Volume 1
Capítulo 3: Reencontro
André abriu os olhos e demorou a se acostumar com a iluminação do local, estava deitado mas não conseguia se mexer, podia sentir que estava preso à cama, mas pelo menos essa era muito mais confortável do que os últimos locais onde conseguira dormir. Aos poucos conseguiu identificar as características do local.
Todo o ambiente era branco e limpo, assim como suas roupas, tudo parecia novo, além de cheirar bem, não era de pedra como o último lugar que lhe serviu de abrigo… Não haviam outros móveis, apenas a cama em que estava preso. O local era um cubículo de apenas 6 metros quadrados.
A porta se abriu e uma voz conhecida veio aos ouvidos de André:
— Já era hora de você conseguir sair daquele inferno…
André fez um esforço e virou a cabeça, mesmo que soubesse quem era, ele precisava confirmar.
— Felipe… É outra alucinação? Não… Não pode ser… Acho que essa é com certeza a primeira vez que fico feliz em te ver…
Um rapaz negro, de dreads coloridos e jaqueta amarela estava em pé junto a porta com um sorriso, e ao ouvir André dizer essas palavras olhou para os braços enfaixados do seu velho conhecido que estava preso à cama e baixou a cabeça.
— Então era verdade? Havia mesmo outra forma de atravessar os mundos?
— Hurrum! Você estava certo… — Confirmou André — Mas agora não é hora para isso, me tire daqui, você sabe que não há motivos para me prender…
Felipe fez um sinal assertivo com a cabeça e saiu do quarto, voltando segundos depois acompanhado por dois homens altos e fortes.
— Você tem certeza? — Perguntou um deles — Pelo que eu sei, ele poderia matar todos nós se quisesse…
— Foi o que o senhor disse… — Completou o outro.
— Lembrem-se que eu sou o superior da Divisão de Inteligência — Respondeu Felipe — Vocês estão sob minhas ordens, além disso, se ele causar qualquer dano, eu assumo a responsabilidade.
André estava calado até esse momento, mas não pode se conter
— E desde quando você tem algum tipo de responsabilidade? — Perguntou ironicamente enquanto os guardas livravam-no das algemas que prendiam seus pulsos, tornozelos, pescoço e cintura.
— Muita coisa mudou nos últimos 4 anos, acho bom você se preparar bem — Respondeu Felipe com tom de deboche — Vai ter muitas surpresas.
Quando finalmente foi liberado de todas aquelas algemas, André sentou-se na cama com certa dificuldade, olhando fixamente para Felipe. Ele queria abraçá-lo e ao mesmo tempo dar um soco na sua cara.
Felipe pareceu entender o que André sentiu naquele momento, sorriu e disse:
— Vamos dar uma volta, a primeira parada é a cozinha, pela sua aparência você está precisando muito comer algo…
André não falou nada, apenas andou com dificuldade em direção à porta, Felipe lhe apontou a direção a ser seguida, e os dois saíram lado a lado pelo corredor, sem trocar uma única palavra.
O pobre garoto de cabelos castanhos desgrenhados, e aparência subnutrida chegou à cozinha salivando, comendo tudo que conseguia, aos poucos sentiu suas forças retornarem, mesmo que seus braços quase não se movessem e suas mãos permanecessem fechadas.
André sentia muita dor ao movimentar seus braços, mesmo assim precisava deles para levar a comida para a boca. Seu orgulho de guerreiro não o permitia aceitar ajuda, principalmente de Felipe, seria humilhante demais.
— Sabe… Esse mundo é bem diferente do mundo onde estávamos. — Felipe puxou conversa — Aqui não existe magia, é a tecnologia que realmente importa, inclusive temos uma equipe trabalhando em uma forma de criar uma chave que possa abrir a porta por esse lado. Talvez em dois anos…
Antes que o rapaz sorridente pudesse terminar sua frase, André interrompeu:
— Preciso que você chame os outros, o mais breve possível.
— O QUÊ? — Felipe estava tão espantado que acabou gritando – Alguns deles te querem morto, lembra?
— Não ligo. — A expressão de André era séria — Tem algo mais importante do que briguinha de crianças que precisamos discutir.
— De que tipo..? — Perguntou Felipe enquanto mastigava um biscoito.
André não respondeu, apenas continuou comendo. Felipe respirou fundo para não dar um soco no pobre esfomeado, apesar de ser conhecido como o mais paciente dentre os 33, Felipe sempre conseguia perder a paciência com André.
— Tá. — Falou Felipe — Fica me devendo uma…
Felipe saiu por alguns minutos, e ao retornar para a cozinha encontrou André ainda sentado, terminando de esvaziar um pote de biscoito. Ao entrar no cômodo foi recepcionado com um arroto prolongado.
— Eu mandei uma mensagem para os outros — Disse Felipe — Agora vamos esperar e ver quantos estão dispostos a falar com você…
— Obrigado! — André agradeceu baixando a cabeça.
— Você agradecendo? Ha-ha-ha… — Felipe riu com a surpresa — É a primeira vez que eu vejo isso…
Vendo que André já acabara de comer, Felipe o convidou para conhecer a instalação onde estavam, enquanto isso contava a André como encontraram ele em estado de coma meses atrás. Poucos metros após saírem da cozinha, Felipe parou.
— Eles vão querer saber o que é tão urgente para que você os convoque… — Felipe disse em tom sério — E não sei se lembra, mas nenhuma reunião que você participou terminou bem, espero que tenha um bom motivo.
André continuou andando, parando após exatos seis passos, virou-se para Felipe, e olhando nos seus olhos disse pausadamente para que não houvesse engano ou necessidade de repetir:
— O Cavaleiro de Prata…
Antes que ele concluísse a frase os olhos de Felipe apresentaram sinal de medo.
— …Ele está aqui — Concluiu André — Tenho provas de que ele de alguma forma conseguiu atravessar.
Felipe deu dois passos para trás, baixou a cabeça, e murmurou:
— Que merda de pesadelo que nunca acaba…
As palavras de Felipe expressavam exatamente o que ele sentia no momento, sua cabeça estava confusa, apesar de ser uma informação simples de entender, era muito complicado de avaliar a situação, ele precisava ponderar por alguns momentos.
— Sei que a informação de que o Cavaleiro de Prata passou para cá traz uma infinidade de possibilidades, e nem mesmo a sua habilidade é capaz de avaliar a situação de forma simples. —André aparentava tranquilidade — Acho que ainda temos tempo, vou explicar tudo quando os outros chegarem.
— Se eles toparem se reunir com você… — Respondeu Felipe, com uma expressão de desânimo — Mas se souberem o motivo creio que todos virão.
— Não quero ter que informar nada para cada um individualmente, prefiro explicar apenas uma vez, além disso, muitos duvidariam das informações se eu não puder provar a verdade.
Ao dizer isso, André se dirigiu ao quarto onde acordou momentos atrás. Felipe entendia que ele precisava descansar, e por isso achou importante não incomodar mais.