Mundo de Formamus Brasileira

Autor(a): Sr. V


Volume 1

Capítulo III: “Conhecidos”

“Às vezes quando se está perdido o melhor a se fazer é procurar a luz. Pois se entrar ainda mais na escuridão, pode findar se deparando com o maior de seus medos. Eu observo você, pequeno(a) coelhinho(a)...”

***

— Essa cidade é bem movimentada. Fiquei sabendo de alguns casos estranhos que aconteceram por aqui. 

— Que casos?

— Uma igreja pegou fogo e as pessoas que estavam nela, bem, nunca foram encontradas. Nem sequer os restos… Apenas sumiram!

— Oi? E isso é possível?

— Não sei bem os detalhes, mas… Todos, incluindo o padre, desapareceram sem deixar rastros. Isso em 1666, mas houveram alguns casos em 1736, 1763 e 1812. O último foi recente, um garotinho desapareceu nas proximidades! Embora, só vamos saber se esses incidentes estão ligados quando investigarmos mais a fundo.

— Será que o garoto está bem? — disse alguém no banco traseiro.

— Espero que sim. Não gosto quando crianças se envolvem!

— Charles, Charles. Ninguém aqui gosta meu amigo! Mas, se for o caso...

Disse ele puxando um revólver, seu sorriso era nítido em seu rosto ainda jovem. Cabelos pretos e olhos azuis profundos. Por vez a garota falou:

— Concordo com Clint. Não gosto quando crianças se envolvem, mas… se for o caso também estou mais que preparada. 

Disse ela puxando um punhal da cintura. A garota de cabelos cacheados marrons, lambia a lâmina enquanto seus olhos castanhos encaravam o homem que dirigia. De repente mais uma pessoa entrou na conversa, parecia jovem:

— O Charles é sempre um chorão que deixa o trabalho sujo pra gente. Fazer o que, é a idade, ela chega pra todos! — Coloca a mão no ombro do motorista.

— Charles, você é muito maníaco, sabia? Essa sua obsessão por limpeza não é deste mundo. 

— Isso mesmo, Verônica está certa. — disse Clint. — Você e suas manias de limpeza. Tem que sair dessa vida difícil de “caçador”, isso não é mais pra você coroa.

— Hehehe. Não posso, já que nasci para caçar esses lobos! Faço isso a 30 anos, não tem como parar agora. Além do mais, quem cuidaria de vocês? Vocês são meus netinhos queridos. — disse com tom de sarcasmo.

— De vovô já temos o Bobby, se bem que ele é mais como um pai! — Sorriu Verônica.

— Foi ele que ligou pro Charles sobre esse trabalho. Eles são amigos antigos, eu acho… — disse Clint o encarando.

Por vez o homem de pele clara e cabelo grisalho o qual cobria os olhos, disse rindo muito enquanto desligava o rádio:

— Amigos antigos? Hahaha. Aquele cretino disse isso, foi? — Encarou os demais. — Bem, amigos? É, amigos. Vamos tirar o fato de ele ter sido casado com minha prima! 

— O que?! Bobby e sua prima? Que?! — Verônica parecia surpresa.

— Não se impressione muito. — disse rindo.

— Ei Charles, se disse que já fazem 30 anos caçando lobos. Mas se eles são lobos, você é o que então? — Perguntou outro garoto no banco traseiro.

— Eu? Boa pergunta Rigor… — Sorri. — Eu sou um… caçador qualquer. Apenas seguindo o que se tornará em breve minha presa. Lobos não podem fugir de mim!                       

O carro chamava atenção das crianças que brincavam na rua da velha cidade. O céu azul dava um pouco mais de contraste à paisagem mórbida e simples que era “Centralia” na Pensilvânia, lugar calmo até então.

Charles avistou uma garotinha que acenou para ele, ele a encarou por um momento enquanto em sua mente vinham lembranças confusas de outra pessoa. Por vez a deu um sorriso gentil e acenou de volta.

“Milena… já faz quanto tempo?” 

Verônica o interrompeu de seus pensamentos, ligando o rádio. Uma das emissoras começou a tocar um dos sucessos da banda “The Beatles”. Ela por vez começou uma coreografia animada.

— Que banda é essa, Verônica? — Perguntou ele.

— O que velhote? Você não conhece os Beatles?

— Não… Mas o som é bom.

— Às vezes me esqueço de que o senhor já é velho. — O encarou. — Essa é uma banda que tá fazendo sucesso! 

— E como nunca ouvi falar neles?

— São novos até. Começaram a dois anos atrás, mas o sucesso está chegando. Fazer o que? Eles são bons.

Charles sorriu e aumentou o volume, por vez diminuindo a velocidade em seguida ao avistar um posto. Não demorou muito para conduzir o carro até as bombas de gasolina.

— Saiam um pouco do carro. Vão dar uma volta por aí enquanto encho o tanque!

Verônica foi a primeira a sair. Correu às pressas rumo ao banheiro, os demais sorriam dela, mas ela não parecia se importar. 

— Segurei até onde dava. — Falou abrindo a porta do banheiro feminino.

Clint também saiu. Acendeu um cigarro se encostando no carro enquanto encarava algumas lindas moças na lanchonete à frente.

— Olha lá, que gato. — disse uma delas acenando.

— Ele está olhando pra gente! — Sorriu.

Elas começaram a cochichar entre si, encarando ele com sorrisos e olhares sedutores, dando até mesmo tchauzinho com a mão. Ele em resposta deu a sua mais longa tragada, soprando em seguida a fumaça em forma de coração. 

As moças aplaudiram impressionadas. Ele por vez tomava coragem, já dava seu primeiro passo quando:

— Sai da frente.

A porta logo atrás dele se abriu de uma vez só, o jogando no chão. Um garoto mal encarado saiu, tinha cicatriz em um de seus olhos, cabelo loiro e pele clara. Ao encarar Clint no chão, começou a rir.

— Se deu mal! Hahaha. — disse apontando o dedo.

Clint por vez se levantou, limpou um pouco a sujeira de sua calça. Olhando para trás avistou as jovens que agora riam dele, algumas até mesmo zombavam. Ele suspirou fundo e jogou o cigarro no chão pisando nele.

— Porra, Rigor. Me fez passar vergonha seu merdinha!

— Eu disse pra sair da frente. 

— Ei maninho, já chegamos? — disse um garoto também saindo do carro.

Ele era igual a Rigor, mesmo cabelo loiro, olhos azuis, porém, não possuía uma cicatriz. Essa era a única coisa que os diferenciava, pois até mesmo suas roupas eram parecidas.

— Não, Igor. Só paramos para abastecer! 

— Pensei que ia dormir a viagem toda, moleque. — disse Clint.

— Vou ter que comprar mais goma. Essa daqui babou…! — disse Igor, cuspindo o chiclete no chão.

Rigor por vez colocou o braço ao redor do pescoço de seu irmão, saíram em seguida rumo a lojinha no posto. Enquanto isso, Clint encarou um homem que ainda dormia no banco traseiro, roncando feito um porco.

— Esse daí já tá morto! — disse acendendo outro cigarro e fechando a porta com força.

Charles já começava a encher o tanque, quando percebeu um senhor que o encarava. O idoso sorria e cochichava enquanto observava o carro.

— Gostou meu senhor?

— Gostar? Kikiki. Esse carro é lindo demais para eu apenas gostar! Ouso dizer, que é como minha antiga esposa… Bonita, mas quente. Isso faz um estrago… Hehehe.

— Hahaha. Ok, né… se o senhor tá falando.

— Pena que você o usa para isso. — disse apontando para o porta-malas.

Lá estava um caixão de madeira, envernizado, cor preta. Também possuía alguns símbolos estranhos nele, sem contar a grande cruz vermelha.

— Também não gosto de carregar os mortos! Mas é o trabalho, fazer o que. — Sorri.

— Nunca vi um carro desses por essas bandas. São uma funerária fora da cidade?

— Isso mesmo. Os familiares não são daqui, querem enterrar ele no lugar de origem!

— Entendo… Não há nenhum lugar melhor que o lar.

— Isso pode ter certeza. Mesmo assim, esse é um bom lugar para morrer também.

— Bem, aqui em Centralia é bem calmo. Vocês vão gostar, tem muitos lugares para se visitar até! Hehehe… Sem contar que os trabalhos na mina surgem a todo o momento.

— Entendo. Realmente parece um lugar bem calmo para se viver! Pessoas bem amigáveis, mas… não é para mim.

— Por que diz isso? 

— Gosto da aventura. Não me daria bem em um lugar como esse. Meu caminho é na estrada, até onde ela me levar, até onde eu conseguir ir com minhas próprias pernas. E até onde esse carango aguentar me carregar!  

— Espero que um dia chegue a algum lugar bom. Todos merecem descansar um dia. Todos!

— Bem… Tem alguns que não merecem o descanso… — Sussurrou Charles consigo.

— Ei, e qual o nome da funerária? 

— Oi?

— O nome da funerária de que trabalha.

— Há sim, bem. Somos a… Funerária “Última despedida”! Nos encarregamos que nossos clientes tenham o descanso eterno, seja ele querendo… ou não.

— Hahahaha, você é engraçado.

O senhor saiu dali ao mesmo tempo em que Charles terminou de encher o tanque. Olhando novamente para as crianças que corriam na rua Charles parava um pouco para pensar. Por vez Clint percebeu, se aproximando dele o surpreendeu com um tapinha nas costas.

— Já fazem quantos anos em Charles?

— Dez anos…

— Ela teria quantos anos, mesmo?

— Doze… Ela teria doze anos. Mas… daqui três dias… Daqui três dias é o aniversário de 13 anos dela.

— Lamento meu amigo. 

— Tudo bem. Não foi sua culpa, acidentes acontecem… Infelizmente acontecem.

— Olha, não é querendo ser chato nem nada, mas… Você tem que superar um dia, sabe? E… Conversar sobre, meio que você não conta nada da sua vida para a gente. Pensa nisso…

Clint bateu em suas costas e saiu. Charles por vez se perdia em pensamentos felizes com uma criança, os dois correndo em casa, os dois fazendo um bolo, os dois brincando, ela o chamando de “Vovô”. Lembranças felizes que se desmanchavam com fogo, chamas eternas em sua mente.

Ele encarava o chão, embora seus pensamentos estivessem longe demais, até mesmo sua visão se misturava com suas memórias.

— Ei velhote, vamos nessa? — disse Verônica entrando no carro.

Charles por vez voltou a si, respirando fundo entrou no carro. Em seguida os demais também o fizeram, era ora de voltar à estrada.

***

Minutos se passaram, entraram em algumas ruas, mas nunca chegando ao destino. Os gêmeos sorriam no banco de trás enquanto riscavam com um pincel o rosto do que ainda dormia. Já Clint, limpava sua arma com muito cuidado, Charles olhando pelo retrovisor sorriu.

— Você cuida dela como uma filha. Não, está mais para uma amante!

— Hump. Diferente das pessoas… ela cuida mesmo de mim. Só estou retribuindo o favor, apenas isso.

— Nossa, isso foi tão romântico. — disse Verônica se virando para ele. — Até me fez chorar… não pelos olhos, claro.

Disse ela piscando para ele, Clint por vez virou o rosto um pouco desconfortável. Verônica se virou para frente novamente, o deixando continuar a limpar sua arma em paz.

— Relaxa, Clint. — disse Charles. — Vai ser mais um trabalho normal… Entramos, investigamos e se tiver algo a mais… Nos livramos do problema.

— Assim espero, Charles. Assim espero…

***

De minutos se tornaram horas, mas nada de chegar ao destino. Foi quando por coincidência encontraram a casa, logo atrás do cemitério da cidade. Casa de madeira antiga, parecia bem aconchegante também, da chaminé saia fumaça. Também avistaram dois carros estacionados por ali perto, um “Ford Mercury 1950 Coup” vermelho, e um “Cadillac Seville 1959” magenta.

— Rapaz, o amigo aí tem estilo! — disse Clint apontando para o Cadillac.

— Droga. Diz que é mentira… O que esse bosta tá fazendo aqui? — Sussurrou Charles consigo.

Ele então estacionou o carro debaixo de uma árvore, todos saíram em seguida. Alguns se alongavam, os dois irmãos por vez foram dar uma olhada nos arredores. Os demais foram em direção a casa, enquanto um homem permaneceu dormindo no banco de trás.

Ao se aproximarem da casa, notaram três pessoas as quais filmavam por ali. Uma mulher e dois homens, um deles com roupa indigna.

— Quem são essas figuras? Conhece eles, Charles? — Perguntou Clint.

Charles parecia um pouco aéreo, foi quando avistou algo:

— Merda.

Disse ao avistar um homem o qual conversava com os moradores da casa na porta. Ele por vez também os notou e se despediu das pessoas pegando um papel. Não demorou a vir até onde eles.

— Charles, meu bom. Há quanto tempo! Como tem passado? — disse ele se preparando para um abraço.

Charles por vez o respondeu com um soco no estômago, que o fez se ajoelhar enquanto tentava recuperar o fôlego.

— Boa… Eu… eu mereci. — disse babando.

— O que está fazendo aqui, Jack? 

O homem se levantou. Tinha roupas que seguiam o mesmo tom de cores: Camisa de tecido fino amarelada, casaco marrom com botões dourados, calça boca de sino marrom claro e sapatos marrons. Também tinha vários colares de diferentes religiões em seu pescoço e anéis diferentes em cada dedo de suas mãos. Sua pele era morena, seu cabelo escuro cobria os olhos com belos cachos.

Sorriu ele ajeitando o casaco e se recompondo:

— Bem… e o que mais seria, Charles? — disse o encarando. — Negócios, velho amigo. Apenas negócios…

As pessoas as quais filmavam nas mediações começaram a rir, enquanto gravavam dois cachorros em um momento de intimidade.

— Quem são esses idiotas? Na última vez que te vi você ainda sabia escolher suas companhias. — disse Charles.

— Não importa quem são. — Ficou mais serio. — Que porra estão fazendo aqui? Você não tinha se aposentado, velhote?

— Não mesmo. E como você mesmo disse: “Negócios, apenas negócios meu velho amigo.” — disse com tom de sarcasmo.

— Olha, escuta aqui Charles. Eu não quero atrapalhar suas coisas, também espero que não me atrapalhe!

— Então voltou a ser caçador? Hump, quem diria. O filho pródigo retorna a sua casa, mas depois de perder o que? Em?

— Você ainda está chateado? Não leva pro coração… Desde o início você sabia quem eu era. O erro foi seu de confiar! — Sorri.

— Então o erro foi meu? Hmmm… — Agarrou ele pela gola da camisa. — Agora sem brincadeira. Ta me fazendo perder tempo… Só vou perguntar mais uma vez. O que você está fazendo aqui? 

Verônica e Clint os encaravam sem entender o que estava acontecendo. Charles parecia bem chateado, Jack por vez tirou o sorrisinho do rosto, ficando mais sério. Agarrando as mãos dele e apertando, o que fez Charles soltar. 

Novamente ajeitou o casaco e disse se recompondo:

— Não quero problemas, Charles. Sei bem que o que fiz não tem perdão, mas, porra. Você tem que me entender, você me conhece sabe que eu sou um merda!

— Eu achei que você tinha mudado. Estendi a mão pra você, enquanto os outros te apontavam o dedo eu te ajudei. Mas no fim… Você me decepcionou.

— Entra na fila então meu amigo. Cachorros sempre mordem o dono… Eu não sou diferente de um Charles. Só um cachorro vira-lata latindo pro dono!

O clima estava tenso, por sorte as pessoas estranhas se aproximaram. Um homem bem vestido de forma elegante segurando uma filmadora. Uma mulher que estava com ótimas roupas e, um chapéu de sol cheio de detalhes. 

Os dois ao se aproximarem, encaravam os demais. Olhavam de cima a baixo com uma expressão superior, por vez Jack os apresentou:

— Gostaria de apresentar os meus amigos… Sr.Reis e Stra.Reis!

— Olá, prazer em conhecê-los. — disse Clint estendendo a mão para cumprimentá-lo.

— Quem disse que somos amigos Vincent? Eu apenas te contratei, não confunda as coisas. E quem são esses? — disse o homem ignorando Clint.

— Alguns conhecidos.

— Certo, já vou indo. Tenho que construir o cenário o quanto antes! Você ainda vai demorar?

— Não senhor. Só vou terminar o que pediu, então vou ao encontro de vocês!

O homem então saiu com a mulher, o indígena também o seguiu. Entraram no carro vermelho e partiram deixando Jack com os demais. Charles novamente irritado, falou levantando a voz:

— Porra Jack. Um nome falso?! O que está aprontando agora?

— Nada, eu juro. Eu mudei tá! Pode não acreditar, mas eu estou tentando me manter na linha, sabe? E eu não estou enganando eles. É que o filho da mãe não gostou do nome Jack… Disse que é um nome sem finesse. Finesse, é? Vou mostrar a porra da finesse pra esse almofadinha… — disse resmungando. — Enfim, juro que não estou fazendo nada errado.

— Quem jura mente. Você não vai me enganar! Não de novo.

— Relaxa, Charles. — disse Verônica o segurando no ombro.

Ela tentava acalmá-lo. Clint por vez encarava Jack, que sorriu e disse se aproximando dele:

— E quem seriam vocês?

— Prazer, me chamo Clint. — disse estendendo a mão.

— Sou o Jack. — O cumprimenta.

— E eu, Verônica.

Ele se aproximou dela, segurou sua mão e a beijou como um verdadeiro cavalheiro. Deu um leve sorrisinho, o que foi suficiente para Verônica ficar vermelha. Então disse batendo no ombro de Charles:

— Haha. Vejo que as coisas vão ser divertidas a partir de agora, velho amigo. — disse abrindo um sorriso.



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