Volume 1
Capítulo 41: Oitava Página do Diário
— 20 dias! — Eu repetia para mim mesmo — Apenas 20 dias!
Era esse o tempo que eu tinha para me preparar para o meu reencontro com os heróis, eu precisava estar preparado. Como nós três que fomos escolhidos para a missão tínhamos ganhado um tempo de folga dos treinos exaustivos, me foquei totalmente no controle do Rancor.
Durante os meus treinos secretos ficava imaginando diferentes possibilidades de encontros com os heróis, todos os possíveis diálogos, como eles reagiriam quando descobrissem que ainda estou vivo e como eu deveria mostrar superioridade.
Mal podia esperar para pisar em Jonas, o balofo que mandou me jogarem naquela merda de buraco fedido. Mas o principal de tudo era reencontrar Zita, ela tinha dito que depois daquela festa seria enviada para a montanha de fogo, onde faria um treinamento especial com os sacerdotes do deus do fogo. Mas eu desejava de todo o coração que ela estivesse nessa festa também, para dançarmos juntos mais uma vez.
— Quem sabe outro beijo. — Suspirei ao lembrar do primeiro.
Mas antes de partir na missão, eu precisava estar pronto. Então treinei absurdamente o controle do meu poder, como já conseguia formar uma adaga, pensei em moldar outra coisa. Um dos pontos negativos que observei sobre o “Rancor” foi que demorava para liberar toda a névoa que formava a adaga, porém, após liberada eu podia fazê-la virar fumaça e voltar ao formato quantas vezes precisasse a uma velocidade considerável.
Com base nas limitações impostas pelo meu poder, imaginei que se conseguisse transformar a névoa em algo que passasse despercebido seria mais viável, a melhor opção que encontrei foi uma peça de vestuário. Ninguém esperaria que uma camisa pudesse ferir alguém.
O problema seria que ao transformar uma peça de roupa em uma adaga, eu ficaria sem aquela roupa, imagina que constrangedor deve ser lutar seminu, então nada de fazer calças. Fiquei imaginando como as pessoas reagiriam ao me ver “tirando a roupa” para lutar. Acabei rindo um pouco.
A solução para os meus problemas veio quando Miraa me pediu que escolhesse o figurino para a noite da missão. Observei que todos os modelos que ela me mostrou tinham duas coisa em comum: Eram muito ridículos e tinham uma capa. E isso era exatamente o que eu precisava, não a parte de serem ridículos, se eu pudesse transformar o rancor em uma capa, quando eu precisasse da adaga seria mais rápido. E eu não ficaria nu. Obrigado senso de moda estranho do leste.
— Eu quero o traje preto, com a capa, tudo preto…
— Você será muito chamativo dessa forma, não acha? — Miraa me olhou desconfiada — Geralmente se usa menos preto, e mais algumas cores leves. É uma roupa para uma festa.
— E eu sou a distração da missão. Preciso chamar atenção! — Respondi com confiança.
Miraa não disse mais nada, apenas sorriu como se tivesse ficado feliz com a minha resposta. Depois disso eu fiquei mais uns dias apenas me concentrando em criar uma capa com o Rancor, era mais difícil, e eu não estava indo bem, criar um tecido maleável era mais complicado do que uma adaga rígida. Mas eu continuei treinando.
Duas semanas se passaram, até que foi rápido, geralmente o tempo passa mais devagar quando estamos ansiosos, talvez porque foram duas semanas sem ser agredido de nenhuma forma, e foram dias ótimos. Eu sentiria saudade.
Faltando um dia para a nossa jornada para o Oeste, Baruu chamou eu e Surii, para decidirmos juntos o plano de ação a ser adotado. Como cada um sabia exatamente o que deveria fazer, Baruu recomendou que entendêssemos o que os outros fariam, assim teríamos um melhor trabalho em equipe.
Era muita pressão, embora fossemos Filhos do Leste, éramos crianças. Mas a melhor forma de se obter experiência é praticando, pelo menos essa era a lógica de Yobaa. Eu ainda era muito inocente e não entendia como o mundo funcionava, para mim bastava eu ser forte e não teria problemas.
Fiquei imaginando como a nossa mãe ficaria feliz quando cumpríssemos a missão, ela iria nos elogiar, Yobaa me respeitaria e admitiria que fiquei forte, eu não precisaria mais passar por uma sessão de treino torturante todos os dias.
Baruu atrapalhou meus pensamentos divagantes dizendo:
— O Deco será o representante principal, Surii e eu estaremos como acompanhantes, mas não se preocupem, eu cuido da entrada e das apresentações! Também vou ensinar algumas regrinhas de etiqueta, e quem sabe uns passos de dança para nos misturarmos melhor. Lembrem de não fazer nada do que estiver na lista de falta de etiqueta…
— Eu vou roubar o tesouro, segundo as informações está em um lugar de difícil acesso, mas tenho experiência em invasões e roubos, durante o jantar quando os representantes de cada reino for discursar é o melhor momento. Assim estarão todos virados de costas para a saída, aí eu escondo o tesouro na carruagem e volto. — Surii disse levantando a mão.
— Eu cuido da distração para que Surii consiga tirar o tesouro do castelo em segurança, e voltar à festa sem que percebam seu sumiço. — Falei imitando o gesto de Surii.
— Depois de tudo, é só subirmos nas carruagens e voltarmos à montanha solitária, o Reino de Prata nem saberá que roubamos o tesouro! — Completou Baruu. — O maior problema é a fuga, se formos capturados será o fim das nossas vidas.
O plano parecia bem simples e infantil, o que me deixava um pouco nervoso.
— Precisaríamos de mais pessoas para o apoio, não conseguiremos apenas nós três… — Comentei.
— É só levar pessoas suficientes… — Sugeriu Surii.
— Não é tão fácil, como será um encontro entre todos os reinos para comemorar os dois anos da chegada dos heróis e promover a paz, creio que haverá um esquema de segurança grandioso. No convite até mesmo especifica a quantidade máxima de pessoas que cada delegação pode levar, com toda certeza para forçar-nos a reduzir os guardas pessoais e evitarem quaisquer conflitos, assim, a maioria do nosso pessoal terá que ficar fora do castelo, para facilitar a fuga é melhor poucas pessoas! Além de ser no castelo real do Reino de Prata, mesmo eu jamais entrei naquele castelo, e nem temos ninguém que conheça.
— Mas eu já entrei, eu conheço algumas coisas lá… — Murmurei involuntariamente.
Baruu me olhou assustada enquanto Surii sorriu como se tivesse um flash de genialidade, eu havia esquecido que apenas Miraa e Surii sabiam o motivo de eu ter ido parar no fundo da Grande Falha. Agora pensando melhor, eu nunca tinha conversado muito com meus irmãos mais velhos, geralmente eles falavam de suas histórias e aventuras, eu apenas ouvia.
— Então você pode pensar em uma forma de sairmos do castelo e traçar uma rota segura pela cidade?
— Surii parecia ter entendido exatamente onde eu queria chegar.
—Claro, eu conheço toda a cidade em torno do castelo, sou um espião, já esqueceu? — Disse empinando o nariz.
Baruu continuava confusa, me olhando como se esperasse uma explicação, me senti muito importante, sorri e falei de forma convencida:
— E se eu disser que tenho um plano perfeito?