Volume 10 – Arco 4
Capítulo 98: Poder das memórias.
Leon
— Esse é… o meu desejo.
Após todos os acontecimentos no inferno, não voltamos lá e Thiago não queria me contar o que viu depois de mim, ele sempre ignorava o fato de eu perguntar alguma coisa.
Fome, sede, ou qualquer necessidade humana não afetava o nosso corpo, então poderíamos andar por milhares de anos que nunca sentimos a necessidade de dormir… por conta disso a nossa aventura foi extremamente simples, mas sem um destino em mente.
— Pra… onde estamos indo?
— Não sei também. Só tamo andando por aí.
Thiago não tinha ideia de pra onde ir, já que não tinha como ele fazer sua vingança. Sem contar que ele não sabia lutar, e muito menos sabia uma forma de encontrar o pai.
— Temos que treinar de alguma forma…
O lugar onde estávamos era uma floresta que parecia acabada, então ficamos em alerta com qualquer barulho que surgisse. Era triste a nossa situação, mas necessária…
"O que será que eu devo fazer agora…"
Isso não era um pensamento só do Thiago, mas sim de todos. O caminho solitário causava um sentimento ruim, e mais do que isso, a saudades de estar em um lugar onde tínhamos controle da situação também atingia a gente.
— Mas será… que tudo tão ruim assim?
Uma voz misteriosa atingiu meus ouvidos, não… a minha mente. Não consegui ler a mente desta pessoa, por isso foi uma surpresa saber que havia outro alguém sem ser eu e meu irmão, olhei assustado para todos os lados.
— Não tenha medo, vai ficar tudo bem.
Era masculino e parecia transmitir um poder tão forte… rapidamente comecei a sentir olhares terríveis vindo de todos os lados, Thiago não parecia sentir a mesma coisa, por isso ele estava "bem". Mesmo assim, me agarrei no meu irmão, com medo de alguma coisa acontecer, ele tinha interpretado como se eu estivesse com sono, e que quisesse chorar por tudo o que aconteceu, ele não entendia… não tinha a mínima ideia do que estava acontecendo comigo, e por mais que eu quisesse o apoio dele, naquele momento… não tinha como ter.
O medo se aproximava de todos os lados.
“Não precisa ter medo… Não precisa ter medo… Não precisa ter medo… Não precisa ter medo…”
E isso se repetia milhares de vezes até um homem encapuzado aparecer na nossa frente… seu rosto era extremamente difícil de olhar, isso por conta da escuridão em volta dele.
— Parece que vocês… finalmente saíram de lá, certo?
Sua voz era grossa, e dava uma sensação de morte…
— Sim, o que mais você quer de mim agora?
— Mais nada, Thiago… só que siga o plano.
— Certo… senhor Riki.
— Vá de encontro a Nina, ela te dirá o que fazer.
— E como vou encontrá-la?
— Você sabe onde ir… pois seu irmão irá guiá-lo.
Thiago estala a língua.
— Eu já falei para deixá-lo longe disso, todo o seu plano não estava envolvendo ele, por que logo agora?
— Ora, ele consegue escutar a voz dela.
O que estava acontecendo ali? Nem eu mesmo sei… uma voz na minha mente dizia que eu não podia falar nada, que estava proibido de perguntar alguma coisa… por conta disso tentei deixar de lado todas as minhas perguntas, mas Thiago tinha um plano com essa pessoa, que fez a gente sair do inferno e entrar nessa terra desconhecida, mas por qual motivo ele queria fazer isso?
— Lembre-se… aquele lugar, você deve ficar lá até vê-lo.
— Certo.
O homem que foi nomeado de Riki sumiu enquanto corvos voavam em volta dele, mesmo em meio a escuridão da floresta, no horizonte havia uma luz que aos poucos iluminava todo o lugar. Com isso… meu irmão continuou andando pelo horizonte, o silêncio foi cada vez mais brutal naquele momento, e não havia nada que eu pudesse fazer para quebrar aquilo.
— Talvez… em algum momento eu vou te explicar o que aconteceu.
— Hm?
Thiago me olha, e dá um sorriso, nem mesmo eu poderia explicar o que estava se passando na sua mente, nossos olhos se encontram de leve, mas nada acontece além disso, ele parecia uma mãe cuidando da sua própria criança, já que estava tentando me proteger…
— Bem, você deve estar curioso sobre isso, não? Então um dia eu te contarei tudo, quando der certo…
— Mas… e se não der certo?
— Vai dar certo.
Continuamos andando sem ter um rumo, enquanto isso uma estrela brilhava na nossa frente, dando luz a todo o lugar que estávamos… e com isso…
— Vamos encontrar a Nina, tem algo que podemos fazer.
“Venha… por aqui.”
Uma voz gentil falava na minha mente, dizendo o caminho que deveríamos seguir… por algum motivo, essa voz gentil já falou comigo algumas vezes antes, então… a saudades que deu ao escutar algo que tinha na minha vida.
— Thiago… vai por esse caminho!
— Por que?
— Só vai, só vai…
— Ok…?
Ele correu por um tempo por onde eu falei que deveria, as árvores que haviam no caminho eram imensas, mas ainda sim foi fácil caminhar por um caminho tão extenso assim… Corremos até sair da floresta, e assim que vimos construções… paramos por um tempo. Era um lugar extremamente bonito, havia torres entre outras coisas assim…
“Esse lugar… está parado no tempo.”
“A gente deveria ter mais tecnologia…”
“Já está ficando de manhã, hora de abrir o comércio.”
“O que será que a princesa Emilly está fazendo agora?”
O pensamento dos outros não era tão ruim quanto o que tinha no inferno, aqui na terra… é tudo mais tranquilo.
“Por… aqui!”
A voz seguia um caminho estranho e que era totalmente diferente, passava por rios, caminhos estreitos, pontes, matos… qualquer coisa, só para chegar em uma ponte de madeira estranha. Era a coisa mais bonita de se ver, de um lado da pequena ponte havia um reino vivo, lindo e perfeito. Do outro lado da ponte havia um reino morto… mas…
— Está… vivo de novo?
Quando começou a chover, tudo naquele reino ficou vivo de novo, e novamente… tudo morreu após a pequena chuva que deu.
— O que seria isso, Thiago?
— Não sei, mas é muito lindo.
— …
Passamos pela ponte indo em direção ao reino vasto e morto…
“Tenha calma, minhas crianças, estou aqui para ajudá-los…”
Todo aquele lugar morto, e até mesmo todo o lugar vivo… qualquer coisa, tudo se torna branco.
um lugar que não tinha cheiro, calor, frio, não havia nada além de mim… e do meu irmão. As vozes das outras pessoas sumiram, e tudo… absolutamente tudo… sumiu. Medo? Tristeza? Dor? Não… não havia nada no meu coração, os batimentos estavam desorganizados, rapidamente se organizam e tudo fica em sincronia. Na nossa frente, tinha uma bolha de escuridão… e era o que estava falando com a gente, lá de dentro sai uma pessoa… Ela estava deformada e estava sem seus olhos, havia um pano preto envolta deles.
— Bem-vindos… ao meu reino.
Sussurros que não falavam nada com nada começaram a surgir na minha mente, e uma melodia começou a ser cantada… essa melodia aquecia o coração de quem ouvia, e aquilo parecia ser uma forma de hipnotizar alguém. O sorriso que essa pessoa estranha estava dando era extremamente malicioso, e parecia que ela estava tentando fazer alguma coisa com a gente… talvez… hipnotização.
Dor… sofrimento? O que era isso? Sentimentos humanos não eram algo explicado pra mim, não era algo que eu sentia. Pequenos lugares da minha mente aos poucos sumiram, e tudo que eu tinha em mente… estava sumindo…
O inferno não tinha cor, não tinha forma, não tinha essa palavra na minha mente… meu nome já não era Leon, ele nem ao menos existia.
Uma mão gentil toca meu rosto, causando uma leve sensação de desconforto…
— As suas memórias… são tão deliciosas.
Então… aquela sala branca já havia se tornado tudo pra mim, qualquer coisa que eu fosse pensar era branco… a dor é branca, o sofrimento é branco, a felicidade é branca, o medo é branco…
Aquela sala significava a minha vida, aquela sala significava tudo. O tempo já não fazia mais sentido… a minha vida… já não tinha mais sentido.
Aquela pessoa sorriu enquanto tudo isso acontecia com a gente, e eu esqueci de tudo… após isso eu caí no chão, e meu irmão caiu do meu lado… meus olhos se fecharam… e eu perdi a consciência.
— Já está tudo certo?
— Sim, Riki.
— Se de alguma forma eles acordarem e se lembrarem das coisas?
— Impossível.
— Como pode ter tanta certeza?
— As memórias deles estão comigo, pode confiar.
— Entendi.
— E agora, o que será feito?
— Vamos esperar um tempo, até ele passar por aqui… está tudo planejado.
— Você acha que esses dois são capazes de matar ele?
— Tenho mais que certeza.
— Sabe me dizer onde se encontra agora?
— O tempo aqui está passando muito rápido, talvez nesse momento ele esteja na academia de batalha.
— Então posso viver aqui… mais um tempo.
— Claro, só lembre de uma coisa.
— O que?
— Não morra, em hipótese alguma.
— O que faz você ter essa desconfiança de minha pessoa?
— Ele… pode ter aquele poder.
— Ahahaha, ele não pode me apagar…
— Não sabemos o limite de sua força, nem ao menos se ele pode apagar o conceito de existir.
— Entendi… pode deixar comigo, a jornada dele acabará aqui.
— Obrigado. Agora… vou me encontrar com Solveig, até mais.
— Tchau.
Corvos começam a cantar até sumirem todos de uma vez, essa conversa aconteceu enquanto eu acordava, mas… decidi ficar quieto para ver o que dava para escutar, essas vozes, nomes, e qualquer coisa do tipo não me eram estranhos, mas não sabia o que estava acontecendo, até pouco tempo atrás algo acontecia na minha vida, mas não me lembro, nem tenho certeza do que deveria fazer em relação a isso.
Após meu irmão acordar e me levantar junto com ele, essa tal pessoa vem em nossa direção.
— Vocês agora são meus, e eu poderei fazer o que quiser com vocês.
A palavra dela era como se fosse uma ordem, não havia uma forma de passar por cima disso, tudo na minha mente dizia para obedecê-la, e nunca… nunca na vida questionar uma de suas ordens.
— Vocês vão encontrar um humano daqui um tempo, talvez ele esteja acompanhado… quero que matem ele, mas só depois de eu brincar um pouco…
Ela continuou falando sobre esse tal humano, o nome dele é Hideki e provavelmente estaria acompanhado de uma garota chamada Shiori, nós dois teríamos que esperar Nina fazer suas brincadeiras para assim conseguirmos matá-los… com isso, voltamos para a floresta em um estalar de dedos…
“Não… faça isso…”
Uma voz na minha cabeça aparece, pedindo para não fazer nada do tipo.
Olhei para os lados, pois não sabia que poderia fazer essas coisas, ignorei por um tempo e assim vejo que duas espadas surgiram na nossa frente, e elas caíram no chão… estranhamente era a única coisa que ainda ficava inteira.
Quando me abaixei para analisar e pensar direito se é com isto que devemos matar aquela pessoa, essa mesma voz surge na minha mente…
“Por favor, Leon, não segure essa espada!”
Olhei para os lados, pois estranhamente… esse nome não me era estranho, como se fosse o meu nome. Naquele momento era como se alguém estivesse me chamando e tentando falar comigo, mas… não sei quem era, não me lembro… não me lembro de nada.
De alguma forma eu sabia que não deveria segurar essa espada, mas por que eu não poderia segurá-la? O que me impedia? Era a voz? Não… havia palavras tão fortes no meu coração que nem conseguia sumir, não segurar uma espada, proteger quem ama, e dar felicidade para as pessoas que estavam em volta, eram essas as palavras que estavam no meu coração… mas…
O que é felicidade? Não… não era o que eu deveria estar pensando, e sim em como eu traria essas coisas para alguém. Uma luz aparece na minha frente, talvez fosse algo que só eu conseguia ver… aquela luz, não… aquele anjo me trouxe de volta algo que foi arrancado de mim a pouco tempo.
Memórias? Não… sentimentos.
Coisas que nem ao menos soube o que era, na verdade… parece que nunca entendi essas coisas desde que existi, desde uma época sombria na minha vida que nem lembro… essas coisas… esses sentimentos… por que estão florescendo no meu corpo logo agora? Pessoas se aproximaram no horizonte, e logo sumiram em poucos momentos, enquanto tudo isso acontecia eu fiquei lá, esperando que algo acontecesse comigo. As ordens de Nina foram descumpridas, eu deveria ser punido… mas nada acontece, na verdade o vento forte só bate nas minhas costas… e tudo começa a mudar de cor.
Os céus ficaram laranjas, a grama fica preta, as árvores começam a sumir, e tudo naquele lugar fica estranho, o inverso das cores, dos sentimentos, dos sentidos, de tudo… e assim fica por um tempo, até que aquelas pessoas estranhas voltam do nada, e tudo volta ao normal.
Estranhamente um sentimento ruim se passa pelo meu corpo, como se eu tivesse ganhado centenas, não, milhares de informações de uma vez. Todas as minhas memórias estavam voltando ao normal… algo que durou muito pouco tempo, Thiago também… aconteceu a mesma coisa com ele, mas em todo esse momento onde eu estava sozinho, quieto no meu canto, ele estava sumido…
Sua voz aparece na minha mente, e logo corro para ver o que estava acontecendo…
Em meio a tudo isso, uma explosão de vidro aconteceu, que tornou todo o reino que estava em branco… em uma destruição completa, era como se uma guerra tivesse acontecido por aqui.
— Hideki… calma!
— CALMA? CALMA O QUE? OLHA O QUE ESTÁ ACONTECENDO COM A SHIORI, NÃO PODE SER ASSIM, NÃO PODE!
Vozes começam a ser escutadas, enquanto isso vejo Thiago atrás de um arbusto, preparado para falar com essas pessoas misteriosas que estavam na nossa frente, ele me percebe, segura a minha mão e me coloca atrás dele.
— PARE, JOVEM!
Thiago se levanta e assim corre um pouco em direção para aquelas pessoas.
— O que está acontecendo por aqui? Parece que temos convidados!
Tento fazer ele parar, mas não consigo de forma alguma, algo estava acontecendo para ele ficar assim, e o que era? Eu não consigo entender ele depois de tudo isso que aconteceu…
— Ei… não precisa fazer isso… a gente poderia só ignorar…
— Ignorar? Como assim ignorar… pessoas precisam da nossa ajuda e é a nossa hora de brilhar! Vamos fazer igual ela!
Thiago fala de uma pessoa na qual não conheço, mas que aos poucos surge na minha mente, ele estaria falando da mamãe? Não sei dizer… mas algo estranho acontece na minha cabeça, não posso explicar direito pois nem eu entendo o que está acontecendo, mas um nome surge… um nome que deveria ser citado por qualquer um. Solveig.
— Calma, está tudo bem, não estamos aqui para atacá-los, e sim para ajudá-los, da mesma forma que nos ajudaram!
— Quem é você?... — pergunta o garoto de cabelo roxo.
— Eu? Meu nome é Thiago, e esse tímido aqui é meu irmão mais novo, o Leon.
— Ajudar? Nós não fizemos nada para ajudar outra pessoa.
— De certa forma é verdade, mas vocês nos salvaram, dava para ver a luta de longe…
Thiago conseguiu ver a luta, mas o que era essa luta? Eu não consegui ver nada de onde estava…
— O que?
— Nina, a deusa das memórias estava controlando muitas pessoas, incluindo eu e meu irmão nisso!
— …
— Ela estava tentando fazer com que esse lugar fosse protegido pela gente, mas na verdade… não conseguiu muito bem!
— Entendo.
— No caso, Nina tomou nossas memórias e tentou nos usar. — expliquei;
— Ei, cortou o que eu estava falando!
— D-Desculpe…
— Enfim, da mesma forma que vocês nos ajudaram, vamos ajudar vocês!
Meu irmão falava com tanta prioridade que estava tudo bem que aos poucos decidi seguir o que ele estava fazendo, mesmo que parecesse estranho e sem noção alguma, ajudar pessoas que nem ao menos conhecemos… é ruim.
Existia algo que ele teria que me explicar, e era tudo isso que estava acontecendo nesse lugar, o que ele sabia? Como ele sabia?
Eu queria saber de tudo o que ele sabia.