Volume 3

Capítulo 118: Rainha do Deserto

Ao chegarem na Grande Falha, os sete que vieram com André resolveram tormar rumos diferentes, e portanto, decidiram que era o momento de se separarem. André, Zita, Lídia, e Sônia foram para a Montanha Solitária, a sede do poder do Reino do Leste e antiga casa de André.

Eduardo foi com Wagner para a Cidade de Prata, eles esperavam encontrar com alguns conhecidos, na esperança de que houvessem sobrevivido ao ataque do reino de Aço. E como o retorno dos 32, quatro anos atrás, foi um pouco abrupto, eles haviam deixado algumas coisas e agora tentariam recuperar.

Amanda e Gledson foram se encontrar com os outros heróis ao sul da Grande Falha, já que as informações que coletaram no caminho indicavam uma tensão entre os herois que retornaram primeiro e o Reino do Sul. Também haviam boatos de problemas no Reino de Aço, mas Amanda não tinha boas lembranças de sua estadia lá.

As coisas estavam bem piores do que eles haviam deixado. Mesmo após conseguirem impedir uma guerra de dimensões continentais e selado a magia perdida, aquele mundo estava um caos total.

A jornada heróica de André em busca de resgatar escravos, em paralelo com uma guerra, levou a uma crise de alimentos em muitas regiões. Grande parte desses alimentos era produzida e processada por escravos, e sem mão de obra para essa tarefa, a fome começou a ameaçar dizimar vilas inteiras.

Famílias nobres influentes faliram, muitos acordos tiveram que ser quebrados, pequenas rixas foram se formando, e também houveram revoltas populares de aldeões insatisfeitos com a elevação nos impostos para custear a vida dos nobres que perderam seus escravos.

Mesmo fora da guerra essas pessoas ainda sofreram muito. Toda uma estrutura social foi desorganizada, todo um sistema econômico ruiu. Os reinos do oeste entraram em crise financeira, alimentícia e populacional. Então o Reino de Prata, o mais estável, deu um golpe nos outros três.

O Reino de Cristal foi obrigado a entregar a princesa regente como refém para receber uma garantia de ajuda do Reino de Prata. O Reino de Aço teve seu rei morto traiçoeiramente e entrou em uma disputa de poder internamente entre os três príncipes. E Reino de Bronze entrou em estado de sítio, com uma revolução interna que dividiu a população em disputa de poder.

Enquanto isso, o Reino do Norte se manteve isolado, como sempre, não havia uma notícia sequer de como estava a situação além das fronteiras, apenas de que elas estavam fechadas.

O Reino do Sul, que havia recebido muitos imigrantes que buscavam refúgio fora da crise e das revoltas dos reinos do oeste, usou essa mão de obra para aumentar seus recursos disponíveis e incrementar o seu poderio militar. Isso ameaçou os outros reino, mas eles estavam com problemas internos demais para resolver.

E também havia o Reino do Leste, este permanecia como se nada tivesse acontecido, sua população agia como se não tivesse sido quase assolada em uma guerra anos atrás. E o mais surpreendente, segundo as informações, a Senhora do Leste, Miraa, estava desaparecida.

— Como pode ter acontecido tanta merda desde que fomos embora? — Amanda se perguntava, pensando alto.

— Vai saber. — Gledson respondeu entre dois bocejos — Salvamos esse mundo, eles disseram. Mas de quê? Por que? Para o quê?

— Ou, “para quem”? — Amanda completou.

— O que você quer dizer?

— Você é o “sombrio” aqui véi, me diga você.

— Também acha que havia alguém por trás de tudo?

— Você diz, além do Cavaleiro de Prata? — Amanda parou e recuperou o fôlego perdido depois de andar e falar — É eu acho! Ouvi André e Felipe algo sobre o segredo dos deuses durante a reunião de natal, não entendi muito mas acho que pode ter relação a toda a movimentação que fizeram para nos trazer de volta pra cá.

— Ah sim, lembro de André ter comentado algo assim muitos anos atrás quando estivemos nas ruinas do que foi o Reino de Pedra. Foi quando Felipe decifrou as inscrições que levaram ele e Zita a encontrarem a sétima chave…

— Cê está divagando muito, mano! — Amanda reclamou.

— Verdade, acho que estou muito cansado… — Gledson estendeu sua sombra, e de lá apareceu o carro que Felipe deixou para Lídia — Carregar essa coisa por tanto tempo esgotou minhas energias…

— Espera! — Amanda bateu na própria testa — A gente estava com esse carro loucão o tempo todo? Poderíamos estar usando ele desde que saímos da cordilheira, já teríamos chegado no acampamento, véi!

— Eu sou o sombrio, não o inteligente… — Gledson disse, se deitando no banco traseiro — Dá teus pulos que eu vou puxar um ronco.

Ela pegou o volante e dirigiu, e com isso a viagem se tornou mais rápida. O fato do carro ser elétrico e ter paineis solares no teto para alimentar as baterias também ajudava muito, uma vez que não havia um posto de gasolina naquele mundo. O maior problema era que as estradas não eram adequadas, então ela precisou manter um ritmo lento.

Mas ela não esperava encontrar um grupo de batedores do Reino do Sul.

Amanda estava distraída com a estrada quando o grupo cercou o carro ordenando que ela parasse. Mesmo com certa curiosidade pelo que se tratava o veículo, eles fizeram uma abordagem eficaz.

Amanda saiu do carro com muita raiva, e para piorar ela foi reconhecida. O carro tinha ajudado os guerreiro do Sul a entender que ela era de outro mundo, já que não existia algo daquele jeito em nenhum dos sete reinos.

No meio de uma crise daquelas e Gledson resolveu tirar um cochilo, era só o que faltava. Em sua mente, amanda xingava o seu companheiro de viagem com todos os palavrões que ela conhecia. Como ele não acordou com todos aqueles caras gritando?

Mas os guerreiro do Sul acharam melhor não incomodar Gledson, todos temiam o cara que podia matar eles usando suas próprias sombras. Então o líder deles sugeriu levar apenas Amanda como refém, e no deserto seria mais fácil esconderem suas pegadas, assim seriam impossível Gledson rastreá-los.

Amanda não disse uma palavra sequer, mas estava muito puta da paciência. E pra piorar ela ainda estava de TPM. Pelo menos aqueles guerreiros eram bem educados e não a machucaram, apenas amarraram suas mãos e a fizeram andar muito, mas muito mesmo.

Quando enfim não dava para ver outra coisa qua não fosse areia marrom-acinzentada e o céu azul, eles a soltaram e começaram a montar acompamento. Isso chocou a heroína.

— Tem certeza de que é seguro me soltar? — Amanda perguntou confusa — Acho que você esqueceu que sou uma heroína…

— Não tem problemas. — O líder dos batedores riu alto — Seu amigo está dormindo a uns quilômetros daqui, e você não é perigosa!

— Sou perigosa sim! — Ela bufou— Sou Amanda, a heroína de vidro! Vocês deveriam me temer.

Em vez de assustar os homens, as palavras de Amanda tiraram um série de risos deles, como se ela fosse a piada mais engraçada da década.

— Seu poder é inútil! — Ele disse em sarcasmo — Controlar vidro? Acha que tem algum vidro aqui? Se estivéssemos na capital do reino, talvez houvesse alguns objetos em vidro para você controlar e fazer uns truques bonitinhos, mas estamos na porra de um deserto! É só areia e sol quente!

Amanda olhou para ambos os lados, observando a vastidão infinita se estendendo em todas as direções. Em seguida encarou o homem grande e de sorriso triunfal, que parecia achar que suas palavras eram o suficiente para vencer a heroína.

— Uns truques, você diz…

Amanda deu as costas ao homem, e começou a andar por entre os soldados, e mesmo que eles permanecessem em guarda, não demonstravam nenhuma intenção de atacar ela.

— Lá no Reino de Aço eu costumava fazer uns truques com vidro…

Amanda se virou para o homem mais uma vez, e pondo o dedo em riste, continuou falando como se explicasse para uma criança:

— Acho que vocês sabem, mas o Reino de Aço é um produtor de minério, ferro e armas. O metal é usado em tudo, desde móveis e utensílios até as roupas, logo, o vidro, por ser considerado frágil, é excluído do dia a dia daquele povo. Eu não tive a oportunidade de treinar adequadamente, ou sequer de ter material suficiente à minha disposição quando morei lá.

Ela pôs as mãos na cintura e olhou para o céu.

— Aí eu voltei ao meu mundo original, e lá aprendi muita coisa interessante. Aprendi muita coisa sobre o vidro, sobre o meu poder. Por exemplo, como reforçar a estrutura molecular dele até se tornar praticamente inquebrável, ou como fazer uma lente convergente para focar a luz solar em um determinado ponto…

Amanda voltou o olhar ao homem.

— Aí me mandaram para um lugar semelhante a esse para treinar meu poder. Consegue adivinhar o porquê?

O homem engoliu em seco.

— Algum de vocês sabe do que o vidro é feito?

Cerca de dez segundos e ninguém deu resposta alguma.

— Areia, senhores! — Amanda levantou as mãos à altura dos ombros e sorriu — A porra do vidro é feita da porra da areia! E vocês me trouxeram até o meio do caralho do deserto! Pelo meu poder, eu sou a rainha dessa merda aqui!

Assim que terminou de falar, Amanda levantou rapidamente as duas mãos acima da cabeça, e seis lanças de vidro emergiram da areia, impalando os soldados mais próximos a ela. Sem perder tempo a heroína recolheu seu corpo, cruzando os braços à frente do rosto.

O vidro que atravessava os soldados se liquefez e foi em direção a ela como se atraído pelo seu corpo. Em poucos segundos, Amanda tinham uma armadura de vidro blindado protegendo-a.

Acima de seus ombros, quatro lanças de vidro de cerca de um metro, flutuavam naturalmente. Ela levantou a postura, e erguendo a mão direita aberta na direção do homem, disse:

— Repete aí que o meu poder é inútil, rapidão, só pra eu testar uma parada.



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