Volume 6

Capítulo 277: Kiara

Depois de nos levar para o interior do castelo, a criada responsável por nos guiar parou em frente a uma porta com um tapete vermelho e virou-se para nos encarar.

— Chegamos aos aposentos privados de Lady Kiara. —, disse ela. — Por favor, esperem um momento enquanto eu busco permissão para entrar.

Fran e Guendalfa assentiram quando a criada se virou e bateu suavemente na porta.

— Lady Kiara? Guendalfa e a Princesa do Raio Negro estão aqui para vê-la.

— Sim, entrem. —, disse uma voz de dentro da sala.

A empregada abriu a porta para nós. Havia uma mesa com uma cadeira ao lado da janela, um espelho com a altura uma pessoa ao lado de um armário lindo, uma poltrona no canto e uma cama king size no meio. Todo o mobiliário e o interior eram feitos com ouro ou foleados nesse material, mas os desenhos não eram vistosos.

Em vez disso, eles foram cuidadosamente elaborados de modo a parecerem agradáveis aos olhos. As cortinas, o carpete e os lençóis eram todos feitos de tecido luxuosos ou seda. O quarto inteiro estava limpo e arrumado. Era óbvio que sua ocupante estava sendo tratada como uma convidada de honra.

Uma velha gata-negra estava sentada ereta na cama. Nós sabíamos que ela deveria ser uma gata-negra, mas sua aparência não indicava isso. Os cabelos de suas orelhas e rabo tinham ficado brancos. Sua postura era boa, o que indicava que ela ainda devia estar na ativa, apesar de parecer abatida e magra. Ela também era alta. Parecia que ela poderia chegar a 1,70 m em pé. Ela com certeza não passava a impressão de uma velha senhora frágil, cujo corpo estava definhando.

Ela olhou para Fran com um olhar tão intenso que fiquei intimidado por um breve momento. Eu senti como se meu coração parasse e que estava perfurada por punhais. Se ainda fosse humano, teria me prostrado de forma inconsciente no chão por medo. Fran, no entanto, estava completamente imperturbável.

— Você é Kiara?

— E quem foi que lhe disse que você poderia falar comigo de forma tão grosseira?

— Lorde das Feras.

— Hah! — Ela deu um tapa no joelho. — Bom saber. Me certificarei de dar um belo soco na próxima vez que o ver.

Uau, ela falava de forma muito brusca. Mas, de forma surpreendente, isso se encaixava muito bem com ela.

— Para responder sua pergunta... —, ela continuou: — Sim. Eu sou Kiara. Eu conheço o pirralho birrento logo ali. — Ela apontou o queixo para Guendalfa.

— Birrento? Eu já tenho 22 anos! — replicou Guendalfa

— Calado! — gritou Kiara. — Todos com menos de 40 anos são pirralhos birrentos para mim. Então, quem é a garota?

— Mestra Kiara. — disse Guendalfa, surpreso. — Você não ouviu falar da Princesa do Raio Negro?

— Lady Kiara acabou de acordar hoje. —, disse a camareira que nos guiou para esta sala. — Nos últimos vinte dias, Lady Kiara esteve em coma.

Puta merda! Um coma por vinte dias!? Se ela ficou desligada por tanto tempo, não era de surpreender que ainda não tivesse ouvido falar de Fran.

Eu olhei mais de perto e vi que suas bochechas estavam um pouco afundadas e seus lábios estavam realmente secos. Seus braços pareciam finos e frágeis, indicando que estavam sendo pouco usados.

— Ela está... — começou a empregada, mas Kiara a interrompeu.

— Pare aí. — Ela gesticulou para Fran e disse com uma voz suave: — Venha aqui querida.

Fran trotou até a cabeceira.

— Qual é o seu nome?

— Fran.

Kiara abriu os braços e Fran a abraçou. No início foi um abraço leve, mas depois de alguns segundos, Kiara de repente puxou Fran com força para ela.

— Todos esses anos eu temi que o objetivo que eu buscava fosse inalcançável. —, disse ela. — Agora eu tenho a prova do sucesso de pé bem na minha frente. Obrigada Fran, por vir até mim e me mostrar que minha jornada não foi em vão.

Kiara enterrou o rosto no ombro de Fran. Senti meu coração apertar quando ouvi o que ela disse. Seu sussurro, que carregava o peso de 50 anos de dúvida, incerteza e determinação, parecia reverberar por toda a sala.

Após alguns momentos de silêncio, Kiara enfim se acalmou e libertou Fran.

— Você pode me dar os detalhes? —, Perguntou Kiara. — Como você fez isso? A menos que haja alguma razão para você não me contar. Eu não vou forçá-la.

— Claro. —, Fran acenou com a cabeça. — Mas ouvi que Vovó Kiara já deve saber o método.

— Quem te disse isso?

— Dias.

— Quê...? Então ele ainda se lembra de mim...?

— Nn. Aurel e Rumina também.

Os olhos de Kiara começaram a vacilar, e ela sorriu.

— Aqueles tolos. —, ela disse. — Eles deveriam ter me esquecido e seguido em frente há muito tempo.

— Eles não esqueceram. Sempre procurando por você. —, disse Fran.

Kiara suspirou: — O que eu tenho é apenas uma hipótese. Deixe-me ficar mais confortável primeiro.

Kiara se virou e saiu da cama. Guendalfa freneticamente estendeu a mão, mas ela o afastou e sentou-se em sua poltrona.

— Então tudo começou naquele dia em Ulmut. Eu me aventurei nas profundezas de um calabouço, apenas para descobrir que sua mestra era uma gata-negra evoluída. —, disse ela. — Foi assim que conheci Rumina há 50 anos. Ela era muito doce para o seu próprio bem. Ela se ofereceu para me ajudar a evoluir, mas seu método era muito elaborado. Isso exigia que ela se transformasse em um ser maligno.

Fran piscou.

— Transformar em ser maligno, como?

— No passado, um dos chefes da Tribo dos Gatos-Negros invocou um ritual para afogar nossa espécie no poder do Deus Maligno. —, disse Kiara. — Foi por algo estúpido como para fortalecer a tribo. Como muitos membros da tribo, Rumina também foi apanhada nos processos do ritual. Ela também tinha o poder do Deus Maligno incorporado nela.

Ela mostrou uma careta neste momento.

— Então ela me disse para recuar, e eu fiz isso, e de repente, minha habilidade de Detecção de Presença Maligna ficou louca. Senti uma presença nojenta vindo de Rumina, que ficou cada vez mais forte enquanto eu a observava. Ela provavelmente estava usando seus poderes como uma mestra do calabouço para desbloquear alguma parte corrompida de sua alma ou algo parecido. De qualquer modo, eu sabia que o que ela estava fazendo era algo ruim, então eu corri e dei um soco nela. Eu a disse que não queria evoluir se isso significasse perder uma amiga. E esse foi o fim.

— Transformar em ser maligno? —, Perguntou Fran.

— Eu tentei descobrir isso por conta própria. —, disse Kiara. — Depois de pensar nisso, me lembrei da pesquisa que fiz sobre a incapacidade do nosso clã de evoluir. Havia muita desinformação sendo espalhada na época. Parte disso foi por membros da nossa própria tribo tentando evitar a humilhação ou manter a moral dos mais jovens. Parte foi espalhada por um gato-azul que só queria mexer conosco. E não havia muitas provas escritas onde quer que eu procurasse.

Ela suspirou.

— Um dos poucos itens que me veio à mente foi um pergaminho velho e rasgado que mal era legível. As partes que eu podia ler diziam que nossa tribo invocou a ira dos Deuses e fomos amaldiçoados. Precisávamos derrotar algo no nível do Deus Maligno para quebrar essa maldição. Acho que Rumina estava tentando se tornar essa coisa maligna. Ela queria me deixar derrotá-la para que eu evoluísse.

Kiara cruzou os braços e se inclinou para trás enquanto terminava sua explicação.

— Então, essa é a minha teoria. —, disse ela. — O quanto isso está relacionado com suas experiências?



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