Magia Gênesis Brasileira

Autor(a): Rafaela R. Silva


Volume 1

Capítulo 2: O primeiro segredo é revelado

Distante dali, Ector seguia para o seu destino, acompanhado de seu mais novo oficial e mais três soldados. Com intervalos somente para o descanso e alimentação dos cavalos, conseguiram chegar à sede do Conselho Mundial pouco após Gregory se pronunciar à amedrontada e alvoroçada multidão ali presente.

Ector e os demais desciam de seus cavalos, os quais foram recebidos pela guarda local e direcionados aos estábulos. Enquanto isso, uma mulher, de cabelos curtos, tentava se sobressair à multidão, mas sua baixa estatura não a beneficiava.

Aquela bela jovem, um pouco descabelada, com a pele levemente bronzeada, sinalizava freneticamente ao grupo que acabara de chegar, apontando para uma entrada lateral menos congestionada pela massa ali presente.

Era perceptível que ela estava a trabalho do conselho, aparentemente uma auxiliar de Gregory. De modo quase angustiante, ainda buscava passar por toda aquela gente e chegar à pequena tropa, que tentava entender o motivo de todo alvoroço. Por fim, após uma árdua luta, chegou ao seu destino.

— Bom dia, cavalheiros. Meu nome é Liffa Truman. Desde já, peço desculpas pela confusão e que ignorem essa constrangedora situação — disse ela, enquanto orientava a passagem do grupo.

Um tanto estabanada ao tentar organizar alguns papéis e pastas em suas mãos, Liffa informou aos convidados que estava aguardando mais pessoas. Assim que todos estivessem presentes, ela os chamaria para iniciar a reunião e explicar melhor o motivo de tal convocação. Depois, ligeiramente, ela se esgueirou entre os guardas e dirigiu-se para fora. Podia-se claramente perceber que passar por multidões, definitivamente não era o que ela gostava de fazer.

Após algumas horas, Cázhor e Lenna já se aproximavam dali. Dentro da carruagem já era possível visualizar as imediações do reino. Lenna estava entusiasmada com a chegada ao seu destino. Sua primeira missão fora do reino de Manshur, uma grande oportunidade de provar ser mais do que julgavam sobre ela.

A chegada ao reino de Ancor atraia maus olhares por onde a carruagem passava. Lenna sabia que, devido sua raça, ela não era bem-vinda. Os transmorfos foram o estopim para dar início ao grande conflito de Carmim no passado. Sua presença agitava ainda mais os locais.

— Por que o Sr. Wilheiman está com aquilo?

— Aposto que isso tem alguma coisa a ver com a agitação na sede.

— Monstro, como tem coragem de dar as caras?

Enquanto ouvia o desprezo dos habitantes, Lenna se retraía em um canto. Cázhor ao ver a cena, claramente não se importou muito.

— Fique tranquila. Não dê atenção a eles. Foque na missão — aconselhou ele.

Dentro da cúpula, Vladmyr já estava impaciente. Era constantemente advertido por Ector que, por mais que tentasse acalmar os ânimos, também se encontrava bem afoito pelo tempo de espera. A ansiedade acabou, quando viram uma movimentação na entrada do corredor que levava até a sala onde estavam. Lá vinha ela, com seus cabelos desgrenhados, tentando equilibrar as pastas e pergaminhos enquanto andava. Liffa estava acompanhada de mais duas pessoas.

— Esses são o Sr. Wilheiman e a Srta. Weins. Eles também irão participar da reunião.

O homem trajava o que parecia um sobretudo num tom verde musgo com algo que lembrava uma cruz na altura do seu peito. Destacava-se também suas grevas refinadas com uma joia incrustada e seu cabelo levemente esverdeado.

Vladmyr olhou aquele homem, mas não conseguiu identificar qual sua classe. Parecia uma mistura de clérigo, mago e de longe talvez um guerreiro meia boca, nada que justificasse tamanha espera. Seu nome, no entanto, lhe era familiar. Por várias vezes, quando era criança, escutou de seu pai sobre um jovem excêntrico que havia entrado muito novo para a cúpula dos magos devido a sua grande aptidão com magia. A julgar pelo que via, tudo indicava que era ele o tal mago.

Vladmyr se perdia em suas memórias até que uma grande agitação se tornou seu foco. Os olhares se voltaram para a mulher que acompanhava o mago. O ambiente, claramente, se tornou desconfortante. O grupo de Ector se demonstrou bem hostil, alguns levando suas mãos às espadas já em prontidão.

— Ela está conosco! — Liffa disse desesperadamente se pondo a frente e repreendendo a ação.

— O que uma transmorfo faz aqui? Vocês enlouqueceram? — esbravejou Vladmyr.

Com tamanha repreensão, Lenna se afastou assustada, até se encostar à parede.

— Nem todos foram criados da mesma forma, treinados para serem soldados ignorantes que atacam primeiro antes de perguntar — retrucou Cázhor, dirigindo seu olhar aos militares.

Ainda havia muito rancor a essa raça. Tanto ódio envolvido que cegou os homens, os quais, após a guerra, caçaram e quase aniquilaram todos. Uma forma de vingança por provocarem tal chacina, fazendo-os se refugiarem em áreas isoladas. Aos olhos de muitos, nada mais que o merecido.

Os poucos que sobreviveram, se escondem em vielas, mudando de tempos em tempos para evitar uma nova retaliação. Outros ambicionam uma vingança contra aqueles que os perseguem até hoje.

Mesmo após os ânimos se acalmarem, Vladmyr ainda expressava sua completa objeção em aderi-la na missão. Para ele, se realmente fosse algo de tanta importância, a presença dela só traria mais problemas.

— Essa raça só está aguardando o momento certo para dar início a uma nova traição ao reinado! — insinuava Vladmyr.

— Não fale de mim como se eu estivesse ausente! — revidou Lenna, mesmo após as falhas tentativas de Cázhor em mantê-la quieta. — Pare de me julgar por algo que não fiz!

— Todos são iguais! Traidores! — gritava Vladmyr.

— Não me importo quem queria matar quem. Todos aqui foram convocados e aprovados pelo conselho, nenhum de vocês tem a autoridade de contestar — interrompeu um homem que acabava de chegar.

Imediatamente, todos os presentes, fizeram uma reverência curvando-se em direção àquela pessoa. Era ninguém mais que Gregory, líder do conselho.

Após sua chegada de supetão, ele dispensou as formalidades. Vladmyr tentou ignorar a situação intensa que se formou, deixando seu corpo cair em direção ao enorme sofá que se encontrava atrás dele, próximo à parede, afundando-se nas enormes almofadas de cor azul anil.

Gregory então, solicitou aos três guardas da tropa que acompanhavam Ector para se retirarem e isolarem a sala, a fim de evitar interrupções alheias. Logo depois, sentou-se em uma poltrona mais ao centro da sala.

— De fato, não há dúvidas quando se fala sobre a grande reputação da maior lenda quando se trata de magia no mundo, o mago Fazhar. Nome esse, associado à criação de toda a forma de ocultismo que conhecemos — dizia Gregory, dando início à reunião.

— Creio que, todos aqui presentes, saibam também sobre a história de um lendário livro escrito por ele, quando a magia ainda sequer era conhecida. Um livro que traz inúmeras histórias sobre suas aventuras pelo mundo, acumulando seu conhecimento, criando encantos e magias a partir de suas experiências. — Ele tentava, da forma mais sucinta, abordar o assunto.

— Ele de fato existe — disse Liffa.

— Nem mesmo eu sei muito sobre o conteúdo desse livro. Somente os antigos líderes tinham ciência de seu conteúdo, embora, também não soubessem muita coisa. Porém, foi o suficiente para o Conselho Mundial selá-lo. E assim ele se manteve.  — Gregory fez uma breve pausa — Até hoje!

— Sr. Sthef, realmente esse é o local adequado para divulgar esse tipo de informação? — interrompeu Cázhor, que não parecia surpreso, mas estava claramente apreensivo.

Os demais ali presentes estavam embasbacados e, ao mesmo tempo, apreensivos em saber que tal artefato, de fato era real e, antes mesmo que pudessem fazer qualquer questionamento, Gregory continuou sua explicação:

— Pois bem, pelas expressões, não é de se espantar a surpresa de vocês. Mais do que óbvio, todas as informações passadas aqui são extremamente sigilosas e jamais devem ser repassadas a qualquer um, sob pena de traição ao reino — disse Gregory, mantendo a mesma feição do início da reunião.

Ele esclareceu que, na época, os estudos do livro foram pausados quando as coisas começaram a sair de controle. A descoberta de certas magias que concediam um enorme poder, chamou muita atenção dos líderes do exército. Porém, elas exigiam uma troca equivalente para serem conjuradas. Normalmente, sempre envolvia sacrifícios e grandes tragédias. Uma segunda grande guerra era totalmente inviável. Então, sua tradução foi suspensa.

— Recentemente, uma agitação incomum ocorreu dentro da câmara onde o livro encontrava-se selado. E hoje, a barreira mágica que o encobria, estourou como um simples pedaço de vidro frágil, desfazendo os selos.

— Ele se abriu e suas páginas começaram a se folhear, parando inexplicavelmente em uma específica — disse Liffa completando.

Segundo o relato de Gregory, o livro estava ressoando, parecendo indicar algo. Foi então que decidiram analisar a tal página que ele exibia. Nela, continham várias menções a um tal Zzhael Umyr. O mesmo que auxiliou na criação do que hoje é conhecido como o Conselho Mundial.

Citações que, ao final das traduções, os levaram a presumir que esse livro pertencia a ele, e não à Fazhar. Talvez fossem transcrições do suposto livro original, mas cheio de anotações próprias. Os pesquisadores não conseguiram chegar a um consenso.

Parecia que o livro demandava a presença do original. Mas por que tal comportamento, e justo agora? Era o que mais intrigava a todos.

— Partindo do ponto de que pode haver um livro original, eu os convoquei para verificarem o caso.

— Mas, se é algo de tamanha importância, por que não convocou toda a elite das tropas e do conselho para fazer a tal busca? — questionou Cázhor.

— Não vou designar uma tropa ou mesmo todos os meus melhores analistas para algo que pode ser em vão, despertando mais alvoroço. É incabível desfalcar tanto assim a segurança do reino para algo que ainda é uma mera suposição. — Com um olhar frio e cansado, continuou — Vocês dois já são um desfalque grande o suficiente para essa missão. Creio que suas escolhas para pupilos, foram mais do que bem selecionadas.

A resposta de Gregory soou com um tom de ordem e um pouco ranzinza.

— Ao menos que alguém tenha algo realmente importante a acrescentar, peço que ouçam em silêncio! — exigiu Gregory.

Então, o líder do conselho, continuou suas orientações para a missão. Liffa entregou aos quatro, um pequeno pedaço em branco da página do livro de Zzhael. Além de pequenos medalhões unidos a um fino, porém forte, colar.

— Nesses medalhões estão gravados a insígnia do reino de Ancor e o selo do Conselho Mundial. Foram feitos com um encanto especial para camuflar a magia desses pequenos fragmentos do livro que acabaram de receber. De certa forma, além de garantir a autenticidade de vocês na missão, serve como um selo — esclareceu, de antemão, Liffa.

— Um especialista em rastreio, se unirá ao grupo de vocês. Seu nome é Eduardh Hardro. Um confiável e antigo conhecido do reino de Nifhéas. A discrição da participação dele no grupo é imprescindível, conto com a colaboração de todos.

Pela primeira vez, Gregory parecia levemente apreensivo ao passar essa última orientação. Tal inquietude não passou despercebida, mas a demanda da missão era tão mais relevante que, qualquer outra explicação, poderia esperar.

— No mais, se preparem para a missão. Com certeza será uma árdua jornada. Principalmente pela falta de informação — continuou Cázhor — mesmo com acesso restrito às informações, ao longo dos anos, muitos tentaram possuir o livro que temos aqui. Caso realmente exista outro, creio que vocês não serão os únicos a tentar encontrá-lo.

Sem mais nada a dizer, Gregory se levantou, acenou levemente com a cabeça em sinal positivo para Liffa e se retirou da sala.

— Aqui estão alguns mapas e anotações com prováveis locais em que podem ter alguma coisa sobre o suposto livro de Fazhar. Tudo foi baseado em traduções feitas, às pressas, do exemplar de Zzhael Umyr. É uma linguagem muito antiga, então não me culpem se uma ou outra coisa não fizer muito sentido — alertou ela, antes que a questionassem.

Após a tensa reunião, ficou acordado que o grupo tirasse o restante da tarde para se recompor e que partissem no dia seguinte ao alvorecer. Ector despachou os três guardas que o acompanhavam até agora, para evitar um grupo volumoso, o que só chamaria ainda mais a atenção. Manteve apenas seu oficial, que julgava apto e estava a par da missão.



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