Volume 2

Capítulo 68: O Novo Herdeiro da Chama

Já eram quase sete da noite, as galinhas de André dormiam tranquilamente no galinheiro, Zita havia preparado parte da janta, e o dono da casa, mesmo com apenas uma mão funcionando, estava preparando uma salada com os vegetais de sua horta.

Mais uma noite como as outras desde que André comprara o sítio com o dinheiro ganho no clube de lutas ilegais. Com a diferença que dessa vez havia uma visita nova, Lídia, a segunda pessoa em comando de Felipe.

O cheiro delicioso de comida saudável tomava conta do ambiente, e a visitante salivava mais que cachorro em frente a máquina de assar frango. Mas a janta teria que ser atrasada por causa de mais uma visita.

O som de motor parecia se aproximar, indicando que alguém vinha à residência oficial de André sem aviso prévio o sequer um convite por parte do dono da casa.

 — Quem pode ser a essa hora? — Zita olhou pela janela e viu um carro se aproximar — Será que é alguém perdido?

Indo em direção à porta da frente, a Sacerdotisa do Fogo teve uma grande surpresa ao ver Alice Argent, uma das pessoas mais importantes da Aliança Internacional e um coreano que Zita não reconheceu, os dois estavam parados frente a porta da casa como se fossem íntimos dos habitantes dali.

 — Boa noite Elizabeth! — Alice cumprimentou — Quanto tempo? Senti saudades…

Reconhecendo a voz de Alice, Lídia correu o mais rápido que conseguiu para dentro de um quarto, e se escondendo debaixo da cama, permaneceu lá, em posição fetal.

 — Que cheiro bom! — Park lambeu os lábios, desejando a comida que cheirava tão bem.

Vendo que as visitas permaneciam com Zita, André resolvu ir à porta ver o que estava acontecendo.

 — Senhor André Lima! — Alice falou com falsa alegria ao vê-lo — Quanto tempo? Por mais que seja apenas a segunda vez que nos encontramos, fico feliz de ver que está bem!

 — Foda-se a sua felicidade… O que vieram fazer aqui? — André perguntou apaticamente.

 — Eu sei que Lídia está escondida aqui! — Alice disse sorrindo com o canto dos lábios. 

 — E deveria ser segredo?

 — Talvez, mas imaginei que seria cortês fazer uma visita.

 — Também é cortês convidar as visitas a adentrar a casa, principalmente a essa hora da noite… — Park fez menção de andar em direção à porta — Quem sabe um convite para jant… 

 — Estou cagando pra essa tal cortesia! — André engrossou o tom de voz — E se tentar entrar na minha casa eu vou te mostrar o motivo de quase todos os outros terem medo de mim!

 — Acho bom acreditarem no que o meu namorado disse! — Zita esbravejou.

Enquanto isso, Lídia permanecia escondida debaixo da cama, abraçada com os próprios joelhos e hiperventilando.

 — Um herói sem braços, uma heroína sem poderes e uma secretária sem chefe… — Alice caçoou — O que vocês três podem fazem contra nós dois armados?

Ao dizer essas palavras, Alice levantou um pouco o terno executivo, revelando o cabo de uma arma de fogo curta, que André reconheceu sendo similar à que era usada pelo sargento Fidelis.

 — Se a sua intenção era me ameaçar com essa arma aí, deveria já ter chegado com ela em punho e engatilhada… Ou ainda resta alguma dúvida da minha capacidade?

A conselheira da AI escondeu a frustração de falhar com tal ameaça, e cobriu a arma novamente, ficando em silêncio. André também evitou trocar mais palavras com os dois visitantes, torcendo que fossem logo embora para que ele, Zita e Lídia pudessem jantar.

Mas em vez de ir embora, Park se voltou para Zita, mudando o rumo da conversa.

 — Você ainda se considera uma heroína?

 — Recebi esse título graças às minhas ações no Outro Mundo, e mesmo que não tenha tanto orgulho dele, ainda não o abandonei por completo.

 — Mas você não tem mais o poder da chama, e não está em condição de fazer nenhum ato “heroico”!

 — Meros detalhes. — Zita deu de ombros.

Lee Sen Park deu dois passos para trás, e abriu os braços como quem esperava receber um abraço. André e Zita se entreolharam confusos, como se ambos duvidassem da sanidade mental do coreano.

Ao mesmo tempo Park sorriu e emitiu um leve grunhido. Suas mãos emitiram um brilho alaranjado que foi se transformando em pequenas labaredas, por fim, chamas crepitantes cobriram totalmente seus membros superiores.

 — Eu tenho o poder do fogo! — Park disse orgulhoso.

 — Azar o seu! — Zita deu de ombros.

 — Acho que você não entendeu, eu tenho o poder que era seu…

 — Ninguém perguntou!

 — Acredito que você está irritada por ver alguém possuir um poder que foi seu por tanto tempo.

 — Não! Eu estou muito irritada por um cara mimado que eu nem conheço ter vindo à minha casa com uma loira metida, ameaçar o meu namorado e exibir um poder  que eu conheço muito bem, como se fosse a coisa mais importante do mundo, e atrapalhar a nossa janta. É sério, a comida está esfriando e vocês NÃO estão convidados a ficarem.

André estava em silêncio, mas sorria, ele achava lindo o jeito bravo de Zita, ele sabia melhor do que ninguém que aquele ainda não era o ápice da raiva dela.

O coreano recolheu suas chamas e apagando o pouco de fogo que insistia em queimar a manga de sua camisa, retornou ao carro comum sorriso triunfal. Enquanto isso, Alice a André permaneciam se encarando de forma agressiva na porta da casa.

 — Amanhã eu e esse cara aí iremos para o Outro Mundo! — Alice disse apontando para Lee Sen Park — Então, a próxima vez que nos encontraremos será em uma dimensão totalmente diferente, com regras e leis diferentes, acho que poderemos ter uma conversa mais divertida…

 — Aguardarei ansiosamente! — André respondeu sem esboçar reação alguma.

Alice deu as costas e retornou ao carro, em poucos segundos o veículo saiu da frente da casa e do campo de visão de André e Elizabeth.

Os dois adentraram a casa, e com certa dificuldade conseguiram convencer Lídia que já estava tudo bem. E como se nunca houvesse acontecido a chegada dos dois estranhos, a janta foi servida.

Após a deliciosa refeição, o assunto da visita voltou a tona.

 — Não entendi… — Lídia disse meio perdida — Achei que tinham vindo aqui me prender… ou matar.

 — Você não é mais importante para a Aliança Internacional. — Zita explicou com uma expressão sombria — O que aqueles miseráveis queriam era apenas nos desestabilizar emocionalmente, pois sabem que brevemente estarem retornando para o Outro Mundo, e lá as coisas serão diferentes!

André… abraçando-a, deu um beijo no topo da cabeça de sua amada, e ficou por alguns instantes passando os dedos pelos cabelos castanhos, que um dia foram ruivos.

 — Eu sei que você ficou mal de ver aquele cara com o seu poder, e esse foi o exato motivo de terem vindo aqui, mas quero que me diga o que está sentido agora.

 — Vontade de matar os dois… — Zita respondeu rangendo os dentes — E de uma forma bem dolorosa.

 — Isso é bom, vamos precisar que lembre-se disso quando a hora chegar!

De volta à estrada, Alice permaneceu séria e em silêncio por quase todo o trajeto de retorno, enquanto Lee Sen Park sorria mais do que criança no parque. Incomodada com a alegria do colega de viagem, Alice perguntou:

 — O que achou da antiga possuidora do poder da chama?

 — Perigosa e intimidadora…

 — Ficou com medo?

 — Não… — Park sorriu com o canto da boca — Na verdade eu fiquei animado! Queria que pudéssemos lutar, acho que é a melhor forma de nos conectarmos.

 — Depois dizem que eu quem sou estranha!



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