Volume 1
Capítulo 5: Irmão
— 98… 99… 100!
Lucas largou um pedaço de madeira no chão. Seus braços doíam e pareciam macarrões de tão fracos, piores do que no primeiro dia de treino.
Pouco importava de qualquer forma, pois atingiu o objetivo que almejava.
O atributo "Esgrima" foi desbloqueado.
Era esse atributo o motivo de escolher Dom do Ladrão ao invés de Arte da Esgrima. Todas as técnicas de espada vinham dali, o que só facilitava sua vida.
Sentou-se num banco da praça. As pessoas o estranharam, e ele confessava que era vergonhoso fazer aquilo em plena manhã do final de semana, porém era melhor do que tentar em casa.
Não compensava passar o risco de quebrar algo e enfrentar a ira de sua mãe.
"Valeu a pena pelo menos… agora só preciso liberar as árvores de skills e terei um jeito de lidar com aquilo."
Como não sabia a maneira que abria a tal tela, assistiu algumas aulas sobre usar uma katana.
Mataria dois problemas com uma pedra, no caso aumentar inteligência e saber o jeito correto de usá-la.
Levou duas horas e meia de constante aprendizado, compensadas por um precioso conhecimento e diversas telas abertas em sequência.
O atributo inteligência aumentou. (5x)
O assunto "Uso básico da katana" foi concluído.
Skills foram desbloqueadas. Diga "skills".
— Skills.
Uma larga janela apareceu. Nela havia três blocos principais recheados de ícones, abaixo estavam outros nove blocos menores.
Os maiores representavam as classes principais — Guerreiro, Mago e Ladrão.
Por conta de sua escolha anterior, o primeiro ícone das skills de ladrão estava aceso, porém tinha outro um acesso em um dos blocos menores.
"Hum? Desde quando tenho essa classe? É um arquétipo de ladrão, mas não era para tê-lo agora."
O ícone em questão era um baú aberto cheio de itens.
Toque da Sorte
Aumenta grandemente a chance de itens comuns e raros caírem de monstros.
Aquilo explicava o motivo dos goblins droparem Ervas da Manhã com tanta facilidade. Não fazia ideia do motivo de ter a tal skill já liberada, mas agradeceu internamente.
Lucas possuía dois pontos para consumir entre os blocos maiores, então escolheu a primeira da árvore de Mago e a segunda da árvore de Guerreiro.
Iniciado em Magia
Desbloqueia uma magia elementar de 1° nível.
Carregar Força
Permite acumular energia para fortalecer o próximo ataque.
Fechou todas as janelas, levantou do banco e pegou o pedaço de pau. Atacou o ar, dessa vez usando pelo menos o que aprendeu nas videoaulas.
Seus braços doloridos repetiram o mesmo movimento de novo e de novo.
O atributo Esgrima aumentou.
Apenas parou perto do horário do almoço. Ao chegar em casa, viu uma pessoa inusitada conversando com sua mãe na mesa.
Era um rapaz mais novo que Lucas, bastante atlético e muito falador. Era seu polo oposto, também conhecido como o irmão caçula da família.
— Luquinhas, finalmente você chegou! — Sua mãe o olhou e abriu um sorriso. — Viu só, Levi? Eu te disse que seu irmão mudou!
— Não é possível.
O garoto levantou da cadeira e se aproximou dele. Ficou boquiaberto, o que só criava mais confusão na cabeça do irmão.
— Mano, você realmente tá se exercitando e comendo bem agora?
— Eu tô. Comecei faz uma semana.
— Quem é você e o que fez com meu irmão, seu impostor?!
Lucas fechou a cara e deu um cascudo nele. Depois de se arrumar mais apropriadamente, juntou-se à conversa na mesa.
Levi tinha o costume de visitá-los nos finais de semana, então não dava para perder a chance de descobrir algumas novidades.
A primeira e mais inesperada era de que ele arranjou uma namorada.
— Ohhh, e como ela é? — A mãe perguntou, enquanto servia o almoço. — Ela é estudiosa? Inteligente? Bonita?
— Mãe, ela é normal. — Ele conteve uma risada por causa daquela falta de paciência. — O nome dela é Natália, ela é meio raivosa, mas bem legal e interessante. A gente se conheceu ano passado no campus, eu só vim me confessar umas semanas atrás e deu certo…
— Tenho inveja de você — o irmão mais velho falou, bagunçando o cabelo do caçula. — Eu não duvidava por conta da sua aparência, garanhão, só que te digo que cheguei a levar um susto.
— Não mais do que eu quando soube que você começou a tentar ficar saudável, mano!
Uma leva de risadas e um almoço complementaram a reunião familiar. Os dois irmãos foram para dentro do quarto jogarem qualquer joguinho, em especial o jogo Road Fighter.
Ocasionalmente rolava uma trapaça por um dos lados, mas nada que ferisse a diversão.
— Ei, mano, eu tô pensando numa coisa faz tempo.
— O que seria?
— Eu acho que quero me tornar um Raider.
Aquilo deu um certo desconforto em Lucas, isso o levou a sua derrota no primeiro round.
— Por que você quis me dizer isso agora?
— Porque eu tenho certeza que posso passar nos testes, tanto os de empresas quanto os do estado. — Levi perdeu o segundo round. — Aí eu queria saber sua opinião. Você acha que compensa?
— Sinceramente, não pra você.
Ele venceu o último round e colocou na tela de seleção de personagens. Largou o controle em cima do console Ploy e travou os olhos em Levi.
— Eu tenho certeza que quer fazer isso por dinheiro, mas te digo que não precisa. — Sorriu, afagando o cabelo dele. — Você tá na faculdade que quer, tem uma namorada e daqui dois anos vai se formar. Pra que arriscar tudo isso?
— É que… é injusto. — Abraçou as pernas, sua expressão ficou sombria. — Você teve que sacrificar seu futuro pelo meu, mano. Eu queria arranjar mais dinheiro pra que não precisasse ser assim… pra que a culpa não fosse minha.
Uma batida na cabeça jogou os nervos do caçula para o alto. Lucas demonstrou raiva por meio de uma careta falsa.
Por mais que entendesse o motivo dele se sentir assim, não gostava de vê-lo se rebaixar por um ato de bondade vindo da família.
— A culpa não é sua, lembre-se disso.
A sentença encerrou a conversa. Eles voltaram a jogar como se nada tivesse acontecido, semelhante à infância quando podiam passar o dia inteiro enfiados no sofá sem fazer nada.
Era uma memória boa, mas distante demais para a realidade atual.
Quando anoiteceu, Levi se despediu e foi embora, porém Lucas insistiu em acompanhá-lo até a parada do ônibus. Os dois se abraçaram uma última vez.
Ele observou a lataria azul se misturar ao trânsito e suspirou. Já esperava que seu irmão fosse ter tal ideia, além do mais, o negócio de Raiders gerava bastante dinheiro.
Porém jamais o colocaria em tamanho risco, não enquanto estivesse vivo.
A primeira experiência de entrar no portal se cravou na mente, e ele com certeza não desejava que o mesmo acontecesse ao seu querido irmão.
Lucas precisava matar essa preocupação, uma grana fácil estava nos seus pés e mesmo assim ignorava por uma birra infantil.
“Eu não devia ter medo de algo tão bobo quando algo mais assustador pode ocorrer a qualquer momento.”
Ele entrou em casa e foi direto a um saco escondido no guarda-roupa. Pôs em cima do ombro e caminhou lentamente em direção a porta, passando pela cozinha.
— Mãe, vou deixar umas coisas na casa de um amigo e já volto, tá?
— Tá bom, filho. — Ela parou de lavar os pratos e viu o saco. — Jesus, parece que você tá levando um corpo. Cuidado pra não te pararem com isso daí.
— Pfft… não é um corpo, relaxa.
Ele saiu com algumas risadas. Olhou de um lado para o outro quando chegou na calçada, não tinha nenhum vizinho à vista, então seguiu sozinho.
O saco em suas costas estava repleto de Ervas da Manhã, que seriam vendidas logo naquela noite. Sacou o celular do bolso e discou para um número.
A ligação foi atendida na hora.
— Atendimento da Scarlet Witch Bazar, pois não?
— Alô, eu gostaria de saber se estão comprando Ervas da Manhã.
— Sim, estamos. Você tem alguma para vender?
— Tenho. Estou indo agora mesmo para sua agência.
— Certo. Por favor, espere na recepção quando chegar.
Lucas desligou a ligação e foi para o tal endereço da Scarlet Witch Bazar. Parou na frente do prédio e ficou de queixo caído ao perceber a altura daquilo.
Um grande letreiro vermelho com preto destacava o nome da agência. Um pouco intimidado pela aparência, ele entrou no prédio.
A entrada possuía um balcão entre dois elevadores, onde uma secretária teclava num computador.
— Com licença…
A moça ergueu os olhos e arrumou os óculos, sua feição permaneceu dura.
— Sim?
— Eu liguei mais cedo. Quero fazer uma venda e a pessoa disse pra eu esperar aqui…
— Oh, claro. — Ela apontou o dedo para um conjunto de assentos no canto. — Espere ali um instante, vou chamar alguém.
Sentou num dos assentos, olhando de relance a secretária se levantar e ir até uma porta na lateral. Estava ansioso, era a primeira vez que conversava com um estranho sem gaguejar.
Alguns momentos depois a secretária retornou com uma pasta nas mãos. Ela tirou dali uma folha de papel e entregou nas mãos dele.
— Me acompanhe até a sala de inspeção. — Indicou a porta pela qual entrou e saiu. — Verificaremos a autenticidade do produto e você precisará preencher esse formulário mais tarde para finalizarmos a venda.
— Cer-certo…
Lucas se levantou e caminhou para o canto indicado. O lado de dentro era uma ampla sala branca com um balcão preto no meio e com diversos instrumentos nas estantes.
Lá dentro um homem de cabelo curto e loiro andava de lá pra cá, usando uma roupa bem casual em comparação com a secretária.
Ele encarou os dois que chegaram e limpou o balcão de alguns objetos, deixando uma balança e um conjunto de facas, além de um termômetro esquisito.
— Boa noite — disse, arregaçando as mangas. — Soube que você trouxe Ervas da Manhã para vender. Onde as encontrou?
— Perto da minha casa… Encontrei dentro de uma caixa deixada na rua. Perguntei pra todo mundo se era uma entrega, mas todos disseram que não compraram isso.
— E como você não achou o dono, quer vendê-las. — O homem afiou uma das facas. — Pode colocar o saco em cima da balança, por favor?
Fez conforme o pedido. O peso na balança subiu para 4kg, o que fez o sujeito levantar as sobrancelhas de surpresa.
— Interessante… — Pôs um par de luvas e tirou uma parte das ervas. — Deseja escolher comprar alguma coisa enquanto analiso o produto?
— Se não for muito caro, sim.
— Angeline, pode levá-lo ao setor de equipamentos básicos?
A secretária acenou positivamente, guiando Lucas para fora da sala. A última coisa que ele viu foi a expressão de perplexidade por parte daquele doutor estranho.
Ambos foram à uma outra sala, onde havia um amplo corredor de tapete azul e diversos itens espalhados em prateleiras nas paredes.
Lucas observou os diversos objetos, a maioria não parecia lá grande coisa.
— Vocês tem um anel ou colar com uma propriedade mágica?
— Temos um colar que acabou de chegar. — A mulher foi mais na frente e puxou um colar de uma das prateleiras. — Este aqui fornece uma pequena barreira numa pessoa contra golpes… É fraca, mas eficaz contra inimigos menores.
Olhou o objeto. Tinha um olho no centro, cercado por várias pedras azuis e com uma esfera negra no meio do olho. Era estiloso.
— Eu vou querer.
— Boa escolha. Deseja parcelado ou à vista?
— Quero parcelado. Aceita pix?
— Aceitamos.
Lucas fez o pix e parcelou em 10×, já que o valor era alto demais até para seus padrões.
A venda das Ervas da Manhã foi suficiente para sobrepor grande parte do dinheiro, logo só precisaria se preocupar com as parcelas e usar o resto da maneira que quisesse.
Retornou para casa após resolver toda a questão do formulário, além de tirar uma engraçada lição sobre as vendas: tudo era regulamentado e organizado.
Para sua sorte não exigiam somente cartão, o que facilitava e muito aceitarem outras formas de pagamento.
Equipado e arrumado, esperou ficar o tempo passar lá fora. Quando sua mãe dormiu, foi para as ruas.
Sua habilidade com esgrima cortou os goblins rapidamente, logo os outros 10 foram eliminados. A meta foi atingida, 50 goblins mortos.
Uma mensagem apareceu à sua frente, uma que já esperava há bastante tempo.
A masmorra Caverna Fungicida foi liberada.
Deseja iniciar uma excursão?
→ Sim | Não.
Sem nenhum peso na mente, ele escolheu "Sim".