Sonhar Brasileira

Autor(a): CaetanoGabriel


Volume 1

Capítulo 1: Todom Sonham

Deitado sobre cama, Ezkiel remexia-se, tentando encontrar uma posição confortável para dormir. Maeve estava deitada sobre seu colo. Seus cabelos escuros, com a única mecha avermelhada, estavam bagunçados entrelaçados entre os dedos do rapaz. Ela fazia questão de espremer o corpo o máximo possível contra o peitoral do namorado.

Essa era uma situação normal para o casal, uma noite comum, como todas as outras que tiveram juntos pelos últimos dois anos. Porém, naquela noite, garota estava mais animada que de costume.

— Vai funcionar! Bota fé em mim que vai funcionar!

Maeve mexia o corpo animada, esfregando o nariz sobre o queixo dele. Os dois encaravam o objeto que dançava contra o vento fraco da janela entreaberta.

— Não sei por que você está tão animada com isso.

Um belo filtro de sonho pairava entre os dois. A madeira clara sustentava fios azul-púrpura entrelaçados, lembrando o ninho de uma grande aranha. Três penas brancas, presas ao aro, se moviam com o vento, tocando-se delicadamente.

— Porque você vai sonhar! Isso é muito maneiro, não acha? Tipo... muito foda!

Ezkiel analisou o rosto pequeno da namorada, comtemplando a euforia em seus olhos grandes.

— Claro! Muito foda.

— Claro que você não acha foda! Você nunca sonhou antes!

Ezkiel bufou pelo nariz, um sorriso sarcástico formando em seu rosto. Maeve começava a ficar emburrada, inflando as bochechas pequenas com ar. A mesma expressão fofa de costume.

— Para de debochar de mim, cara! O site falou que fazia sonhar.

Ela efetuou uma pausa, encarando-o, enquanto ele revirava os olhos propositalmente para perturbá-la.

— E estava bem baratinho.

— Ah! De novo?

Uma gargalhada sincera escapou de Ezkiel. Ele não conseguiu se conter diante da ingenuidade boba de sua namorada. Não era a primeira vez que ele tentará comprar coisas aleatórias na internet apenas por diversão. A última fora uma coleção de pedras místicas que deixavam a pessoa não ficar doente. Parecia estar funcionando bem, até ela pegar uma gripe.

— Claro! Ótimo! Podemos ir dormir agora?

— Sim.

A voz emburrada dela foi abafada pelo barulho dos edredons se movendo para tampar o rosto. Maeve inclinou a cabeça devagar contra o peito de Ezkiel como um pequeno animal de estimação se preparando para dormir. Ele sentia a respiração dela torna-se lenta aos poucos se unindo em uma sincronia favorável à sua.

Fechou os olhos devagar, encarando mais uma vez as penas brancas de uma ave desconhecida presas ao filtro e os fios púrpuras que atraiam de forma hipnotizante. Aos poucos a concentração se esvaía, enquanto o balanço pendular do objeto levava a sua mente até o sono tomar o aposento.

 

《 Sonhador encontrado! 》

《 Processando assimilação compatível com Filtro de Sonhos... 》

《 Compatibilidade existente! 》

《 Reconstruindo conexão...》

《 Sonhador se torna um Coletor de Sonhos! 》

《 Analisando estado do corpo...》

《 Corpo encontrado! 》

《 Integração de Coletor, Ezkiel Arcs, concluída! 》

 

...

 

《 Retorno disponível em 2 horas 》

 

A voz robótica e agênero soou em sua mente como um despertar estranho. Uma sequência de eventos começou a se organizar em sua compreensão.

Uma dor preenchia todas as partes do corpo, tornando-se parte dele. Uma fraqueza física devorava-lhe vivo. Um sentimento novo para alguém que sempre teve um bom porte físico.

Uma fome lacerante consumia seu estômago, desconforto inédito de não possuir combustível algum no corpo. Seus órgãos pulsavam devagar, devorando se em um ato de autofagia, buscando qualquer centelha da energia que conseguissem absorver.

Por último, e mais perturbadores, era os seus sentidos. Cada movimento involuntário parecia errôneo. O próprio corpo era a causa de um desconforto tamanho que levaria qualquer um ao desespero. O ar adentrava em seus pulmões de forma estranha. Os batimentos cardíacos pareciam dessincronizados, pulsando o próprio sangue de forma correta, mas esquisita ao mesmo tempo. Até a posição que sua língua estava pairada em sua boca lhe causava angústia.

Quanto mais pensava no corpo, mais o desconforto crescia. Detalhes pequenos tornavam-se focos de desespero por motivos que nem entendia ao certo, apenas sabia que estava errado.

Após alguns tempos nesse misto desconfortável de sensações, tomou coragem de abrir os olhos. As pálpebras se moveram como portas antigas, emperradas por um longo tempo.

Sua visão oscilou, aos poucos moldando a cena ao redor. Estava em uma cela antiga, com barras enferrujadas à sua frente. As paredes antigas eram feitas de tijolos de pedra consumidos por musgos verde-escuros. A iluminação era baixa, vindo apenas da lua que se estreitava pelo vão da pequena janela às suas costas. Poças de água se formavam por todo o aposento, criadas pelo excesso de úmida, causando a impressão de que a própria cela estava chorando por anos. O solo estava deteriorado pelas águas, formando uma espécie de lixa que arranhava os pés enrugados e lacerados do prisioneiro.

Desesperado, tentou mover-se, mas corrente em seu pescoço, que ainda não havia notado, puxou-o de volta contra o local. O tranco foi tão forte que o garoto ficou sem ar. Os olhos se arregalaram, as mãos puxaram contra a coleira metálica na tentativa inútil de tirá-la.

Um outro barulho metálico correu pelas pedras, porém dessa vez, ele não estava preso à outra extremidade. Seus pulsos estavam presos a grilhões cujo outro lado, que deveriam estar fixo aos tijolos de pedra do solo, estavam soltos pela deterioração da cela.

Ezkiel tocou os próprios pulsos com as mãos pequenas e brancas. Observou as feridas em carne viva que o metal havia feito. Cicatrizes antigas e novas, de uma série de tentativas inúteis de se libertar. A dor percorreu pelo seu ser como um choque antigo. A sensação parecia, ao mesmo tempo, familiar ao corpo, mas avassaladora para sua mente.

Seus dentes rangeram em uma agonia extrema, mas ele conseguiu se recompor rapidamente. Notou então suas mãos: jovens, sujas e calejadas. As unhas estavam rachadas, moles o suficiente para retirá-las com apenas um puxão leve.

A respiração tornou-se irregular. Um pânico que nunca havia sentido antes adentrou sua mente, fazendo dela morada. A cabeça mexia-se de um lado para o outro, puxando a corrente com toda a força que as mãos fracas possuíam, enquanto os pés pressionavam contra o solo, tentando se levantar e quebrar a corrente, apertando ainda mais seu pescoço.

— Soco...

A sua voz quase não saiu ao tentar gritar. Parecia mais um rosnado de uma criatura sufocada do que um grito humano.

A boca estava completamente seca e seus lábios craquelados vazavam pequenas gotículas de sangue que banhavam a língua áspera.

“Sonho. Estou em um sonho! O filtro de sonhos funcionou. Isso tudo é só a merda de um sonho fodido!”

A surpresa que surgiu em sua mente lhe encheu de uma felicidade genuína. Um sorriso surgiu em sua boca pálida, avermelhada pelo próprio sangue.

“Só preciso acordar. Eu quero acordar!”

Pensou enquanto encarava as grades enferrujadas à sua frente e o barulho de gotas d’água caindo sobre as poças na pedra. O som foi interrompido por uma voz familiar em sua mente, junto com uma tela de tom azul púrpura surgindo perante seus olhos.

 

《 Retorno disponível em 1h58min》

 

“Que porra é essa? Quem está falando comigo?”

Pensou assustado, cogitando a ideia de estar louco. Entretanto, as frases que havia desconsiderado ao despertar nesse mundo vieram à sua mente.

“Corpo compatível? Coletor de Sonhos?”

Confuso, outra janela azul púrpura surgiu em frente aos seus olhos:

 

Nome: Ezkiel Arcs

Raça: Coletor de Sonhos

Corpo: Humano

Classe: –

Fios de sonho: 0/1000

Estágio: Sem alma

Grau: –

Talentos:『Torturado』

Habilidades:『Coletar Sonhos』『Analisar de Sonhador』

Sonhos Coletados: –

Algumas informações não estão visíveis ao usuário.

 

“O que está acontecendo comigo?”

Uma vontade abrupta de gargalhar pelo pânico veio à sua mente. O medo se misturava com a desorientação da aba à sua frente. As informações pareciam tão confusas em sua mente que ele não conseguia pensar em outra coisa além de uma piada de mau gosto.

“Por que a porra do meu talento é Torturado?”

Foi a primeira coisa que passou por sua mente.

Assim que uma nova aba se formava em sua frente, um barulho de passos ecoou pelos corredores molhados da prisão. Seus olhos se esbugalharam, e ele começou a mexer a corrente desesperadamente, tentando chamar atenção o máximo possível. Com o foco no movimento das chamas que surgiam iluminando o local, a janela do filtro de sonhos desapareceu de sua frente.

Em passos velozes, um homem surgiu em seu campo de visão. Ele usava um colete de couro mal curado que se desfazia a cada movimento do corpo. Empunhava uma espada na mão direita, o metal craquelado estava repleto de arranhões por toda a sua base até a empunhadura simples de couro, mostrando a qualidade baixa qualidade do ferreiro.

Para completar o conjunto, em sua mão esquerda pendula uma lamparina trêmula, desgastada e vazando pequenos gotículas de óleo por toda a sua base, transformando suas chamas em pequenas faíscas voláteis.

A aparência do homem não fazia nenhuma contraparte com os seus equipamentos. As marcas de uso que os itens possuíam eram a semelhantes a cicatrizes em seu corpo, entretanto, uma chamava mais atenção. Em seu rosto, entre marcas de sujeira e leves feridas a serem curadas, corria da sua sobrancelha até maxilar, uma cicatriz pelo olho esquerdo.

Um golpe feito por uma fera grande que dilacerou o seu rosto. Esse entendimento vinha pelo estado da cicatriz, que não parecia ter a forma de um corte, apenas uma parte da carne fora retirada deixando uma cicatriz enrugada e profunda, aonde apenas um orbe leitoso com riscos avermelhados ainda se movia.

Os cabelos, de uma cor difícil de identificar pela luz tremula, eram lisos e óleos caindo até os ombros. Uma juba de um leão maltrapilho.

Entretanto, o que mais chamava atenção de Ezkiel por toda a figura do caçador trajado em couro e cicatrizes a sua frente não era sua espada ou cabelos malcuidados, mas sim a sua idade. Ele parecia estar próximo de sua idade, um jovem com menos de 20 anos.

— Ainda existe um prisioneiro nesse lugar esquecido?

Soou a voz grossa do homem, semelhante a uma animal rugindo. Ele encarou Ezkiel de cima a baixo, com o corpo tencionado para atacar.

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