Volume 1
Capítulo 15: Fim da Primeira Fase
O sol surge no horizonte, a cidade é encoberta de dourado.
Muitas pessoas caminham pelos corredores até chegarem à saída da arena. Elas conversam animadas entre si, impressionadas pelo desempenho dos lutadores e a empolgação em tentar prever os combates futuros.
Em meio à multidão, uma mulher de cabelos longos, lisos e grisalhos, anda com as mãos próximas do rosto, expirando ao terminar sua oração silenciosa.
“Que bom que ele está bem…” pensa ela, abrindo devagar os olhos para ter um relance das cores do céu. “Mas ainda não acabou… Você ainda irá continuar, não é? Mesmo que se despedace no caminho…”
Com o tempo, todas as arquibancadas ficam vazias, estando Holliver no centro da área de combate. Atualmente ele veste roupas normais, tendo saído por completo do personagem da realeza: o rei.
— A terra se tornou digna — fala, pegando uma porção na mão, deixando-a deslizar para o solo. — Está na hora de ir para o próximo patamar, “filho”. — Ele pega um frasco de dentro do jaleco, abrindo-o devagar com suas mãos enrugadas.
Sua memória sobrepõe constantemente a imagem do seu discurso de despedida para o público. Estavam no centro da arena os vencedores de cada batalha, usando os mesmos mantos e algemas de prisioneiros da cerimônia de abertura. O discurso do rei soava:
Os oito traidores foram executados… bom trabalho. Honrarei minha palavra, a partir de hoje vocês me servirão.
Dentro do recipiente há areia, havendo pedaços de dentes espalhados pelo interior.
— Achei meio boba a ideia do torneio ter um “enredo”, mas o público estava animado com isso. Foi divertido.
— Obrigado a todos da plateia! — falava Gaojung, Holliver cai mais uma vez em suas lembranças. — E claro, também aos telespectadores que aguentaram passar a madrugada vidrados na transmissão! O alcance de público foi incrível! Estarei aguardando para ver todos novamente no próximo domingo!
De volta ao presente, o organizador balança o braço, derramando toda a areia.
— Parabéns garotos, vocês poderão pisar em parte da “glória” do maior “cenário” do mundo. Estamos confiando no potencial de vocês, “geração de lanças”.
Sons de passos ecoam de um dos corredores.
— Ah… são vocês.
Dois homens surgem das sombras. Um é Romanto, o barbudo; o demais é mais baixo que ele, usando um chapéu de pano que cobre o rosto enquanto pelo corpo usa uma túnica de mesma cor.
— Houve algum imprevisto?
— Não… — responde o de túnica. — Minha equipe médica tratou todos os lutadores, nenhum esteve próximo da morte.
— Hahaha! Um trabalho bem mais fácil do que seria no submundo, não acha?
— Sim, me deixou até entediado.
— Com licença, senhor Holliver. — O barbudo está com os pés alinhados, mantendo os braços para trás, demonstrando respeito nessa pose igual um mordomo.
— Sim? Fale, Romanto.
— As vendas de passes para a sala VIP foram um sucesso, conseguimos nomes grandes para o segundo dia.
— Ótimo ótimo! Prepare as mudanças dentro do prazo, falhas não serão toleradas.
— Como o senhor desejar. — Ele se inclina um pouco, colocando a mão no peitoral.
Os dois indivíduos deixam o local, devolvendo-o a um ar solitário.
“Sinceramente…” Holliver olha para o teto, vendo o desenho de um gavião entre os holofotes, um que estava sendo ofuscado durante as lutas pelo excesso de luz. “Me fazendo sair das sombras por ver a situação em que essa geração estava vivendo. Que época terrível. Mas fiquem tranquilos, garotos. Não vou deixar que ela os estraguem.”
Ele caminha na direção do corredor, sumindo na escuridão.
“Ao menos… se puderem ficar vivos até o final.”
[Dia 1/2 - Vencedores que irão para as Quartas de Final:
1. Laerte
2. Traçal
3. Kimai
4. Ury
5. Holpos
6. Kaon
7. Jay
8. Humine
“Não há dúvidas! A luta mais empolgante foi a do Traçal contra o Omnislai!”, “Arrepiei naquela do Omnislai! Os dois têm muito potencial! Estou confiante de que será Traçal quem irá levar a yrai para casa!”, "O que aconteceu com esses caras?! Simplesmente ficaram muito mais forte desde o último circuito amador! E você viu o quão absurdo Traçal está?! Só Laerte pode pará-lo!", comentários de alguns espectadores que foram abordados na saída.”]
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Dois dias se passaram. As notícias e vídeos sobre o Torneio da Corte foram fortemente disseminados na internet e jornais, havendo uma forte onda de críticas contra a brutalidade demonstrada, regras “frouxas” e passividade do juiz; entretanto, seja por uma curiosidade pura ou insensatez vivente no fundo dos corações das pessoas, a maioria prosseguiu curiosa sobre o desenrolar do evento, provando isso pelo esgotamento instantâneo dos ingressos extras postos à venda.
Como é possível?
Nesse mundo, a medicina é um grande destaque em meio aos outros campos de estudo, tendo alcançando um patamar em que tratamentos podem resolver a maior variedade de cânceres; até o tempo de repouso dos pacientes pode ser reduzido a poucos dias independente da gravidade do problema que tiverem. Claro, naturalmente a qualidade dos equipamentos e especialistas envolvidos são relevantes para tanta eficácia.
Um dos fatores decisivos para Holliver não poder ter seu evento abalado até o cancelamento: a sua proeminente equipe médica. Um grupo desconhecido, mas que se provou muito além da média, como no tratamento do Omnslai, que teve fraturas nos ossos e órgãos arranhados pelas costelas, problemas que foram resolvidos em poucas horas.
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Laerte está olhando para um supermercado do outro lado da rua, tendo a vista atrapalhada às vezes nas passagens dos carros. Ele está vestido com um casado cinza, encobertando a nuca com o capuz acoplado. Suas pernas sobem e descem no mesmo lugar, preservando-o para que não esfrie no exercício.
Faltam 3 dias para o segundo dia do torneio.
“Promoção de 30% nos doces?!”, pensa, visualizando na mente uma prateleira repleta e chocolate sendo esvaziada por suas mãos. “Isso não significa que posso comprar uma galáxia inteira deles?!”
Um sorriso se forma no rosto do rapaz, ele suspira e continua a corrida, passando entre a movimentação branda de pessoas nessa manhã.
“Como se eu pudesse gastar dinheiro tão à vontade. Não importa que trabalho faça, não é uma liberdade que possa ter sempre… Que coração fraco tenho, preciso me relembrar constantemente do foco. Tenho que treinar mais e então transformar essa minha mentalidade… em ‘aço’! É certeza que os outros também estão se preparando, não vai ser que nem no domingo passado em que lutamos às cegas.”
Laerte “para” na faixa de pedestre, aguardando com pequenos saltos a permissão do semáforo para atravessar.
“(...) no meu caso não devem saber com exatidão, mas Traçal e os demais demonstraram boa parte das suas capacidades atuais, realmente deram muito conteúdo para serem analisados. E por ser um torneio do Holliver, as gravações estão muito boas, nítidas. (...) Bom, tem três lutadores que tenho certeza que não podem comigo em nenhuma situação: Holpos, Kaon e Humine, esses três não podem me arranhar nem com estratégia, simplesmente lhes faltam coisas essenciais para isso. Entretanto… se eu estiver muito desgastado quando enfrentá-los, pode virar um problema. Ah… pensando melhor, não tem como eles avançarem para outra etapa sem qualquer cansaço ou dano físico, o páreo está duro demais para permitir que os mais fracos possam ser sortudos junto do ‘fator ileso’.”
As horas passam, ele chega na encosta de um rio, correndo pela calçada ao lado com a borda do corpo sendo iluminada pelos reflexos de luz da água.
“Em todo caso, não é viável abaixar a guarda contra qualquer adversário. Como sempre.”
Laerte inspira fundo ao tomar sua postura de boxe em um instante, levantando o cotovelo ao atirar o ombro à frente, liberando um soco direto que estreme o ar no cessar do punho; sua imagem vibra, seu suor se espalha.
Seus tênis freiam pelo solo, parando a corrida para mandar dois jabs consecutivos que viajam pelo ar como vultos; ele vola a correr, alternando o ritmo constantemente para treinar os jabs, golpes retos e também ganchos que sobem como mísseis, deixando um rastro de poeira parecido com fumaça. Seu corpo gira de uma vez, avassalando todo o trajeto de um balanço lateral de direita, espantando as pessoas próximas com o vento; o boné de um garoto é derrubado.
“(...) não… contra ‘ele’ que é mais baixo, tenho que descer o braço para causar o máximo possível de dano…”
O rapaz prossegue se movendo, não notando o público surpreso que deixa para trás. Seus olhos brilham de leve debaixo das sombras do capuz, destacando o foco abissal em que está imerso.
“Se eles estão se esforçando agora, vou me afiar para esmagá-los com tudo o que vierem!”
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Em outra parte da cidade, em um hotel, calças estão sendo coçadas, mais especificamente: na bunda. Holpos está deitado de lado no chão, bocejando, esfregando igualmente as costas por baixo da camisa.
— Ei… presta atenção — fala Unsai, que está sentado perto com um notebook.
Suas palavras são ignoradas.
— É com essa atitude que pretende ganhar do Traçal e Laerte?
— Tch! Como se esses vídeos fossem servir de alguma coisa, e eu já assistir as lutas na arena.
— Você sabe que estudar possíveis oponentes é o básico. Acha mesmo que está em posição de tratá-los como inferiores? Mesmo que seja só uma barata se comparado ao Traçal?
— Hã!? Estou muito mais forte do que no ano passado, posso dar cabo de todos eles a qualquer momento!
— Impossível impossível — responde imediatamente, abanando uma mão para apoiar sua descrença. — Cara, o Traçal estava raspando as paredes na luta contra o Omnislai, fez até um buraco quando a acertou. Não importa o quão forte você ficou, não tem nenhuma chance contra os dois favoritos ou o que sobrou dos Quatro se enfrentá-los diretamente em seus pontos fortes. Ao menos será assim no caso de pisar naquela arena sem nenhuma estratégia preparada para cada.
— Argh! Depois de uma derrota tão miserável, por que ainda está na cidade?!
— Obviamente para cuidar de você. Nossa academia é longe, então ninguém mais pôde vir.
— Eu não sou a porcaria de um garotinho! Você não é minha mãe, vá embora! — Ele aponta com um braço, estendendo-o por completo.
— Não seja chato, vou ficar e te ajudar com a parte estratégica. E bem, sobre a parte de eu ter perdido… É o famoso não há o que fazer, e então? não posso confiar a você minha vontade? Rejeita carregá-la ao topo?
Holpos olha a orelha do Unsai, que está com ataduras finas cobrindo-a pela área em que foi arrancada.
— Tá tá! Me mostre o que quiser, só não garanto que vou estar atento a muita coisa.
— Haha! Esse é o espirito! Certo, espera aí, vou escolher uma luta simples para começar… Ah! lembrei! Irei assistir aos confrontos do próximo domingo na arena.
— O quê? Como conseguiu um ingresso? Já tinha comprado antes por saber que ia perder?
— Idiota, não supus que eu fosse perder na primeira rodada…
— Trágico. Bem, então como?...
— Quem perdeu na primeira fase recebeu passe VIP para assistir as próximas lutas. Apesar de que eu não sei quem mais daria as caras por lá depois daquelas derrotas humilhantes.
— Como a sua.
— Estou confiante que perdi após uma dura batalha.
— Sei, sei…
— Enfim, vamos ao que interessa. Fora Traçal e Laerte, o oponente que acredito que mais pode te dar trabalho é o Jay.
— Hm… Aquele dos olhos puxados que fez o oponente dançar.
— Sim… não creio que der para chamar aquilo de dança, mas foi por aí.
— E o que tem de mais nele? É só um magricelo, não tem nada de incrível. Posso esmagá-lo com força bruta!
— Hahaha! Impossível impossível!
— Isso de “impossível” já está me irritando! — Holpos se senta, ameaçando o outro com uma expressão raivosa, mantendo os dentes à mostra. — Está querendo arrumar briga comigo ou o quê?!
— Cara, o Jay literalmente faz força bruta, agarrões e técnicas de submissão serem ineficientes. Seu estilo é justamente baseado nessas duas coisas.
— Ué!? Como briga sem isso?!
“Pelo jeito o dia vai ser longo… Seria bom se o treinador estivesse aqui, ele poderia fazer o cabeça oca entender tudo de alguma forma. Oh! Tive uma ideia!” Unsai balança os braços, gesticulando movimentos abruptos desprovidos de sentido. — Faz assim e “pah”! depois “kabum” e “gah”!
— Desgraçado!
“Parece que a brincadeira irritou ele de vez…”
— Tem certeza que esse golpe vai funcionar! É de um ângulo e “timing” realmente profundos!
“Ele entendeu minhas intenções nessa droga de explicação?!”