Volume 1

Capítulo 49: Décima Página do Diário (1)

Me vi cercado por uns 20 guardas, dentre eles dois dos que me levaram para a Grande falha. Além deles tinham dois dos “heróis”. O da frente era o que havia me atacado, pelas armas girando em torno de seu corpo eu imaginei que o poder dele pudesse controlá-las, atrás dele estava Léo, os demais heróis estavam em posturas defensivas sem apresentar intenção de atacar. Para a minha sorte a maioria das pessoas tinha que vir desarmado para poder entrar na festa.

Léo fez menção de interferir, mas Long-Hua fez um gesto indicando para ele aguardar. Lembrei que Miraa tinha explicado que os heróis haviam sido distribuídos pelos outros seis reinos em uma tentativa de equilibrar o poderio militar e evitar que o reino de Prata se sentisse tentado a atacar os demais. Claramente Leonardo estava no Reino do Sul, de onde Long-Hua era um dos líderes.

Em seguida vi a princesa Esmeralda puxar Lilás pelo braço e escondê-la entre seus serventes, o que me tranquilizou um pouco. Era bom ver que nem todos ali queriam me matar. O ovo que eu segurava tinha caído no momento do ataque surpresa, mas Surii foi rápida em apanhá-lo.

O herói que havia me atacado à traição tomou a dianteira e se apresentou. E pelo que Yobaa tinha me ensinado, quando um cavaleiro se apresenta por nome e título ele quer u duelo, então dificilmente alguém iria interferir. Esses protocolos de honra eram bobagem para mim, o importante é vencer e sobreviver.

— Meu nome é Wagner , herói herdeiro do deus da guerra!

— Eu sou And… Deco!

— Andeco?

— Não! Apenas Deco, do Leste.

Wagner não disse mais nada, apenas abriu os braços e as duas lanças ao seu lado voaram em minha direção.

O natural seria desviar saltando para trás, mas eu confiava que técnicas básicas serviriam naquele momento, então corri em direção a Wagner passando por entre as duas lanças enquanto tirava a que estava presa à minha capa na intenção de usar. Parte de uma estratégia era não usar sua arma mais forte de primeira, então eu usaria as armas de Wagner contra ele.

Aproveitando que meu oponente não esperava tal atitude e os demais permaneciam em volta sem dar sinal de quererem interferir, arremessei a lança com toda a força que pude, mirando o meio do tórax de Wagner. Mas para a minha surpresa ele não tentou desviar ou se defender, e quando a lança estava a centímetros de seu corpo, simplesmente sumiu. Como se nunca houvesse existido.

Me vendo desarmado, Wagner avançou com a espada em punho. É obvio que ele não esperava que eu teria uma arma. Passei a mão pela capa e rapidamente uma parte dela se converteu em uma adaga reta que usei para me proteger da espada longa antes que fosse atingido.

Foi arriscado mas deu certo, e como eu girei enquanto formava a adaga, Wagner ficou me olhando com cara de babaca. Mas no segundo seguinte duas novas lanças apareceram ao seu lado girando e prontas para me atacar.

Coloquei o braço direito na frente do corpo segurando firmemente a adaga, enquanto criava uma segunda na mão esquerda. Não fiz questão de esconder dessa vez, pelo contrário, queria que Wagner visse e ficasse com medo.

— Então nossos poderes são semelhantes?

Demorou um pouco mas ele finalmente entendeu como o meu poder funcionava.

Ele recuou dois passos baixando as armas, que segundo a etiqueta dos cavaleiros indicava que estava desistindo do duelo. Finalmente o treino com Yobaa estava tendo alguma serventia.

Mas os outros guardas não foram tão cavalheiros e vieram todos ao mesmo tempo, era difícil enfrentar vários guardas ao mesmo tempo enquanto protegia Surii, mesmo o treinamento rigoroso que eu tive não era suficiente para me preparar para tanto. E me faltava experiência de combate, o que sobrava aos guardas.

Lembrando das técnicas de postura e defesa que aprendi com Yobaa, eu me mantive entre os guardas e Surii, e como as minhas adagas eram muito curtas para um combate contra duas dezenas de espadas longas, eu fui recuando e levando junto Surii, até não ter mais para onde recuar.

Olhei para Surii com o canto do olho sem desviar totalmente a atenção dos guardas, e vi que ela não estava mais com o ovo.

— Cadê o ovo?

— Que ovo?

— O tesouro…

— Aaah… Eu passei para Baduu, ela está saindo com ele…

— Quando você passou para ela?

— Roubar também envolve uns truques de mágica!

— E cadê a Baduu? Como assim saindo?

— Ela conhece umas pessoas que a ajudaram a escapar com o tesouro, e eu fiquei para ajudar você com a distração…

Eu estava encurralado em um canto do salão, Surii estava logo atrás de mim, encostada na parede em posição fetal. Mas pelo menos Baruu agora estaria em segurança, enquanto parecia ser o nosso fim, do nada surgiu uma parede de fogo em torno de nós dois, parecia nos prender e ao mesmo tempo proteger.

De dentro da parede de fogo me protegeu surgiu a ruiva mais bonita do mundo, o fogo a tocava mais não a agredia, era mais como se estivesse acariciando sua pele.

Enquanto eu sentia inveja daquelas chamas, Zita se aproximou apressadamente e disse.

— Eu não vou poder proteger você por muito tempo, essa técnica consome o meu poder muito rápido, então só há uma forma de você escapar: Retire o cristal de Victoria!

Não tive tempo de responder, o fogo começava a desaparecer lentamente, Zita pegou a mão de Surii para retirá-la, mas eu a segurei por mais três segundos.

Tempo suficiente para um beijo de despedida.

— Eu esperei um ano por isso — Disse Zita com um sorriso envergonhado.

— Eu pensei nesse momento todos os dias… — Respondi.

— O que aconteceu naquele dia? Todos achamos que você estava morto…

— Eu acho que morri e renasci… E dessa vez como um herói.

Não tivemos mais tempo, Zita retornou por dentro das chamas levando Surii aturdida, Enquanto eu me escondia atrás de uma armadura decorativa, ao chegar ao outro lado eu a ouvi dizer:

— Ele fugiu! Deve ter saído pela janela lateral!

Os guardas do castelo imediatamente correram na direção que Zita tinha lhes indicado, nenhum deles imaginaria que uma dos 32 estava cobrindo a minha fuga. Aproveitando o alvoroço me infiltrei por entre as pessoas correndo desorganizadamente e consegui chegar até onde a comitiva da princesa

Fui direto aonde Lilás estava, disfarçada com um véu emprestado por Esmeralda que lhe cobria o rosto e parte do corpo.

— Lilás precisamos fugir, as outras duas já conseguiram sair aproveitando o tumulto que causei, agora não podemos perder tempo.

— Espere — A princesa Esmeralda interferiu — Não posso deixar que a leve, preciso que essa garota venha comigo!

— Acredito que você não tenha objeções, uma vez que ela não se trata de uma filha do Leste. — Completou Victoria.

Olhei para as duas de pé ao lado de lilás, mas não dava tempo de chegar a uma conclusão ali mesmo, seria questão de minutos até descobrirem que eu ainda estava no salão. Então agi sem pensar, improvisar era meu segundo melhor poder.

Arranquei o cristal vermelho do pescoço de Victoria e me afastei bem rápido, esperando que ela me lançasse um ataque imediatamente, levando em conta que eu não conhecia os seus poderes. Mas para a minha surpresa ela não reagiu de primeira, apenas tocou o pescoço e em seguida sorriu.

— Por quê?.. — A única coisa que ela parecia conseguir dizer.

— Porque eu quis… — Achei melhor não falar sobre o pedido de Zita.

— Você sabe o que acabou de fazer?

— Ah… Não exatamente…

— Quem foi que te falou sobre o rubi? Anne? Não… Deve ter sido a Elizabeth, quando vocês dançaram…

— Foi mal…

— Não precisa se desculpar, eu que tenho que lhe agradecer!

Victoria olhou para Lilás e perguntou:

— Onde você mais deseja ir agora?

— Aaaah…. beeem… — Lilás pensou e respondeu — Quero ir para onde a irmã Flor…

Antes que terminasse de responder, Victoria tocou seu ombro e as duas desapareceram ali, na minha frente, simplesmente sumiram. E eu fiquei lá de boca aberta sem entender o que tinha acontecido.

— Você não faz ideia do que acabou de acontecer, não é? — Esmeralda me perguntou comum sorriso gentil.

Apenas acenei com a cabeça indicando que não.

— Vic levou a sua irmãzinha para um local seguro, não se preocupe.

Eu continuei sem entender.

— A irmã Victoria pode se teleportar, mas aquele rubi continha um feitiço de restrição dos seus poderes, nem eu ou ela poderíamos retirar aquilo, então quando você tirou ele, a libertou. Agora nós duas estamos livres. Em agradecimento iremos ajudar você na sua fuga.

Ao mesmo tempo Victoria reapareceu sozinha dizendo:

— Eu deixei ela com o resto do seu grupo em segurança, agora vou retirar Esmeralda, nós duas não estaremos seguras aqui depois de você ter me libertado…

Victoria tocou o ombro de Esmeralda e as duas simplesmente desapareceram na minha frente, e mais uma vez eu fiquei com cara de idiota.

Até que um grito me trouxe de volta à realidade.

— Aquele desgraçado ainda está aqui!

E mais uma vez eu estava cercado.



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