Paladino Branco Brasileira

Autor(a): Jr. Ferreira


Volume 1

Capítulo 4: Camélia Michaelson

CAMÉLIA MICHAELSON

Os dias arrastavam-se desde a minha última visita a Nathaniel, e eu me sentia cada vez mais debilitada, consumida por esta doença implacável.

Eu estava deitada em meu quarto, sendo examinada por um médico, enquanto Louis mantinha-se ao meu lado. O silêncio opressivo preenchia o ambiente, tornando-se ainda mais pesado com a angústia que habita nossos corações.

Louis, ao me observar, exibia nos olhos uma mescla de frustração e raiva. Ele acreditava firmemente que a culpa pela minha enfermidade recaía sobre Nathaniel e sua condição de amaldiçoado. Para ele, a ausência de magia em nosso filho era a raiz de todos os males que me afligiam.

 — Se aquele moleque não fosse um amaldiçoado, você estaria forte e saudável  — desabafa com amargura.

— Por favor, evite esse tipo de comentário, vindo de você, é especialmente difícil de suportar — respondi.

Louis permaneceu calado por um momento.

Mesmo ele estando ao meu lado, sinto-nos cada vez mais distantes. Uma barreira invisível se ergueu entre nós, alimentada pela incompreensão e pela mágoa. Eu o amo, mas também amo nosso filho, e é meu dever protegê-lo, mesmo que essa doença debilite meu corpo.

Enquanto as palavras de Louis ainda reverberam em minha mente, faço uma última tentativa:

— Por favor, Louis… Não coloque a culpa em Nathaniel. Ele não tem responsabilidade sobre minha doença.

No entanto, ele apenas desvia o olhar, incapaz de compreender a profundidade das minhas palavras. 

O médico termina seu exame e deixa o quarto, eu e Louis nos encontramos em um silêncio carregado de significados não ditos. 

A angústia dentro de mim cresce à medida que vejo o abismo crescente entre nós. Ele prioriza seu desejo por poder e status, ignorando o amor e o bem-estar da nossa família. Meu coração se parte ao testemunhar essa transformação em um homem que uma vez amei profundamente.

 

LOUIS MICHAELSON

Após o médico deixar o quarto, fui chamado por um dos empregados da mansão. Deixei Camélia aos cuidados de uma serva dedicada e me dirigi ao meu escritório, um salão imponente que refletia o poder e a tradição da família Michaelson.

O ambiente exalava grandiosidade, com suas estantes de livros que alcançavam o teto, abarrotadas de conhecimento acumulado ao longo dos séculos. Poltronas luxuosas e bem talhadas convidavam ao descanso, enquanto a mesa no centro do salão ostentava o brasão da nossa família, símbolo de nossa linhagem nobre.

Adentrei o escritório e me deparei com o médico, cujo rosto refletia preocupação. Ele era um homem de idade avançada, com olhos cansados que denotavam anos de dedicação à ciência e à magia. 

A expressão grave em seu rosto despertou em mim um pressentimento sombrio.

Aproximei-me da mesa e me sentei em uma das poltronas, convidando-o a fazer o mesmo. O médico suspirou e começou a falar, suas palavras pesadas como chumbo no ar.

— Marquês Michaelson, lamento informar que o caso da Lady Camélia é extremamente delicado. Ela está sofrendo de uma doença rara, cuja cura ainda escapa à ciência e até mesmo à magia.

Meu coração apertou-se ao ouvir aquelas palavras. Camélia, a mulher que um dia amei profundamente, estava condenada por uma doença cujo fim era incerto. A imagem imponente e fria que eu carregava como um escudo começou a rachar, revelando as profundezas de minha angústia.

Inquieto, questionei o médico: 

— Mas o que podemos fazer? Existe alguma esperança?

O médico baixou o olhar, parecendo carregar o peso de uma verdade insuperável. 

— Infelizmente, Marquês, não temos muitas opções. A doença que aflige Lady Camélia é tão rara e complexa que nem mesmo a ciência ou a magia avançaram o suficiente para encontrar uma cura… Ela não tem muito tempo.

Um nó se formou em minha garganta, as palavras do médico ecoando em meus ouvidos. O peso da responsabilidade por meu próprio fracasso como marido e protetor de nossa família parecia sufocar-me.

Agora, diante da inevitabilidade da perda iminente, as rachaduras em minha imagem idealizada de família começará a desmoronar, revelando um abismo de frustração e tristeza. Enquanto absorvia a magnitude da situação, senti uma mistura avassaladora de culpa, medo e um amor ainda latente por Camélia. Ela estava à beira da eternidade, e não havia poder terreno capaz de impedir esse destino implacável.

Nesse momento, a grandiosidade do meu escritório parecia vazia, incapaz de preencher o vazio em meu coração. Todo o poder e status que tanto me esforcei para alcançar não tinham valor diante do inevitável destino da Camélia.

Enquanto continuávamos nossa conversa no escritório, eu olhava com desespero para o médico, esperando que ele me desse uma resposta que pudesse aliviar a angústia que me consumia. Com uma voz trêmula, questionei: 

— Existe algum método, alguma forma de retardar a progressão dessa doença?

O médico suspirou profundamente, parecendo carregar o peso de todas as incertezas do mundo. Ele me fitou com olhos tristes e respondeu com sinceridade: 

— Marquês Michaelson, eu temo que não exista um método comprovado para retardar a doença. No momento, tudo o que podemos fazer é continuar o tratamento e rezar para que os deuses tenham piedade da Lady Camélia.

A frustração e a raiva me consumiam, e Nathaniel continuava sendo o alvo de meu ressentimento. Cegado pela ira, eu proferi palavras impulsivas: 

— Se aquele verme não tivesse nascido, não estaríamos passando por essa situação. Ele é a causa de todo o nosso sofrimento!

O médico apenas balançou a cabeça, compreendendo o peso da minha raiva, mas sem poder oferecer consolo ou solução para o meu conflito interno.

Após algum tempo, deixei o escritório e retornei ao quarto onde minha esposa repousava. Era um espaço majestoso, como um quarto de um rei, com cortinas longas e douradas, móveis elegantes e aconchegantes. No centro, uma cama imponente com dossel envolta em tecidos finos e macios.

Adentrei o quarto com o coração pesado, segurando a terrível notícia que abalaria a essência de nossa família. Camélia me olhou com expectativa enquanto eu me aproximava, e eu percebi a angústia refletida em seus olhos.

Com a voz embargada, dei a notícia devastadora: 

— Camélia... tive uma conversa com o médico. — Fiz uma breve pausa, meu olhar buscando os dela. — Você está enfrentando uma doença extremamente rara. E, infelizmente, ele me disse que não há cura. O tempo que nos resta, é pouco.

Um silêncio opressor encheu o quarto, como se a própria doença tivesse se materializado ao nosso redor.

Após um período de reflexão, ela reuniu forças e começou a implorar:

— Por favor, Louis, traga nossos filhos para me verem. Todos eles, inclusive Nathaniel. — A fragilidade de sua voz ecoava no quarto. — Eu suplico traga eles aqui, por favor!

Contudo, a raiva e o ressentimento ainda fervilhavam em meu coração. Eu não podia suportar a ideia de ver Nathaniel, a lembrança viva do meu fracasso como pai, diante da doença que consumia a vida de Camélia.

— Você pede algo que não posso conceder.

— Louis, você... você não vai trazer meus filhos para me verem? — Camélia perguntou, sua voz estava trêmula e atônita. — Você vai negar... o meu último pedido?

— Camélia, eu levei a sério o que você pediu. Vou trazer Metternich e Emma para vê-la — respondi calmamente, mas com firmeza. — Eu... apenas acho que a situação com Nathaniel é... complicada demais.

Neste momento, afastei-me dela e caminhei em direção à porta do quarto. Enquanto eu me afastava, sua voz desesperada ecoou pelos corredores:

— MONSTRO… VOCÊ É UM MONSTRO, LOUIS MICHAELSON!

Caminhando pelos corredores da mansão, eu me amaldiçoava e culpava Nathaniel por todas as provações que minha família enfrentava. A escuridão da minha alma se intensificava a cada passo que eu dava, mergulhando-me ainda mais na sombra da ira.

 

NATHANIEL MICHAELSON

Era tarde da noite, eu estava quase adormecendo, quando um estrondo ensurdecedor sacudiu minha tranquilidade. Saltei da cama num sobressalto, olhos arregalados, coração martelando no peito. Cheguei à janela, o quarto ainda mergulhado em escuridão, e a visão do lado de fora revelou-se como um pesadelo.

O céu noturno estava banhado por uma luz alaranjada, como chamas ardentes brotando do bosque ao lado da mansão. Pássaros aterrorizados cortavam os céus, as asas batendo freneticamente enquanto fugiam da ameaça invisível.

A explosão, mesmo a distância, era impressionante. Seu clarão brilhante e selvagem iluminava a paisagem noturna, pintando o horizonte com tons flamejantes. Um trovão estrondoso acompanhava o espetáculo, estremecendo as árvores e o chão.

Minha mente estava em suspenso, incapaz de processar a realidade diante dos meus olhos. 

Foi então, que uma onda de choque surgiu da explosão, violenta e voraz, rasgando a escuridão e avançando em direção à mansão. A força da explosão atingiu a torre em que eu estava, me empurrando contra a parede com força brutal.

Fiquei atordoado, o ar foi forçado para fora dos meus pulmões pelo impacto. Lutei para recuperar o fôlego enquanto o tumulto lá fora persistia, inabalável.

Então, em meio à cacofonia do caos, um grito ecoou na noite, agudo e dilacerante:

— CAMÉLIAAA…

Uma onda de pânico me percorreu, e eu soube, com uma certeza terrível, que algo horrível havia acontecido.



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