Volume 4
Capítulo 151: Uma Heroína Forjada nas Chamas (1)
Desde sempre ela tem apenas a sua mãe.
A mesma mãe que batalhou para cuidar dela e que lhe deu o nome de uma rainha. Elizabeth, a criança mais tímida do jardim de infância, e também a menor. Seu tamanho lhe rendeu o apelido “Zita”.
Ela não se importava de ser chamada pelo apelido, na verdade até gostava dele. Zita não se achava digna de ser chamada pelo mesmo nome que uma rainha de verdade.
Ela não era especial em nada.
Suas notas eram regulares, seu desempenho físico era mediano, seus amigos eram poucos, ela não era a melhor ou a pior em nada. Mas isso não a chateava, Zita já estava acomodada naquela vida mediana em uma cidade pequena.
Um dia sua mãe conseguiu um emprego melhor e as duas se mudaram para uma cidade maior. Foi na mesma época que ela estava completando 12 anos, bem no meio do ano. Isso atrapalhou todo o seu ano letivo.
Como não conseguiu se matricular em outra escola, Zita teve que ficar o resto do ano sem estudar. Mas ela não ficou parada, enquanto sua mãe trabalhava, a garota frequentava um ginásio esportivo.
Zita descobriu que poderia ter alguma habilidade para esportes, mas ano letivo recomeçou, e ela precisou retornar à escola. Suas notas eram piores do que na escola anterior, seu humor piorou, suas atitudes ficaram cada vez mais insuportáveis para sua mãe.
Ela estava prestes a completar treze anos.
Tudo que Zita queria era ser uma garota normal. As outras garotas mais velhas que praticavam esportes no ginásio sempre falavam sobre namorados, maquiagem, internet…
Mas Zita parecia predestinada a nunca ser uma garota normal.
Uma noite, ela acordou com uma voz a chamando.
— Elizabeth! — A voz dizia.
— Quem é? — Ela perguntou, sentando na cama e olhando para todos os lados.
— Eu a escolhi. — A voz continuou.
— O que está acontecendo? Quem está falando?
Então um brilho surgiu a deixando completamente cega. Ela perdeu o equilíbrio e sentiu seu corpo flutuar, como se não tivesse peso. Uma força a puxou em alguma direção, e ela sentiu seus pés tocarem uma superfície sólida e quente.
Seus olhos voltaram a ver, e o lugar onde estava a assustou. Era uma caverna vulcânica, cheia de pedras escuras e iluminada pelo fogo que emergia da lava líquida a poucos metros dos seus pés descalços.
Havia uma figura humanoide de quase dois metros de altura, de pé sobre a lava.
— Onde estou…?
— Bem-vinda ao meu mundo ilusório! — Disse a mesma voz de antes — Eu sou o deus Fênix, aquele que carrega o poder do sol e controla o fogo. Você é a minha escolhida para carregar o meu poder e proteger o mundo.
—…
— Não precisa temer, as coisas serão explicadas conforme você for se acostumando à sua nova condição.
— Eu morri?
— Não, mas quando morrer, eu a verei novamente. Até lá, viva bem e use o seu poder para proteger o mundo.
— Poder…? — Ela o encarou, ainda confusa.
— Elizabeth Cruz, a Herdeira da Chama! É assim que você deverá ficar conhecida.
Então ela acordou, no meio de uma planície recoberta de grama. Um local diferente de tudo que ela já tinha visto de verdade. No máximo na televisão.
Haviam outras crianças caídas ali no chão, ao redor de Zita.
Uma, duas, três, …, trinta e duas, trinta e três contando com ela.
O primeiro depois dela acordou. Era um garoto loirinho, e disse se chamar Leonardo. Depois uma garota chamada Anne, e outra chamada Mirian. Mas havia um garoto que demorou a acordar, e ele era meio estranho.
O garoto era extremamente magro, como se não comesse havia dias. E estava usando um tipo de vestido, ou uma daquelas roupas de hospital. Zita lembrou de quando precisou ficar internada por uma semana e usou uma coisa daquelas.
Quando ele finalmente acordou, Leonardo e Lucas foram falar com ele. Mas antes que as coisas fossem totalmente explicadas, os sacerdotes chegaram. Eles explicaram que as crianças eram os escolhidos pelos deuses para protegerem aquele mundo. E que todos eles tinham sido enviados para esse mundo novo.
Algumas das outras crianças pareciam estar entendendo o que acontecia, outros estavam mais confusos que Zita. Ela estava parcialmente a par de tudo. Aquele cara disse que era um deus e tinha escolhido ela, mas foi muito vago.
Enquanto se perdia em pensamentos, ela percebeu que cada sacerdote escolhia uma das crianças e depois seguia pelo caminho, e restavam poucos. Ela percebeu ainda que havia uma criança a mais do que restavam de sacerdotes.
Alguém seria deixado para trás.
Só restaram ela e o garoto de roupa hospitalar. Mas ela foi escolhida, e não ele.
Zita estava feliz de ser escolhida, mas estava se sentindo mal pelo garoto. Ela precisava fazer algo.
—Vem também… — Ela disse, estendendo a mão para o garoto.
—Eu sou André… — Ele respondeu.
—Eu sei… — Ela disse sorrindo — Eu sou Elizabeth, mas prefiro ser chamada de Zita…
O sacerdote, que se chamava Nupac, deixou André em um local onde os órfãos viviam, ali ele teria alguma chance de sobreviver. Zita não queria ter que deixar ele naquele lugar destruído, mas não podia fazer nada.
Ela prometeu que voltaria para ajudá-lo.
Em seguida ela foi levada ao Castelo de Prata e iniciou o seu treinamento como heroína.
Por um ano ela teve poucas oportunidades de sair do castelo, e em algumas destas ela via o garoto pelas ruas. Ele sempre estava fazendo alguma coisa, e quando tentou se aproximar dele, os guardas dela não deixaram.
Ele sempre sorria para ela, mas nunca se aproximava.
Na festa de um ano da chegada dos heróis ela exigiu levar ela ao castelo, e com muita insistência, e auxílio do Cavaleiro de Prata, ganhou a permissão. Mas as coisas não saíram como ela imaginou.
Primeiro, o garoto cantou uma música que ela gostava muito, e depois a beijou. E momentos após isso ele foi amarrado e levado do castelo sem nenhuma explicação. Desse dia em diante ela passou a odiar Jonas.
A partir daí as coisas tomaram um rumo mais complicado.
Zita se mudou para a montanha de fogo, o lar dos efrites. O local era na verdade um vulcão adormecido que servia de santuário a um povo antigo com características físicas abençoadas pelo deus do fogo.
Longevidade e imunidade ao calor extremo eram duas das características mais notáveis.
Na montanha de fogo, Zita foi iniciada como sacerdotisa do Deus Fênix e passou a receber treinamento especial para ter total controle sobre seus poderes. Uma rotina dura cumprida com dedicação.
Ela não estava satisfeita consigo mesma por não ter sido capaz de ajudar André. Zita se culpava pelo que ele tinha passado, e mesmo que o Cavaleiro de Prata lhe houvesse garantido que o menino estava bem, ela duvidava muito.
Nupac a aconselhava e treinava pessoalmente desde o dia que ela havia chagado naquele mundo estranho. Ele também não a deixava esquecer André, o sacerdote carregado de cicatrizes parecia também se lamentar por não ter sido capaz de impedir o destino triste do garoto.
Outro ano se passou. Ela já tinha quatorze anos, mais um mês e faria quinze. Os “heróis”, como ela e os que vieram juntos eram chamados, foram convidados a um novo banquete de comemoração.
Para surpresa dela, André estava lá também.
Dessa vez ele estava como representante do Reino do Leste. Haviam outras duas garotas com ele. Mas elas estavam apenas seguindo um plano louco para desmascarar o Reino de Prata e revelar a todos que havia ali uma das relíquias divinas.
No final da noite, André e as garotas haviam roubado a relíquia e começado uma crise internacional que poderia culminar em guerra. O reino de Prata teve sérios rompimentos nas relações com os reinos vizinhos.
Da montanha de fogo, Zita acompanhou as notícias de que as relações foram aos poucos se normalizando, até que o Reino do Leste entregou a Semente da Mãe Terra ao clã da floresta, no Reino do Sul.
Tudo havia voltado ao normal, mas não significava que a paz era estável.
André surgiu mais uma vez, agora resgatando escravos. Isso gerou o início de uma crise econômica que foi se alastrando em um efeito dominó. Não restaram opções a não ser colocar os heróis na linha de frente para impedir André.
O Reino de Prata, principal vítima, atacou a cidade mercado de Parva, foi um massacre total de civis inocentes. Zita tentou intervir, mas foi impedida por Leonardo e Jonas.
No meio de tanta frustração ela perdeu o controle, os sentidos e a razão.
Quando sua consciência retornou, ela estava nua em meio a um acampamento em chamas, e em sua frente estava André que se debatia com queimaduras por todo o corpo.
Por meses ela achou que ele havia morrido, isso a levou ao fundo do poço. Uma crise de depressão tomou de conta da ruiva. Até ela descobrir que André ainda estava vivo.
Seu ânimo retornou.
Zita tomou coragem, treinou intensamente até recuperar a forma e criou um plano de resgate. Seu único erro foi pedir ajuda ao Cavaleiro de Prata.