Aelum Brasileira

Autor(a): P. C. Marin


Volume 2

Capítulo 46: Karine de Vitari

GRIS

 

Acho que é a mulher mais bonita que já vi na minha vida. Bom, não é como seu eu vivesse há muito tempo também.

Deixo de lado por um instante o amuleto de promítia. Com o dom da visão, vislumbro a aura da donzela de vermelho.

Ah! Você sabe que eu não me sinto bem ao ser chamado de lupino, Madame Vitari — contesta o mascarado.

— Você nunca pareceu se incomodar. — Ela inclina sua cabeça para o lado e sorri.

— Bem, se for só de vez em quando, eu acho que não há tanto problema assim. —  O Sr. Coiotes olha para nós, limpa o pigarro da garganta e depois continua. — Certo, Srta. Karine, temos noventa e três moedas de ouro de orçamento. Gostaríamos de negociar algumas informações com isso.

É diferente de todas as auras que eu já presenciei, é prateada. Parece haver uma ligação com o alinhamento de vida, porém a dos demais magos de vida que eu já notei eram somente brancas.

Karine olha em minha direção, traga de seu cigarro de novo, e pergunta: — Qual a cor?

— O quê?

— Qual é a cor da minha aura?

Eu olho para os demais, e todos aguardam uma resposta. Kali, em particular, parece desaprovar o fato de eu ter analisado a aura de Karine, sem sua permissão.

Porém, o mais preocupante é que Alienor está quieta, e ela nunca fica quieta. A ruiva está com as pernas cruzadas, e com seu corpo inclinado em direção a Karine. Seu rosto está apoiado sobre seu punho, e ela presta atenção a todos os movimentos da donzela de vermelho. Acho que só a vi tão relaxada, enquanto dormia.

— Prateada — respondo. — É difícil de descrever, mas eu diria que é muito parecida com a prata. Quase da cor de seus olhos.

Ela sorri, bate seu cigarro no cinzeiro para remover as cinzas, então me diz:

— Obrigada pela informação, era uma curiosidade que levava comigo há muito tempo. Em troca, o que deseja saber?

— Como assim, em troca? — Olho para os demais em busca da resposta.

— Esta é a Vivenda de Alvitres, Gris — diz o Coiote. — Aqui, dentre outras atividades, é um comércio de informações. É possível comprá-las com dinheiro, ou pagar por elas com outras informações, desde que estas sejam realmente valiosas.

— Quanto ao conhecimento que você me passou, eu o avalio em quinhentas moedas de ouro imperiais, Gris — afirma a Madame Vitari. Ela volta a tragar de seu cigarro, como se a quantia não representasse nada.

Quinhentas peças de ouro seriam suficientes para comprar uma casa grande em um bairro intermediário da capital imperial. É também o dobro do valor de uma pedra mágica de Fubuldjin, daquela que usamos na cabana. É muito dinheiro.

— Quinhentas moedas de ouro por algo que esse moleque viu sem mais nem menos? Por que ele ficou rico assim do nada? — interroga Kali, a apontar para mim, ao passo que se levanta e cerra seus punhos.

Qual o problema dela comigo?

Karine termina de tragar de seu cigarro e, com uma paciência felina, responde: — É uma informação que passei os últimos mil e duzentos anos procurando. Além disso, acabo de confirmar que o Gris tem a capacidade de analisar auras. Portanto valem quinhentas peças de ouros imperiais.

Mil e duzentos anos, quantos anos ela tem?

A dama de vermelho solta a fumaça de seu cigarro por sua boca e olha nos olhos de Kali. Então ela diz: — Você me deve vinte peças de ouros imperiais por essa informação, Srta. Calíope.

— Ahm?!

— Eu disse para não fazer perguntas neste local. Solicitar informação aqui custa dinheiro — comenta o Karakhan.

Por que não foi mais específico antes!?

— Não há problema se você não possui dinheiro para pagar, Srta. Calíope. Uma garota bela igual a você conseguiria quitar esse montante como uma tulipa amarela por dois meses, mesmo sem coletar qualquer informação dos clientes. — Ela volta a tragar de seu cigarro.

Kali não parece entender o que a Srta. Vitali disse. Eu tampouco entendi, para dizer a verdade.

O Karakhan faz um sinal para a Kali se aproximar, então a lumen se curva para ouvir melhor. O mascarado cochicha algo em seu ouvido, mas não posso ouvir. Falhei por não ativar o dom da audição.

Ao ouvir as palavras do coiote, Kali se levanta, toma ar e seu corpo enrijece de medo. Seu rosto fica todo avermelhado, é quando ela toma forças para dizer: — N-não! Eu pagarei, pagarei! — Ela retira as moedas da algibeira que o professor nos deu e desliza sobre a mesa. Exatas vinte peças de ouro.

— Depois eu devolverei, prometo — ela diz, ao passo que olha para mim e Alienor repetidas vezes.

Essas moedas não eram para isso, mas não vejo problema, afinal eu ganhei outras quinhentas. Além disso, nós pagaríamos pelo seu suposto trabalho como guia, e creio que ela não fará novamente.

— Ai! Desculpem, não vou me intrometer novamente. Podem continuar sem mim. Está calor aqui, verdade?! Ai! Não precisa responder isso... — Ela abana seu rosto com ambas as mãos e procura por uma janela na parede em busca de ar fresco.

Receio que se houvesse uma claraboia aberta, Kali se jogaria por ela agora.

— Pode tomar emprestado isto aqui. — Madame Karine estende um leque vermelho e preto em direção a Kali, e ela o pega com as mãos trêmulas.

— I-isso vai custar algo? — pergunta a santa.

— Aqui nesta sala só compramos e vendemos informações, minha querida. Não é uma loja de leques, fique tranquila — A donzela de vermelho dá singelo sorriso, depois questiona: — Enfim, ao que devo a honra da visita?

— Queremos saber quem é o competidor do festival, Malak de Thar — diz o mascarado.

— Entendo, vejamos tal informação — aduz a donzela de vermelho, a qual deixa seu cigarro sobre um cinzeiro, junta as pontas dos dedos, inclina sua cabeça para cima e fecha os olhos. — Loquir motis.

Um fluxo branco se reúne na cabeça de Karine, é alguma magia mental do alinhamento de vida. Depois de alguns instantes, ela encerra a magia e diz:

— Sinto muito, não há informações a respeito de Malak de Thar, salvo que ele compete no atual festival, junto de Hector Vivara, porém isso vocês já sabem. Isso custou dez moedas de ouro. Alguma outra pergunta?

— Espere! Mas você acabou de dizer que não há informações. Então por que... — aduz Kali, então ela tampa a própria boca, depois completa: — Está bem, está bem, só continuem. Ficarei quieta...

— Não existir informações, Srta. Kali — diz o Karakhan —, também é uma informação. Alguém que não consta nos registros da Vivenda de Alvitres é certamente muito poderoso, influente ou discreto.

A Madame Vitali não concorda ou discorda. Creio que ela só se manifestará caso a questionemos a respeito, e pelo devido pagamento.

— Que tipo de magia Malak de Thar usou na última luta do festival? — questiona o Karakhan.

— Malak usou magias de alinhamento sudoeste — responde Karine. — Quinze peças de ouro.

O Karakhan coça seu queixo por detrás de sua máscara, depois pergunta: — Como ele faz isso sem sucumbir à loucura?

— Essa informação tampouco está disponível. Porém por dez moedas de ouro, eu posso sugerir a hipótese mais plausível.

— Certo, pode dizer — diz o mascarado.

— É provável que Malak de Thar seja um profano.

— O que é um profano? — ele pergunta novamente.

— Com essa pergunta, você extrapolará seu orçamento inicial. Deseja saber mesmo assim? — Ela olha para o Karakhan, porém sou eu que respondo.

— Sim, deixo disponível mais duzentas peças de ouro, das que ganhei.

Eu deixaria mais, porém não quero correr o risco de gastar todo o dinheiro sem ter certeza que as informações serão realmente úteis.

— Santos estão para o alinhamento branco, assim como os profanos estão para o alinhamento negro. Profanos podem usar qualquer magia desse alinhamento, de qualquer nível. Até cinco níveis acima dos seus alinhamentos, eles usam sem penalidades. Acima disso, o fazem com algum custo à sua saúde. Ademais, em condições normais, não sofrem com a loucura.

— Só um minuto, Srta. Karine, preciso falar com meus colegas por favor — digo à donzela, e ela balança sua cabeça em afirmação, depois volta a tragar de seu cigarro.

— Algum de vocês entendeu? Eu não compreendo tanto assim de magia — pergunto aos demais.

— Bem... É parecido com minhas magias — diz Kali. — A minha potência mágica é de cinco níveis em criação e outros cinco em vida, porém eu nasci com uma condição que posso usar magias de alinhamento branco até cinco níveis acima dessa potência mágica. Ou seja, posso até usar magias de nível dez de criação ou vida.

— Uau! Você é incrível, Srta. Kali — digo a ela.

— Humpf! Isso só me trouxe problemas até hoje. — Ela vira seu rosto para o lado e faz beiço.

— Porém, há mais um detalhe, Gris — aduz o mascarado. — Ao que tudo indica, ele pode usar magias de níveis ainda mais altos, porém custariam de sua própria saúde.

— Se for igual que meu caso — interrompe Kali —, ele pode desmaiar, entrar em coma ou até morrer, caso use magias de níveis muito altos.

Karine pega seu cigarro, tragra outra vez, então complementa: — Há mais uma característica importante que não comentei ainda, eles podem usar magias de morte sem tocar nos inimigos. Essas informações custaram cinquenta peças de ouro.

— Isso é perigoso — comenta o mascarado —, mas faz sentido, se comparado com o que nós vimos.

Creio que até aqui já tenhamos resolvido as dúvidas sobre nosso adversário. Se lutássemos contra ele, sem sabermos disso, provavelmente perderíamos. Alinhamento de morte é o mais poderoso, pois suas magias têm potencial de acabar com o combate ao instante.

Magias de sono, propagação de dor, alucinação ou a mais irreversível de todas: Morte súbita, uma magia que expulsa o todo o fluxo do oponente, ao passo que gasta a mesma quantidade de fluxo do lançador. Ou seja, se o lançador possuir mais fluxo, ele mata o inimigo com um toque.

O problema das magias de morte é as mais poderosas têm como requisito o toque. Mas neste caso é pior ainda, pois Malak pode fazê-lo sem tocar em seu alvo.

— O alinhamento de morte é repulsivo, eu sei — diz a Madame Karine. — Desejam saber algo mais?

Olho para os demais, estão todos satisfeitos, já Alienor parece hipnotizada pela dama de vermelho. Eles olham para mim, e balançam a cabeça em negação. De fato, creio que temos todas as informações necessárias para enfrentar Malak.

Agradeço a Cintia por me ensinar a me preparar deste modo. Agradecei depois também ao mascarado por me mostrar este lugar. É certo que será útil no futuro.

Tenho algo a perguntar, algo que não se relaciona a Malak, mas preciso fazer a pergunta correta.

— Madame Karine, você sabe quem eu era há quatro anos atrás ou mais?

Novamente, a dama de vermelho junta as pontas dos dedos, inclina seu rosto para cima e diz: — Loquir motis.

Ela analisa por um instante, depois encerra a magia e diz: — Essa informação extrapola o orçamento. Custará trinta mil peças de ouro.

É muito dinheiro. Provavelmente nunca juntarei tanto em minha vida inteira.

— Eu não tenho tanto. Obrigado, eu creio que é tudo.

Madame Karine toma um pouco de ar, traga de seu cigarro e diz: — Eu posso trocar tal informação por outra, caso queira.

— Qual informação?

— Quero saber com detalhes como você alcançou o domínio dos dons de resistência mental, manipulação de massa e sentidos aprimorados do impetus.

— Sinto muito, Srta. Karine. Essas informações não estão à venda.

Karine se inclina na minha direção e se apoia sobre seu pulso para dizer: — É justo. Se em algum momento você mudar de ideia, sabe onde me encontrar. — Ela pisca para mim.

— Aliás, fale com o Bruto da recepção quando você sair, ele te entregará uma insígnia, com ela você terá acesso irrestrito a qualquer filial da Vivenda. É uma cortesia para que se lembre de mim.

— Obrigado, Srta. Vitali — digo.

— Pois bem, foi um prazer negociar com todos vocês. Fiquem à vontade para conhecer o restante do jardim.

— Espere! — diz Alienor. — Há algo que eu quero saber.

— Alienor, não podemos gastar dinheiro assim — a contesto.

— Ah! Gris, me empresta aí, vai. Eu preciso saber quais são as fraquezas daquele demônio.

— Mas nós já entendemos tudo o que precisamos saber a respeito de Malak.

— Eu não quero saber nada sobre aquele cara sem graça.

Ahm? Não entendi.

— Eu preciso saber quais as fraquezas do Demônio da Lua Nova, isso é o mais importante de tudo! — explica a ruiva.

— Perdão, a Vivenda de Alvitres não conhece um Demônio da Lua Nova, portanto não há como ajudarmos com isso — aduz Karine.

— Srta. Karine, o Demônio da Lua Nova é como a Alienor chama meu professor, o Sr. Valefar.

Ao dizer isso, Karine perde seu semblante relaxado e seu corpo fica rígido. Ela se ajeita na poltrona, apaga seu cigarro no cinzeiro e diz:

— Informações sobre esse homem não estão à venda na Vivenda de Alvitres. Peço que não insistam.

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