Vol. 1 – Arco 1

Capítulo 3: A Cidade do Interior

Woodnation 9:24 da noite, doze de julho.

Desnorteado com o show de luzes, Leonard Mystery desabou sobre o chão arenoso.

Olhando para os arredores, compreendeu estar no meio de um cenário desértico, cheio de calor e areia. 

Isso, claro, se não fosse pela pequena cidade ao lado, anunciada por uma placa com a frase “Bem-vindo à Woodnation” estampada nela.

— Mas que merda foi essa que cê fez…?

Só não mais desnorteado que ele, Einstein estendeu a mão para ajudá-lo a se levantar. Respondeu: 

— Teleportei a gente, oras. Essa magia é do balacobaco, né?

— Uau… incrível. Como cê faz tudo isso?

— Ah, meu confrade, quer que eu conte tudo para o senhor?

Encarou os olhos estáticos do homem-hamster, agarrando a sua máscara:

— Sim, quero que me conte tudo. Tudinho, porque já tô muito confuso!

— Ok, ok. Irei contar tudo para ti. É melhor se sentar, a história será longa.

Assim que se sentou no chão, o pançudo vestido de hamster iniciou a sua narrativa: 

— O meu nome é Einstein Heisenberg Holmes e sou um hamster. Faz alguns dias que acordei nessa cidadezinha, sem saber o motivo. Não me recordo de praticamente nada da minha vida, só das informações que acabei de dar e o fato de que possuo dois irmãos: meus amados Darwin Galileu e Elin Rose! Não tenho ideia de onde Elin esteja, mas tenho certeza de que o Darwin foi levado… Deus me livre, mas talvez até morto, por alguém chamado Amadeus! Por algum motivo, Leonard, o seu rosto e o endereço do seu apartamento também estavam na minha cabeça. Eu ouvia vozes dizendo para te encontrar… Como não sabia o seu nome, cheguei à conclusão de que o senhor era esse homem chamado Amadeus. Aí me teletransportei até New Krox para te descer o sarrafo e descobrir onde meu irmão está. Isso é tudo.

— Na real, não é uma história muito grande, mas é bem interessante — comentou o detetive. — Como é que tu consegue soltar aquelas “magias”? Nasceu com esse dom ou foi algo que aprendeu?

— Não tenho ideia, detetive. É instintivo. Só sei que sei.

— De qualquer forma, é incrível saber que o sobrenatural é real. Será que cê é o único ou existem outras pessoas com dons sobrenaturais pelo mundo?

— Ué, você não sabia?

— Por que eu saberia?

— Oras, juro que te vi quebrando os gessos que te prendiam somente com a força dos músculos. 

— E daí?

— E daí? E daí que logo depois disso, meu compadre, você saiu correndo tão rápido quanto uma mãe que deixou o filho na escola e que agora precisa chegar em casa o mais rápido possível por ter deixado o forno ligado com um frango dentro!

— Isso nem é tão rápido.

— Ok, então você correu tão rápido quanto uma mãe nessa mesma situação, mas as posições do frango e do filho estão invertidas!

— Fui tão rápido assim?!

— Hmmm… Não, o seu filho morreu e você adotou o frango. Hoje em dia, ele está fazendo faculdade de direito.

— Nossa, que final lindo… — Uma lágrima caiu do seu rosto. — Calma aê, do que estávamos falando mesmo?

— Acho que o senhor tem poderes.

— Aí já tá viajando. Só tá pensando isso por ter perdido as memórias e não saber muito bem como a sociedade funciona.

— Se está dizendo…

— Mas mudando de assunto, então cê é meio que um feiticeiro, né?

— Bem, eu faço magias, isso faz sentido... Cacetadas, tive sorte de ter encontrado um detetive tão esperto para me ajudar!

— É claro. Eu diria que sou muito bom no que faço, sabe? No meu último caso, derrotei uma gigantesca organização secreta de bêbados que planejavam destruir o governo americano.

— Nossa… Então eu tive MUITA sorte de te encontrar!

— Sua sorte é realmente muito grande. Inclusive, quanto que vou ganhar depois de encontrar os seus irmãos?

— Vixe. Sabe, é que não tenho dinheiro…

Leonard soltou um sorriso mesquinho.

— Na moral, quase me matou e nem vai me pagar? — disse ele. — Tudo bem, vou ganhar dinheiro com o processo que darei em você depois disso.

— Mas era só porque eu pensava que você era o tal do Amadeus! E ainda desconfio um pouco de você, então é melhor tratar de me ajudar se não quiser levar um tiro de magia na fuça!

“Ele fica agressivo do nada, parece até uma criança. Tenho que começar a tomar cuidado…”, pensou o detetive, falando: 

— Tanto faz, sorte a sua que eu não perderia de jeito nenhum a oportunidade de desvendar um mistério desses. Estou procurando um caso como esse aqui faz muito tempo.

— Uhul!

A dupla enfim entrou na cidade no meio do deserto e passou a passear por ela. 

Como uma digna cidade do interior, Woodnation era formada por uma praça principal e algumas ruas com moradias simples. Além de bares, lojas e etc. Tinha um único hospital e uma só delegacia, mas ambos conseguiam aguentar o número de pacientes e crimes que a cidade costumava ter, já que era presumível que havia poucas pessoas lá. 

A cidade não é muito maior do que um distrito de cidades grandes como New Krox e Ravender City, então os dois não demoraram muito para atravessar todos os cantos dela.

Após o turismo, a dupla se sentou em um banco de madeira instalado no meio de uma calçada. Eles passaram a observar a paisagem árida da cidade. 

— E agora? — Einstein perguntou.

— Bem… onde cê tava quando acordou sem memórias?

— Deitado no meio da pracinha.

— Deveria ter dito isso antes, pô, quando passamos por lá. Mas… ninguém viu um homem fantasiado de bichinho dormindo no meio da praça? 

— Acordei de madrugada, talvez tenha desmaiado ali depois de ficar tarde, aí ninguém viu.

— Vou ver isso depois com a galera dessa cidade. — Se levantou em um salto. — Vamos voltar para a praça. Tenho certeza de que vou descobrir alguma coisa. 

Em poucos minutos, retornaram para lá.

Leonard varreu os arredores com seus olhos, investigando o gramado e procurando por objetos suspeitos.

Nada.

— Já descobriu? — indagou o feiticeiro. — Nossa, aqui tá ventando demais!

— Caaaalma — falou, encontrando uma civil. Se aproximou dela em um instante. — Opa. Poderia me dizer se viu o meu amigo, aquele carinha fantasiado de hamster, dormindo aqui há alguns dias atrás?

Foi surpreendido com um tapa da mulher, que saiu correndo.

— Moça…? 

Tentou entender alguma coisa, mas não conseguiu chegar em nenhuma conclusão. 

Era tão feio assim? Ou irresistível ao ponto de incitar a loucura das novinhas? Seria uma mistura de ambos? 

— Que tabefe! — exclamou o hamster, gargalhando que nem uma criança do quinto ano que acabou de encontrar o desenho de um homem nu no livro de biologia.

Leonard esperou pela chegada de outros civis. Quando chegou a hora, fez a mesma pergunta para outros três, um por vez. 

Em todas as tentativas, eles saíram correndo. 

“Que merda tá acontecendo? Será que tô fedendo?”, pensou.

Quando chegou a quarta tentativa, as coisas pioraram: o senhor que foi parado por Leonard resolveu não sair correndo. 

Muito pelo contrário, o atingiu com um soco!

— Cara, que agressividade é essa? — resmungou o detetive.

— Vai se ferrar, seu tarado de merda! — gritou o homem.

— O quê? Como assim?

— Você acha que isso é engraçado? — Os olhos irritados do velho desceram até as pernas do detetive.

Os olhos de Leonard seguiram os do homem. Ainda assim, não compreendeu tanta euforia.

— Tudo isso só porque estou vestido só com um avental? — indagou o detetive. — Pelo amor de Deus, quanta frescura! 

O velho ficou apenas mais furioso. 

Será que também estavam implicando por que o avental estava sendo levantado pela ventania, deixando as bolas de aço dele amostra para todos?

"Frescuuura", pensou.

— Foi mal, não foi na malícia. Esqueci de pegar as minhas roupas no hospital. Acredita que me esqueci desse detalhe? Bem que achei estranho esse ventinho mais profundo do que o normal… 

Ele foi atingido com outro soco. Talvez merecidamente. 

— Ô, não vale bater enquanto falo!

— Mata! Mata! Mata! — gritou Einstein.

— Ei, fala pra ele que não sou um tarado!

Prestes a obedecê-lo, o homem-hamster se desesperou e soltou um falsete: 

— Cuidado com as nozes! 

— Ahn? — O detetive se virou para, não entendendo a mensagem a tempo. 

Quando foi perceber, a perna daquele senhor já estava entre as suas. 

O velho não poupou violência na hora de chutar as suas nozes.

— Santa senhora dos hamsters! — berrou Einstein. — O senhor está bem?

Leonard sequer respondeu. Estava paralisado, com o rosto tão expressivo quanto o de um cadáver.

Isso até cair no chão, como um verdadeiro morto.

— Meu Deus… — Virou-se para o responsável pelo chute. — Senhor, você… castrou ele!

— Esse é o remédio para tarados, tá achando o quê? — falou o velho carrancudo, com um rosto de desgosto. Muito desgosto. Desgosto e dor.

— Tudo bem?

— Caramba… — O velho aproximou a mão de seu pé. — Por que dói tanto?

Ele sentou-se no chão, agonizando de dor.

— Quer ajuda?

Einstein até tentou se aproximar para ajudá-lo, mas ele o afastou. Não parava de agonizar, bater no chão e cerrar os dentes. No ápice da dor, começou a bater sua cabeça inúmeras vezes no chão.

— Oh, meu Deus. Ele está virando um papa-léguas…

Já chorando e não conseguindo aguentar, o velho berrou aos quatro ventos:

— QUE PICA DURA DA PORRA!!!

Sem forças, caiu sobre a calçada, sem mais consciência.

— Ué — Sem entender como a situação chegou naquilo, Einstein logo entrou em desespero. — Meu Deus, que tragédia. Os dois morreram!

Com um controle emocional digno de nota, começou a chorar como uma cachoeira. 

Por mais que o seu traje totalmente fechado não permitisse que alguém visse isso, não era difícil de notar, uma vez que berrava como um bebê com diarréia explosiva:

— Uurhr, ajqmaawewewre… URURURURURU!!!

— Que barulhão todo é esse…? — resmungou Leonard, abrindo os olhos.

— Detetive? Que bom te ver, pensava que tinha falecido!

— Ahn?

O detetive foi logo esmagado pelos braços grossos do hamster, que começou a balançá-lo como um boneco de pano. 

— Você não terá filhos… a sua árvore genealógica acabou aqui. É uma pena.

— Do que cê tá falando? Me solta! — Soltou-se em um impulso, se levantando.

— Não se preocupe, meu chapa. Talvez, seja até melhor desse jeito. O senhor parece ser meio sem noção, sabe? Lelé da cuca. Tenho dúvidas ao pensar se seria um bom pai.

— Dá pra calar a boca, mano? Ata que vou ter filhos. Nem ferrando.

— Claro que não vai. Foi castrado.

— Ah, castrado?

— É. Uma pena. 

Quando uma pessoa é castrada contra a própria vontade, o que se espera dela é chorar. Ou então, ficar furioso. Se sentir impotente. 

No caso do detetive Mystery, ele começou a dançar breakdance.

— Você tá bem…?

Ele continuou dançando. O seu corpo girava no chão como um beyblade.

— Leona…?

Saltou no meio do giro e fez uma pirueta aérea.

— Cara?

Começou a imitar a morte daquele cara do Titanic.

— “Não faça isso, Jack. Tem espaço para mais um…”

No caso, estava imitando a esposa.

— “Não, Jack… não vá…” — Começou a fingir choro.

Vendo a cena, cabisbaixo, Einstein chegou a única solução lógica: o chute nas bolas fez o detetive sofrer de um surto psicótico. 

Sabia bem como os testículos são importantes para a sanidade dos homens — há muitas décadas, um senhor bem famoso perdeu um dos testículos e isso foi o suficiente para que ele se tornasse um ditador. Para que Leonard não sofresse um destino semelhante, Einstein precisava entrar em ação. Precisava lobotomizá-lo.

— Não se preocupe, você vai voltar ao normal quando eu usar minha magia para um tratamento de choque!

Ao ouvir isso, o ditador em potencial saltou para trás em um piscar de olhos, gritando:

— Calma, é pegadinha!

— Não se preocupe, acho que é até melhor. Você ficará mais normal do que um dia já foi… o que não é bem algo difícil.

— Olha quem fala!

— Como ousa, seu mequetrefe?

— Ei, ei, vamos brigar. Não precisa me lobotomizar, eu só estava mostrando que o chute não me machucou nem um pouco. Estou ótimo, pô!

— Ah, então não foi castrado?

— Era tudo uma pegadinha. O chute dele não me machucou. Muito pelo contrário, foi ele quem ficou todo lascado. Qualquer um que chuta as minhas bolas de aço são destinadas a um destino cruel. Uma dor no pé maior do que aquelas que cê sente quando bate o dedo mindinho na quina.

— Cacetadas! Isso é sério?

— É — afirmou, orgulhoso. — E antes que venha falar algo, isso não é nenhum tipo de superpoder: foi puro treinamento.

— Carambolas… como fez isso?

— Bem, isso é uma técnica difícil de dominar. Sempre curti esses negócios de malhar, sabe? Por isso que, desde os meus dezenove anos, decidi que iria malhar todos os cantos do meu corpo.

— Todas elas?

— Sem exceção.

— Macacos me mordam, isso é incrível! Mas como malhou essas partes? Sabe, as que aquele velho chutou.

— O segredo é amarrar um peso de academia nelas, parça. Se o peso cair, elas caem junto.

— Santo Cristo, isso é muitíssimo perigoso!

— Exatamente por isso que me esforcei ao máximo que podia para isso, porque a minha dignidade estava em risco. Não vou mentir, doeu bastante nas primeiras vezes. Mas é por isso que, hoje em dia, sou o único homem totalmente imune a chutes no saco.

— O senhor é…“incastrável”! Que sensacional! Você é demais, detetive!

— Isso aê, haha!

— Ah, que piada… — resmungou o velho, atordoado.

“Ele acordou?”, pensou Leonard, virando-se para o homem e percebendo que o seu pensamento infelizmente se concretizou. O velho levantou, furioso. 

— Maldito… — falou o senhor, afundando a mão no bolso. — As pessoas já estão falando de você. Não pense que não vim preparado, vagabundo!

— Ei, só me deixa vazar daqui. Não foi a minha intenção dar uma de tarad– — Saltou para trás quando o senhor tirou um revólver do bolso e disparou contra o gramado. — Eita preula!

— Corre, vagabundo! Corre!

— Vou correr mesmo!

Sem mais, Leonard agarrou Einstein por um de seus braços para puxá-lo e correu como um louco. 

Seus glúteos ao vento.

 

 

Em uma cidade pequena do interior onde todos possuem armas e as notícias de um tarado se espalham tão rápido quanto uma gripe, a melhor opção que a dupla dinâmica encontrou foi se esconder dentro de um beco encardido. O lugar estava repleto dos mais variados lixos e o fedor era o bastante para que mais ninguém ousasse entrar ali.

— Quais serão os nossos próximos passos, detetive?

— Procurar um lugar para dormir, pra amanhã começarmos a procurar o tal do Amadeus. Acho que ele tá nessa cidade, espero que esteja. O grande problema é que não trouxe dinheiro.

— Nem roupa. Está vestido com esse avental até agora.

— É, antes me sentia confortável, mas o frio no meio das pernas já começou a ficar sinistro… — reclamou. Suas pernas peludas tremiam. — Não pode nos teletransportar de volta para New Krox para eu pegar dinheiro e roupa?

— Não vai dar. Esse feitiço gasta muita energia, só posso usar uma vez a cada 48 horas.

— Tá me zoando, né?

— …

— Mereço isso… — murmurou. — Então bora encontrar algum lugar para dormir. Tenho uma ideia.

Quando o céu caloroso da cidade se tornou totalmente frio ao passo que a escuridão aumentava, a dupla saiu da sarjeta e Leonard guiou o seu cliente até um dos lugares pelos quais passaram durante a caminhada pela cidade: o estacionamento de trailers.

Trailers pareciam ser bastante apreciados naquela cidade, talvez por conta dos turistas que costumam ir até cidades do interior como aquela em trailers. 

Por isso, havia ao lado de um bar um considerável campo onde vários trailers se encontravam estacionados. 

Só que, junto deles, apenas um pequeno problema: os veículo se encontravam estacionados ali desde a década passada. Aquela área se tornou uma espécie de lixão.

— Saímos de um lugar horroroso para outro? — indagou Einstein.

— Pois é. Fazer o quê? — comentou o investigador, não muito horrorizado pela ideia. Evitou os inúmeros sacos de lixo rasgados e restos de comida despejados pela área até alcançar o trailer com a aparência menos horrível dentre todos os outros, abrindo a sua porta. — Tá ótimo. Espera, vira pro lado.

Saindo do caminho da porta, esperou uma família de ratazanas saírem de dentro da prisão de ferrugem. 

Após isso, com um sorriso otimista, entrou em seu novo lar.

Do lado da entrada, uma mesa e uma geladeira quebrada. Do outro, uma pia coberta com uma montanha imensurável de louça e um fogão igualmente quebrado. Em uma das pontas, a área do motorista. Na outra, uma conveniente beliche.

— Cacetadas… que horror — Einstein resmungou. — É tanto pó que quem dormir aqui acaba morrendo por intoxicação.

— Melhor do que morrer de frio lá fora. Vamo dormir logo. Aproveitar que tem uma beliche. — Deitou-se na cama de baixo.

— Eba, vou ficar em cima! — Einstein saltou até o topo da beliche. — Deixa para lá, gostei desse lugar. Essa cama é muito boa!

 

No dia seguinte…

 

— E então, vamos começar a investigação? 

Com um sorriso estampado no rosto, o detetive deu um tapinha nas costas de seu cliente e o levou para fora do estacionamento abandonado.

— Tá atrasado, porque já comecei — respondeu Leonard.

— Cacetada, que veloz… O que descobriu? Já encontrou os 

meus irmãos? Cadê eles?!

— Tá louco? Ainda tamo longe disso. Mas tem um lugar para onde quero te levar.

Os dois saíram do estacionamento e caminharam pela cidade, revisitando as ruas do bar, hospital, delegacia e passando ao lado de vários quintais. 

O destino demorou bons minutos e um pouco de fôlego. Ele se localizava em uma colina, nos limites da cidadezinha. Aquela área da cidade era cheia de mansões, onde os mais ricos da cidade ficavam — não que existissem muitos. 

A dupla parou na frente de uma das maiores mansões da colina. A estrutura da casa era feita de uma madeira rústica cor de vinho, carregando consigo um certo estilo da década de 50. Ela era protegida por um enorme muro de pedra, com um portão de ferro no meio.

— O homem que mora nessa casa se chama Amadeus Stevens. — Leonard começou. — Ele é um velho rico que quase nunca é visto fora de casa. O impressionante é que, se pá, eu nem descobriria esse nome sem uma pesquisa maior caso ele não tivesse se envolvido em um escândalo.

— Que escândalo? 

— Era mais uma noite normal quando o filho de uns dos vizinhos jogava bola com uns amigos, até acabar tacando a bola para longe com um chute. A bola caiu dentro do quintal do Amadeus e o moleque pulou o muro silenciosamente para pegá-la. Então, Amadeus viu o moleque e quase estourou a fuça dele com um tiro de escopeta. Isso aconteceu há alguns anos.

— Macacos me mordam…

— Foi assim que o encontrei. Sabe como é, né? Sempre tem umas velhinhas fofoqueiras pelas bandas de qualquer cidade, seja grande ou do interior. Só precisei ficar andando por aí até o meu ouvido fisgar alguma fofoca das boas. Foi bem legal. Só não continuei fazendo isso porque fui confundido com um tarado de novo e uma moça quase atirou em mim.

— Eita.

— Pois é. Esse cara virou notícia por causa de uma arma, mas parece que quase todo mundo aqui anda armado. Essa cidade é porreta!

— Bom, muito obrigado, detetive! — exclamou Einstein, cerrando seus punhos e se aproximando do portão. — Irei explodir essa joça e resgatar o meu irmão!

— Opa, opa, opa, opa, opa, opa, vai parando! Eita, eita, eita, eita, eita! Opa, opa, opa, opa, OPA! — Agarrou o emocionado pelo braço.

— Me solta!

— Tá louco? Isso vai chamar muita atenção e talvez o seu irmão nem esteja lá dentro. Nem mesmo temos certeza de que esse é o Amadeus que estamos procurando, parça. Vamos esperar anoitecer, aí vou fazer uma missão de reconhecimento. Se eu encontrar algo suspeito, tu vai poder até mesmo soltar uma ogiva nuclear dentro dessa mansão que não vou ligar.

— Ok… Mas também quero participar da missão de reconhecimento.

— Só se trocar de roupa. Senão, vão te identificar rapidinho se te verem.

— Nunca!

— Ahn? O quê? Por quê?

Einstein cerrou os punhos, ofendido com aquela fala.

— Está pedindo para um hamster tirar os seus pelos? Isso seria bizarro e assustador!

“Ah… só pode estar zoando com a minha cara!”

— Tá falando sério…?

— Sim!

— Tem certeza? É brincadeira não?

— Estou falando sério, detetive!

“Merda.”

— Ok, então cê não vai. Problema seu. 

— Hm… Então tá bom. Só tome cuidado, esse cara parece ser meio louco. 

“Não me diga.”

  — Fique do lado de fora, ok? Enquanto entro na mansão, cê ficará observando de longe. Só vai avançar caso eu não volte em uma hora.

— Certo!

— Então tá fechado. — Fez um toque de mão com Einstein, bem atrapalhado, já que o hamster não tinha coordenação motora alguma. — Agora é só esperar a noite chegar…

— Ok, vamos fazer o que enquanto isso?

— Bem, enquanto não anoitece, por que não me mostra mais de suas “magias”? 

— Ok. 

— Primeiro, é melhor irmos para um lugar mais fechado.

  

De volta para o estacionamento…

 

— Mirabolante, não? — Einstein comentou, animadasso.

O homem-hamster tinha uma habilidade excepcional em fazer malabarismo com suas bolas de energia. 

— Sim, é mesmo! Mas isso é magia ou só malabarismo?

— É magia COM malabarismo!

— Descolado demais!

Einstein continuou a fazer o malabarismo animadamente.

— Mas tu tem outras magias, né não? Ou tudo se resume a bolinha de energia que explode, magia de cura e de teleporte?

— Hm…

— Não tô criticando, saca? Essas três habilidades são ótimas…

— Te explicarei melhor. Assim, todos os meus poderes são criados por uma energia chamada mana. Ela é tipo o combustível das magias.

— Legal. Conta mais.

— Posso fazer a mana adquirir a forma de energia pura quando quero  apenas explodir as coisas, posso usá-la para acelerar temporariamente a capacidade de regeneração quando quero curar alguém, seja eu ou outra pessoa. Também posso utilizá-la para fazer aquela magia de teleporte, mas isso gasta muita mana e por isso que sou incapaz de usar esse feitiço por uma segunda vez antes de esperar um período de 48 horas. Além disso, consigo converter a minha mana em um desses cinco elementos: fogo, água, raio, ar e terra — explicou, sem perder a concentração no malabarismo. 

— Sério? Mostra aê então. 

— Claro, meu confrade!

Cada uma das esferas que o feiticeiro manuseava começaram a relampejar em luzes coloridas. 

Leonard inicialmente pensou que elas estavam prestes a morfar como Power Rangers, mas logo compreendeu; cada um dos orbes logo tomou a forma de um dos cinco elementos, sem perder a forma e nem a aura brilhante. 

Além do mais, as mãos de Einstein não pareciam se ferir pelo calor da bola de chamas e nem pela eletricidade da esfera de raios. Nem mesmo o seu traje parecia ser afetado por isso, mas o detetive já notara aquele detalhe com as bolas de mana explosiva.

— Isso é sensacional! — exclamou.

— Do balacobaco, né? Eu chamo o meu conjunto de habilidades mágicas de… Magic!

— Isso é o esperado, né? Do que mais cê chamaria?

— Gabriel Cogumelo da Silva Terrestre.

— Ok, tanto faz. Mas Magic é muito vago. Você faz magia, disso nós dois sabemos. Mas a sua magia não pode ser qualquer magia. E se existirem outras magias por aí, chamará todas elas de Magic

— É.

— Não, não, não! Elas precisam ter nomes diferentes. E a sua magia é uma magia mais… estilosa. 

— Por quê?

— Mais estranha, sabe? 

— Ah, sei.

— Mentira, ela é bem normalzinha. Mas tu é estranho pra cacete.

— Ei!

Leonard levantou-se rapidamente, tomado pela criatividade:

— É isso… o seu poder deveria ser chamado de Strange Magic!

Einstein Heisenberg Holmes não respondeu, ocupado em continuar o malabarismo com as bolas e levemente magoado por ter sido chamado de estranho.

— Ei, vai me ignorar?

— Desculpa, é que o senhor apenas adicionou um “Strange” no nome que inventei. Não muda muita coisa.

— É assim? Tranquilo, não te ajudarei mais com os nomes... mal-agradecido.



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