Volume 1 – Arco 2

Capítulo 13: Bem Vindo de Volta

Após tudo aquilo, voltaram para a casa na floresta, sem sequer terem pegado uma fruta para comer mais tarde, mas isso ao menos serviu para não tentarem mais gracinhas pelo próximo dia, ficando em casa, lendo e escrevendo, aprendendo aos poucos.

No dia da volta de Quevel, resolveram testar os novos poderes de Ahrija. De sua vida passa, Eliassandra pouco se lembrava de usuários de ar, inclusive entre o exército dracônico que enfrentou, a maioria era fogo e água, como se fosse um tipo de orgulho deles, talvez fosse.

Ahrija por outro lado parecia tão destrutivo quanto todos os dracônicos que conheceu. Sempre que tentava usar o elemento acabava não dosando direito e empurrando a si mesmo ora pro lado, ora para trás e às vezes até mesmo pra cima, fazendo Elia dar uma risada ou outra daquela situação:

— E você ri, né? — Ahrija reclamou se levantando do chão.

— E eu vou chorar?

A princesa se aproximou para estender a mão para o pequeno dragão que estava no chão, os pequenos chifres já estavam evidentes, ele parecia ter orgulho, nem escondia aquilo:

— Vamos lá, temos que esquentar a refeição. — Elia falou sorrindo.

Ahrija correu para dentro da cabana, indo direto pra cozinha, algumas coisas já tinha acabado, já que a princesa se provou uma comilona, as vezes comeu até fora de hora, ou isso, ou a comida de Quevel era muito boa.

Ou os dois.

O pequeno dracônico entregou algumas verduras para que Eliassandra cortasse, parecia tão animado que arrancava sorrisos calamos de Elia.

Aos poucos, mais comida era feita pela dupla, ambos ansiosos pela volta do mestre Quevel, até Elia começou a chamá-lo assim sem querer por conta de Ahrija:

— Então você nunca viu outra criança além de mim?

— Não é bem assim tá, é que o senhor Quevel me adotou quando eu era muito pequeno.

— Você ainda é pequeno.

Elia riu e Ahrija tentou jogar uma fruta nela, que por sorte se abaixou fazendo ela bater na parede, ambos deram risada daquilo, duas crianças, mas claramente independentes a sua maneira: Elia era inteligente, sabia aprender rapido, já Ahrija era bom em serviços domésticos e em cozinhar, nesses dois dias souberam separar bem o tempo entre manter a casa arrumada e explorar os novos poderes do dracônico.

Estavam tão animados e presos nas suas tarefas que nem perceberam quando aquela figura alta aparece na porta com um sorriso calmo, mas cansado da viagem:

— Oh, cheguei cedo?

— Mestre!

Ahrija deixou todos os seus afazeres, correndo até seu mestre e pulando nos braços dele:

— Bem vindo de volta, senhor Quevel. — Elia saudou em cima do banquinho que usavam para cozinhar, já que a bancada era muito alta.

— Oi Ahrija. Olá princesa. — Ele saudou.

Abraçava Ahrija com carinho, tal qual um pai que voltou de uma longa viagem, mesmo que fossem apenas dois dias. Aquilo fez Elia pensar em como seria quando seus a vissem de novo, mesmo com aquele novo olho… Ainda iriam a reconhecer.

Não apenas isso, o cabelo também estava ficando mais cheio, mas não formavam ondas como sua mãe.

Quevel estava focado no abraço, até sentir aqueles chifres em crescimento, afastou o garotinho de si e suspender no ar, olhando bem seu rostinho animado e infantil:

— Você tem chifres? — Estava surpreso, mas logo começou a dar risada, girando Ahrija no ar. — Vocês despertou! Ahrija você despertou!

Estava radiante, girando seu pupilo nos braços, animado por aquilo, mas lá no fundo… Um tico triste, afinal ele perdeu esse momento tão importante para qualquer criança naquela idade:

— Qual elemento? Como foi?

— Ah, ele despertou com o elemento ar e foi me salvando de lobos do mato. — Elia sorriu.

Quevel parou com aquela onda de felicidade, encarando os dois, duas crianças… Sozinhas por dois dias e quase foram mortos por lobos do mato, deveria puni-los, sabia disso, mas sinceramente? Pra que? Eles estavam vivos, e bem, não pareciam estar machucados, se desse tudo errado nem vivos estariam.

Por que reclamar quando algo tão maravilhoso quanto o despertar ocorreu? Apenas riu abraçando seu pupilo mais uma vez:

— Esse é meu garoto, salvando a princesa em perigo.

— É! — Ahrija comemorou.

Elia fez bico e voltou a mexer a panela de cima do banquinho, mas quando virou o rosto acabou sorrindo, era bom ver essas interações de famílias diferentes… Talvez se não fosse inimigos, sua vida passada iria gostar de ter ele como seu mentor:

— E você, princesa? E seu olho?

Elia pensou e tocou o proprio rosto, não sentiu nada de diferente, então deu de ombros, sinalizando que não deu em nada ainda:

— Não quer ir tomar banho? Almoço vai demorar. — Elia pediu.

— Sim, eu preciso, ah, a carta já foi enviada.

Quevel deixou a bolsa que carregava em cima de uma cadeira e logo foi tomar seu banho naquele banheiro que os três dividiram atualmente, era um pequeno comodo, e o único da casa que era separado por uma porta, por segurança.

O dracônico finalmente pode descansar, a viagem até a cidade mais próxima só era rápida assim pois usava sua forma de dragão e voava sem parar, caso contrário era quase uma semana inteira até chegar lá. 

Agora podia tirar suas roupas de viagem revelando o corpo não apenas esculpido pela guerra em cicatrizes como também os músculos que ainda cultivava. De todas as cicatrizes uma chamava atenção, era semelhante a uma queimadura que pegava todo seu ombro, a lembrança que aquele monstro o deixou.

Como um general, naquela época chamou para si a responsabilidade de parar aquele monstro, poucos sobreviviam dos encontros com ele, e quem sobrevivia dizia coisas que não faziam sentido, até que finalmente pode enfrentá-la cara a cara. Quão grande foi sua surpresa quando viu diante de si uma garota humana, de pele acinzentada de tão branca, olhos mortos e sem vida, empunhando um cajado.

Para ele… Aquilo era uma criança, ou deveria ser, pela situação que viu mais parecia uma sombra do que deveria ter sido — era uma criança de guerra, e antes mesmo que poder falar algo ela lhe atacou.

Não era um exército.

Não era um batalhão.

Nem mesmo uma infantaria.

Era apenas uma criança que não deveria ter mais que 15 anos lhe atacando com uma magia que até pessoas adultas teriam dificuldade, sabia que todos a chamariam de monstro, que teriam medo dela, mas Quevel, mesmo sendo atacado…

Só sentiu pena.

Uma criança moldada em guerra morreria na guerra, mesmo que seu corpo sobrevivesse, sua alma já tinha morrido a tempos.

Ficou perdido naqueles pensamentos sentindo a água caindo pelo seu corpo daquele chuvueiro improvisado que tinha construído, queria ter salvado aquela criança.

Se perguntava que fim levou aquela criança, afinal ela deveria estar perto de seus vinte e cinco anos agora, se é que ela realmente tinha aquela idade, ainda lembrava daquele terror que viu no rosto dela quando foi atingida.

Os olhos arregalados, as mãos frágeis apertando o cajado e finalmente dando as costas e correndo com medo, guardava aquele segredo para si: ele a deixou fugir.

No fundo tinha esperança que ela talvez mudasse, mas nunca teve essa resposta, nem sabia se ela estava viva, torcia para que sim, mas no fundo sentia que ela já tinha partido…

Era uma pena.

Na cozinha as duas crianças estavam arrumando a mesa com três pratos enquanto conversavam sobre trivialidades da vida enquanto estavam ali, Quevel demorou um pouco para sair do banho, com os cabelos ainda úmidos e roupas mais leves:

— Que prestativos, cozinharam pra mim?

— Sim! — Ahrija.

— Na verdade precisamos cozinhar porque ficamos sem comida. — Elia entregou.

Ahrija deu língua emburrado para Elia que parecia sempre fazer questão de cortar seu barato, Quevel deu uma risada com aquilo, para ele era muito fofo ver aquela interação entre duas crianças:

— Mestre! Conte sobre sua viagem! — Ahrija sorriu.

Agora os dois estavam à mesa com Quevel, o garotinho tinha olhos animados e ansiosos, já a pequena tinha olhos curiosos para Quevel, não pensou que eles iriam gostar de saber disso, mas de fato… Ahrija não conhecia muitas pessoas já que moravam isolados na Floresta Negra:

— Bem… A vila mais próxima daqui é uma de Aures e…

— Aures?! De verdade?

Os olhos de Elia se iluminaram, aures eram um povo muito recluso na sua antiga vida, seres humanóides que mesclavam características animais com humanos, uma afinidade natural com a magia da natureza.

Eram seres quase místicos em sua antiga vida, e tinha uma vila inteira deles?

— Podemos ver? Por favor?

— Ah, você quer?

— Sim!

Elia estava ansiosa para ver aquelas pessoas, Quevel sorriu com aquilo, agora ao menos ela o deixava menos desconfortável, os olhos estavam mais vivos, lhe dava um calor no coração:

— Bem, iremos precisar ir de qualquer forma. É mais fácil seus pais chegarem do que no meio da floresta.

O sorriso de Elia ficou ainda mais vivido e brilhante, até se apressou para comer mais rápido:

— Quando vamos?

— Eu acho que preciso dormir um pouco, e também de uma explicação sobre os lobos.

— Ah…

Os dois pareceram murchar como bexigas, fazendo bico, não estava bravo, só queria entender como aquilo aconteceu.

Conduziu os dois ao quarto para que explicassem bem o que aconteceu, claramente ficou surpreso ao saber que só estavam vivos por conta daquilo, foi realmente muita sorte para os dois que aquilo aconteceu bem na hora:

— A princesa disse pra eu soltar ela! Acredita?

— Era a melhor solução na hora. — Elia resmungou.

E ali estava, uma mistura entre uma pessoa muito mais velha com uma criança como deveria ser, aquela atitude surpreendeu Quevel, de fato… A ideia da princesa fazia sentido visto a situação que os dois ficaram, mas… Não era natural uma criança tão pequena pensar em morrer assim.

Talvez não morrer.

Foi uma estratégia inteligente e básica de guerra, já tinha visto na prática, mas… Por que ela pensou naquilo?

— Princesa… Você está bem? — Quevel perguntou seriamente

Elia ficou encarando o mestre dracônico sem entender, até sorrir calmamente, até com uma maturidade que ele não sabia que aquela criança tinha:

— Sim, eu estou, senhor. — Garantiu sorrindo. — Mas por favor, não me chame assim. — Fez bico no final.

Não conseguiu não rir, bagunçando os cabelos de Elia com certo carinho, ela realmente ficava fofa fazendo bico:

— Certo, Eliassandra, melhor assim?

— Sim. Obrigada.

— Mas eu vou continuar te chamando de princesa! — Ahrija riu abraçando sua mais nova amiga.

Mais uma risada do dracônico mais velho, vendo Ahrija abraçando com força e Eliassandra o empurrando dizendo que não gostava dele, mas era mais uma brincadeira entre os dois:

— Bem, então vamos viajar para a vila, mas antes eu realmente preciso dormir…

Mesmo que estivesse tentando, ele estava mesmo cansado daquela viagem sem parar, precisava descansar um pouco, e ainda precisava ver e ensinar sobre os poderes de Ahrija. Raramente viu dracônicos com aquele elemento, quem diria não é mesmo?

— Ei senhor, os dracônicos só tem um elemento? — Elia

— Alguns têm mais de um, mas é bem raro, não quer dizer que não podem ter.

— Eu posso ter? O senhor tem?

Ahrija tinha olhos cheios de expectativa e animação, Quevel quase sentiu culpa por cortar as pequenas asas dele:

— Não, eu sou um especialista em fogo e só, mas sim, você pode ter, isso é incrível.

— Meu próximo elemento vai ser fogo! — Ahrija sorriu colocando as mãos na cintura e empinando o nariz.

Elia sorriu comemorando, incentivando ele, sabia que ele não podia escolher isso, mas quem liga? Se perguntava se ele iria conseguir isso, mas adoraria se fosse assim.

Quevel passou a mão no rosto, e então bocejou, agora que passou toda a adrenalina da viagem sentia o corpo cansado, gostaria de ficar mais tempo conversando com as duas crianças, ouvindo sobre seus feitos, mas não iria aguentar. Se levantou cansado, caminhou até o quarto e deixou o grande corpo desabar na cama.

Ahrija riu.

Elia arregalou os olhos, quão forte eram aquelas camas que ele simplesmente poderia se jogar e não quebrar? Quevel era enorme! Não só de tamanho, mas ele parecia pesado pelo corpo musculoso que tinha:

— O mestre realmente cansou da viagem.

— Percebi, vou recolher e lavar os pratos.

— Certo! — Ahrija concordou sorridente.

Estava em êxtase pelo mestre ter voltado e já estar animado pelos seus novos poderes, logo poderia treinar com ele! Era seu sonho se realizando aos poucos.

Tinha uma admiração imensa por Quevel, ele lhe acolheu quando ninguém olhava para si, além de órfão, ainda era menor do que os dracônicos de sua idade.

Nem lembrava que logo, sua primeira amiga iria embora viver sua vida, e Elia não tocava no assunto. Não queria ver a tristeza dele. Naquele momento, mesmo que Quevel ainda lhe desse arrepios, tinha eleito Ahrija como seu amigo.

Talvez se preservasse mais a felicidade de Ahrija… Poderia ter o perdão de Quevel pelas desgraças que fez em sua vida passada.

Quem sabe…?

Ferrer e Ian D'Ank

Príncipes e irmãos mais velhos de Eliassandra

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