Volume 1

Capítulo 4: Busca por ajuda (versão antiga)

 

Mary terminava de enfaixar a mão de Ethan enquanto ele estava desmaiado. Quanto ao braço retorcido que obteve, não havia muito o que fazer: se ela tentasse mexer mais, iria piorar. De certa forma se sentia culpada, porque foi por irresponsabilidade e falta de atenção que os dois acabaram desse jeito, e não estavam nem no começo da jornada ainda. A partir de agora, ela deveria ser precavida e lembrar que as vidas dos dois dependiam dela.

Ela se ajeitava e colocava sua máscara de pano no rosto; logo depois colocando o capuz em Ethan para cobrir sua cabeça e então deu um jeito de colocá-lo em suas costas, afinal eles não podiam ficar muito mais tempo ali, sabe-se lá quem apareceria por ali depois de toda a confusão causada.

Apesar de só conseguir usar um dos braços, Mary de certa forma era bem forte, mas também tinha o fator de Ethan ainda ser novo, portanto, baixinho e leve, então pôde levar até as mochilas junto, apoiadas nas costas do menino. Ela segurava os braços dele com a única mão restante e a bainha da katana ela fixou atrás de si para manter Ethan naquela posição em suas costas.

Enquanto andava com ele nas costas, Mary tentava ir mais pelos cantos, para evitar ser vista facilmente, pois naquela situação seria morte certa. Acabou se lembrando de como Ethan, após disparar para matar Dex, estava com um olhar muito assustado e até mesmo lacrimejando, não por hesitação de atirar, mas por estresse e até pânico. Ela novamente se sentia culpada por colocar tanta pressão em um garoto pequeno, mas não tinha tanta escolha, não naquele mundo de singulares.

— Você evoluiu bastante, que bom. — Mary sussurrou para si mesma, lembrando como Ethan era no começo do treinamento.

O menino era bem medroso e mal sabia montar uma pistola mesmo após ensinado. Por muitas vezes Mary saía para realizar algumas tarefas e o deixava para tentar conseguir por conta própria, e, por muitas vezes, não conseguia concluir. Porém, mesmo assim, continuava se esforçando para quem sabe um dia ajudar sua mestra, que agora era basicamente a única pessoa que ele podia contar com.

Mary um dia havia chegado no esconderijo que eles estavam utilizando, que nada mais era que uma casa subterrânea abandonada, e viu Ethan com a cabeça deitada nos braços, que estavam apoiados na mesa. Olhando mais de perto, ele ainda não tinha conseguido montar a pistola sozinho, estava pela metade. Ela vê isso e até sorri, não podia negar que havia sentido um certo orgulho de Ethan. E, agora, o garoto estava ali, com uma mão perfurada por uma bala porque sabia atirar como foi ensinado.

Continuando a carregar Ethan, subindo ruas, descendo com dificuldade e tendo que se virar para saltar obstáculos no caminho, Mary conseguiu sair daquelas ruínas da cidade, para depois deparar-se com um matagal aberto e em seguida um conjunto de árvores, o que dava a entender que mais à frente teria no mínimo uma floresta para percorrer ainda.

Ela encarou aquele campo de mato verde aberto com muita suspeita, era um caminho limpo demais. Decidiu fazer um teste, chutando uma pedra que encontrou ali perto bem no centro do campo. Como ela suspeitava, o local em que a pedra caiu explodiu como se fosse uma mina.

Após isso, começou a se concentrar. Não conseguia sentir nenhuma energia vindo do campo, o que indicava que, se tivessem bombas plantadas ali, então eram todas artificiais, plantadas manualmente. Porém, ela sente uma energia vindo da lateral daquele campo, em que havia uma cerca de arame farpado se estendendo até a floresta mais à frente. Aproximando-se mais dali, Mary olhou em volta para ver se não estava sendo vigiada e entender se aquela cerca tinha algum tipo de rede elétrica.

Pegando uma pedra no chão novamente e jogando num dos meios da cerca para ver o resultado. Na primeira tentativa não aconteceu nada, na segunda também não, porém na terceira tentativa, a pedra simplesmente passou pelos arames como se não tivesse nada ali. A moça aproximou-se mais e tentou fazer a mesma coisa só que com a mão, e, novamente, o membro dela passou pelos arames como se não tivesse nada no local.

Mary pensava consigo mesma se essas ilusões também poderiam ser criadas com pessoas. A singular passou pela ilusão de cerca e então se virou na direção da floresta, conseguindo chegar nela sem ter que passar pelo campo minado.

Assim que chegou no conjunto de árvores, passou por alguns morros complicados de barro, tentando não derrubar Ethan de suas costas. Mary chegava no final daquela floresta que de certa forma era meio curta, parecia que servia apenas para fechar melhor a entrada do que tinha logo depois. Após acabar o conjunto de árvores, ainda tinha mais um morro para descer, e depois dele o destino final, uma espécie de vilarejo contendo casas simples e alguns escombros.

De longe já era possível ver pessoas andando nas ruas e trabalhando com seus poderes, regando plantas, preparando terrenos para pequenas plantações. Mary pensou como isso sim era um bom uso dos poderes, facilitar o trabalho. Porém, antes mesmo de dar mais um passo na direção do vilarejo, ela ouviu um barulho de pistola sendo armada e quando se virou para trás, viu o rapaz parceiro de Dex, que havia colocado aquela mancha na moça para poder rastreá-la com seu poder.

Ele mirava a pistola na direção de Mary, ofegante e com uma das mãos no olho que recebeu o tiro da singular, onde sangrava bastante.

— Como sobreviveu? — questionou enquanto começava a suar frio, não conseguiria revidar de jeito nenhum da maneira que estava.

— Não importa, passa o garoto. — ele se contorcia de dor por causa de seu olho. — Nem mais um passo, ou eu atiro em você. Passa o garoto pra cá. — ele dizia com uma expressão enraivecida enquanto estendia a mão para frente.

Mary tentava pensar numa solução, porém as opções estavam mais que escassas. Não podia largar Ethan, senão ele cairia morro abaixo: seu braço direito estava comprometido e, se fizesse qualquer movimento suspeito, provavelmente levaria uma bala. A moça estava pronta para fazer uma jogada arriscada, mas que talvez desse certo.

Um pouco atrás deles, pendurada em uma árvore, uma figura vestindo uma calça cargo feminina preto, um par de tênis esportivos brancos e surrados, junto de uma regata também preta e tendo um porte físico magro, descia do galho que estava sem fazer barulho e, ao aterrissar no chão, levou sua mão esquerda à boca, mordendo seu polegar até seu canino perfurar sua pele e começar a sangrar.

O líquido então escorre pela mão da moça e, justamente ao começar a descer pela sua pele, ele começou a flutuar na direção do indicador dela. A moça então estendeu seu braço na direção do rapaz, começando a mirar nele.

Agora sendo possível ver seus olhos e cor de cabelo, ambos eram vermelhos. Ela se concentrou um pouco e aquele sangue flutuando na ponta de seu dedo se molda e se torna uma pequena esfera. Por fim, a singular fez um movimento de disparar uma arma com o dedo e o projétil foi em alta velocidade na direção do rapaz.

— Não vai passar? Então, que seja. — o rapaz se preparava para puxar o gatilho, porém, antes de conseguir fazer isso, sua cabeça foi acertada por trás por uma esfera vermelha, que após alguns instantes, fez uma parte de sua testa começar a inchar, até chegar ao ponto de explodir e abrir um buraco, enfim derrubando-o de vez.

Mary se aliviava um pouco, pois, apesar de seu rosto ter sido manchado por pedaços cerebrais, já sabia de quem se tratava. Justamente por causa disso, ela também fica um pouco apreensiva. A singular de sangue se aproximava e enfim revelava seu rosto; seus cabelos eram lisos e curtos, amarrados atrás de sua cabeça como rabo de cavalo, e utilizava piercings na orelha esquerda. Mary reconhece na hora.

— Lucy. — seu tom não era de empolgação.

— Mary. — por outro lado, o tom e expressões de Lucy demonstravam raiva e até desprezo. — Tem culhão para voltar aqui, o que você quer? — a moça reparou no menino atrás das costas dela. — Ah... Então quer dizer que a sangue frio, indomável e sem escrúpulos Mary se tornou uma babá?

— Preciso de ajuda. — Mary dizia da maneira mais neutra que conseguia. Lucy reparou no braço retorcido da moça e na mão enfaixada do garoto.

— E por que eu deveria ajudar você? Eu não sou de guardar rancor, mas você é uma egoísta. — Lucy confrontava a moça.

— Você sabe que não tínhamos escolha. Queria sacrificar mais em prol de menos?

— Fala isso para o David, e a primeira coisa que você recebe é uma estaca de gelo na sua garganta. — a singular estava ficando irritada, sua mão estava coçando para mirar uma bala de sangue em Mary, porém algo segurou seu ombro por trás, impedindo-a.

— Deixe essa parte comigo, Lucy. — a ruiva olhou para o lado e viu um homem alto, com cabelos curtos e loiros, assim como seus olhos, que também eram amarelos por conta de seu poder. Ele ainda por cima tinha uma barba rala, utilizava uma jaqueta de flanela verde e uma camiseta branca com calças jeans e botas.

— Hum... — Lucy olhava para o rapaz e relaxava sua mão, logo em seguida cruzando os braços e deixando que o rapaz assumisse a conversa.

— Bruno. — a albina disse.

— Por que voltou, Mary? Já falei que não vamos enfrentar os heróis, e sabe bem que nem todo mundo gosta de você. — questionou.

— Eu não ligo para o linchamento de palavras. Eu preciso de ajuda, tanto nisso, — ela mostrou seu braço quebrado. — quanto contra os Heróis. E você vai me ajudar, lembra o serviço que fiz para você?

— Lucy, verifique se ela não foi seguida por mais alguém. — dito e feito. — Mary, mesmo que você tenha salvado minha filha, não posso simplesmente ordenar a todos da cidade para te seguirem contra os Heróis, você sabe que o David não superou ainda a morte do irmão.

— Ele sabe que não foi minha culpa, dezenas morreriam se eu tivesse voltado. — Mary pensava no que poderia fazer enquanto conversava. — Bruno, eu ouvi que vocês estão tendo muitos problemas com um grupo de singulares, né?

— Como descobriu? — perguntou ele.

— Encontrei um cidadão do seu vilarejo fazendo uma investigação num local próximo de onde estava, pode procurar pela Alice depois.

— A mensagem não deve ter chegado ainda. Certo, eu verifico depois.

— Então, para não haver problemas, façamos um novo acordo demoníaco, Bruno.

— Tem certeza disso, Mary? — perguntou Bruno, a moça olhava para Ethan em suas costas e acenava positivamente com a cabeça. Ele suspirou e, depois de ver que não tinha jeito mesmo, pois ele já sabia do que Mary era capaz com aquela espada, ele estendeu a mão para a singular e ela começou a brilhar num tom amarelado.

— Ofereço minhas habilidades aos Cicatrizes. — Mary começava o acordo.

— E, em troca, ofereço abrigo para os desabrigados. — Bruno continuava.

— Desde que Ethan e eu possamos receber ajuda se necessário. — Mary dizia.

— Com a condição de também ajudarem no vilarejo enquanto estiverem se hospedando nele.

— Eventualmente uma missão contra os Heróis será necessária.

— Porém virá de seu próprio carisma e vontade dos cidadãos escolhidos.

— Fecho este acordo absoluto.

— Caso um de nós o descumpra, este pagará com a vida.

Dito todas essas palavras, os dois apertaram suas mãos, ambas foram envolvidas em chamas azuis e, após um tempo, elas se dissiparam junto do brilho na mão de Bruno.

— Obrigado de novo, Bruno. — Mary dizia.

— Não me agradeça, eu não posso obrigar os nossos melhores singulares, como o David ou a Lucy. Se reconciliar com eles infelizmente vai ter que ser com você.

— Eu sei...

Lucy voltou da floresta e disse que estava tudo limpo, não havia sinal de alguém além do rapaz já morto ter seguido Mary. Bruno então explicava a situação para a singular, que, ao ouvir que Mary novamente estaria no vilarejo, fez uma expressão de certa forma decepcionada.

— O David vai ficar tão puto. Eu que vou ter que acalmar ele depois, você sabe, né? — a ruiva coçava a cabeça, ainda não aceitando de vez que aquilo era real. Lucy respirou bem fundo e se virou para a albina, acenando negativamente e revirando o olhar para cima. — Tá, que seja, melhor que nada.

— Fica tranquila, ele vai ficar bem. — Bruno dizia.

— Fala isso porque não é a namorada dele. — Lucy utilizou seu poder para puxar o sangue do corpo do rapaz morto, tentando retirar o máximo que conseguia. Logo após isso, o líquido flutuava em sua mão no formato de uma esfera. — Estende esse seu braço.

Dito e feito, Lucy então se aproximou de Mary e começou a fazer movimentos de mão naquele sangue flutuante, como se estivesse alterando algo nele.

— Meu tipo de sangue você já sabe, o dele é O positivo. — Mary dizia. A singular fica meio receosa de aplicar seu poder no garoto e olha para Bruno, que acena positivamente.

— O que o garoto tem de tão importante? — Lucy perguntou enquanto separava aquele sangue todo em duas esferas.

— Ele é minha esperança. — respondeu Mary.

— Hum, como sempre, só pensando em acabar com os Heróis. — retrucou a ruiva.

— Não, ele é só minha esperança mesmo.

Lucy fez uma expressão confusa, como se nada do que a moça tivesse dito fizesse sentido, afinal, aquela era Mary, uma das singulares mais letais que o vilarejo já viu. Mesmo que seu poder fosse um pouco limitado, já que não adicionava nenhum benefício físico ou mental, ela ainda tinha uma lista grande de mortes confirmadas de singulares e humanos comuns. Grande parte dos usuários de poder eram dos Heróis e, mesmo que enviassem alguém poderoso atrás dela, Mary simplesmente sumia do radar. Ela era basicamente chamada de Assassina de Heróis pelo vilarejo.

A ruiva então só ignorou o que ela havia dito e colocou a esfera de sangue que alterou no braço retorcido de Mary. O líquido se envolvia no braço da singular, que começou a sentir algumas dores, porque seus ossos, músculos, pele e tudo mais estava voltando para o lugar certo e se cicatrizando com a ajuda daquele sangue. O mesmo aconteceu com Ethan, só que, por estar praticamente anestesiado, ele nem reagiu.

Terminado o procedimento de cicatrização, Bruno pediu para que as duas o seguissem. Após chegarem na entrada do vilarejo, eles passaram e Mary sentiu um formigamento, pois lembrou que em volta dela havia uma barreira que protegia a cidade de ataques vindos de cima, e, se qualquer um que entrasse nela, o usuário daquele poder saberia na hora.



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