Dançando com a Morte Brasileira

Autor(a): Dênis Vanconcelos


Volume 3

Capítulo 56: Esperança (1)

Na manhã seguinte à morte de Jaan, uma jovem cruzava apressada os corredores do Palácio do Sol até finalmente entrar no salão do trono. Lá, o Primordial do Sol permanecia sentado, com a cabeça apoiada no braço e um semblante de tédio.

A jovem tinha os olhos completamente amarelo-claros, um vestido simples azul-claro e cabelos brancos com algumas mechas cianas.

"Jane... O que você está fazendo aqui?" Jeane ficou preocupada.

Jane se aproximou do trono e se ajoelhou.

— Pai... Por favor, mande subordinados para buscar meu irmão! Senti muita dor e ouvi gritos a noite inteira, como se ele estivesse pedindo socorro...

Sol olhou para baixo com soberba.

— Por que eu deveria fazer isso? Vocês não passam de decepções.

Ela levantou o rosto, olhando para ele.

— E-eu pintei meu cabelo para que você gostasse de mim. Não pareço com a Lua?

— Você achou mesmo que fazendo isso teria minha aprovação?

Ela abaixou a cabeça novamente, encostando-a no chão, e clamou:

— Por favor, papai... Salve Jaan!

Ainda olhando para ela com arrogância e nojo, respondeu:

— Não me importo que ele morra. Se você estivesse lá para morrer junto, seria ótimo nunca mais precisar olhar para essa sua cara horrenda.

Jeane permaneceu em silêncio, de pé ao lado do trono, como era obrigada. Olhando para sua filha, percebeu que Jane lentamente criava uma adaga de sangue, escondida.

"Filha, não faça isso, por favor..."

Quando Jane terminou de formar a adaga, se levantou rapidamente e avançou em direção ao coração de seu pai.

"FILHA, NÃO!"

Creck!

Sol segurou seu braço e o quebrou como um graveto.

— AAAIIII! AAAAAIII! — Jane começou a chorar, gritando desesperada de dor.

Sol, segurando o braço quebrado, se levantou, Sccrrrchh... e a arrastou para fora do salão.

— MÃE! MAMÃE! — clamava por Jeane.

Jeane começou a lacrimejar, deu um passo à frente, mas Sol, de costas, ordenou:

— Volte ao seu lugar! — Ele virou o rosto ligeiramente para ela e completou: — Ou quer ser punida junto?

Jeane travou, começou a chorar e permaneceu parada ao lado do trono, enquanto escutava sua filha gritar de dor sendo levada.

— M-M-ME DESCULPA!... POR FAVOR!... ME DESCULPA, PAPAI!

Sol a ignorou, arrastando-a pelos corredores do palácio até a masmorra no subsolo.

PAH-PAH!...

Ao chegar a uma escada, a jogou, fazendo-a rolar pelos degraus escuros e cobertos de lodo até parar sobre o braço quebrado. Jane chorava sem parar. No chão, ela o viu se aproximar, descendo as escadas com raiva.

Tentou se levantar, mas não conseguiu. Escorregou levemente naquele líquido espesso, gosmento e escuro. Antes de cair novamente, Sol a segurou com brutalidade, Rrrrrrppppp... e a arrastou pelo corredor do subsolo, deixando pegadas profundas e firmes, enquanto ela era arrastada por toda aquela sujeira.

As paredes de pedra, antes cinzas, agora estavam cobertas de lodo escuro. O ambiente era úmido, Poc!... Poc!... com gotas de líquido ainda mais escuro pingando das pedras. Rrrrrrppppp... a arrastou pelo chão de tijolos até as celas abandonadas, dominadas por insetos monstros como baratas zumbis, pequenas lacraias mutantes que se esconderam nas fendas ao escutarem o barulho, e larvas que se alimentavam do lodo nas paredes.

PAH!...

Sol abriu uma cela e a jogou lá dentro, sobre o braço quebrado.

— A-ah-aii... Argh...

O lugar não tinha nada além de um par de algemas enferrujadas presas à parede e um cheiro insuportável de corpos em decomposição. Nenhuma das celas abrigava outra pessoa, ao menos viva. Esqueletos estavam presos nas paredes, e em algumas, nem sequer ossos restavam, pois haviam servido de alimento para os pequenos monstros que dominavam aquele lugar.

Insetos comuns disputavam território, mas logo se tornavam alimento também, deixando esses monstros mais fortes, em uma constante mutação ao ingerir sangue. Se ao menos ela estivesse sozinha naquele lugar em desuso, seria melhor do que conviver com aqueles seres minúsculos e nojentos. Tremendo de dor, Jane tentava se mover, segurando o braço ferido, tentando amenizar o sofrimento.

A umidade do chão se infiltrava em seu corpo, e ela sentia um frio cortante naquele lugar, que não possuía nem mesmo uma janela para que ela pudesse ver a luz do sol.

— Você vai apodrecer sem comida e água, vai passar o resto da sua vida definhando até a morte. Você não serve para nada. Seu corpo, seu rosto, nada é igual. Sua inútil.

Jane, caída no chão, olhou para cima e viu o rosto de nojo de seu pai.

— Seu corpo me dá vontade de vomitar. Eu deveria ter arrancado você da barriga da sua mãe e matado antes de precisar olhar para você. Ptu! — Sol cuspiu no rosto da sua filha e se virou, saindo em direção às escadas.

— ...Me desculpa...

A única luz que iluminava aquele lugar vinha da porta, na escada. Ele não acendeu nenhuma das velhas tochas do local e, assim que saiu, Plahck! fechou a porta atrás de si. Jane ficou na mais completa escuridão, apenas conseguindo ver os pequenos olhinhos dos insetos que a observavam. Kr-kr-kr... o som das larvas devorando o lodo ecoava ao seu redor, kliklikli... e o barulho das patinhas das lacraias, se arrastando pelas fendas das paredes, completava o pesadelo.

— ME DESCULPA! — Continuou em lágrimas, deitada no piso, ouvindo os sons das pequenas criaturas ao seu redor durante o dia inteiro, enquanto seu corpo permanecia imerso no líquido escuro, um mar de sangue velho da linhagem do sol.


Na manhã seguinte, Jeane acordou ainda na madrugada.

Dormia no quarto de Sol, mas dificilmente em sua cama. Vendo-o descansar ao lado de quatro cumcudinas demônios da linhagem dele, saiu de fininho e se dirigiu até a cozinha do palácio.

Lá, conseguiu pegar comida e água com as servas, que a ajudaram sem denunciá-la ao Sol. Após receber o jarro de água e uma pequena cesta de pães, se dirigiu rapidamente até a escada do subsolo, conseguindo entrar escondida e levando o alimento para sua filha.

Quando chegou, fechou a porta da escada e usou uma pequena magia do sol para iluminar a descida pelos degraus escorregadios, indo com cuidado para não escorregar. Poc!... Poc!... O som das gotas batendo no piso ecoava enquanto o cheiro e a umidade daquele lugar se tornavam quase insuportáveis.

Ao fim da escada, começou a caminhar com mais facilidade, escolhendo pisar no centro das pedras, pois nas extremidades havia mais gosma. Iluminava o caminho à frente com o pequenino sol criado, e logo começou a escutar um choro baixinho. Jane se encheu de medo ao ver a luz se aproximando.

Jeane finalmente chegou à cela de sua filha e a encontrou deitada no chão, chorando baixinho e cheia de machucados. Seu vestido estava rasgado, o braço quebrado agora mais roxo, agravado pelo ambiente precário. Ela tremia, não apenas de frio, mas de medo, mas ao ver sua mãe, seus olhos brilharam, tremendo mais do que seu corpo.

Rrrrppp...

Jane se arrastou até a grade, desta vez não chorando para dentro, mas gritando bem alto. Segurava a grade com uma mão, e dava para ver nitidamente seus dedos roídos.

— Mãe, por favor, não me deixe aqui sozinha, mãe... Mãe! Mamãe, por favor, não vá! Por favor, mamãe! Não, não...

Jeane colocou a comida ao lado das grades para que Jane pudesse pegar e comer.

— Não posso, filha. Tenho que servi-lo lá fora, meu tempo está apertado... Volto amanhã com mais comida. — Jeane, sem olhar diretamente para sua filha, se levantou e se virou para sair.

— MAMÃE!... NÃO ME DEIXE AQUI SOZINHA!... NÃO ME DEIXE SOZINHA!... de... novo... ma...mãe...

Jeane continuou subindo as escadas, mesmo ouvindo o choro desesperado de Jane pedindo por ajuda. Quando sua mãe saiu e fechou a porta, Jane soltou a grade, se sentou no chão e, segurando seu braço quebrado, começou a chorar e soluçar ainda mais.

— Por favor... Me tira daqui, mamãe... — murmurou baixinho.

No dia seguinte, Jeane retornou às celas do subsolo com uma tigela de comida e uma jarra de água. Seguiu o mesmo procedimento de antes: fechou a porta atrás de si e usou magia do sol para iluminar a descida. Cautelosa, desceu os degraus para não escorregar, mas não percebeu que partes do lodo estavam mais esmagadas do que no dia anterior.

Ao chegar ao corredor, iluminou melhor o ambiente, notando os insetos das paredes se afastando com a luz. Caminhando, Jeane começou a ouvir sons estranhos e, instintivamente, diminuiu o passo, avançando lentamente enquanto mantinha a luz à frente.

A gosma nas paredes se movia lentamente, mas ali não havia circulação de ar. Os insetos, irritados pela luz, se escondiam cada vez mais nas fendas. A cada passo, Jeane sentia mais medo daquele ambiente escuro. O som de algo sendo mastigado tornava-se cada vez mais nítido. Finalmente, chegou à cela de sua filha. Estendeu o pequenino sol diante de si e viu Jane, de costas, morta, sendo devorada pela besta do Primordial Branco.

As costas de Jane estavam abertas, e a besta a devorava, com a boca cheia de sangue amarelo.

Jeane paralisou de medo.

Crash! Clec!

A tigela e a jarra caíram de suas mãos, quebrando e ecoando no ambiente, que agora não estava mais vazio.

— S-s-socorro...

Paralisada, não gritou; apenas se virou para tentar fugir, mas, nesse momento, Frufrufrufru... todas as tochas do local se acenderam em chamas brancas. Branco surgiu a centímetros de seu rosto, sorrindo para ela.

Jeane se assustou, Pashfh! e Branco a empurrou contra a parede ao lado da cela, sujando suas costas no lodo.

— Está indo aonde? — Riu, olhando para Jeane, que se encolhia de medo. — Acha que pode chamar alguém? Lisssck! — Branco passou a língua pelo pescoço dela, subindo para o rosto, enquanto ela tentava afastá-lo.

— ...

— Já foi um milagre sobreviver ao parto de gêmeos, uma meia-humana tão fraca como você. O que ele viu em você? Essa tinta no seu cabelo fez ele realmente fantasiar que você é a Lua? — Mexia a cabeça para os lados com um tom sarcástico. — Pelo menos esse objeto que você criou serviu de brinquedo e comida para minha besta.

Jeane não parava de chorar enquanto ele falava.

— Ooh... Que carinha é essa? — Colocou a mão no rosto dela, virando-a para si. — Por que está chorando? Que medo é esse que você está sentindo? — Ele, com a mão apertando as bochechas, PAH! a empurrou no chão com brutalidade.

Caindo em frente à cela, a segurou, levantou a cabeça dela e a forçou a olhar para sua filha morta dentro da cela.

— Olha só que cena mais linda... — disse, com um sorriso estranho no rosto, observando o desespero de Jeane. — Limpe essa bagunça, não quero voltar aqui e sentir esse cheiro de carne de meia-humana. Fui claro?

— ...

Jeane, muito assustada, não respondeu.

Branco virou o rosto dela para si novamente.

— FUI CLARO?!

— S-si-s-sim, vou limpar tudo, não se preocupe.

Pahf...

Branco a soltou e, junto com sua besta, saiu do subsolo.

Completamente desolada, Jeane chorava enquanto juntava os restos mortais de sua filha em um velho barril de madeira, no corredor, já repleto de sangue podre, espesso e escuro, que mal parecia ser da linhagem amarela. Passando a roupa rasgada de Jane pelo sangue, que dava cor ao ambiente sombrio, Jeane continuava soluçando, com a respiração trêmula, enquanto observava sua filha iluminada pela forte luz branca das tochas.

— Desculpa por não ter ficado aqui com você... É tudo culpa minha. — Jeane passou o braço nos olhos para limpar as lágrimas. — Eu... Eu fui fraca... E-e-eu não fui mãe...

Se sentou ao lado do corpo.

— Eu deveria ter tentado fugir com você! Eu... Eu deveria ter... EU DEVERIA TER MORRIDO POR VOCÊ! — Abraçou o corpo da filha. — Me desculpa, filha... Me desculpa por ter sido tão egoísta... — Tocou os lábios na testa de Jane com um beijo, segurando-a nos braços, aos prantos.



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