Volume 2
Capítulo 14: Acidentes para finais felizes
BOKUTSUNAGARI
Acidentes para finais felizes
Chigiri insiste em acertar Hikaru com garras e punhos, mas falha repetidas vezes. Em um golpe mais forte, suas garras afundam no escudo de madeira, quase atingindo o antebraço do garoto.
— Essa foi perto! — comenta Hikaru, desfazendo o escudo e avançando com a faca.
Chigiri desvia por pouco, mas o garoto ainda consegue cravar a lâmina em seu peito. O vampiro reage rápido, desfaz a investida com um tapa violento e soca Hikaru no rosto com força suficiente para jogá-lo de lado.
— Eu te imploro, só desista e me deixe em paz… — Hikaru apoia as mãos no chão, cambaleante, e ergue a faca outra vez.
— Eu já disse que só vou parar quando você morrer.
Hikaru ergue o rosto. Sua face está inchada, marcada de roxo e vermelho. Ele cospe, e Chigiri percebe um dente quebrado caindo no chão.
— Sinto muito pelo dente.
— Não quero sua compaixão, vampiro.
Chigiri suspira, cansado, e se apoia nas costas de um bambu.
— Eu realmente não quero te matar. Não vejo necessidade disso tudo, mesmo você tendo matado o Kagami.
Ele desvia o olhar por alguns segundos, respira fundo e encara Hikaru de novo.
— Afinal… por que você quer tanto me matar?
— Porque quero te matar da mesma forma que você matou meus amigos.
— Amigos que não ligavam pra você? Eu observei você a noite inteira, só esperando um momento certo.
— Além de assassino, espionou minha vida social? Belo exemplo de gente você é.
— Eu não sou gente, garoto. E você também está deixando de ser.
— Como assim?
— Você quer me matar por causa de “amigos”? Aqueles caras te deixavam de lado. Estavam mais interessados naquele tal de Akihiro do que em você.
— Não fale do Akihiro de novo. — o tom dele se torna grave, ameaçador.
— Por quê? Porque ele é mais maduro enquanto você se agarra a motivos banais pra tentar me matar? Eu devorei quase todo o Akihiro, e mesmo assim ele veio aqui me defender e tentar ajudar o Kagami.
O desgosto consome Hikaru. Sem dizer nada, ele avança, tentando atingi-lo. Chigiri desvia com facilidade.
— O que foi? Ficou bravo com a verdade?
— Cala a boca, criatura nojenta! — o grito faz o vampiro ficar sério pela primeira vez.
— Também não estou te achando simpático. Se quer lutar, vai ter luta.
Hikaru estende a mão e gera raízes com espinhos. Chigiri desvia e tenta atacá-lo por outro ângulo, mas o garoto cria novos espinhos sem precisar de uma barreira. As hastes grossas atravessam boa parte do vampiro, prendendo-o.
— Vamos acabar com isso…
Hikaru sorri, aproxima-se e segura Chigiri pelos cabelos, pressionando a faca contra seu pescoço.
— Pronto para morrer?
O vampiro mantém o olhar cansado, aceitando o destino. Hikaru pressiona a lâmina, cortando a pele — mas Akihiro chega a tempo.
— Hikaru! Para com isso!
Akihiro salta sobre Chigiri e acerta o rosto de Hikaru com a perna. O garoto cai, segurando o rosto ardendo, enquanto Akihiro tenta libertar o vampiro.
— Ei, vampiro, eu vou te tirar daí…
Ele segura Chigiri pelos ombros e o puxa, retirando-o dos espinhos.
— Você tá bem? Vai se curar?
— Sim… só me dê um minuto.
Akihiro acena e vira para Hikaru, que já se levanta com a faca em punho.
— O que você tá fazendo aqui, Akihiro Nishida? Acabou de chorar pra sua namorada vampira?
— Vim te impedir, Hikaru. Não vou deixar você matar mais ninguém.
Hikaru solta uma risada curta e sarcástica.
— Vai bancar o herói dos vampiros agora? Não estamos em um conto de fadas, idiota.
— Só estou tentando ser alguém diferente pela primeira vez. Estou deixando meu orgulho de lado pra ajudar quem precisa.
— Tá se achando a nova Kimiko. Gostei dessa atitude.
Hikaru corre para cortar Akihiro, mas Chigiri o empurra para fora do alcance e desfere um soco devastador no peito do garoto, arrastando-o para trás.
— Seu vampirinho nojento, eu—!
A dor o corta no meio da fala; ele se curva, cuspindo muito sangue.
— Eu acho… que você fraturou minha costela…
— Que legal. Eu podia ter fraturado seu crânio.
Chigiri avança de novo. Hikaru se joga no chão e tenta perfurar seu estômago, mas o golpe é tão previsível que o vampiro o agarra pelo braço e o arremessa com tanta força que ele bate contra um bambu, quase o quebrando.
— Ei… vampiro…
— Chigiri. Meu nome é Chigiri.
Akihiro se surpreende, mas o entende
Hikaru abre os olhos atordoado, vê o chão de terra borrado… e então percebe: seu antebraço foi arrancado pelo impacto.
— Meu braço… meu braço!
Ele pressiona o ferimento, enquanto Chigiri observa segurando o antebraço arrancado.
— Seu desgraçado! Eu vou matar você e o Akihiro e usar o sangue de vocês pra recuperar meu braço!
Ele se levanta com esforço e cria uma prótese de madeira que substitui o membro perdido. É funcional, mas rígida e pesada.
— Akihiro, pode dar um jeito nele por mim? — pede Chigiri.
— Oi?! Por que eu? Você é mais forte que eu!
— Estou cansado e quero me recuperar um pouco. Já lutei demais com ele.
Akihiro assente. Chigiri apenas observa, encostado no bambu.
Hikaru avança debilitado, tentando socar Akihiro. O garoto rola no chão e acerta um chute na canela dele. A força sobrenatural estilhaça os ossos e arranca a perna de Hikaru do joelho para baixo. Ele cai.
— Minha perna! Você vai me pagar, Akihiro!
O garoto toma fôlego apoiando sua cabeça contra o chão para se levantar, marcando sua cabeça a cabelos com sangue, terra humida e ódio.
— Me desculpa, Hikaru. Você não me deixa outra opção.
Hikaru tenta invocar raízes rapidamente. Uma delas perfura o joelho de Akihiro, que grita e salta para longe.
— Akihiro!
Chigiri corre para ajudá-lo a levantar. Hikaru cria outra prótese de madeira, agora para a perna, e se ergue.
— Dessa vez vocês não escapam.
Ele se prepara para lançar espinhos, mas uma faca atravessa seu corpo — rim, fígado, tudo perfurado. Kimiko está atrás dele, com o símbolo em mão.
— Kimiko?! Por quê?!
— Nunca disse que era leal a você. A namorada do Akihiro pediu minha ajuda. E cá estou.
Hikaru cai, gemendo de dor.
Kimiko se aproxima de Akihiro e arranca com uma mão o pedaço de madeira preso no joelho dele.
— Se feriu muito, meu subordinado?
— Não muito… obrigado por vir.
— Não há de quê. Agora finalize. Você foi bravo e completou seu objetivo.
Chigiri, desconfiado, pergunta:
— Antes disso… por que ajudou o garoto a matar os vampiros?
— Princípios. Só isso.
Chigiri suspira. Kimiko olha para Akihiro:
— Termine logo. Acabe com esse ciclo.
— Kimiko… é mesmo preciso?
— Por que essa dúvida? Ele não tem mais volta.
— Mas… talvez eu consiga mudar ele. Ensinar algo. Ajudá-lo a superar.
— Akihiro, você acha que ele faria o mesmo por você?
Akihiro silenciosamente baixa os olhos.
— Já pensou… que, se ele conhecesse a Morgan, poderia tentar matá-la só para se vingar de você?
A verdade o atinge como um tapa.
Ele respira fundo, pega a faca e caminha até Hikaru. O chão ao redor está úmido, avermelhado. As roupas de Hikaru estão cobertas de terra, barro e sangue. Ele respira com dificuldade e olha para Akihiro.
— Você… vai me matar?
Sem responder, Akihiro estende a mão.
Hikaru, surpreso, cria raízes para se apoiar e segura a mão do garoto.
— Obrigado… de verdade…
Mas, em um golpe rápido, ele gera uma lâmina de madeira e tenta cravá-la no rosto de Akihiro. O garoto segura a lâmina com a mão, deixando-a atravessar sua palma sem reagir.
Só demonstra decepção.
— A Kimiko estava certa. Eu não devia deixar alguém tão orgulhoso viver.
Ele solta a mão de Hikaru, firma a faca e a crava no pescoço do garoto.
— Morra em paz.
Hikaru cai, desfazendo as próteses. Engasga com o próprio sangue. E mesmo neste estado ele reúne forças descontando toda sua raiva em apenas uma única frase.
— Eu… te odeio!
Akihiro observa, imóvel. Os movimentos de Hikaru diminuem, sua voz rasgada pelo sangue engasgado e a dor era grande, até que finalmente ele enfim aceita sua própria morte.
— Eu… eu vou te odiar sempre…
Ele fecha os olhos. Akihiro sente apenas um vazio.
— Boa noite, Hikaru.
Naquela noite, Akihiro Nishida morreu e outro nasce.
Kimiko se aproxima, pousando a mão em seu ombro.
— Você está bem?
— Acho que sim… nunca vi alguém morrer na minha frente.
— Você fez o certo. Se ele continuasse, seria pior.
Akihiro acena e olha para Chigiri.
— Obrigado, garoto. Tô vivo graças a você.
— Não há de quê… acho que vou pra casa.
Chigiri se afasta. Kimiko chama:
— Akihiro!
— Sim, mestra?
— Fique bem. Por favor.
Ele suspira sem virar para ela.
— Vou ficar. Obrigado.
A mente dele está em frangalhos. Ele desce do templo e caminha pelas ruas do amanhecer. Abre a porta de casa, sem ânimo, e dá de cara com Rem.
— Ei, Akihiro! Onde você estava? Ficou fora a noite inteira!
— Desculpa… caminhei tanto que perdi a noção do tempo.
— Isso explica o cheiro de suor. A Morgan pediu pra eu te avisar: ela deixou uma carta na cozinha.
— Carta?
— Sim. Não li, mas ela parecia triste.
Uma pontada acerta o peito do garoto. Ele caminha até a cozinha. A carta está ali.
Ele abre. Lê. E seu peito aperta. O silêncio pesa. Akihiro amassa o papel entre os dedos, quase rasgando.
Então grita — alto, desesperado.
Rem corre.
— Akihiro?! Você tá bem?! Eu ouvi—
— A Morgan… a Morgan me deixou…
Rem pega a carta e lê.
“Olá Aki como está sua jornada? Está tudo bem? Espero que sim, como eu também espero que deseje que a minha própria jornada seja boa. Sinto muito se foi assim que acabou Aki, eu realmente queria que você estivesse comigo para ver o quão belo é Aokigahara, quero realmente ver se a minha família está bem e viva principalmente, pois isso significa muito para mim. Eu espero que você não fique com raiva de mim e que me espere quando eu voltar. Eu sempre te amei e sempre vou te amar Akihiro Nishida, você é o meu mundo, é meu orgulho, fico feliz que você tenha mudado para uma pessoa melhor.
Com amor, Morgan”
Rem não encontra palavras. Apenas abraça o irmão com força.
— Se acalma… por favor…
Ele afaga o cabelo de Akihiro, que respira rápido, quase sem controle, até começar a se acalmar.
— Irmão… eu não entendo sua dor. Só você entende. Mas pensa pelo lado bom… ela está feliz. E ama você. Você mudou. Ficou mais calmo, mais aberto… por causa dela.
Akihiro não responde.
Rem suspira e abraça o irmão de novo.
— Ela quer o seu bem, né? Então por que ficar assim? O seu bem importa agora.
Um silêncio pesado cai entre eles. Então Akihiro se levanta e sorri — pequeno, sincero.
— Eu vou tentar.
Ele caminha até a porta. Rem entende que ele precisa de espaço.
Akihiro abre, sente a brisa do amanhecer e os primeiros raios do sol tocarem seu rosto. Ele encara o horizonte e chora, deixando tudo escorrer: empatia, dor, raiva. Ele sentiu que mereceu isso, mereceu esse sofrimento e acidente em seu namoro, mas entende que isso faz ele ter seu próprio final feliz
Fechando os olhos, sorri entre lágrimas.
— Eu me aceito.
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