Volume 3

Capítulo 108: Perspectivas

Quando Adênia recuou até a base da plataforma de madeira, viu primeiro que todos os seus guerreiros já haviam retornado, trazendo consigo os feridos e os cadáveres. Após garantir que o perímetro estava seguro, ela foi para cima outra vez.

— Foi rápido! — Jonas exclamou com uma expressão feliz.

— 23 mortos em cinco minutos… — Adênia disse com um tom de pesar — Demorar lutando só traria mais mortes para nós.

— A boa e velha estratégia de bater e correr? — Raniely perguntou —Acho que é a tática preferida do André, né?

— Não… — Adênia se encostou no parapeito da estrutura e olhou para onde os soldados do Sul recolhiam seus mortos — Se o meu irmão estivesse no meu lugar, ele levaria tanto tempo para matar tão poucos.

— Vocês mataram três vezes mais do que perderam… — Raniely tentou melhorar o clima.

— Nenhum de nós gostaria de perder um amigo que fosse, mas é assim que a guerra funciona!

Jonas estava sério, parecia refletir sobre o quanto errou em seu comentário. Os demais também procuraram não falar nada, e Adênia permaneceu em silêncio, olhando para o horizonte.

— Você e seus guerreiros causaram grandes perdas e abalaram a moral dos soldados do sul. — Esmeralda disse — Deixe a próxima investida por nossa conta, reúna as suas pessoas, façam funerais ou qualquer que seja a forma de despedida em honra aos guerreiros mortos em batalha que seja do seu costume. Vocês têm vigiado essa região por tempo demais, merecem um descanso.

Adênia não respondeu, apenas deu um sorriso amargo e assentiu com a cabeça. Em seu rosto sujo de sangue inimigo, uma lágrima escorreu, ficando avermelhada conforme descia pela face da guerreira. Mesmo que fosse uma grande líder e soubesse que seus homens estavam dispostos a morrer, ela ainda os tinha como sua família, e perdê-los era uma tristeza irreparável.

Lucas, que estava em silêncio, apenas se lavantou e desceu da plataforma, retornando ao acampamento. Raniely e Jaiane o seguiram. Esmeralda pediu que suas guardas fizessem uma ronda pelos arredores para evitar tentaivas de infiltrações, e logo, sobraram apenas Adênia, Esmeralda e Jonas na plataforma de madeira.

— Ei! — Esmeralda chamou a atenção de Adênia — Vá descansar, ou dar uma moral aos seus guerreiros que perderam parte de suas famílias. Você é a líder das Pessoas Livres do Leste, precisa se recompor e fingir ser forte.

— Fingir? —Adênia olhou de relance para a rainha.

— Isso mesmo… — Esmeralda continuou — Acha que eu também não passo por isso? Pergunta para a Ametista, ela sabe bem como eu estou sempre ansiosa e tensa com o que pode acontecer, mas na frente dos meus súditos tento manter uma postura mais forte.

— E o que tem a ver o uma coisa com outra?

— Eu diria que no fundo somos parecidas.

— Talvez. Mas você fala muito…

— Isso é verdade, mas não posso falar assim sempre, sabe? Quando estou perante pessoas importantes para o reino, cada palavra minha pode ser interpretada de uma forma diferente, então devo sempre medir o meu tom, evitar um vocabulário comum, escolher as…

— Tá bom, tá bom… — Adênia gesticulou para Esmeralda parar — Eu entendi, vou lá ver os meus guerreiros, deixo tudo por conta de vocês dois.

Durante o restante do dia não houve mais nenhum movimento dos soldados do sul, e quando o sol se pôs, os guerreiros livres começaram a acender as piras funerárias de seus mortos. Houve canções alegres, e discursos de liberdade. O último foi o de Adênia.

— Houve um tempo em que temíamos o futuro! — Ela disse — Mas hoje, depois de tudo que passamos, aprendemos que o único destino é a morte! A única esperança é a liberdade! E a única liberdade é o pensamento. Vivemos cada dia sem arrependimentos, e morremos para mostrar que somos livres, hoje foram estes: Kuluu, Hosaan, Mikaai, Etani, Dona, Logamo, Etool, Heretor, Suwani, Fenil, Sairen, Naian, Roban, Rudoni, Yesah, Tenarach, Adinol, Jorani, Kopona, Asderak, Zenira, Mitano e Geero. Seus nomes não serão esquecidos. Sejam livres dessa vida de dor e sofrimentos!

— Que o sol continue a nascer todos os dias, e seu brilho jamais seja ofuscado! — Os guerreiros livres gritaram em resposta.

Ao terminar de discursar, Adênia acendeu uma das piras, e depois tomou um gole de uma bebida que todos compartilhavam. Ao longe, os outros aliados apenas assistiam o funeral improvisado, e imaginavam se seriam os próximos.

Aos mesmo tempo, ao sul, fogueiras também eram acesas, mas não piras. O povo do Sul não tinha o costume de cremar seus mortos, para eles o ato de queimar um cadáver era violência contra um irmão falecido, e um desrespeito ao que aquela pessoa significou em vida. O corpo humano deveria ser enterrado após a sua morte, e as piras funerárias dos guerreiros do Leste eram coisa que somente pessoas sem civilização poderiam fazer.

Em vez de cremar, os soldados do sul embalsamavam seus mortos para depois enterrá-los como heróis de guerra. Unguentos e poções com efeitos conservantes eram aplicados nos cadáveres, assim eles seriam preservados por semanas e até meses, para que suas famílias pudessem se despedir adequadamente.

Enquanto assistia o procedimento de limpeza e conservação dos cadáveres, Lu-Ji se remoia por dentro, com a culpa por uma derrota tão rápida em sua primeira batalha.

Ele sabia que seus soldados estavam cansados, e que levando em consideração a reputação dos guerreiros do Leste, aquela foi uma derrota dentro das expectativas. Mas ainda era difícil aceitar a culpa por perder 61 dos seus irmãos de clã.

Ele ainda não tinha visto o mascarado que lhe tirou as mãos tempos atrás, esse era o seu principal objetivo, encontrar e se vingar de quem tentou tirar a sua maior habilidade, a arquearia. Mas além disso, havia uma missão secreta que Lu-Ji recebeu diretamente de Long-Hua, era de manter os inimigos ocupados enquanto o Rei do Sul, junto com os mais experientes soldados de sua confiança davam a volta para um ataque na retaguarda.

A saudade de Yu-Kan também ajudava a aumentar a pressão interna que ele sofria. Descobrir que Yu era mulher tirava um pouco a culpa que Lu-Ji sentia por ser atrído por ela. Mesmo que o Reino do Sul fosse um lugar liberal para relacionamentos amorosos, o clã de vento não tinha esses costumes.

Lu-Ji levaria aquela vitória, ele ahavia prometid isso para si mesmo. Sua honra como guerreiro do deserto carregando o nome de Long-Hua estava em jogo, além da vida de centenas de jovens soldados do Sul sob seu comando.

Para evitar mais baixas emum possível ataque noturno, ele havia escolhido alguns melhores da sua confiança para fazer uma ronda. Evitando qualquer ataque surpresa dos inimigos à frente.

A noite era um dos momento preferidos dos guerreiros do Leste, assim que o sol se punha eles pareciam se mover como feras sedentas por presas, aproveitando a escuridão noturna para encobrir seus movimentos. As enormes fogueiras onde agora queimavam os cadáveres do seus que caíram em batalha poderia sr muito bem uma simples estratégia de distração.

Mas Lu-Ji estava ciente de toda a artimanha que aqueles guerreiros selvagens tinham, e se preparou para cada possibilidade. Até mesmo se seus inimigos declarassem rendição, ele estava disposto a massacrá-los, não era seguro confiar em guerreiros sem classe, que viviam como animais e não respeitavam a ninguém, sequer ao seus mortos.

Lu-ji andou um pouco por entre as tendas do acampamento, até chagar à sua. Lá dentro havia apenas um saco de dormir e parte dos seus pertences pessoais. Não era muita coisa, apenas o necessario para revidar um possível ataque noturno, e sobreviver em campo, caso fosse necessário.

Mas ele já estava acostumado ater tão pouco, era o cstume de seu povo nômade, não ter muito para se mover mais rápido.

Ele deitou e ficou olhando o teto de sua barraca de couro, por mais que estivesse ansioso, ele precisava dormir, amanhã era o dia em que ele teria sua vitória.



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