consciência rapidamente lhe deu a resposta que precisava.
— Você parou o tempo? Que original...
— Resposta errada! — Brahat interveio — O que ele deseja dizer é que o tempo é relativo. Então o tempo não está parado, e sim estamos nos movendo muito mais rápido do que todo o resto do mundo.
— Fico feliz que tenha percebido. — Hermes deu uma piscadinha para Brahat — E como esse efeito vale para mim também, nós três envelhecemos mais rápido do que o resto do mundo, ou seja...
A expressão no rosto da mulher coberta ficou congelada por um momento, enquanto o homem de saiote deu um sorriso forçado.
— Está tentando nos envelhecer à força? — Lithy perguntou, com um semblante amargo.
— Não. — Hermes cruzou os braços e fechou a cara — Estou matando vocês dois de velhice.
— Não há motivos para isso! — Brahat berrou.
Hermes parecia discordar.
— Vocês me ferraram, o meu herói está morto e a única pessoa que amei desistiu de tudo... Acha que não há motivo?
Lithy mudou rapidamente de expressão, agora um olhar afiado e maníaco dominava sua face.
— E acha mesmo que pode nos vencer assim? Por mais que agora possamos envelhecer, só preciso me afastar de você o suficiente, e seu poder não terá mais efeito!
— É verdade! — Brahat concordou — Tempo e espaço se anulam!
— Por que não tentam? — Hermes se sentou no chão e gesticulou para que a mulher se afastasse dele.
Conforme ela dava passos para trás, seu corpo envelhecia visivelmente, ficando enrugado e pálido. Antes que ela fosse capaz de sumir da vista dos outros dois, caiu morta.
Vendo aquela cena, o deus dos raios parecia incrédulo.
— Como!?
— Eu acelerei o tempo dentro de cada um de vocês. E conforme se afasta de mim, a velocidade só aumenta. É algo complicado que guardei para vocês por séculos...
Enquanto Hermes ainda falava, Brahat agarrou o topo de sua cabeça com muita força.
— E se eu te matar antes que...?
O deus dos raios congelou.
— Tempo de reação! Você percebe as coisas, mas não consegue reagir. — Hermes disse, enquanto se libertava da pegada do oponente — Entenda de uma vez, o tempo é absoluto.
Brahat não conseguia mover sequer os olhos.
— Para nós dois, será uma eternidade, para o resto do mundo, uma fração de segundo. Quando os outros perceberem, eu, você e o cadáver de Lithy já teremos virado poeira... E um novo sol estará brilhando sobre esse mundo! E seu brilho jamais será ofuscado!
...
Quando, Sula, a deusa do espaço, percebeu, não havia mais nada. Os outros três deuses que deveriam estar ali na sua frente viraram poeira. Por alguns segundo elas até achou que fosse algum tipo de truque, mas não.
As almas dos três foram incorporadas à existência, à origem do universo.
Com isso, eram cinco almas de deuses que ela havia deixado de sentir. O que significava que seus iguais estavam em risco, ou melhor, ela estava correndo sério perigo.
E como ninguém sabia a localização do fragmento da vida que Fênix havia guardado, não havia imortais sobre aquela terra. Ou melhor, havia um, o Guardião do Mundo.
Ficar muito tempo em um lugar apenas era muito arriscado, Sula decidiu. Ela resolveu procurar ajuda da única pessoa em quem poderia confiar naquele mundo, sua heroína escolhida, Victoria
. . .
Ela viu seu pai ser alvejado bem em sua frente sem poder fazer nada. Depois o mudo se tornou um borrão e o acampamento se transformou em um castelo... Não! Aquilo foi teletransporte!
Seu pai, que Alice procurou por tanto tempo, morreu logo após eles se reencontrarem. Maldito destino que a odiava. E como se não bastasse, sua cabeça parecia que ia explodir de tanta dor.
Os soldados da aliança que dominavam o castelo estavam assustados com a chegada dela, por sorte a reconheceram antes de puxarem o gatilho. Agora que Ritter, Jafah e Getúlio estavam mortos, as tropas da AI estavam um pouco bagunçadas.
Foi quando Alice percebeu um trono prateado, com uma coroa brilhante em seu assento. Ao redor do trono havia uma caixa translúcida, onde letras flutuantes formavam a frase:
“SOMENTE AQUELE QUE FOR DIGNO DE SER REI”
— Digno? Isso é subjetivo... — Alice murmurou, erguendo a mão em direção à barreira implantada por Jonas.
— Senhorita, essa coisa é indestrutível! — Um dos soldados disse.
— Tentamos até dinamite. — Explicou outro.
Alice lembrou da história que seu pai havia contado horas atrás sobre um reino que construiu.
— A dinamite não é digna! — Ela disse — Mas, eu pergunto, e a herdeira do primeiro rei dessa terra?
Ao tocar na barreira, a magia do herói desapareceu, como se tivesse rompido em cacos de vidros, virando poeira brilhante em meio segundo.
Alice não sabia o que sentir, é claro que ela estava triste pela morte de Ferdinand, mas estava animada pela herança que ele deixou. Caminhando até o trono, ela pegou a coroa e pôs sobre a sua cabeça.
Os soldados da AI assistiram boquiabertos a cena de autocoroação de Alice, alguns tinham visto o general Nogueira coroar Stanis, mas Alice parecia muito mais poderosa.
Ao sentar no trono, Alice decidiu que faria o possível para deixar seu pai orgulhoso, mesmo que isso significasse ir contra tudo que ela tinha acreditado até ali.
Naquele dia, uma nova lenda nasceu naquele mundo. Uma lenda sobre uma rainha que veio de outro mundo, era filha de um deus, e que era digna.
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